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Ausência de gravidade do descumprimento da obrigação no adimplemento substancial

2. Requisitos da Teoria do adimplemento substancial

2.2. Ausência de gravidade do descumprimento da obrigação no adimplemento substancial

A ponderação da gravidade do incumprimento inicia-se a partir de um critério objetivo, fundado na interdependência da prestação, considerado por Mosco como sendo o “standard” decisivo para uma conclusão sobre o tema289. Depois, deve ser considerado o aspecto subjetivo, relativamente à justa expectativa do credor na satisfação do seu interesse, assim como enunciado na Convenção de Viena (artigo 25, já comentado no capítulo I).

O elemento de gravidade a ser ponderado na configuração do adimplemento substancial assume diferentes denominações nas legislações alienígenas, sendo intitulado como “material breach” no direito inglês; como violação fundamental no direito internacional sob a influência da Convenção de Viena. Também é classificado a contrário sensu, como na legislação italiana a ser conceituado como inadimplemento de pouca importância e na codificação portuguesa. Na legislação pátria, perquirimos pelo inadimplemento insignificante. Independente da nomencratura, trata-se do mesmo elemento, apenas denominado sob o aspecto negativo (quebra material ou violação fundamental) ou o aspecto positivo visto sob os parâmetros do adimplemento.

Assim, a questão da materialidade da obrigação atingida pelo descumprimento, como parâmetro para a configuração do adimplemento substancial ou do inadimplemento passível de resolução, representa uma ausência substancial no cumprimento da obrigação de modo a desnaturar a obrigação prometida, ao passo que: “An unjustified failure to perform substantially the obligations promised in a contract is a material breach. The key is whether the aggrieved party obtained substantially what he bargained for, despite the breach, or whether the breach significantly impaired his rights under the contract. (...) Although there are

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no clear-cut rules as to what constitutes a material breach, several basic principles apply. First, partial performance is a material beach of a contract if it omits some essential part of the contract. Second, the courts will consider a breach material if it is a quantitatively or qualitatiely serious. Third, an intencional breach of contract is generally held to be material. Fourth, a failure to perform a promise promptly is a material breach if time is of the essence; that is, if the parties have clearly indicated that a failure to perform by a stated time is material; otherwise, the aggrieved party may recover damages only for loss caused by the delay. Fifth, the parties to a contract may, within limits, specify what breaches are to be considered material290”.

Assim, não existe regra determinada para se verificar se a materialidade e a essencialidade da obrigação foi cumprida ou descumprida. O caminho existente para essa valoração ocorre por meio da aplicação de parâmetros aplicados dentro da boa-fé objetiva, de forma a constatar se: (i) a execução parcial será considerada uma inexecução grave se atingir alguma parte essencial do contrato; (ii) uma violação fundamental será valorada se atingir seriamente quantidade ou a qualidade da obrigação; (iii) uma inexecução do contrato intencional caracteriza-se uma violação fundamental; (iv) será um inadimplemento grave se a obrigação não for realizada no tempo devido, sendo este requisito fundamental; e (v) as partes podem elencar nas cláusulas contratuais quais obrigações, se descumpridas, configurarão uma violação fundamental.

No tocante a este último parâmetro, vale frisar que essa prerrogativa outorgada aos particulares pelo ordenamento jurídico é calcada no princípio da boa-fé objetiva, posto que se as partes eligirem cláusulas contratuais como essenciais e estas carecerem dessa natureza, o inadimplemento destas não terá força para caracterizar uma violação fundamental passível de resolução contratual, podendo ser impugnada na via judicial a resolução aplicada nesta hipótese.

Esse parâmetro confere uma grande margem às partes que para terem resultado frutífero devem exercê-lo mediante os limintes impostos pela boa-fé ao passo que “os figurantes do

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contrato bilateral, da mesma maneira que, livremente, introduzem a interdependência das prestações, convencionando a bilateralidade, e, assim, submetem-no ao regime geral, podem: estipular a natureza do descumrpimento cabível ao remédio, desprezando, por exemplo, a utilidade da prestação; reduzir a resolução ao inadimplemento absoluto...291”. Contudo, qualquer abuso cometido pelos contratantes nessa eleição, é sancionado pelo sistema jurídico positivo, por meio do não reconhecimento da referida escolha, sendo passível de impugnação judicial com a atribuição da responsabilidade proporcional ao abuso cometido.

Não obstante, nos princípios do Direito Europeu dos Contratos, no artigo 8:103 também verificamos critérios norteadores da gravidade do inadimplemento, por meio dos seguintes requisitos: “L’inadempimento di una obbligazione è grave in relazione al contratto se a) la stretta osservanza dell’obbligazione appartiene alla natura del contratto; o b) l’inadempimento priva sostanzialmente il creditore insoddisfatto di ciò che esso ha il diritto di ricevere in base al contratto, salvo che il debitore non ha né abrebbe ragionevolvemente potuto prevedere tale risultato; o c) l’inadempimento è dovuto a dolo e dà al creditore ragione di ritenere di non potere più fare affidamento sui successivi adempimenti292”.

Outrossim, o Projeto do Código Europeu dos Contratos também aborda o requisito da importância do inadimplemento capaz de gerar a resolução do contrato, no artigo 107, ao estipular que: “Ai fini delle regole seguenti un inadempimento è di rilevante importanza se concerne uno degli obblighi principali (e non secondari) del contratto, e inoltre quando, tenuto conto della qualità delle persone e della natura della prestazione, l’inadempimento stesso cagiona al creditore un pregiudizio tale da privarlo sostanzialmente di ciò che egli è in diritto di attendersi dal contratto. Si considera, in particolare, di rilevante importanza l’inadempimento quando: a) è totale; b) è parziale, ma l’interesse del creditore di ottenere la parte rimanente è venuto obbiettivamente meno293”.

No sistema jurídico pátrio, a gravidade do inadimplemento é pontuada por meio da análise dos efeitos gerados, poisque “... para a dissolução do vínculo e quebra do contrato, certamente

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ASSIS, Araken de. Op. cit., p. 50.

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SCHULZE, Reiner e ZIMMERMANN, Reinhard. Op. cit., p. 400.

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há de se exigir um incumprimento mais forte e qualificado, que esteja, assim, a atingir o contrato na sua substância, e não em simples acidente ou qualidade294”. A necessidade de desnaturação séria do programa contratual para a existência do inadimplemento originador do exercício do direito resolutório serve como medida acautelatória de determinação do inadimplemento ou do adimplemento substancial. Na hipótese, da ausência do alcance da essência do contrato pelo descumprimento, haverá apenas um simples desvio da execução na sua quantidade ou qualidade que privilegiam a manutenção do contrato, descontando a falta do cumprimento com as penalidades devidas.

Por conseguinte, a gravidade do inadimplemento gerado será objetivamente valorada em relação ao prejuízo causado ao credor pela inexecução por meio do critério concreto de essencialidade do sinalagma. Se não houver a configuração dos critérios acima expostos, o descumprimento não será fundamental, ensejando a constatação da insignificância da inexecução caracterizadora do adimplemento substancial com conseqüências diversas a do inadimplemento absoluto ou relativo.