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3.3 ADC 1: VOCÁBULOS, MODALIDADE DEÔNTICA, ADJUNTOS ADNOMINAIS E

3.3.4 Atributos: processos representacionais de classificação

Na fundamentação teórica, apresentei as três funções do discurso se sempre presentes em textos - o significado acional – modos (inter)agir discursivamente referentes a gêneros, o significado representacional – maneiras individuais de representar os aspectos do mundo e o significado identificacional– maneiras de identificar(se), estilos (FAIRCLOUGH, 2003, 159).

Para analisar os atributos, utilizo o processo representacional que está relacionado ao processo de significado identificacional – maneiras de identificar(se), estilos. Os estilos estão associados à representação dos atores sociais em textos (FAIRCLOUGH, 2003). Vale ressaltar que estilos não estão associados apenas à identidade, mas também a identificação de outras pessoas, o que nos remete a relação dialética entre identificação e relações sociais. Essa relação dialética também existe entre discursos e estilos. Nos discursos que os estilos se manifestam como forma de representar as realidades sociais que por sua vez, resultam nos modos de

identificar-se frente a essas realidades sociais. A relação entre representação e identificação é natural e espontânea o que torna impossível distinguir o significado uma da outra.

Nessa perspectiva, sugiro que o significado identificacional, neste trabalho, seja entendido como meio termo entre a função ideacional e a função interpessoal da linguagem, conforme os estudos de Halliday (1991), visto que o modo como nos identificamos nos discursos em nossas relações sociais está ligado aos discursos que interiorizamos e a interação com nossos interlocutores. Faircloug (2003), nos apresenta a relação entre representação e identificação.

Como os processos de identificação envolvem os efeitos constitutivos do discurso, deve ser visto como um processo dialético no qual discursos são inculcados de identidades [...] Uma consequência dessa visão dialética é que significados em textos podem ser vistos como pressupostos significados representacionais, as presunções por meio das quais as pessoas de identificam (FAICLOUGH, 2003, p. 159).

Assim, o processo de concepção de identificação está relacionado aos processos de representação, de classificação, de construção de semelhanças e diferenças (FAIRCLOUGH, 2003). O foco da minha pesquisa é a dimensão de análise linguística, categorias gramaticais, significado de palavras presentes nos textos dos estudantes sobre o fenômeno bullying e as sugestões para mitigá-lo. Dessa forma, evidencio as construções identitárias fundamentadas nos atributos que são impressos nos textos dos estudantes.

Tabela 6 – Atributo: Gordo/a

Atributos: Gordo/a

1. “eu ja vi muitas pessoas sofrendo bullying e umas delas foi de uma pessoa que era gorda” 2. “um defeito pessoas ser gorda”

3. “já presenciei isso com outras pessoas, pelo fato de gozarem da cara dela por ela ser acima

do peso e entre outros... isso me deixa tão triste, que eu tento ajudar todas elas”

4. “oque vi fpoi eles zuando de mais com a pessoa por ela ser gorda e tls mais na brincadeira” 5. “já vi pessoas sendo chamada de gorda também mas eu nunca interferi por medo pessoas da

minha própria sala”

6. “já vi pessoas sofrer bullying por serem diferentes, por serem mais gordinhas ou magras demais, a realidade é que a sociedade julga muito sem olhar o próximo”

7. “os alunos que são mais inteligentes ou diferente das outras pessoas, um pouco mais magra ou mais gorda”

8. “eu vi uma menina sofrendo bullying so porque ela era gorda”

9. “já vi pessoas sofrendo bullying. pela aparência, principalmente por ser acima do peso” 10. “já presenciei pessoas maltratarem as outras, xingarem de gordo, baleia, feio, preto...”.

11. “pessoas da minha sala chamam um colega meu de gordo, na brincadeira, mas mesmo essa

brincadeira querendo ou não machuca”.

12. “pela pessoa ser gorda, pela aparecia física, modo de falar, pela cor raça,” Fonte: da autora (2020).

As construções identitárias nos atributos ‘gordo/a’ e ‘acima do peso’, materializados nos textos dos estudantes, em geral nos mostram os conflitos referentes a essas identificações e as relações sociais que as construíram. Dessa forma, nos dados desta pesquisa, os conflitos identitários que os estudantes apresentam em seus discursos (em sua identificação de outrem como gordo/a ou acima do peso) sugerem à falta de conhecimento por parte dos estudantes sobre o assunto.

O mesmo conflito identitário é reforçado no extrato: “eu vi uma menina sofrendo

bullying só porque ela era gorda” (DA PESQUISA, 2020) a mesma demanda – falta de

conhecimento para representar essa diferença. O uso do vocábulo ‘só’ representando a função de advérbio com sentido de ‘apenas/somente’ mostra a intenção linguística de desqualificar na representação ‘gorda’ como defeito ou diferença para uma pessoa sofrer bullying. É uma contradição hegemônica na luta pelo poder de desconstrução do discurso de violência, porém usando o atributo pejorativo ‘gorda’ no texto como justificativa de acabar com o bullying.

A contradição é percebida na construção linguística adversativa no extrato “um defeito pessoas ser gorda” e “o que vi foi eles zuando de mais com a pessoa por ela ser gorda e tls mais na brincadeira” (DA PESQUISA, 2020), explicitamente marcada por ‘defeito/gorda’ e ‘mais na brincadeira’ que legitima a manutenção dos discursos de preconceito que o bullying é uma brincadeira e que ser gorda é um defeito. Esses discursos ainda contribuem com o processo de propagação da ideologia da desigualdade social e da intolerância.

Os atributos agora analisados referem-se aos vocábulos preto/negra/cor materializados linguisticamente nos textos dos estudantes que participaram desta pesquisa.

Tabela 7 – Atributos: preto/negra/cor

Atributos: preto/negra/cor

1. “algumas pessoas descobrirem sobre sua casa incendiada e sua mãe assassinada, perguntavam-o se ele havia comido um pedaço do churrasco de sua mãe, diziam que ele era

´´preto´´ devido ao incendido”.

2. “já vi pessoas sendo maltratadas verbalmente devido sua cor, orientação sexual, modo de falar e de se vestir”.

3. “uma vez estava no ponro de ônibus com minha amiga que é negra e alhumas pessoas passaram rindo dela”.

4. “já presenciei pessoas maltratarem as outras, xingarem de gordo, baleia, feio, preto...”. 5. “pela pessoa ser gorda, pela aperemcia física, modo de falar, pela cor raça”

Fonte: da autora (2020).

Os textos que analiso oferecem-me indícios para a compreensão da relação entre o discurso de manutenção do racismo nas práticas sociais investigadas. Lembrando que desde a era colonial e escravocrata o racismo é um problema no Brasil. A Lei Afonso Arinos foi a

primeira lei a ser aprovada pelo congresso em 1951. A lei precisou passar por revisão e foi criada a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 que em seu art. 1º determina que: “serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional” (BRASIL, 1989, art. 1º). Agora o racismo é crime com pena de reclusão e inafiançável. Porém, mesmo com a criação dessas leis e seus efeitos legais, ainda é muito difícil o cumprimento delas.

É fundamental preocupar-se com os efeitos ideológicos de sentido que esses discursos produzem nas relações sociais desses estudantes, pois estão carregados de crença, atitudes, valores e identidades enraizados neles. Os sentidos produzidos nesses textos são hegemônicos e negativos porque servem para manter interesses de relações de poder sobre uma raça. De acordo com Ramalho e Resende (2011), quando a luta hegemônica é instaurada, temos as representações ideológicas no discurso de manutenção da desigualdade.

A luta hegemônica travada no/pelo discurso é uma das maneiras de se instaurar e manter a hegemonia. Quando o abuso de poder é instaurado e mantido por meio de significados discursivos, está em jogo a ideologia (RAMALHO; RESENDE, 2001, p. 24).

A ideologia é um instrumento semiótico de lutas e de poder com uma concepção negativa que serve “para estabelecer e sustentar relações de dominação” (THOMPSON, 2002, p. 77). Segundo Fairclough (1989), a ideologia é eficaz quando sua ação é sutil, imperceptível de forma que:

se alguém se torna consciente de que um determinado aspecto do senso comum sustenta desigualdades de poder em detrimento de si próprio, aquele aspecto deixa de ser senso comum e pode perder a potencialidade de sustentar desigualdades de poder, isto é, de funcionar ideologicamente (FAIRCLOUGH, 1989, p. 85).

É por isso que o poder hegemônico materializado nos textos dos estudantes, estabelecido pela ideologia, veiculada pelo discurso de racismo serve para a instauração e manutenções das representações discursivas que favorecem a desigualdade fundamentada no censo comum.

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