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AUTOESTIMA E EMPODERAMENTO DE MENINAS E MULHERES NEGRAS

Como exposto, as desigualdades, sendo elas econômicas e sociais, aqui no Brasil, têm gênero e raça. O enfrentamento dessa situação, por parte de oprimidas e oprimidos, passa também pelo direito de saber sobre si, reconhecer sua ancestralidade e a estupenda contribuição à construção deste país; significa utilizar-se do pertencimento racial e da descolonização do pensamento para a quebra de padrões, e assim, empoderando-se, afirmar-se no mundo.

Autoafirmar-se é um ato de resistência. E resistir significa às pessoas negras continuar existindo e permanecendo no mundo, mesmo contra todas as adversidades enfrentadas constantemente. Sendo a escola um local de promoção da justiça, a resistência deve ser encarada por ela como uma estratégia para compartilhar o legado de luta do povo negro, a luta pela existência. Lamentavelmente, na maioria dos casos, ocorre o contrário. Muitas vezes, nesses locais, as religiões, os costumes e a cultura de matrizes africanas são amplamente demonizadas e discriminadas. Assim, por meio de professores e formadores, “[...] internalizamos as ideias através da socialização” (ADICHIE, 2015, p. 33), sentindo-nos invisíveis e obrigados a nos esconder, camuflando-nos entre os demais alunos; enfim, abrindo mão de nossas subjetividades. Para a educadora negra e o educador negro, estimular o protagonismo feminino negro é ressaltar o empoderamento como uma forma de estar bem consigo mesma(o) e impactar positivamente na vida das meninas negras nas escolas, incentivando a sua permanência e bom desempenho neste ambiente, fornecendo um local acolhedor, onde elas possam sentir-se bem vindas e bem vistas. E para isso é importante trazer falas significativas para as meninas, não

naturalizar a falta de autoestima destas, já que “[...] ninguém nasce com baixa auto-estima. Ela é apreendida e resulta das relações sociais e históricas” (ROMÃO, 2001, p. 162). Paralelamente, faz-se necessário mostrar a relevância da herança como um elo entre o passado, o presente e o futuro, e não como fraqueza ou sinal de inferioridade, como se ensina até os dias atuais em algumas escolas brasileiras.

A autoestima das meninas negras é entendida nesta pesquisa como uma maneira de reconhecer as diversas identidades e fortalecê-las, e compreender por que algumas delas são oprimidas e apagadas, e diante disto formar uma consciência de sua potência, e este é um ponto- chave das relações de desigualdades no Brasil, a rejeição aos preconceitos, estereótipos e estigmas. A autoestima e autoafirmação ajuda nesta luta, no combate à inferiorização, a não cooperar com a formulação ou o fortalecimento de estigmas.

É, portanto, papel da escola libertadora pensar em uma educação que gere a autoestima das meninas negras, garanta que através do currículo e das práticas educacionais expressem conhecimentos positivos em relação à negritude, motivando crianças negras, em especial, meninas negras a construírem identidades negras. A escola opressora, ao contrário disso:

[...] adestra nosso comportamento e nossa personalidade cultural, étnica e emocional, e essa criança só irá ressignificar seus valores e sua vida em períodos posteriores ao da infância. E até chegarmos a este processo muitos parâmetros introjetados pelas determinações sociais se constituem realidade. (ROMÃO, 2001, p. 174).

A queniana Wangari Maathai, primeira africana ganhadora do prêmio Nobel da Paz, “[...] se expressou muito bem e em poucas palavras quando disse que quanto mais perto do topo chegamos, menos mulheres encontramos” (ADICHIE, 2015, p. 20). E menos ainda mulheres negras, e não é por causa da capacidade ou a falta dela. Trata-se das condições históricas a que mulheres negras são expostas.

Ensinar meninas negras a almejarem ser brancas para serem consideradas “boas” “competentes” etc. é fortalecer a opressão. Meninas negras têm as suas próprias potencialidades, ainda que reprimidas. Pesa sobre essa repressão, além da questão racial, o fato de serem mulheres, como diz Adichie (2015, p. 36-37): “Seríamos bem mais felizes, mais livres para sermos quem realmente somos, se não tivéssemos o peso das expectativas do gênero”.

Ressaltar talentos é primordial, ao invés de gênero e raça. Mas como a realidade durante muito tempo privilegiou meninos brancos, é chegada a hora das meninas negras, por tanto tempo também invisibilizadas e silenciadas, terem suas características, subjetividades, talentos e identidades ressaltadas.

Não há mais espaço para a atribuição à superioridade de valores, quando se fala de diferenças. Como explica Adichie,é preciso espalhar o senso de identidade e com ele o orgulho de ser quem se é.

Mostrar a constante beleza e capacidade de resistência dos africanos e dos negros. Por quê? A dinâmica do poder no mundo fará com que ela cresça vendo imagens da beleza branca, da capacidade branca, das realizações brancas, em qualquer lugar onde estiver. Isso estará nos programas de TV a que assistir, na cultura popular que consumir, nos livros que ler. Provavelmente também crescerá vendo muitas imagens negativas da negritude e dos africanos.

Ensine-lhe a sentir orgulho da história dos africanos e da diáspora negra. Encontre heróis e heroínas negros. Existem. [...] ensine-lhe sobre o privilégio e a desigualdade. (ADICHIE, 2017, p. 52-53).

A autoestima na escola precisa partir do pressuposto “[...] eu tenho valor. Eu tenho igualmente valor” (ADICHIE, 2017, p. 12), cultivando o respeito por quem somos e nada mais além disso. Adichie (2017, p. 48) ressalta que “A cultura não faz as pessoas. As pessoas fazem a cultura. Se uma humanidade inteira de mulheres não faz parte da nossa cultura, então temos que mudar nossa cultura”.

Essa perspectiva nos mostra que podemos promover isso através de uma educação que incentive as mulheres a serem mais corajosas do que já são, mas também a não ser corajosas se não quiserem, incentivar a expor suas opiniões, e serem respeitadas, sem receios de represálias; a tomarem decisões, se manifestarem quando algo a incomodar, defender o que é seu – pensamento, objetos, ou qualquer outra coisa – e ensiná-las que nada deve acontecer sem seu consentimento.