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MEU BONECO É UM VIAJANTE QUE VAGA PELO IMAGINÁRIO

PEDAGÓGICA EM TEATRO EM CONSTRUÇÃO

MEU BONECO É UM VIAJANTE QUE VAGA PELO IMAGINÁRIO

Inicia-se esse tópico com uma frase escrita por um alu- no/integrante do GEPAT “Pessoas” em seu diário de bordo, enfatizando o caráter imaginário que o boneco de luvas pode suscitar, fazendo-os navegarem pelo universo do ima- ginário perpassando não só o ato de criação como também uma possível dramaturgia do boneco.

Sobre o boneco de luva, Pereira et al. (2015) afirma que:

O ator manipulador calça a mão com o boneco, como no Mamulengo. [...] Com bonecos de luva, o importante

26 Recorri estritamente ao uso das tecnologias, principalmente por não poder estar presente nesses encontros iniciais.

é a intensidade do gesto e, a partir do momento em que se reduzem as ações, esse gesto fica muito mais in- tenso e a magia de uma cena ou de um espetáculo é a junção de elemen- tos que determinam um personagem e o que lhe confere vida e animação (PEREIRA et al., 2015, p 35).

Ao produzirem seus próprios bonecos, foi verificada a sa- tisfação dos “gepatianos”27 em participar de um processo de

criação diferente do que estão habituados a desenvolver, pois agora a ideia era dar vida a um personagem a partir de um objeto inanimado construído por eles próprios. Essa constru- ção compreende toda uma logística de infraestrutura, aden- trando em um espaço específico para o trabalho com o teatro de animação, o que possibilitou ainda mais o despertar para nossas necessidades.

O grupo dispõe de uma sala pequena para realização de encontros e reuniões, conquistada com muita luta; contudo, para práticas como essas, é necessária a utilização de labora- tórios específicos, o que só nos incita a conquistar não só nos- so espaço como área de conhecimento num ambiente quase que predominantemente tecnicista, como também nosso es- paço artístico – se há um laboratório de química, de alimentos e de matemática, também é necessário um para o teatro. Esse tipo de comentário pode ser irrelevante para alguns, porém, reitera-se que a participação nessa oficina propiciou desde

27 Nomenclatura designada pelos próprios integrantes aos que fazem parte do GEPAT “Pessoas”.

um olhar mais aguçado para as necessidades do nosso grupo até o reconhecimento da importância do teatro de animação e as possibilidades de criação em animação de um modo ge- ral. Ainda, em especial para o município de Zé Doca, a ofici- na oportunizou a memória da cultura popular e das histórias quase esquecidas de seus moradores, propiciando o resgate da identidade cultural.

É imprescindível mencionar a influência e significância da estrutura física, da pesquisa dos materiais, da transposi- ção didática e dos processos de criação coletiva e individual que envolvem essa área. Os participantes não aprenderam somente a fazer bonecos de luva, mas foram além, trabalhan- do em grupo, estudando materiais diversificados e diferentes possibilidades didáticas, sendo capazes de produzir seus pró- prios instrumentos de aprendizagem.

A estrutura do laboratório de bonecos de luvas foi dividida em cinco etapas: apresentação da atividade, confecção com sua caracterização e criação do personagem, manipulação, produção da dramaturgia e apreciação das apresentações co- letivas produzidas. Na coleta dos dados, destacam-se os regis- tros visuais e audiovisuais, a entrevista padronizada via ques- tionário online e a autoavaliação oral realizada ao término das atividades pelo coordenador dos laboratórios, cujo percentual de respostas consta nas figuras apresentadas ao longo deste texto e nos fragmentos dos relatos dos participantes.

Figura 1 – Participações anteriores em teatro de animação

Fonte: Dados da pesquisa.

As maiores dificuldades enfrentadas pelos participantes estavam relacionadas à manipulação e à criação da voz, como também à produção do texto dramatúrgico; constatou-se, in- clusive, que alguns fragmentos de textos já haviam sido uti- lizados em outras apresentações do grupo. É necessário citar também a preocupação que tiveram com os textos moralizan- tes e com referências ressaltando os problemas envolvendo se- gurança, educação, saúde e o cotidiano escolar no munícipio de Zé Doca.

As maiores dificuldades que eu en- contrei foram: manusear o boneco durante a apresentação, porque tí- nhamos que ter cuidado quanto à for- ma em que ele deveria estar, e a ou- tra dificuldade foi ter que criar uma história que tivesse uma moral, mas que para aqueles que fossem assistir não soasse como algo moralizante. E quanto às facilidades verificadas

foram: a produção do boneco, o en- trosamento de todo mundo para que aquilo desse certo, e o momento que tivemos para descobrir o tom correto das vozes (aluna do técnico em Bio- combustíveis).

A dramaturgia em voga no teatro de bonecos está para além do texto em si, compreendendo também os gestos. O diferencial nessa construção é o ator-manipulador, pois é o toque desse sujeito que confere a dinâmica do objeto-ator (PEREIRA et al., 2015). A manipulação do boneco requer um trabalho corporal envolvendo principalmente os membros su- periores, exercícios respiratórios e técnica vocal; não se trata simplesmente de vestir o boneco e executar algumas ações. O que possibilitou uma melhor assimilação nessa etapa foi a apresentação do espetáculo As peripécias de Casepet e seu

papagaio mágico pelos ministrantes da atividade: ao ver os

gestos executados, os participantes tiveram noções dos ges- tos pontuais para uma apresentação. De acordo com Pereira, “o objeto precisa do ator-animador para que ele possa atuar, pois só não é nada. Ele só se torna ‘vivo’ (ou ativo) com uma manipulação expressiva e ágil, ou seja, ele precisa do corpo, da energia de um ator-animador que o movimente” (PEREIRA et al., 2015, p.81).

Destacam-se as impressões dos participantes sobre o pro- cesso de produção do boneco de luva, de criação dos perso- nagens e das dramaturgias, bem como das apreciações das encenações:

A produção foi muito boa e interes- sante. Pude ver que é possível con- feccionar os bonecos com materiais recicláveis, o que é muito bom pois são coisas muito fáceis de serem en- contradas. A criação de personagem foi bem interessante, acabei colocan- do no boneco algumas coisas que eu gostava, e criei o nome dele de acordo com isso, BUG: um erro que ocorre nos computadores. Depois percebi na fala do professor que, por mais que a gente não queira, acabamos transmi- tindo coisas pessoais para o objeto. A apresentação em grupo foi um pouco difícil, acredito que isso ocorreu pelo fato de não termos domínio total so- bre o objeto (aluno do técnico em Aná- lises Químicas).

Divertido e inovador (para todos). Tra- balho em equipe, trabalhando a ima- ginação e subjetividade. Pondo ca- racterísticas nossas e não nossas em cada detalhe (personagens, drama- tização e histórias). Além de ter sido muito engraçado em diversos mo- mentos. E aprendizagem no extenso trabalho manual (aluno de licenciatu- ra em Química).

As apresentações foram criadas e in- terpretadas por nós mesmos depois que os monitores nos deram uma demonstração (demonstração que baixou nossa expectativa de arrasar; pensávamos que éramos bons, mas eles eram melhores). Mas, mesmo as- sim, após criar a peça-encaixe da opi- nião de cada pessoa da equipe, fomos para a prática (aluno de licenciatura em Química).

A metodologia de aprendizagem com o boneco de luvas contempla conteúdos com saberes múltiplos, perpassando pela produção de texto, recursos cênicos, trabalho corporal e voz, o que possibilita uma aprendizagem com o outro e no coletivo. Ainda, é possível atrelar todo esse conhecimento aos aspectos culturais, podendo inserir informações rele- vantes sobre a cultura de uma determinada localidade que, na maioria das vezes, é desconhecida pelos próprios edu- candos e citadinos, propiciando o fortalecimento da identi- dade cultural local.

SOMBRAS, PARA QUE TE QUERO: IMAGINAÇÃO,