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CAPÍTULO 5: ATRIBUTOS DE UM SISTEMA RESILIENTE

5.6 Perceção dos peritos e stakeholders

5.6.1 Painel nacional

A relevância da perspetiva da resiliência e da gestão adaptativa no contexto das áreas protegidas assenta na noção de que estas consistem em SSE que são dinâmicos e cujo estado se pode alterar, gradualmente ou de forma brusca, devido a fatores internos ou externos. Os respondentes do painel nacional concordam, de forma consensual, que os parques naturais são formados por componentes humanas e

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biofísicas fortemente interligadas (a definição geral de SSE, como apresentado no capítulo 1) e que estes são sistemas dinâmicos (Figura 63). Todos os respondentes deste painel concordam plenamente com a necessidade de monitorizar a evolução das condições ecológicas e socioeconómicas dos parques naturais. No entanto, relativamente à possibilidade de essas condições se alterarem de forma imprevisível a opinião é mais heterogénea: apenas 20% dos respondentes concordam plenamente com a afirmação, 25% concordam parcialmente, 25% discordam parcialmente, sendo igualmente significativa a percentagem de respostas neutras.

O cumprimento dos objetivos dos parques naturais, independentemente das condições em cada momento, é defendido de forma geral por 60% dos respondentes. Por outro lado, a opinião sobre a manutenção da classificação face à deterioração das condições que a justificaram varia bastante, com maior pendor para a discordância.

Quando questionados sobre a necessidade de reestruturar um parque natural (por exemplo, na sua delimitação, estrutura de gestão, normas de utilização, formas de intervenção, etc.) perante novas condições ecológicas e socioeconómicas, a maioria dos respondentes concorda de alguma forma (45% concordam plenamente e 40% concordam parcialmente).

Embora os conceitos de resiliência e de gestão adaptativa não tenham sido (de forma intencional) explicados aos respondentes, é-lhes atribuída uma conotação genericamente positiva, sendo encarados como desejáveis para os parques naturais pela maioria do painel. No entanto, esta visão não é consensual, com alguns respondentes (dois no caso da resiliência e um no caso da gestão adaptativa) a discordarem plenamente. De sublinhar que nenhum dos participantes optou pela não resposta, mesmo perante a ausência de definição dos conceitos, o que pode indicar que existe uma familiarização com estes termos apesar de ser provável a atribuição de diferentes significados.

Quanto à importância do sistema de governança dos parques naturais (i.e., as entidades responsáveis, os instrumentos de gestão, os mecanismos de participação dos stakeholders) na resposta às alterações do território, esta é reconhecida por todos os respondentes.

A necessidade de envolver os stakeholders no processo de tomada de decisão nos parques naturais é contestada só por um respondente. No entanto, nove participantes concordam ‘apenas’ parcialmente com a afirmação.

No que diz respeito à adequação de um sistema de governança policêntrico as opiniões são muito diversas. Nesta questão merece destaque, por um lado, o facto de nenhum respondente concordar plenamente com a afirmação e, por outro, o número de respostas neutras (seis) e de não respostas (duas). A ausência de explicação sobre o que se entende por sistema policêntrico pode justificar, em parte, estes números.

A opção ‘não concordo nem discordo’ pode representar uma verdadeira neutralidade, ausência de opinião por desconhecimento (uma não resposta que não se deseja admitir), fadiga no preenchimento do questionário (a seleção do ponto médio minimiza os custos cognitivos) (Sturgis, Roberts, & Smith, 2014) ou, em última análise, indiferença pelo assunto (o respondente considera que este não é relevante no contexto em discussão).

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Figura 63. Grau de concordância do painel nacional com afirmações sobre a dinâmica dos parques naturais,

respetivas implicações na classificação e gestão e importância do sistema de governança (n.º de respondentes=20) (NS/NR - não sei/não respondo;1 - discordo plenamente; 2 - discordo parcialmente; 3 - não discordo nem concordo;

5.6.2 PNSE

O primeiro aspeto a realçar nos resultados deste painel é o maior número de não respostas e de respostas neutras (quando comparado com os restantes painéis). Isto pode ser indicativo de falta de interesse ou de conhecimento sobre as questões apresentadas. Ainda assim, em cada afirmação a maioria das respostas é direcional (concordância ou discordância) (Figura 64).

Mais de metade (58%) dos participantes neste painel concorda plenamente que o PNSE é um sistema dinâmico e formado por componentes humanas e biofísicas fortemente interligadas. A necessidade de monitorizar a evolução das condições ecológicas e socioeconómicas do PNSE é reconhecida por todos, apesar de quatro respondentes concordarem ‘apenas’ parcialmente.

Ao contrário do painel nacional, a maioria dos participantes concorda genericamente com a possibilidade de essas condições se alterarem de forma imprevisível, embora quatro respondentes discordem parcialmente.

A necessidade do PNSE cumprir os seus objetivos, independentemente das condições ecológicas e socioeconómicas, é a questão que apresenta opiniões mais diversas. No entanto, retirando da ‘equação’ as respostas neutras, o conjunto de respostas concordantes é o que tem maior peso. O mesmo se passa com a manutenção da classificação face à deterioração das condições. Este resultado não deixa de ser curioso, particularmente o número de stakeholders (seis) que concordam plenamente com a afirmação, contrariando de certa forma a ideia de que a classificação é contestada.

A necessidade de reestruturar o PNSE perante novas condições de resiliência e de gestão adaptativa é vista positivamente pela maioria dos respondentes. No entanto, e ao contrário do painel nacional, alguns participantes optaram pela não resposta.

As respostas neutras e as não respostas são mais significativas no conjunto de afirmações sobre a governança do PNSE, talvez porque o conceito de governança não esteja suficientemente claro. Por outro lado, não se verificam respostas discordantes, nem mesmo na afirmação que defende um sistema de governança policêntrico.

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Figura 64. Grau de concordância do painel PNSE com afirmações sobre a dinâmica do PNSE, respetivas implicações

na classificação e gestão e importância do sistema de governança (n.º de respondentes=19) (NS/NR - não sei/não respondo;1 - discordo plenamente; 2 - discordo parcialmente; 3 - não discordo nem concordo; 4 - concordo

5.6.3 PNSC

Para as afirmações em análise neste ponto, os participantes deste painel nunca selecionaram a opção ‘não sei/não respondo’ o que provavelmente pode ser explicado pelo seu menor número e tipo de entidade em que desenvolvem atividade profissional (MR6, capítulo 2).

No primeiro conjunto de afirmações a única que não recolhe apenas respostas concordantes é a relativa à possibilidade de essas condições ecológicas e socioeconómicas do território do PNSC se alterarem de forma imprevisível; dois dos respondentes discordam parcialmente e outros dois assumem posição neutra (Figura 65).

À semelhança dos painéis anteriores, as questões relativas à necessidade do PNSC cumprir os seus objetivos, independentemente das condições ecológicas e socioeconómicas e da manutenção da classificação face à deterioração das condições são as que reúnem menos consenso. Estas são também as únicas neste painel em que existem respondentes a discordar plenamente.

Merece ainda destaque a concordância geral com a necessidade de o PNSC ser resiliente e gerido de forma adaptativa.

Por outro lado, apenas dois respondentes concordam (um plenamente e o outro parcialmente) que o sistema de governança do PNSC deve ser policêntrico.

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Figura 65. Grau de concordância do painel PNSC com afirmações sobre a dinâmica do PNSC, respetivas implicações

na classificação e gestão e importância do sistema de governança (n.º de respondentes=9) (NS/NR - não sei/não respondo;1 - discordo plenamente; 2 - discordo parcialmente; 3 - não discordo nem concordo; 4 - concordo

5.7 Discussão

Considerar os parques naturais como SSE, dinâmicos e em que as componentes ecológica e humana se encontram fortemente interligadas, adequa-se à perceção dos peritos e stakeholders consultados. Os resultados dos questionários confirmam também que os termos resiliência e gestão adaptativa são geralmente encarados como positivos e desejáveis, embora se admita que as interpretações sejam muito diversas e que não exista plena consciência das suas implicações.

A perspetiva da resiliência e da gestão adaptativa, ao promover diversidade, redundância e experimentação, colide em certa medida com o desejo de eficiência e de otimização que (em teoria) orienta as políticas públicas e que é reforçado pela existência de recursos (bastante) limitados. Como referido no ponto 5.3, os desafios à operacionalização da gestão adaptativa são vários, alguns de natureza prática, outros mais conceptuais.

Um deles consiste no facto de a filosofia da gestão adaptativa estar ancorada na monitorização das condições e na avaliação dos resultados das ações de gestão, que tem fraca tradição (e investimento) no nosso país (Ferreira, 2016).

Uma gestão baseada na ótica da ‘resiliência ecológica’ implica, não só a monitorização do sistema, mas também a identificação dos limiares a partir dos quais este passará para outro estado funcional. Ou seja, é preciso determinar as variáveis principais e os níveis de pressão ou perturbação que o sistema suporta (Cumming et al., 2015).

A abordagem da ‘resiliência ecológica’ é defendida sobretudo para sistemas sujeitos a perturbações extremas com resultados imprevisíveis. No entanto, a possibilidade de alterações imprevisíveis nas condições ecológicas e socioeconómicas dos parques naturais não é reconhecida por todos os peritos e stakeholders consultados. De facto, as principais pressões tipificadas no capítulo 4 são mais ou menos conhecidas e a maioria tenderá a ser do tipo continuado e com efeitos graduais. No entanto, o sistema é dinâmico e o conhecimento sobre o mesmo é necessariamente incompleto. Por outro lado, podem surgir novas forças motrizes. Fomentar a resiliência das áreas protegidas será, à partida, vantajoso.

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Contudo, este argumento assume que as áreas protegidas se encontram no seu estado desejável, que cumprem a sua função identitária, o que pode não ser verdadeiro. É possível que em alguns casos, apesar da classificação, o estado do sistema não contribua para a conservação da natureza e seja necessário um processo de transformação. Uma vez que essa avaliação não faz parte dos objetivos desta investigação, adota-se o pressuposto de que as áreas protegidas estão/são (n)o estado desejável. Em qualquer dos casos, atingido o estado desejável será sempre necessário promover a resiliência do sistema para que este aí se mantenha.

Apesar das dificuldades de aplicação, olhar a gestão das áreas protegidas do ponto de vista da resiliência tem o mérito de enfatizar a relevância do sistema de governança para o seu sucesso. Esta importância é também reconhecida pelos peritos e stakeholders. No entanto, as vantagens de um sistema de governança multinível ou policêntrico, defendidas pela perspetiva da resiliência, não são percecionadas por todos de igual forma. Porém, relembre-se que a opinião foi solicitada em abstrato, sem esclarecimento sobre o termo nem apresentação das potenciais vantagens neste contexto. Para além disso, a resistência a um modelo que promove diversidade e redundância, em vez de eficiência e otimização, é compreensível.

A lógica da governança multinível suporta-se na necessidade de atuação a diferentes escalas, o que parece ser particularmente importante no caso das áreas protegidas, considerando que estão em jogo interesses (e benefícios) locais, regionais e nacionais. A existência de estruturas em cada um destes níveis poderá ser promotor da participação dos diferentes stakeholders e da construção de relações de confiança.

Por outro lado, uma gestão adaptativa e mais flexível será obrigatoriamente mais exigente para o nível local, que não se poderá limitar a verificar a conformidade das ações de gestão com as orientações superiores. A monitorização do sistema e a correção das ações em tempo útil requer uma maior proximidade ao território, poderes de decisão e capacidade de liderança.