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Compósitos e complexidade – ao encontro da natureza

2.4 Materiais Compósitos

2.4.3 Compósitos e complexidade – ao encontro da natureza

Considera-se que o desempenho de um material compósito não é apenas a soma das propriedades dos materiais empregues, mas antes uma solução que resulta da interacção e sinergia destas, e que o design e aplicação destes materiais representa uma mudança de paradigma no pensamento técnico tradicional dos últimos dois séculos, que se apoiava «…na decomposição do problema em elementos simples e na sua subsequente recomposição mecânica.» (Manzini, 1986, p.64).

Manzini observa também que «O extraordinário protagonismo do conceito de compósito no panorama produtivo parece remeter o percurso dos materiais para uma posição não muito distante do ponto de partida», na medida em que a não homogeneidade e a anisotropia, são características dos primeiros materiais naturais utilizados pelo homem, tais como a madeira, o

osso e a pele, bem como pelo facto de se construírem materiais compósitos desde a antiguidade, de que é um exemplo a mistura de argila e palha utilizada em construção, e cujo intuito é o mesmo dos compósitos avançados da actualidade: «…aproveitar a resistência das fibras à tensão, deixando a uma matriz de propriedades mecânicas inferiores a tarefa de conservar a forma desejada.» (Manzini, 1986, p.91).

Comparativamente com a longa história de utilização de materiais compósitos, o período no qual se valorizam materiais homogéneos e isotrópicos, aparece como um breve instante. Defende- se, que «A evolução das máquinas e dos processos de cálculo dos nossos dias mais não é do que o relançar da continuidade com o passado mais longínquo da tecnicidade humana.» (Manzini, 1986, p.91). Observa-se ainda o seguinte:

«Se actualmente a situação se alterou, o facto deve-se a uma complexidade de factores nos quais os aspectos técnicos e culturais estão intimamente ligados. O desenvolvimento dos compósitos e a gestão da complexidade dos materiais que estes requerem são possíveis graças à actual existência e divulgação de teorias sobre a matéria e seu comportamento, de experiências acumuladas e comprovadas no tempo, de máquinas capazes de tratar esta complexidade de uma forma relativamente económica: uma bagagem de instrumentos que se pode sintetizar com o nome de “neotécnica”. Mas gerir a complexidade do material significa também “pensar de uma forma complexa”, abandonar os modelos de referência mais simplistas e mecânicos sobre os quais assenta, em grande parte, o pensamento técnico moderno. A evolução dos materiais em direcção aos compósitos inclui uma nova forma de conhecimento técnico que se apresenta como componente de uma dinâmica cultural mais ampla, a mesma que fez com que, nos últimos anos, o pensamento ocidental descobrisse o tema da complexidade.» (Manzini, 1986, p.91).

No entanto, para a produção de anisotropias controladas num material compósito avançado, nomeadamente para aplicação na indústria aeroespacial ou em carros de corrida, é necessário um trabalho pouco automatizado, que se reflecte num custo económico elevado; um aumento de produtividade e automação implica menor exactidão na gestão da anisotropia (Manzini, 1986, pp.97-98). Por outro lado, refere-se que as relações entre fornecedor e cliente de materiais compósitos são também estreitas, com o intuito de solucionar as questões técnicas dos componentes, ao nível das propriedades a desenvolver, e do processamento (Edwards, 2004b, p.565 baseado em Bralla13, 1999).

Manzini observa que enquanto os materiais utilizados se afastam cada vez mais do modo como se encontram na natureza, a estratégia técnica do seu desenvolvimento se aproxima de soluções geradas pela mesma, de que são exemplo os ossos das aves e a madeira, constituída por resistentes fibras de celulose e uma matriz polimérica de lignina (Manzini, 1986, p.95); e, que

«Quando comparada com as estruturas naturais (altamente anisotrópicas e não homogéneas, mas altamente integradas em elementos multifuncionais), a tecnologia aparece como um conjunto de soluções bastante rudimentares.» (Manzini, 1986, p.95).

Também Vincent (2002) observa que as estruturas produzidas pela natureza são muito complexas; considera-se que se as conseguirmos compreender podemos aprender muito (Vincent, 2002, p.30). Um exemplo desta “transferência de tecnologia” é o recente desenvolvimento de um processo que permite a produção de tubos metálicos com uma estrutura interior expandida integrada; até recentemente, a excelência desta solução estava confinada à natureza (Vincent, 2002, p.31).

Os materiais encontrados nos organismos vivos são muito eficientes, nomeadamente, quanto à sua resistência por unidade de peso (Vincent, 2002, p.32); os materiais biológicos têm elevados desempenhos, e alguns, como a madeira, nem podem ser melhorados actualmente, do que resulta a elevada importância atribuída aos materiais biológicos em diversas tecnologias (Vincent, 2002, p.33 baseado em Wegst14, 1996). A celulose, um dos constituintes da madeira e de outras

plantas, é um material de elevado desempenho, comparável às melhores fibras produzidas tecnologicamente, e é constituída por diferentes níveis de microfibrilas: as microfibrilas primárias têm cerca de 5 nm de diâmetro, e agrupam-se em cerca de 100 para formar uma microfibrila maior (Vincent, 2002, p.35). Em Vincent encontram-se outros exemplos da excelência dos materiais produzidos pela natureza; estes materiais têm ainda a particularidade de serem inteligentes:

«In nature, shape is cheaper than material. This has been shown a number of times and is manifested in the remarkably high performance, both absolute and specific, of biological materials (wood is one of the most efficient of materials; antler bone is tougher than any man- made ceramic composite) which is achieved not by the use of high performance components but by the degree of detail and competence in their design and construction. The implication is not only that animals and plants have to work hard to win the raw materials – sugars, amino acids, salts – from their environment, but that their control over the assembly and shaping of these materials is much more complete than ours. An essential part of this control is the cellular feed-back mechanisms which direct the accretion of material to places where it is most needed, resulting in adaptive structures. The shape of a tree is the history of the forces which were acting on it while it grew. These same sensory mechanisms, allied to a more mobile effector system as found in animals, lead on to structures whose lightness and apparent fragility are made robust by the ability to adapt shape and structure quickly to changing loads. This adaptiveness not only reduces the energy input into the production of the structure, but also allows it to adapt to changing forces and circumstances during its lifetime, many of which

14 Wegst, U. G. K. (1996), The mechanical performance of natural materials, Thesis, University of

may be unpredictable. Such adaptiveness has also been called smart or intelligent behaviour.» (Julian Vincent in Beukers e Hinte, 1999, p.44).

Considera-se que enquanto os materiais são baratos, não existe incentivo para os utilizar de forma cuidada e económica, sendo os resultados produzidos pouco eficientes, pesados, pouco elaborados no que respeita ao design, e até mesmo feios. No entanto, como o custo de um produto acabado depende do processamento e consumo de energia, para além do custo da matéria-prima, por vezes torna-se mais económico utilizar uma matéria maleável e fácil de processar; defende-se que esta é também uma questão que tem contribuído para a adopção dos materiais plásticos e compósitos (Vincent, 2002, p.29 baseado em Gordon15, 1976).