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Fonte: ELABORADO POR MIQUÉIAS SILVA A PARTIR DE DADOS DA SEMURB, 2007; IBGE, 2015.

77 Na década de 1990, o processo de verticalização na cidade de Natal ocorreu sob duas formas distintas. A primeira se destaca pela restrição do governo federal aos financiamentos da habitação e pela crise econômica em que o país se encontrava, diminuindo assim o mercado de construção de imóveis até o ano de 1994. A segunda, a partir desse ano, teve início com o reaquecimento do processo de construção de edifícios verticalizados, principalmente por causa da aprovação do Plano Diretor de Natal-Lei Complementar 007/94, que estabelecia parâmetros para controle do uso e ocupação do solo (COSTA, 2000).

Essa legislação regulamentou ainda o zoneamento da cidade de Natal em dois níveis. O primeiro nível baseado no macrozoneamento, considerando a infraestrutura instalada nas áreas da cidade, os ambientes naturais frágeis e a democratização do acesso à terra, o que resultou na divisão da cidade em três zonas: zona adensável, zona de adensamento básico e as zonas de proteção ambiental, conforme podemos observar na Figura 3.

E o segundo nível fundamentou-se de modo mais específico na proteção e recuperação de algumas áreas da cidade, consideradas especiais, nos componentes socioeconômicos, ambientais e culturais, que necessitavam de tratamento urbanístico diferenciado. Essas áreas especiais são definidas por Duarte (2011, p. 195) como “porções da Zona Urbana situadas em zonas adensáveis ou não, com destinação específica ou normas próprias de uso e ocupação do solo”, compreendendo assim as áreas de controle de gabarito, as áreas de operação urbana e as áreas de interesse social.

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Figura 3 – Macrozoneamento de Natal no ano de 1994

Fonte: DUARTE, 2011.

Nesse sentido, com a referida aprovação do Plano Diretor-Lei Complementar 007/94, as empresas construtoras/imobiliárias tiveram um período de adaptação à nova legislação, que ocasionou uma verdadeira corrida aos órgãos competentes com os pedidos de alvarás, solicitando autorização de novas construções como forma de ficarem fora das exigências da nova legislação urbana, que se caracterizava como um instrumento mais rigoroso que a legislação anterior no que tange ao gabarito de construção e aos recuos (COSTA, 2000).

79 Neste Plano Diretor, os bairros de Igapó e Potengi foram inseridos na Zona Adensável 2 que previa o incentivo fiscal direcionado ao uso não-residencial, com outorga gratuita para os imóveis que não excedessem o coeficiente básico de 1.8. Para Medeiros (2015) isso evidenciava a intenção do poder público de atrair atividades comerciais e prestação de serviço para esses bairros.

No ano de 2004, iniciou-se a revisão do Plano Diretor de Natal devido à necessidade de se adaptar as normas de planejamento do crescimento da cidade imposta pelo Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001. De acordo com Duarte (2011, p. 361),

O processo de construção do Plano Diretor de 2007 pode ser definido como um dos momentos mais marcantes na elaboração da minuta do Projeto de Lei que foi encaminhada à Câmara Municpal, mas também em razão da conturbada fase de tramitação daquele Projeto no âmbito do Poder Legislativo, que veio renovar as evidências do processo de fragilização dos direitos que envolvem os momentos da construção e modificação da legislação urbana.

O Plano Diretor de Natal passou a ser instituído a partir da Lei Complementar nº 82/2007, com algumas alterações, tendo destaque a preocupação com a sustentabilidade urbana, com a proteção do patrimônio histórico e cultural e com a qualidade de vida dos habitantes da cidade. O zoneamento em nível macro foi mantido com a divisão do território em três zonas (adensável, adensamento básico e proteção ambiental) e em um nível mais específico, considerando os atributos ambientais, sociais, culturais e socioeconômicos; algumas áreas urbanas passaram a ter normas próprias de uso e ocupação do solo, sendo, portanto, definidas como Áreas de Controle de Gabarito, Áreas Especiais de Interesse Social, Áreas de Operação Urbana e as Áreas Non Aedificandi (DUARTE, 2011, p. 407).

A partir do zoneamento determinado no Plano Diretor, foram definidos os coeficientes de aproveitamento básico das áreas da cidade de Natal (Figura 4), considerando que todos os terrenos contidos na Zona Urbana teriam o coeficiente básico de 1,2. Dessa forma, as zonas de adensamento básico corresponderiam às áreas onde se aplica, estritamente, o coeficiente de aproveitamento básico. A Zona Adensável, por sua vez, corresponde às áreas onde as condições do meio físico, a disponibilidade de infraestrutura e a necessidade de diversificação de uso possibilitam um adensamento maior do que aquele correspondente aos parâmetros básicos de coeficiente de aproveitamento. E a Zona de Proteção Ambiental corresponde às áreas nas quais as características do meio físico restringem o uso e ocupação, visando a proteção, manutenção e recuperação dos aspectos ambientais, ecológicos, paisagísticos, históricos, arqueológicos, turísticos, culturais, arquitetônicos e científicos (NATAL, 2007).

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Figura 4 – Macrozoneamento da cidade de Natal no ano de 2007.

81 Observamos que na Figura 4, a Região Administrativa Norte está inserida na área de adensamento básico, ou seja, seu coeficiente de aproveitamento é o básico que corresponde a 1,2. A região leste é uma zona adensável com coeficiente mais elevado em seus bairros, tendo como exceção as Zonas de Proteção Ambiental 8 e 10. Já as regiões oeste e sul da cidade de Natal têm seu coeficiente definido a partir dos bairros, pois se percebe que há um uso misto de coeficiente, uma vez que este é definido com base na disponibilidade da infraestrutura das áreas, da proximidade com áreas de proteção ambiental, entre outros.

Ressalta-se que, com base na entrevista realizada com a representante da SEMURB, para a qual utilizamos o pseudônimo “Representante de Órgão Público 1” (ROP 1), quando questionado se a ausência de prédios verticais estava relacionada com o valor estabelecido pelo coeficiente de adensamento, a mesma explicou que não. Nas palavras de ROP 1:

Não há nenhuma restrição em construir condomínios verticais na Zona Norte. Essa restrição ela não existe como Zona Norte. O que existe são restrições nas zonas de proteção ambiental. Então você vai ter dois trechos da Zona Norte que estão dentro de zonas de proteção ambiental e esses dois trechos estão protegidos na questão da paisagem, na questão ambiental [...]o restante da Zona Norte ele é uma zona de adensamento básico do mesmo jeito da zona sul é zona de adensamento básico, eles possuem mesmo coeficiente básico, mesmo gabarito máximo 65 metros. É igual zona sul e zona norte. [...] O mercado imobiliário é que visa as áreas por motivos imobiliários. Há um mito que aparece nas mídias, nas reportagens que a Zona Norte não pode verticalizar e isso não existe. Legalmente não existe [...] (Informação oral21).

Portanto, a ausência desses empreendimentos estava mais relacionada à demanda do mercado imobiliário, que não achava viável construir empreendimentos desse porte na referida área, do que à normatização estabelecida pelo Plano Diretor, Lei Complementar nº 82/200722.

A partir das normas estabelecidas no Plano Diretor, os bairros de Natal passaram a ter gabaritos pré-estabelecidos e a verticalização passou a se concentrar principalmente nas Regiões Administrativas sul e leste, apresentando uma nova “face” de Natal. Sendo assim, os anos que se seguiram a esses eventos marcaram o processo de alta valorização para essas áreas (leste e sul) em contraposição às áreas oeste e norte da cidade de Natal.

21 Informação oral concedida em entrevista realizada no dia 6 de agosto de 2018, na sala de reuniões da

Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, com a Arquiteta responsável pela revisão do Plano Diretor que está sob o pseudônimo “Representante de Órgão Público 1 (ROP 1).

22 Ressaltamos que desde o ano de 2017 essa legislação encontra-se em processo de revisão, haja vista que, por

orientação do Ministério da Cidade, através do Estatuto da Cidade, o plano diretor deve ser revisto pelo menos a cada dez anos. No entanto, de acordo com ROP 1, por questões orçamentárias, essa revisão ainda não ocorreu em sua totalidade.

82 Nesse contexto, para compreendermos em que cenário surge a Região Administrativa Norte, o subcapítulo que se segue corresponde ao processo de ocupação dessa referida região administrativa, apresentando quais foram os principais marcos históricos e as metamorfoses espaciais.

3.3 REGIÃO ADMINISTRATIVA NORTE DE NATAL: FORMAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO DO SEU ESPAÇO URBANO

Durante alguns anos, para interligar uma margem a outra do estuário dos rios Potengi e Jundiaí, em Natal, foram utilizados barcos ou uma estrada carroçável através do município de Macaíba. Em 1912, teve início a construção de uma ponte, cuja conclusão se deu em 1916, sob a responsabilidade da Companhia de Viação e Construções, que contratou a empresa inglesa The Cheveland Bridge & Engeering Company para a execução da obra, facilitando o acesso de mercadorias e a transição das pessoas de um lado para o outro (SOUZA, 2008a). Essa ponte possuía uma única via por onde circulavam as pessoas, os automóveis e o trem, como pode ser observado na Imagem 5.

Imagem 5 – Vista da antiga Ponte de Igapó, s.d.

83 A construção dessa ponte facilitou a ligação do primeiro núcleo de moradores de Aldeia Velha, que se tornou posteriormente o povoado Igapó23 – as outras áreas da cidade. No entanto, pouco influenciou no seu processo de ocupação, que só aconteceu em anos seguintes, com a construção da segunda ponte. Segundo Paula (2010), com o decreto 981/53, as terras que atualmente fazem parte da Região Administrativa Norte deixaram de pertencer a Macaíba e passaram a integrar o município de Natal, com exceção do núcleo Aldeia Velha, que já pertencia a Natal desde 1938, quando foi desmembrada do município de São Gonçalo do Amarante.

Além do núcleo Aldeia Velha, a Região Administrativa Norte de Natal contava com uma vila de pescadores denominada Redinha, que viviam nas imediações da praia e do Rio Doce. Esse rio fornecia água para a população beber, cultivar hortas e para criar gado para a produção de leite. De acordo com alguns dados históricos de Silva (2003), essa comunidade fazia parte de terras doadas ao Padre Gaspar Gonçalves da Rocha, em 1603, e passou a pertencer a Pero Vaz Pinto, escrivão da Fazenda da Capitania.

No ano de 1731, as terras da Redinha passaram a pertencer à senhora Joana de Freitas, viúva do capitão mor Manuel Correya Pestana, por meio de uma doação realizada pelo Senado da Câmara. As terras doadas faziam limites com a propriedade Pajussara e o Rio Doce. Essa área permaneceu enquanto vila de pescadores até o final do século XIX, período também em que há evidências da existência de um local conhecido como Cemitério dos Ingleses24 (Mapa 10), localizado ao lado da ponte Newton Navarro, nas imediações da Zona de Proteção Ambiental 8.

23Igapó, no idioma tupi, significa água que invade, a enchente, o alagável. Como aquela região apresenta essas

características e tendo sido uma antiga taba, originou o nome indígena do bairro (SEMURB, 2007).

24 De acordo com alguns registros históricos o Cemitério dos Ingleses tinha como objetivo enterrar os mortos que

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