• Nenhum resultado encontrado

Localização do Cemitério dos ingleses (s.d.), Redinha, Natal-RN

Fonte: ELABORADO PELA A AUTORA A PARTIR DE DADOS DA SEMURB (2007), IBGE (2015), GOOGLE EARTH (2018) E VENTOS DO NORDESTE (2011).

Para interligar o povoado Igapó até a comunidade pesqueira da Redinha, foi aberta uma estrada carroçável, que, a partir do ano de 1952, passou a ser conhecida como estrada da Redinha, atual avenida Dr. João Medeiros Filho. Somente em 1975 a mencionada estrada foi pavimentada com paralelepípedo e, posteriormente, no ano de 1989, foi devidamente asfaltada e iluminada. Na Imagem 6, podemos observar a referida avenida pavimentada com paralelepípedo no ano de 1981.

85 Essa avenida nos dias atuais (2018) ainda se constitui como o principal eixo de ligação dos bairros da Região Administrativa Norte, tendo como principal uso do solo a atividade comercial; porém, já está se redefinindo em uma área também residencial, indicando uma elitização dos espaços.

Sobre o processo de formação da Região Administrativa Norte, Souza (2008b, p. 40) afirma que

Formada inicialmente, por duas áreas distintas e extremas, a região representava o distrito de Igapó como passagem de comerciantes advindos do interior do Estado do Rio Grande do Norte, e a Redinha local para veraneio. A R. A. Norte até o final da década de 1960 apresentava em seu interior vasta gleba e uma população de aproximadamente 7.000 habitantes.

É perceptível, que enquanto o restante da cidade Natal, na década de 1960, crescia em termos sociais e econômicos, a Região Administrativa Norte crescia a passos lentos, sendo ocupada, sobretudo, por casas de farinhas, chácaras, sítios, fazendas que destinavam as suas terras para as plantações e pastagens. Por ser uma área com baixa densidade populacional e, consequentemente, ter poucas residências, ainda durante essa década, a referida Região Administrativarecebeu, no ano de 1968, a casa de detenção Colônia Penal Dr. João Chaves25.

25 “Colônia Penal” é o termo que se refere a um antigo presídio que se localizava na margem da av. Dr. João

Medeiros Filho, que também recebia o nome de Colônia Penal Dr. João Chaves. No ano de 2006, o regime

Imagem 6 – Estrada da Redinha em 1981 (atual av. Dr. João Medeiros Filho)

86 A instalação desse presídio levou o Estado a se preocupar com a instalação de uma rede elétrica que levasse não apenas energia para o povoado Igapó, mas também energia à casa de detenção. Esse elemento parecia ter mais importância para o Estado do que a população já existente no Igapó e adjacências. Sobre esse aspecto, Silva (2015, p. 84) discorre que

A Colônia Penal parece ter sido o elemento que levou a Igapó uma necessidade de luz elétrica reconhecível ao poder estatal, muito mais do que a antiga presença de população, que coexistia na cidade às escuras enquanto brilhavam as luzes do lado direito do rio. Assim, ocorre uma aproximação entre o Estado e a população de Igapó, na qual se passa a assegurar uma necessidade considerada básica na época, mas, isso, através da implantação da primeira instituição pública de grande porte fundada nesse local da cidade, a Colônia Penal “Doutor João Chaves”. Assim, a construção de uma instituição criada com a intenção de disciplinar foi o meio escolhido pelo Estado para expandir sua presença à última região a fazer parte do território da capital.

Nesse sentido, percebemos que a área norte da cidade de Natal parecia esquecida aos “olhos” do poder público até nos serviços essenciais para o desenvolvimento social e urbano da área, sendo, portanto, reflexo do posicionamento seletivo do poder estatal que buscavam investir nas outras áreas administrativas que abrigavam a classe dominante da cidade, reforçando a segregação socioespacial como forte marca da formação histórica do território da cidade de Natal. De acordo com Silva (2003), a Região Administrativa Norte se caracterizava como um espaço de pobreza, principalmente pelo déficit de infraestrutura e pela alta concentração da população com baixo nível de renda.

Sendo assim, no subcapítulo que se segue, buscamos resgatar historicamente como ocorreu o processo de parcelamento do solo que deu origem aos conjuntos habitacionais e aos loteamentos que compõem a estrutura urbana da região estudada.

3.3.1 O parcelamento do solo, os conjuntos habitacionais e o surgimento dos loteamentos com moradias autoconstruídas

O parcelamento do solo da Região Administrativa Norte teve início ainda durante a década de 1950, com os preços dos terrenos bem inferiores aos de outras áreas da cidade de Natal, pois a mencionada região não possuía nenhuma infraestrutura que contribuísse para a comercialização dos terrenos para fins de moradia ou para investimentos em outros fechado masculino foi desativado e os pavilhões demolidos, restando apenas um pavilhão masculino destinado aos internos que cumprem regime semiaberto.

87 segmentos. O período em que houve maior comercialização dessas terras foi o de 1957 a 1975, e o período de maiores parcelamentos desses lotes ocorreu entre 1980 e 1990.

Os proprietários fundiários passavam a adquirir terrenos amplos a preços baixos e revendia-os em formato de lotes com dimensões menores, possibilitando ganhos superiores aos que haviam investido. Grande parte dos lotes foi adquirida para a construção dos conjuntos habitacionais e para a edificação de moradias daqueles que não se beneficiavam com a política residencial. Essa população “excluída” criava e organizava seu próprio “espaço vernacular” (CORRÊA, 2017), ou seja, espaços (terras públicas e privadas) invadidos e/ou ocupados, que se transformam em favelas ou loteamentos populares da periferia urbana.

Como exemplo do parcelamento do solo por meio de loteamentos na Região Administrativa Norte, destacam-se: Loteamento Parque Santa Catarina (doado em 1928);

Loteamento América (registrado em 1945); Loteamento Santarém Grande (registrado em 1950); Loteamento Parque Floresta (registrado em 1957); Loteamento de Humberto Pignataro e outros (registrado em 1964) e Loteamento Aldeia Velha (s.d.)26. Os tamanhos desses lotes

variavam entre 12m x 30m, 20m x 40m, 26m x 40m, 30m x 40m, 20m x 37m e 50m x 100m (SILVA, 2003). Como exemplo de lotes que foram destinados para a construção dos conjuntos habitacionais, têm-se o Loteamento Parque Santa Catarina, cujas terras foram parceladas pela COHAB-RN para a construção do Conjunto Habitacional Santa Catarina, no ano de 1978.

A primeira ponte construída sobre o estuário dos rios Potengi e Jundiaí facilitou a transição de pessoas e mercadorias; porém, não contribuiu para incorporar a Região Administrativa Norte de fato à cidade de Natal. Com isso, no final da década de 1960, iniciou- se a construção da segunda ponte rodoferroviária Presidente Costa e Silva27 (Imagem 7), sob o mandato do governador Walfredo Gurgel. Essa ponte teve suas obras concluídas no ano de 1970, contribuindo consubstancialmente para que a parte norte da cidade de Natal ganhasse expressão enquanto espaço residencial.

26 Sobre esses loteamentos, ver Silva (2003).

88 Com a implantação dessa segunda ponte, a Região Administrativa Norte de Natal passou a atrair o mercado imobiliário com amplas ofertas de terras a preços baixos, o que favorecia também a população de menor poder aquisitivo, conforme mostra Araújo (2004, p.41-42):

O início efetivo da formação do espaço da Zona Administrativa Norte se deu a partir do final da década de 1960, quando da implantação da Ponte Costa e Silva (RN- SECRETARIA DE ESTADO DO PLANEJAMENTO, 1977), a nova ponte rodo- ferroviária, a qual além de fazer a incorporação do espaço de Igapó ao contexto urbano de Natal, abriu perspectiva a um promissor mercado imobiliário. Esse mercado imobiliário se tornou atrativo pela vasta oferta de terras e pelo baixo preço do solo, visto que outras áreas da cidade já se apresentavam mais valorizadas, em função das benfeitorias implantadas e da importância que a cidade do Natal vinha adquirindo ao contexto regional.

Além disso, os incentivos do Estado por meio da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), com os investimentos no setor industrial em Natal, instalaram na Região Administrativa Norte da cidade o Parque Têxtil Integrado e o Distrito Industrial de Natal (DIN), com empresas de grande porte que objetivavam promover o desenvolvimento econômico urbano da cidade. A instalação do Parque Têxtil e do DIN

Imagem 7 – Ponte Rodoferroviária Presidente Costa e Silva, s.d.

89 atraiu um fluxo migratório da população que buscava empregos nas fábricas; logo, o cenário de espaço agrícola foi sendo substituído gradativamente pelo espaço residencial.

O contexto de espaço residencial surgiu quando articulado com esses incentivos. O Estado passou a atuar por meio das políticas habitacionais do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), com a construção dos conjuntos habitacionais pela COHAB-RN. Esse órgão construía residências para o mercado popular representado pela população com rendimento mensal de 1 a 5 salários mínimos. No entanto, enquanto o Estado investia na construção de habitações populares, uma marcha silenciosa dos “excluídos” do SFH comprava lotes irregulares ou simplesmente invadia-os, adensando-os para além do controle e planejamento municipal sem nenhum tipo de serviço básico (SILVA,2003). A falta de preocupação do poder público com essa população era ardilosa, conforme nos mostra Bonduki (1998, p. 288) ao afirmar que

A omissão do poder público na expansão dos loteamentos clandestinos fazia parte de uma estratégia de facilitar a construção da casa própria pelo próprio morador que, embora não tivesse sido planejada, foi se definindo na prática, como um modo de viabiliizar a solução habitacional compatível com a baixa remuneração dos trabalhadores e que, ainda, lhes desse a sensação, falsa ou verdadeira, de realizar o sonho de tornarem-se proprietários.

A ilegalidade tornou-se uma regra nas formas de acesso à moradia nas periferias do capitalismo, tendo em vista que o acesso formal à propriedade privada da terra e à moradia tornaram-se aquisições para poucos indivíduos. A elevada demanda por terras na Região Administrativa Norte fez com que, por meio da Lei n° 4.483, de 23 de setembro de 1975, terrenos do Estado fossem transferidos para a COHAB-RN com o objetivo de mais conjuntos serem construídos, assim como foram realizadas ainda desapropriações de imóveis rurais para a construção de unidades de habitação (SOUZA, 2008a).

Simultaneamente com os conjuntos habitacionais, os loteamentos legalizados e/ou clandestinos começaram a fazer parte do mercado imobiliário, pois a terra urbana e a habitação são objeto de interesse generalizado que podem envolver agentes sociais com ou sem capital, formal ou informalmente organizados (CORRÊA, 2017). No entanto, não é em qualquer localização que a invasão de terras urbanas é tolerada. Nas áreas valorizadas pelo mercado, a lei se aplica mantendo a estreita relação entre terra e poder (MARICATO, 2000).

Durante a década de 1970, os conjuntos habitacionais construídos pela COHAB-RN na Região Administrativa Norte, foram: Igapó (1977), Panorama I (1977), Potengi (1977), Panorama II (1978), Soledade I (1978) e Panatis I e II (1979) (MEDEIROS, 2007). Na Imagem 8, podemos perceber projetos de conjuntos habitacionais, no ano de 1979, assim

90 como as terras loteadas. É possível observar que os terrenos não tinham um formato definido, apresentando em sua maioria formas retangulares ou trapezoidais.

91

Imagem 8 – Lotes com formatos irregulares interpretados em fotografias aéreas de 1979

92 Na década de 1980, os seguintes conjuntos foram construídos: Soledade II (1982), Santa Catarina (1982), Santarém (1983), Gramoré (1983), Nova Natal (1983) e Pajuçara (1984). Os conjuntos Apern I, Igapó I, II, III e IV, Apern II, Cidade do Sol I e II, Morada Panatis I e II foram construídos nessa mesma década; porém, com financiamentos realizados pela Associação de Poupança e Empréstimo do Rio Grande do Norte (APERN), Associação de Classe, Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (IPE) e Banco do Estado do Rio Grande do Norte (BANDERN). Entre os anos de 1977 e 1984, houve um auge na construção desses conjuntos, via financiamento estatal (SILVA, 2003).

Na Imagem 9, é possível observar algumas casas pertencentes ao conjunto Santarém e, na Imagem 10, é possível apreciar a abertura de uma importante via de acesso na Região Administrativa Norte, a avenida Itapetinga, localizada também no conjunto Santarém, bairro Potengi. Foi ainda durante a década de 1980 que o Plano Diretor de Organização Físico-Territorial de Natal, criado a partir da Lei nº 3.175/1984, considerou a parte norte da cidade como Zona Especial de Expansão Urbana (DUARTE, 2011).

Imagem 9 – Vista do Conjunto Santarém no ano de 1983

93 Fonte: SEMURB, 2013.

A década de 1990 também foi marcada pela construção de conjuntos habitacionais; no entanto, em menor quantidade, tendo como agentes financiadores o INOOCOP, a CEF e pequenas construtoras. Os conjuntos habitacionais construídos foram: Além do Potengi (1990), Planície das Mangueiras (1990), Icapuí (1990), Vista Verde (1990), Vila Verde (1990), Parque dos Coqueiros (1990), João Paulo II (1991), Novo Horizonte (1991), Brasil Novo (1991), Parque das Dunas (1991) e Alvorada (1995) (SILVA, 2003).

Analisando o Mapa 11, é perceptível que a maioria dos conjuntos foi instalada na parte mais central do território da Região Administrativa Norte e nas proximidades da avenida Dr. João Medeiros Filho, principal via de acesso da localidade. Salientamos que, além dos trabalhadores do Distrito Industrial, esses conjuntos habitacionais beneficiaram ainda parte dos moradores de outras localidades da cidade de Natal que foram pressionados a migrar para as áreas periféricas (COSTA, 2017).

94 A exigência de um rendimento mínimo para a aquisição de uma casa dos conjuntos habitacionais excluía a população desprovida desse requisito e, nesse sentido, contribuía ainda mais para a criação de loteamentos regulares e irregulares, nos quais o preço da terra se tornava mais acessível. Essa população que adquiria os lotes utilizava a autoconstrução como forma de edificação das moradias. Essa autoconstrução é definida por Nascimento (2011, p. 218) como a “provisão de moradia em que a família, de posse de um lote urbano, obtido no mercado formal ou informal, decide e constrói por conta própria a sua casa, utilizando seus próprios recursos e, em vários casos, mão de obra familiar, de amigos ou ainda contratada”. Para a população de menor poder aquisitivo, essa forma de produzir moradias tornou-se uma prática constante para resolver a sua questão habitacional.

Nesse contexto, a cidade de Natal, além de ter na sua composição urbana diversos conjuntos habitacionais, possui 469 loteamentos, sendo 276 registrados e 193

Mapa 11 – Localização dos Conjuntos Habitacionais na Região Administrativa Norte