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6 AUT O-ORGANIZAÇÃO, CIBERESPAÇO E ESPAÇO PEDAGÓGICO

A aut o-organização se caract eriza como um f enômeno de t ransf ormação ou de criação de uma organização, que decorre f undament alment e da int eração das at ividades predet erminadas, se as houver, com a at ividade aut ônoma e espont ânea de element os int ernos, e event ualment e de f ront eira do sist ema3, at ravés de processos recorrent es. A at ividade espont ânea decorre da exist ência de grau mínimo de aut onomia dos element os at uant es. Por sua vez os processos recorrent es precisam est ar present es para que os element os aut ônomos, em suas at ividades, se int egrem em uma organização com aut o-ref erência. Conf orme Debrun (1996, p.8): “ [...] depender basicament e de si mesmo, ser aut ônomo, é a primeira maneira, para um processo organizado, de ser ‘ aut o’ , de ser ‘ ele mesmo’ , de ser int eligível e part ir de si mesmo” . As mudanças predet erminadas podem ser concorrent es ou concordant es com as mudanças espont âneas ou ainda, complement ares e f acilit adoras dessas últ imas. Cont udo, as mudanças predet erminadas t ambém podem ser divergent es, discordant es e ant agônicas das mudanças espont âneas e, port ant o, podem causar dif iculdades ao desenvolviment o dessas últ imas, cont ribuindo para se t er no sist ema um est ado de cont raposição, cont radição e conf lit o.

A inf luência de at ividades aut ônomas dos element os do meio-ambient e – ou sej a, element os ext ernos event ualment e de f ront eira – no sist ema pode ser caract erizada como ruído, pert urbação ou f lut uação que é int roduzido no sist ema e que pode cont ribuir t ambém, de algum modo, para a ocorrência do f enômeno de aut o-organização. Como a organização é ident if icada pelo conj unt o das caract eríst icas est rut urais e f uncionais de um sist ema, ela represent a as relações ent re os element os e as at ividades ou comport ament os do sist ema. Not a-se que essa conceit uação de organização leva em cont a que o sist ema possui uma dinâmica est rut ural e f uncional, i.e., organizacional. E percebe-se t ambém que a est rut ura e o f uncionament o do sist ema possuem padrões de f ormação, ou conf iguração, e de evolução def inidos e que conf erem ident idade ao sist ema. Segundo Debrun (1996, p.13):

3 O sist ema a que nos ref erimos é o Ciberespaço, mas especif icament e a sociocomunicação como

O aspect o organização reside, de um lado, na própria exist ência dos element os: t oda organização comport a element os realment e (e não analit icament e) dist int os, ou, pelo menos, semi-dist int os (é a sit uação part icular do organismo.

O processo de aut o-organização não possui esses padrões de f ormação e de evolução de modo pré-det erminado, pois há a possibilidade de mudança de est ado com emergência de novo est ado, que caract eriza a criação e a evolução, at ravés do mecanismo de adapt ação est rut ural e f uncional. Em alguns sist emas a evolução para uma f orma organizada ocorre na ausência de rest rições ext ernas. Cabe ressalt ar que as múlt iplas int erações ent re f orças ou f at ores de inf luência de est abilidade e as f orças de inst abilidade, que at uam no sist ema dinâmico, podem promover t ant o a organização como a desorganização no sist ema. E a convergência e a divergência, ou mais explicit ament e a cooperação e a compet ição, ent re as f orças de est abilidade e de inst abilidade podem criar as condições para se t er um sist ema dinâmico caót ico. Esse sist ema comport a processos que podem ser considerados em part e de organização e em part e de desorganização.

Uma condição f undament al do sist ema dinâmico é a sua sensibilidade às condições iniciais. Um dado conj unt o de condições iniciais pode permit ir que se possa prever, com um cert o grau de precisão, a evolução dos est ados porém sem a exat idão das soluções analít icas. De f at o, um cert o conj unt o de condições iniciais leva a um conj unt o de soluções dos sist ema que caract eriza o que j á se ident if icou como at rat or do sist ema. A t ransição de um comport ament o organizado para um comport ament o caót ico, com perda de est abilidade est rut ural, é decorrent e da evolução t empral hipersensível às condições iniciais com cenários de t ransição de um regime est ável para um regime inst ável. Os parâmet ros de organização do sist ema podem inf luenciar nas t ransições de f ase nas quais a alt eração est abelecida pode dar origem a padrões novos ou dif erent es de organização. Segundo Bresciani Filho; D’ Ot t aviano (2000, p.293):

A organização pode ser vist a como uma caract eríst ica do sist ema f undament ada na capacidade de t ransf ormar a diversidade de comport ament o (relações e at ividades) dos dif erent es element os em uma unidade global; mas em f ace de seu comport ament o dinâmico e de nat ureza complexa pode ser t ambém uma f ont e de criação de diversidade, de capacidade e de especif icidade est rut ural e f uncional.

Em qualquer sist ema, quando os seus est ados se deslocam para caract erizar uma região permanent e no espaço de est ados, pode-se af irmar que os est ados est ão sendo at raídos para essa região, denominada at rat or. Port ant o, o at rat or do sist ema pode ser considerado como sendo uma f ormação de uma região rest rit a e permanent e, por um det erminado período de t empo, a part ir de uma região mais ampla, no espaço de est ados, por meio de uma ação e um cont role exercidos dominant ement e pelo próprio sist ema, com ou sem inf luência de element os ext ernos ou de f ront eira. Um sist ema complexo – como o Ciberespaço e especif icament e as list as de discussões – pode t er muit os at rat ores, que podem mudar (ou sof rer mut ução), em f unção de det erminados parâmet ros de cont role f uncionais e est rut urais do sist ema. Nesse sent ido, pode-se aqui acrescent ar que os sist emas dinâmicos podem comport ar processo de aut o-organização.

E para que o processo de aut o-organização sej a possível na sociedade humana é f undament al desconst ruir os sist emas de dominação hierárquica. E deve compreender-se que essa desconst rução, por exigência da sua coerência int erna, não pode, em si, result ar de um processo aut orit ário (ou t op-down). Ou sej a, mais import ant e do que aplicar medidas, diret ivas ou ref ormas, t orna-se necessário desencadear mecanismos que, pela sua própria nat ureza, promovam a aut o- organização (ou bot t om-up). O Ciberespaço é um dest es sist emas aut o-organizados.

Como é cada vez mais baixo o cust o das t ecnologias digit ais e a sua conseqüent e dif usão por (quase) t odos, dá origem a uma verdadeira revolução generalizada no campo da circulação e t ransmissão do conheciment o, a qual, de rest o, parece revelar as origens libert árias dos ideais t ecnossociais que est ão na base de algumas das t ecnologias em j ogo. De f at o, na et imologia da palavra conheciment o est á o co-nasciment o (só se compreende uma coisa quando se nasce com ela), o que implica uma con(f usão) ent re o suj eit o e o obj et o do saber (se essa f usão ocorrer ent re dois indivíduos, pode surgir o conheciment o em sent ido bíblico). E, para que o conheciment o sej a part ilhado com out ro, é necessário o re- conheciment o (uma sint onia int erpessoal aparent ada com as af inidades elet ivas de Goet he que permit e que a part ilha sej a f eit a ent re pares, deit ando para o caixot e do lixo da hist ória o execrável magi st er di xi t). A part ilha do conheciment o não é um ‘ j ogo de soma nula’ , porque nós não perdemos nosso conheciment o se o damos a out ro. Pelo cont rário, com a ‘ ressonância’ , essa part ilha associa-se a um ‘ prazer’ ,

ou sej a, a um ‘ ganho’ na t opologia da dádiva (não é por acaso que os cient ist as anglo-saxônicos denominam a sua at ividade de dif undir o conheciment o at ravés da expressão t o gi ve a paper).

O Ciberespaço, que é muit o mais do que uma vast a compilação de dados e uma descomunal enci cl opédi a const it uem uma nova f orma de comunicação e gest ão da inf ormação em rede com pot encialidades inf init as de cooperação. Em part icular, quando permit e, não só uma consult a prat icament e ilimit ada de dados e de conheciment o, mas t ambém a colocação on-line de qualquer produção criat iva por qualquer indivíduo e sem qualquer t ipo de rest rições (o que é um veículo import ant e de reconheciment o, no sent ido ant eriorment e expost o).

Mesmo agora quando se assist e a uma campanha ideológica cont ra a net com o pret ext o, ent re out ras coisas, da prolif eração da mesma pornograf ia que se vende em t odas as bancas de j ornal, há que reconhecer o ext raordinário espaço de liberdade que ela const it ui, sem paralelo em nenhuma out ra organização ou cont ext o de expressão colet iva humana.

O Ciberespaço e o hipert ext o que aí circula implicam um novo t ipo de relacionament o com o conheciment o, cuj a component e est ét ica e espacial é f undament al. Os signif icant es passam a um est ado de suspensão, vagueando (lit eralment e) nas camadas t ransparent es do Ciberespaço, promovendo assim a deriva do (a j ust o t ít ulo) denominado navegant e. A única analogia razoável que se pode est abelecer com est a deriva encont ra-se no sonho ou mesmo no delírio, cuj a ref erência cult ural ant erior é alguma lit erat ura surrealist a. Mais do que a sociedade da inf ormação, de que t ant o se f ala de f orma algo redut ora, o hipert ext o anuncia a sociedade est ét ica, de Schiller aos sit uacionist as (MOURA, 2003).

Por seu lado, a navegação não é seqüencial, mas errát ica. Ao cont rário das narrat ivas lineares, lit erárias, f ílmicas, hist óricas e ideológicas onde assent a ainda o processo clássico de t ransmissão de conheciment os, as narrat ivas f ragment árias, imbricadas e rizomát icas que se encont ram no ambient e do Ciberespaço t omam f reqüent ement e a f orma de nuvens, nas quais cada um mergulha à sua maneira, recolhendo o que mais lhe int eressa e realizando conexões singulares e originais. Os indivíduos t ornam-se assim mais permeáveis à diversidade e capazes de melhor se adapt arem à inovação. Da mesma f orma, o Ciberespaço não é simplesment e um novo media, mas precisament e um pós-media. Ao cont rário da t elevisão, cuj a

comunicação é de um para t odos, ou do t elef one, que é de um para um, no Ciberespaço a comunicação é de t odos para t odos. E t ambém aqui a podemos caract erizar pela sua qualidade eminent ement e recombinat ória que dá origem a um ecossist ema inf ormacional e comunicacional, que é eminent ement e polif acet ado e int erat uant e (PEREIRA, 2000).

O acesso generalizado a t odos os t ipos de sof t ware vem alt erar signif icat ivament e o cont ext o de discriminação econômica e social que sempre est eve present e no acesso ao saber. Hoj e um adolescent e e um prof essor universit ário part ilham as mesmas f errament as e podem consult ar os mesmos t ext os e inf ormações. O conheciment o passa a est ar, não só disponível para t odos, como abert o a (quase) t oda a manipulação e desenvolviment o em t empo real. A novidade e a inovação, que sempre f oram vist os como proj eção f ut urist a, passam a int egrar o discurso mai nst r eam do present e. A expansão do saber é a sua conseqüência prát ica.

As implicações na educação são t ambém evident es. O darwinismo element ar ensina que a evolução é lent a, mas a adapt ação é rápida.