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PROFESSORES FORMADORES

AUTONOMIZAÇÃO COMO MODO DE SER CORPO

No decorrer da discussão deste estudo, tentamos anun- ciar alguns sentidos para a docência no horizonte da corpo- reidade enquanto uma ação educativa/formativa capaz de nutrir a beleza de aprender com prazer. Lugar de vivências do corpo e de aceitação mútua: o que estamos chamando de hu- mana arte docência. Nesse espaço, o encantamento com o conhecimento, a ética do cuidado e a autonomização como modo de ser corpo compreendem alguns sentidos nortea- dores dessa docência – sentidos que, no contexto de uma educação sensível, criam condições para um saber viver de forma singular e plural.

No caso da autonomização como um modo de ser cor- po, percebemos uma abertura de caminhos para a busca

de uma estética/poética de si atrelada à busca de conhe- cimento no percurso existencial. Trata-se de uma cosmo- -estética transpessoal (JOSSO, 2004), construída e procu- rada por uma associação ativa entre a busca da realização pessoal/profissional e a busca de conhecimento rumo à sabedoria. Pelo ponto de vista de Josso:

significa pois que, a cada momento da nossa existência, temos de esco- lher agarrar – ou não – uma opor- tunidade para exercermos um juízo, uma ação, um comportamento, uma atitude interior, levando em conside- ração as perspectivas abertas pela procura de articulação das quatro buscas e apoiando-nos nas práticas de desenvolvimento da nossa aten- ção consciente. A sabedoria não é pois um apanágio dos seres excep- cionais que agem de forma “perfei- ta”; ela reside sim no fato de situar- mos os mínimos gestos na perspecti- va global e complexa, que nos ofere- ce a articulação das quatro buscas, fundada numa atenção consciente de si, dos outros e com o nosso meio natural (JOSSO, 2004, p. 108-109). A humana arte docência dinamiza as potencialidades singulares em prol de uma autonomização plural, porque

o autonomizar-se acontece na produção de sentido cons- truída na relação com o outro, na medida em que estamos implicados no contexto vivencial pela nossa corporeidade. Importante, também, lembrar que:

não há autonomia absoluta, porque a emergência do sujeito autônomo decorre num mundo de interações complexas e multidimensionais que a cultura e a sociedade supõem. O ser humano é interdependente e autônomo, em busca permanen- te do que não tem, do que não é. A aspiração à transcendência, à su- peração é própria de um ser que é síntese de acto e potência, de ordem e desordem, de repouso e movimen- to, de essência e existência. E assim matéria, vida e consciência não são substâncias distintas, mas modos diversos da temporalização e cor- porização da complexidade humana (SÉRGIO, 2004, p. 40-41).

Dominicé, por sua vez, colaborando com esta discussão, enfatiza:

A autonomia é assumida como a resolução de se tomar o percurso de vida nas próprias mãos. As es-

colhas que dependem da decisão de outrem são submetidas a uma pers- pectiva crítica. A autonomia, sem dúvida uma das questões centrais da educação, subtende toda a refle- xão sobre a formação (DOMINICÉ, 1988, p. 151).

Tanto em Dominicé (1988) quanto em Sérgio (2004),

encontramos uma ideia de autonomia ancorada à histori- cidade das coisas, à temporalidade e à intencionalidade no mover-se do corpo. E essa reflexão em torno da autonomi-

zação como modo de ser corpo originou-se da entrada do trabalho biográfico, via narrativas de vida, na compreensão da ideia da humana arte docência, tendo em vista que a vida é o centro da formação. E a narrativa de nossa vida é a narrativa de nossa formação. Com as narrativas de vida dos professores formadores, apreendemos um ser corpóreo responsável em fazer seu próprio caminho na vida, ligado ao processo de transformação e formação do outro, proje- tando o seu ser numa ação pedagógica atravessada pelo encantamento com o conhecimento e a ética do cuidado. Pela trajetória individual de cada colaborador na investiga- ção, encontramos sentidos para um saber ser e um saber fazer no campo da docência. Na lógica e nas evocações des- sas narrativas, lembramos a vida do passado e nos projeta- mos para o futuro sem sair do presente. Nesse movimento, o corpo é o fundamento para a educação na sensibilidade.

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