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3.2 Substituição dos metais

3.2.3 O automóvel

A partir de cerca de 1960 começaram a ser construídas as primeiras carroçarias experimentais, em poliéster reforçado com fibra de vidro; e, a partir de 1970, a ser utilizados materiais plásticos em diferentes partes do automóvel, entre as quais o pára-choques, uma inovação que alterou o automóvel do ponto de vista formal e funcional (Manzini, 1986, pp.110- 112). Essencialmente motivado por questões económicas e de segurança, também o interior do automóvel se transformou, passando de um espaço essencialmente metálico, à excepção do tablier (inicialmente de madeira) e estofos, para um espaço dominado por uma multiplicidade de materiais plásticos e compósitos, e do que resulta «…um micro ambiente “macio” com arestas boleadas e agradável ao toque; um ambiente totalmente desenhado segundo os parâmetros de segurança e com a imagem de suavidade que se pretende transmitir.» (Manzini, 1986, p.156 e p.200).

Também Edwards (2004a) observa que no interior dos veículos, os polímeros são actualmente os materiais dominantes; a sua utilização permitiu que o tablier, anteriormente constituído por centenas de componentes metálicos, evoluísse para uma forma estrutural global, em que se integram as diversas funcionalidades; esta inovação permitiu uma grande redução nos custos e tempos de produção, e aumentou o potencial criativo do interior; é ainda referido que todos os componentes interiores têm de respeitar regulamentação rigorosa de segurança face ao fogo e fumo (Edwards, 2004a, p.531).

Em Edwards defende-se que em produtos complexos, como o automóvel ou o seu motor, as inovações surgem de modo faseado, sendo os componentes desenvolvidos separadamente, essencialmente para restringir os custos e os tempos de desenvolvimento (Edwards, 2004a, p.533). Refere-se que uma das principais barreiras à inovação na indústria automóvel é ainda o longo período de tempo envolvido na introdução de novos materiais (Edwards, 2004a, p.529); e, que a introdução de nova legislação, nomeadamente a directiva do fim de ciclo de vida de veículo (End-of-Life Vehicle Directive) é um dos factores que acelera ou impulsiona a mudança (Edwards, 2004a, pp.529-530 baseado em ED29, 2000). Considera-se que a redução do peso dos veículos é uma das principais tendências de aplicação de materiais no sector automóvel (Edwards, 2004a, p.532).

Segundo Edwards, os materiais tradicionais como o aço ou o alumínio, terão ainda uma grande aplicação, porque as suas propriedades têm sido desenvolvidas e são ainda atractivas. Salienta-se que também a legislação deverá continuar a ter um papel importante no

desenvolvimento dos materiais, em particular no que respeita às questões ambientais, e considerando todo o ciclo de vida dos componentes automóveis (Edwards, 2004a, p.533).

Também Janszen e Vloemans (1997) identificam que o sector do aço, especialmente nos países desenvolvidos, se depara actualmente com diversos factores adversos, e em particular, com a sua substituição por materiais alternativos como o alumínio e compósitos. Considera-se que as questões ambientais e económicas, são dos principais factores que têm impulsionado esta tendência no sector, na medida em que existe a necessidade de reduzir as emissões dos veículos, bem como os consumos de combustível, e é parcialmente através da redução do peso dos veículos que estes objectivos podem ser alcançados. No entanto, salienta-se, que os novos requisitos de leveza, segurança, e conforto, não são inteiramente alcançados apenas pela substituição de uns materiais por outros, e que uma aplicação óptima de novos materiais implica também novos princípios de design e engenharia (Janszen e Vloemans, 1997, p.552).

Observa-se, portanto, que existem factores adicionais no âmbito da competição entre materiais, entre os quais parâmetros sócio-económicos, e em que se destaca o impacto da legislação. Considera-se que a competição entre materiais não é determinada por um único factor, atendendo a que lhes estão inerentes diversos sistemas, uma infra-estrutura, que de um modo geral suporta ou viabiliza as tecnologias. E com a introdução de mais factores influentes, compreende-se que a dinâmica do processo de inovação não é linear, sendo difícil de gerir e de prever (Janszen e Vloemans, 1997, p.553 baseados em Janszen30, 1995). A este respeito, expõe- se o seguinte:

«In order to approach the complexity of the matter it is necessary to assess the relative position of steel against its competitors on a so-called life cycle curve. Whereas steel seems to be just stretching its lifetime by means of incremental improvements, the competitive materials have shift the curve to a higher performance level, actually matching customer requirements to designed properties. By effectively shrinking their lead times to the market through intensive cooperation with end-users, the advanced materials producers are able to enter the market niches formerly occupied by steel as a more generic material and thus ‘jump the curve’. In terms of product innovation, steel now has to ‘catch up’.» (Janszen e Vloemans, 1997, p.553). Janszen e Vloemans propõem um modelo dinâmico do sistema de inovação constituído por 5 subsistemas, em que se apresentam diversos factores que influenciam o processo de inovação: infra-estruturas de transformação, integração e comercialização dos recursos físicos; questões sócio-culturais, ambientais e institucionais; e conhecimento científico e tecnológico (Janszen e

30 Janszen, F. H. A. (1995), Innovation processes, systems of innovation and management of innovation;

profiting from the non-linearities in the innovation process. In: Janszen, F. (Ed.) Advisering en

Vloemans, 1997, pp.553-554). Distinguem-se alguns factores que impulsionam e inibem a utilização do aço e dos materiais substitutos no sector automóvel: limites técnicos no âmbito de propriedades intrínsecas dos materiais, como a densidade; um aumento da preocupação do público com as questões ambientais; pressão política crescente, do que resulta legislação mais exigente; uma maior abundância de substitutos, em quantidade e qualidade; e, uma infra-estrutura industrial melhorada no que respeita a tecnologias produtivas e à aceitação dos materiais substitutos (Janszen e Vloemans, 1997, p.554).

«By means of the automotive example it became clear that the innovation process in the automotive sector (and derived from that, the resulting innovation in the steel sector) is driven by changes in the physical environmental subsystem (pollution). Socio-cultural change in the perception of the environment (increased awareness) brought forward a change in the institutional subsystem by means of an increased legislative infrastructure. To have a viable strategic option in the industrial competitive subsystem, in which resources are transformed, integrated and exchanged, it is required to accommodate the new laws. The solution to the environmental issue can be found in the technologies appropriated, the so-called scientific web. New developments in the fields of materials science (increased performance), engine technology (fuel cells) and design concepts (monobody versus spaceframe) enable the industry to contribute to a more fuel-efficient car use.» (Janszen e Vloemans, 1997, p.554). Como apresentado neste caso, subjacente aos factores tecnológicos e económicos, está um de percepção pública acerca do desempenho ambiental da indústria e respectivos materiais. Neste contexto, considera-se que um material substituto é viável, se o seu desempenho ambiental for superior (Janszen e Vloemans, 1997, p.554). Janszen e Vloemans representam a dinâmica das influências relativas à substituição de materiais no sector automóvel através do seguinte esquema:

Figura 14 – Dinâmica das influências relativas à substituição de materiais no sector automóvel, Janszen e Vloemans, 1997, p.555.

Distinguem-se ainda alguns factores que podem contribuir para retardar a substituição do aço por outros materiais: considera-se, que nos mercados tradicionais da sua aplicação, o aço tem uma vantagem significativa sobre os seus substitutos, que é a de ter uma longa e bem estabelecida tradição de uso e de competência entre os engenheiros de design; defende-se que a transição do aço para outros materiais com os quais estes profissionais não estão familiarizados não é fácil, e requer uma predisposição /mudança de atitude substancial. Outros factores que inibem a mudança são os elevados custos associados ao desenvolvimento de novos modelos de engenharia, construção, uso e reciclagem dos substitutos, que se reflectem em todo o ciclo de vida. Por outro lado, existem também os riscos associados, pelo que se considera que existe uma espécie de bloqueio tecnológico, relativamente à utilização do aço (Janszen e Vloemans, 1997, p.554).

Sugere-se, que no futuro, as novas tecnologias de materiais irão não só afectar as estratégias de inovação e marketing, como também terão impacto nas funções produtivas, e na forma como as empresas se organizam (Janszen e Vloemans, 1997, p.555). A questão central para os produtores e fornecedores de materiais tradicionais como o aço, é agora, a de como abordar esta mudança de paradigma no que respeita aos requisitos da inovação, na medida em que as competências existentes, orientadas para o fornecimento de grandes quantidades a baixo custo, se revelam agora insuficientes; a ênfase no melhoramento dos processos para manter um preço competitivo, parece já não ser a única chave para o sucesso. A utilização de materiais alternativos em certos mercados reflecte que as economias de escala já não são suficientes; diversas circunstâncias têm favorecido as economias de competências (“scope”), exploradas pelos novos concorrentes (Janszen e Vloemans, 1997, p.552).