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2.3 AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA

2.3.2 Dimensões de autonomia universitária

2.3.2.3 Autonomia de gestão financeira e patrimonial

A autonomia financeira, no presente trabalho, constitui, juntamente com o ciclo orçamentário das universidades públicas do Estado do Paraná, o foco central da pesquisa. Em princípio, não é possível, ou pelo menos fica em muito comprometido o resultado de qualquer trabalho voltado ao ciclo orçamentário dessas instituições, sem uma adequada fundamentação da autonomia financeira. Por isso, entre as dimensões da autonomia universitária, a financeira reveste-se da mais alta relevância no contexto do presente trabalho.

A Lei 4024, de 20/12/61, assim definia a autonomia financeira:

Art. 80 - § 3o. – A autonomia financeira consiste na faculdade:

a) de administração do patrimônio e dele dispor na forma prevista no ato da constituição ou nas leis federais e estaduais aplicáveis;

b) de aceitar subvenções, doações, heranças e legados;

c) de organizar e executar o orçamento anual de sua receita e despesas, devendo os responsáveis pela aplicação dos recursos prestar contas anuais.

O espírito da lei, na época, já buscava dar às universidades, a partir de um teto fixado no orçamento da união, a necessária autonomia para executar o seu próprio orçamento. Entendia que somente os seus órgãos internos, através dos seus dirigentes, estavam verdadeiramente em condições de atender às reais necessidades da instituição.

A questão que se coloca para as universidades públicas, segundo Durham (1989, p. 60-61), é:

Como assegurar sua autonomia em face de sua dependência quase total em relação aos fundos públicos que o Estado administra. O repasse de recursos cria uma possibilidade de controle que pode provocar uma permanente interferência do estado na gestão das Universidades [...], destruindo, na prática, a autonomia admitida em teoria. É isto o que tem acontecido com as universidades brasileiras, e a inserção do artigo sobre a autonomia no próprio corpo da Constituição Federal é o reconhecimento da necessidade de proteger a universidade dessa ingerência excessiva (grifo nosso).

Para Ranieri (1994), a dimensão da autonomia financeira e patrimonial proporciona à universidade a gerência dos recursos colocados a sua disposição, compreendendo a tarefa de elaboração, execução e reestruturação de seu orçamento e a constituição e disposição do seu patrimônio. Lembra a autora que os recursos financeiros repassados às instituições passariam a ser bens institucionais. Diante do caráter instrumental da autonomia, a gestão de recursos

exigiria uma responsabilidade institucional, o que supõe o estabelecimento de prioridades, de planos de desenvolvimento a médios e longos prazos, bem como a conseqüente promoção da democratização interna da universidade na distribuição desses recursos.

Como instituição pública, tendo como órgão mantenedor o poder público, as universidades preocupam-se com o nível dos recursos colocados a sua disposição para o atendimento de suas necessidades, que ao longo tempo, têm-se mostrado na realidade, como insuficientes. No ano de 1990, o Prof. Arthur Macedo, em um congresso universitário realizado na Universidade Estadual de Maringá, assim se referia ao assunto:

Não adianta você ter autonomia de gestão financeira se os recursos destinados à universidade forem incompatíveis, estiverem muito abaixo dos recursos necessários para tocar em condições adequadas as obrigações assumidas. Uma autonomia de gestão financeira, sem recursos adequados, equivale a você desobrigar o Estado das suas obrigações com o ensino público. Isto só aumentará a dependência da universidade com o poder público. Então é de fundamental importância que você tenha uma autonomia, e que essa autonomia venha acompanhada de recursos compatíveis com os compromissos assumidos, em termos de ensino de graduação e pós-graduação, em termos de pesquisa, de folha de pagamento de pessoal e, evidentemente, em termos de investimentos e atendimentos à comunidade.

O Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimento de Ensino de Maringá – SINTEEMAR, em seu jornal de 1990, p. 5, apresenta a mesma linha de pensamento quando afirmou: “Das autonomias estabelecidas na Constituição Federal, sem dúvida nenhuma a mais vital é a autonomia financeira e de gestão patrimonial, pois as demais autonomias (didática, acadêmica e administrativa) ficariam restritas pela ausência da primeira”.

A abordagem de Grassman (1997) segue a mesma linha de pensamento até agora evidenciada, mas acrescenta a questão da eliminação de mecanismos formais e legais de controle diretamente exigido pelo Estado sobre a questão dos recursos financeiros das universidades brasileiras. Diz Grassman (apud Karling, 1997, p. 106):

O primeiro aspecto da autonomia universitária que vem à baila e que deve ser considerada, em termos de proposta de universidade autônoma, é aquela derivada da relação Estado-Universidade e que, no caso brasileiro, mais nitidamente, conota a relação poder-submissão: a autonomia financeira.

Reconhecida a obrigatoriedade do Estado em financiar a universidade, e tratando-se de recursos públicos, a autonomia financeira não pode significar a total ausência de controles.

Assim, ela tem como contrapartida a necessidade de uma fiscalização pública desses recursos pela sociedade que a mantém.

A própria Constituição Federal em vigor, no seu artigo 70, remete aos mecanismos operacionais da autonomia financeira, a serem passíveis de controle externo e interno ao determinar:

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada poder.

Parágrafo único. Prestará conta qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma a obrigação de natureza pecuniária. (Brasil, 1988, p. 70-71).(grifo nosso).

A Constituição do Estado do Paraná, no seu artigo 74, remete a mecanismos semelhantes aos do artigo 70 da Constituição Federal, com pequena diferença de conteúdo apenas no parágrafo único, sendo mais preciso:

A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do estado e das entidades da administração direta e indireta, quanto a legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pela Assembléia Legislativa, mediante controle externo e interno e pelo controle de cada poder.

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física, jurídica ou entidade pública que utilize, arrecadem guarde, gerencie ou responda, ou que, em nome deste, assuma obrigação de natureza pecuniária (Paraná, 1989, p. 34-35). (grifo nosso).

Para Karling, (1997, p. 103) “...sem autonomia financeira ou de gestão financeira, não há autonomia administrativa, não há liberdade de gestão. Não adianta querer ser livre sem possibilidade de obtenção dos recursos”. Diz Ribeiro (apud Karling, p. 63), que a autonomia é “sempre negada pela contradição irredutível entre vontade de ser livre e sua dependência do poder estatal financiador”. Em outras palavras, significa dizer que as demais dimensões da autonomia – administrativa, didático e científica – ficam seriamente comprometidas no seu desenvolvimento institucional.

A autonomia financeira, de caráter instrumental, outorga à universidade o direito de gerir e aplicar seus próprios bens e recursos, em função de objetivos didáticos, científicos e culturais já programados. Este aspecto da autonomia de gestão financeira e patrimonial não tem a presunção de exonerar a universidade dos sistemas de controle interno e externo.

Neste mesmo sentido, afirma Brotti (2000, p. 80) que:

A autonomia de gestão financeira é apontada por praticamente todos como o grande limitador da autonomia plena na universidade. Ela é o “gargalo” que estrangula a autonomia universitária. Contudo, há também a percepção de que a autonomia financeira não deve ser absoluta, mais relativa, na medida em que deve haver um limite de recursos estabelecido pelas necessidades reais da universidade. Por isso as maiores discussões e os maiores conflitos se dão justamente em torno desse limite, desse teto.

As universidades necessitam de recursos financeiros para viabilizar a execução de suas atividades-fins e de apoio, para atender aos anseios da sociedade na qual se inserem e, até mesmo, para mantê-las vivas como organizações sociais. Por isso, a autonomia de gestão financeira constitui-se, na realidade, como a mais reivindicada e de mais difícil solução.

2.3.3 Autonomia de gestão financeira e orçamentária das universidades estaduais