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3.5 CONFLITOS EM USINAS HIDRELÉTRICAS NO MUNDO

3.5.5 Barragens no Brasil

O desenvolvimento do programa para geração de energia hidrelétrica no Brasil foi iniciado em 1960 e levado a cabo durante as décadas de 1970 e 1980, durante o regime militar, que foi marcado por uma grave crise energética em nível mundial por causa da primeira grande crise do petróleo. Por esse motivo o Brasil buscou investir em fontes renováveis de energia, tendo a Eletrobrás desenvolvido um estudo aprofundado sobre o potencial hidrelétrico, análise dos rios e bacias hidrográficas, com a finalidade de realizar um mapeamento detalhado de onde poderiam ser construídas as usinas hidrelétricas (MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS, 2011).

Grandes empresas eletrointensivas (alumínio, ferro-liga, etc) estavam se instalando no país e exigiam condições de infraestrutura, em especial, energia elétrica. Por esse motivo, o Estado brasileiro, juntamente com o apoio do Banco Mundial, foram os grandes financiadores da construção das hidrelétricas (MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS, 2011).

Imediatamente iniciou-se a construção de grandes usinas em várias regiões onde havia maior potencial hidrelétrico de menor investimento do Brasil, como as regiões rurais ao longo das bacias do Rio São Francisco e do Rio Paraná. Não obstante houvesse os estudos sobre o potencial e como fazer o aproveitamento da energia, não havia uma proposta de indenização e realocação adequada das famílias que viviam na beira dos rios. Assim, este período foi marcado por um grande deslocamento humano no campo e em pequenas cidades próximas dos lagos criados atrás das barragens, quando milhares de pessoas foram obrigadas a deixar suas terras e impedidas de se organizarem para lutar por reassentamentos melhores. Conflitos sociais locais em torno da construção de barragens foram marcados pela luta de comunidades inteiras que buscavam justiça contra a expulsão compulsória de seus territórios de origem (MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS, 2011).

Com a finalidade de lutar pelos direitos da população afetada e menos favorecida, surgiu, no final dos anos 1970 e começo da década de 1980 (final da ditadura militar e início da democracia), o movimento social organizado contra a construção de barragens no Brasil. A abertura política facilitou a organização da população atingida pelas barragens, bem como a obtenção de informações e a construção de alianças com outros grupos que lutavam por justiça social (MC CULLY, 2001).

A primeira oposição efetiva a barragens, no Brasil, se iniciou no Sul do país, depois que a Eletrosul revelou, em 1977, que planejava construir 22 barragens no rio Uruguai. Foi quando grupos de pessoas atingidas se organizaram para iniciar a resistência contra as duas primeiras usinas que seriam construídas, Machadinho e Itá, formando, assim, a Comissão Regional de Atingidos por Barragens (CRAB). Com o sucesso do CRAB, que melhorou as medidas compensatórias dos atingidos por esses dois empreendimentos, houve uma diminuição do número de pessoas a serem reassentadas (MC CULLY, 2001).

Mais tarde, surgiria na Amazônia, a Comissão dos Atingidos por Barragens na Amazônia (CABA), formada por grupos de trabalhadores rurais e grupos indígenas que lutariam contra as barragens planejadas para o rio Xingu, bem como por compensações devido aos prejuízos causados pelas usinas hidrelétricas de Tucuruí e Balbina, as quais, além de desalojar pessoas, causaram inúmeros problemas em torno do novo revervatório, incluindo contaminação da água e o declíneo do número de peixes. Essas experiências levaram a CABA a tomar posição definitiva contra quaisquer novas barragens (MC CULLY, 2001).

Por sua vez, Sigaud (1988), ao estudar a implantação das usinas hidrelétricas de Sobradinho (1.050 MW) e Itaparica (2.500 MW), localizadas rio São Francisco; Itá (1.620 MW), na bacia do rio Uruguai; e Tucuruí, no rio Tocantins (8.370 MW), concluiu que as populações atingidas foram desprezadas e colocadas a parte no processo de tomada de decisão. Apesar de ter lutado por melhores compensações, a população prejudicada por esses grandes empreendimentos falhou em conseguir significativas concessões (MC CULLY, 2001). Segundo Sigaud (1988), a

demora em definir o destino da população a ser deslocada, que deveria ser o objeto prioritário da atenção do Estado, se por um lado revela a imprevidência das empresas do setor elétrico, por outro se constitui numa evidência de que o „social‟, corporificado nas populações atingidas, esteve fora de cogitação quando se decidiu construir as barragens, quando se firmou contratos e quando se deu início às obras.

A mesma autora ressalta que o social tem ocupado uma posição acessória no processo de tomada de decisões, sendo as soluções encontradas sempre desfavoráveis à população afetada. Assim, conclui que as empresas do setor elétrico têm sido responsáveis pelo deslocamento compulsório de milhares de brasileiros e, consequentemente, por seu empobrecimento e pela piora de suas condições de vida (SIGAUD, 1986 apud PINHEIRO, 2007).

Em 1989, foi realizado o Primeiro Encontro Nacional de Trabalhadores Atingidos por Barragens, que contou com a participação de representantes de várias regiões do País. Foi um momento onde se realizou um levantamento global das lutas e experiências dos atingidos em todo o território nacional. Foi então decidido constituir uma organização mais forte a nível

nacional para fazer frente aos planos de construção de grandes barragens, sendo estabelecido, em 1991, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) (MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS, 2011).

O MAB costuma adotar práticas de ação direta, por meio da ocupação de canteiros de obras de barragens e dos prédios das empresas empreendedoras. Essa estratégia, segundo Acselrad, Mello e Bezerra (2009), constitui uma forma de questionar os empreendimentos e de abrir um debate sobre a pertinência ou não de que eles sejam implementados em determinado território, nos quais a população impactada é pouco ou nada consultada.

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