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4 Análise dos resultados

4.3 Prestação de contas e transparência

4.3.1 Auditoria externa

O IBGC (2016) recomendou que toda organização deve ter Auditoria Independente com a atribuição de assegurar, de acordo com as normas da profissão, que as demonstrações financeiras reflitam adequadamente sua realidade, inclusive revisando os controles internos da organização, que deve resultar num relatório circunstanciado específico.

Sobre o assunto, a recomendação é também no sentido de que a assembleia ou o conselho de administração deve contratar esses auditores independentes para receber as informações acerca das principais políticas contábeis; deficiências relevantes e falhas significativas nos controles e procedimentos internos; tratamentos contábeis alternativos; casos de discordâncias com a administração; avaliação de riscos e análise de possibilidade de fraudes (IBGC, 2016).

Esse assunto acerca da competência da assembleia/conselho será mais bem abordado em seções seguintes, mas, por enquanto, já se deve adiantar que nenhuma das organizações pesquisadas tem como prática que a assembleia contrate auditoria externa. Na verdade, nenhuma das organizações pesquisadas sequer tem ou teve em algum momento uma Auditoria Externa.

Parece que, muito embora a ideia de uma auditoria externa seja boa e fosse coerente com o desejo de fazer as ONGs mais transparentes do ponto de vista das suas contas, na prática, a recomendação não é coerente com a realidade desse tipo de ONGs pesquisadas.

Perguntando sobre se havia auditoria externa na organização em que ajuda a governar e se esse mecanismo faria sentido, um entrevistado respondeu que não há; acha difícil ter; mas vê sentido que se deseje ter:

(...) Faz todo o sentido; na verdade a (org) tem um cuidado para realizar todas as coisas dentro da lei, dentro da ética, né? Então prima muito por isso, mas é aquela história, não basta ser, tem que aparecer também; Então,

precisa dessa auditoria externa como forma de legitimar aquilo que a gente está fazendo; não qualquer auditoria mas uma auditoria também com credibilidade; aquela questão que o justo paga pelos pecadores; o que é comum é você ver pessoas que se utilizam de homens para fazer um bocado de coisas erradas, e quando você faz a coisa certa você sofre, porque você se submete a uma série de questões legais, e uma série de outras questões, faz como que precise mostrar que você faz a coisa certa, certa e seria e ética (...).(O1a)

(...) Eu acho que faz sentido ter essa recomendação principalmente aqui no Brasil, por que já com esse caráter de corrupção que tá no sangue; mas a gente se preocupa muito com isso, e uma das primeiras coisas que todo mundo concordou foi colocar o site pra todo mundo acessar é um portal transparência isso é fundamental e de todos. (O6a)

Outros entrevistados entendem que a recomendação de auditoria externa não faz sentido para as organizações que se financiam majoritariamente por meio de recursos privados. Para eles, apenas as ONGs que recebem recursos públicos deveriam ser auditadas:

(...) Perfeito, acabei de falar que deveria existir um monitoramento, monitoramento esse de auditoria; deveria existir um auditamentos das contas da ONG. Essa clareza, o próprio governo poderia contratar as empresas de auditoria; eu acho que só deve acontecer em ONGs grandes, com grandes convênios com o governo; o governo contrata a auditoria (...). (O2a)

(...) Sendo uma OSCIP ou uma OS, recebendo recursos públicos, que já não é ONG simples, você realmente precisa porque você vai estar na transparência para poder fazer, agora se chama simples ONG, eu acho desnecessário. (O5b)

(...) Como a gente não tem nenhum recurso do governo, acho que talvez não fizesse sentido, acho que seria mais uma interna, pra melhorar o processo, melhorar a qualidade da organização e algumas questões de custos pra poder ter uma programação melhor de administração mesmo(...). (O4a)

(...) Não, na minha opinião se estivesse seria bom; acho que isso serve pra quem ganha muito dinheiro, principalmente dinheiro público, que não é o nosso caso; nós vivemos de doação (...). (O4b)

(...) acho que isso é uma merda; é outro recurso, privado; na verdade ninguém vai atrás dessa auditoria; nas organizações pequenas não funciona (...). (O10a)

Outra opinião surgiu de alguém que entende que a auditoria externa valeria para quem se financia por meio de recursos privados também, sobretudo para facilitar a disputa por recursos, em razão da legitimidade e credibilidade que esse mecanismo emprestaria à organização.

(...) Eu acho que em parte tem razão e necessidade; eu acho que uma ONG precisa mesmo que não receba recursos necessariamente governamentais, mas que recebem privados ter a maior transparência possível, isso facilita até

o engajamento de outras instituições e também de empresas que possam contribuir a partir da percepção de que ali tem a transparência, até mesmo porque há uma visão ainda de empresas muito tímida, por causa da credibilidade que muitas ONGs não tem (...) auditoria evitaria que ONGs não sérias estivessem agindo no mercado disputando com ONGs sérias (...). (O5b)

(...) Olha porque a gente não conhece o coração das pessoas como são, então eu acho que não custa nada olhar, fiscalizar, ver, até pra dar mais credibilidade para as empresas (...) para saberem as ONGs que estão trabalhando de forma adequada; é como se fosse uma certificação; olha tem aqui uma auditoria, a gente tá certificado, trabalho honesto, seguro, então pode confiar, investir, pode apoiar, mesmo que não tenha investimento financeiro, mas pode apoiar, divulgar, chegar junto pra trabalhar, então eu acho que nesse sentido, seria bom (...) mas não tem como contratar porque não tem condições financeiras pra isso; então se couber dentro do orçamento, em caso tenha que pagar, se couber no orçamento e se for viável, com certeza só tem a somar pra uma associação que trabalha direito (...). (O3a)

(...) a “ONG” não tem uma carteira de projetos que justifique isso; vai depender de quem vai te patrocinar; uma auditoria com certificação externa, isso dá credibilidade; isso ajuda a ter uma credibilidade a mais; eu acho que isso é super importante a partir do momento que você está buscando patrocinadores que valorizem isso como um atributo (...). (O7a)

Ou ainda, há opinião no sentido de que nas organizações grandes que recebem recursos privados de grandes empresas, caberia aos próprios financiadores bancar as despesas com auditoria externa, ou providenciar que suas próprias equipes de auditoria fiscalizem a alocação dos recursos:

(...) porque se você for pro universo das Oscips, permite que você assine grandes convênios com empresas multinacionais; eu acho que nesse contexto deve acontecer; as empresas devem exigir e devem sim mandar a própria auditoria pra fazer acompanhamento daqueles milhões de dólares, que foi investido de euros, agora no universo pequeno das ONGs no Brasil, não existe auditoria nenhuma (...). (O2a)

(...) isso poderia vir, por exemplo, se fosse o cara patrocinando e ele dissesse assim: “contrate essa empresa para fiscalizar vocês”, aí é diferente ele pagando (...). (O6a)

Desse trecho, se observa que não se é contra a auditoria externam em si própria, mas a questão que se levanta é sobre quem deve pagar a conta de tal mecanismo de governança. Aponta-se para as questões prioritárias de investimentos com os já parcos recursos nessas ONGs que se financiam com recursos privados.

Ademais, não parece que essa recomendação sendo atendida ou não (havendo ou não auditoria externa) influencia na captação de recursos ou na credibilidade da ONG.

Mas isso não significa que não seja uma boa recomendação. O fato é que todas as organizações querem ser transparentes e gostariam de poder investir nesse tipo de mecanismos:

(...) A gente tem plano de fazer; tem empresa que foi consultada para isso ser feito, mas deu o ok a gente só está aguardando a parte da contabilidade, a entrega de todas as documentações (...). (O1b)

O detalhe dessa resposta, a partir das notas de campo, é que a expressão facial é no sentido de que a organização tem planos de ter auditoria, mas o entrevistado não acredita que isso realmente vá acontecer, em razão da falta de recursos.

Mas, houve uma resposta que chamou a atenção. Indagado sobre essa questão da auditoria externa, o entrevistado disse:

(...) se tiver uma auditoria fiscal eu fecho (...). (O3b)

É que, segundo esse entrevistado, alguns projetos financiados não preveem recursos que são necessários para algum tipo de atividade ou para excepcionalidades, o que implica na necessidade da organização de “maquiar” as contas, não com má-fé, mas apenas para que as contas sejam aprovadas sem maiores problemas burocráticos:

(...) E isso nas pequenas coisas também, tipo os meninos que a gente atende, tem uma bolsa que os padrinhos pagam; o dinheiro que entra da bolsa, eu uso só com os meninos, mas a gente foi fazer uma visita, uma divulgação de ação deles, era para sair meia noite, não tinha carro e fui pegar um Uber, e aí isso entra como transporte na parte dos meninos; então são os pequenos custos que não terão como justificar, mas eu preciso pagar, mas na hora da prestação de contas não pode aparecer. (...) Mas a gente tem essa prestação de contas e a meta é colocar isso para o os padrinhos, por exemplo, os meninos que fazem doações para mandar para eles um mine relatório dessa prestação de contas, mas na frente na página, no site porque é para ser transparente, apesar de saber, muitas vezes eu vou maquinar o almoço de um garoto, para poder justificar vinte reais, que paguei para consertar a fechadura da ONG. (O3b)

Mesmo assim, a auditoria externa não é algo que se encontra nas ONGs. Em verdade, mesmo um entrevistado que está numa ONG que participa de uma rede (Porto Social) com

mais de 90 outras ONGs nunca viu uma ONG que faça auditoria externa. Claro que há organizações que fazem auditoria externa, mas, definitivamente, não é algo comum.

(...) Não, eu desconheço. A não ser quando, não a nível de auditoria, mas de prestação de contas à os órgãos que distribuem as verbas, especialmente os órgãos governamentais que exigem relatórios, mas não chega a ser uma auditoria, apenas um relatório que eles mesmo orientam como esse relatório deve ser apresentado. Mas auditoria não, não conheço nenhuma ONG que tenha esse processo (...). (O5b)

Um entrevistado chegou a dizer que esse mecanismo de governança recomendado é “coisa fantasiosa”:

(...) Eu acho que teria se pudesse, se estivesse recupera eles editar, as ongs na verdade se limitam ao número pequeno de recurso, então acho desnecessário na verdade, essa auditoria, é uma coisa fantasiosa pra, ONG, instituição de grandes portes, que vive (...) (O2b)