• Nenhum resultado encontrado

3.4 CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS NA IMPLEMENTAÇÃO DE USINAS

3.4.1 Gestão de Conflitos

Com relação aos mecanismos de gestão de conflitos ambientais, Vivacqua (2005) destaca que existem dois tipos: os judiciais e os extra-judiciais. O primeiro tipo é aquele solucionado no Poder Judiciário, por meio da utilização de mecanismos legais que permitem a participação da sociedade na defesa do meio ambiente. No segundo são utilizadas técnicas de negociação, em que a resolução do conflito ocorre por meio de acordo entre as partes.

Para Bredariol (2001), o desenvolvimento de pessoas, grupos e sociedades, está diretamente relacionado à capacidade de criar e resolver os conflitos, que estão presentes em todas as relações humanas. Para isso, existem os métodos de resolução de conflitos que, segundo esse autor, se dividem em dois grupos: aqueles provenientes das teorias da comunicação dos grupos, definidos como comportamentais; e os métodos de estruturação de problemas, que utilizam as teorias de decisão.

Os métodos das teorias da comunicação dos grupos envolvem a participação de um mediador neutro para apoio à resolução do conflito. Esse método é utilizado no caso de existirem interesses contraditórios que dividem as partes e, por esse motivo, necessitam da intervenção de uma terceira parte, neutra, que ajude as partes a chegarem a um acordo (BREDARIOL, 2001).

Já os métodos que se apoiam nas teorias de decisão contribuem para a tomada de decisões através do desenvolvimento de modelos e analogias, do cálculo e da previsão de possíveis consequências para diferentes alternativas de ação e por experimentação e simulação que assistam à definição de caminhos para se alcançar um objetivo desejado (BREDARIOL, 2001).

Vivacqua (2005) salienta que a resolução dos conflitos mediante negociação e é muito mais vantajosa e econômica do que a resolução de conflitos na esfera judicial, que além de demorada, é dispendiosa. O autor cita ainda, a arbitragem, como ferramenta auxiliadora na resolução de conflitos fora da esfera judicial. Exemplo de arbitragem utilizada pelo governo é a constituição de comissões e grupos que atuam como árbitros na resolução de conflitos, como os Comitês de Bacia Hidrográfica, criados pela Lei nº 9433/97, que arbitram em primeira instância os conflitos relacionados aos recursos hídricos.

Costa (2003) também propõe a utilização dos métodos alternativos de resolução de conflitos, definidos como aqueles independentes do monopólio estatal, e cita três principais: (1) negociação: acordo encontrado pelas próprias partes; (2) mediação: negociação facilitada por um terceiro; e (3) arbitragem: substituição da vontade das partes por um terceiro. Os objetivos dos métodos alternativos de resolução de conflito são atender os interesses das duas partes envolvidas e pacificar o conflito de uma maneira mais eficiente, visando sempre o caráter educativo do processo preventivo de novos conflitos.

Dentre as formas de se abordarem os conflitos, Costa (2003) relata a autotutela (solucionados pela força), a autocomposição (solucionado pelas partes) e a heterocomposição (solucionados por um terceiro). Dentro dessa classificação, tem-se a heterocomposição estatal e a alternativa, podendo ser vinculante (protegido pela coercibilidade estatal) ou não. Dentro da classe vinculante ressalta-se a arbitragem. Já no lado da autocomposição, em que as partes não têm uma solução imposta, tem-se a mediação e a negociação (COSTA, 2003).

Costa (2003) cita a privacidade e a liberdade de decidir sem a intervenção de terceiros como principais vantagens da negociação. É também o método menos custoso e de maior controle sobre os resultados.

Já Acselrad, Mello e Bezerra (2009) criticam a resolução de conflitos baseada na negociação, afirmando que “o encaminhamento do conflito não se dá pela discussão sobre aquilo que é justo ou injusto, mas pela maior ou menor capacidade dos agentes de barganharem seus interesses, tidos como foro provado”. Nesse argumento eles acrescentam que quando o litígio envolve atores sociais com acentuada desigualdade de poder, a resolução negociada de conflitos pode operar como uma tecnologia de desmobilização social. Ponderam ainda que em certos casos a negociação não impede o agravamento dos conflitos, e o consenso estabelecido harmoniosamente, ao mesmo tempo em que reduz o nível de agressividade entre os atores, encobre os conflitos, que permanecem latentes.

Com relação à mediação, Costa (2003) destaca que suas principais características são o sigilo, a preservação das relações entre as partes, a informalidade, a flexibilidade do

processo e a valorização da autonomia da vontade e da boa-fé. Pode ser classificada de duas formas: mediação avaliadora ou conciliação, onde o mediador assume uma postura de análise e avaliação em busca de propostas razoáveis; e a mediação simplesmente compositora, em que o mediador apenas trabalha técnicas de comunicação, sem opinar ou propor soluções. O que define a utilização de um ou outro método é a natureza do conflito. Como a mediação não é um método vinculante, ou seja, a condução do processo depende somente da vontade das partes, a garantia do cumprimento do acordado é a elaboração de um contrato. Não obstante todas as vantagens presentes nos processos mediativos, estes apresentam a desvantagem de os participantes poderem utilizá-los como jogo tático de descoberta de informações para o ajuizamento de uma ação e serão infrutíferos se uma das partes não cooperar (COSTA, 2003). A arbitragem é mencionada como método impositivo, uma vez que se trata de um método decisório e vinculante, pois o judiciário garante sua coercibilidade2, sendo classificado como um procedimento muito rígido. É o único método dessa natureza admitido no Brasil e regulamentado pela Lei nº 9.307/96. As principais vantagens da arbitragem são sua rapidez procedimental e a eficácia de sua decisão. O árbitro é escolhido por sua especialização técnica, tendo, por isso, uma visão profunda do problema (COSTA, 2003).

Quanto aos métodos de resolução de conflitos adotados pelo setor elétrico, ressalta-se o código de águas (Decreto 24.643, de 10.07.1934) como o marco estruturante desse setor, tendo instituído as bases da fiscalização e da resolução de conflitos. O Decreto nº 2.335/973, por sua vez, que instituiu a ANEEL, dispõe sobre a resolução de conflitos no setor elétrico, tratando-se de uma previsão abrangente, da qual partem portarias e resoluções que a regulamentam, que resultam na aplicação do arbitramento, da mediação e da arbitragem (COSTA, 2003).

No arbitramento há um aperfeiçoamento do conteúdo contratual, sem haver conflito de interesses. A sistemática do arbitramento segue um processo público e condicionado à

2 As decisões tomadas com base na arbitragem são definitivas, sendo seu resultado imposto a ambas as partes. O

resultado não pode ser questionado e sua aplicação é obrigatória. O próprio poder judiciário trata de garantir sua execução. Por esse motivo diz-se tratar de um método vinculante, pois a decisão não é passível de ser alterada ou questionada.

3 Art. 18. A atuação da ANEEL para a finalidade prevista no inciso V do art. 3º da Lei nº 9.427, de 1996, será

exercida direta ou indiretamente, de forma a:

I - dirimir as divergências entre concessionários, permissionários, autorizados, produtores independentes e autoprodutores, bem como entre esses agentes e os consumidores, inclusive ouvindo diretamente as partes envolvidas;

II - resolver os conflitos decorrentes da ação reguladora e fiscalizadora no âmbito dos serviços de energia elétrica, nos termos da legislação em vigor;

III - prevenir a ocorrência de divergências;

IV - proferir a decisão final, com força determinativa, em caso de não entendimento entre as partes envolvidas;

comprovação, por parte dos agentes envolvidos, de que não chegaram a um acordo entre si. Entretanto, Costa (2003) ressalta que o arbitramento adotado pelas Agências Reguladoras não passa de um processo administrativo, uma vez que é utilizado por um Órgão da Administração que atua impondo uma decisão sobre o administrado, bastando o surgimento desses atos para que sua prestação torne-se exigível. Em se tratando de contratos administrativos de longo prazo, a arbitragem é uma garantia necessária para que o contrato possa sobreviver às várias transformações na economia. Nesse sentido, o artigo 23 da Lei nº 8.987/95 explicita a necessidade de se estabelecer no contrato administrativo cláusula que defina foro e modo amigável de solução de divergências entre as partes (COSTA, 2003).

A mediação na ANEEL é atribuição da Superintendência de Mediação Administrativa Setorial, resumindo-se a uma audiência, na qual se tenta a composição amigável, seguida de uma imposição de conduta pela própria ANEEL caso não se chegue a um acordo (COSTA, 2003). A mediação adotada pela ANEEL não pode ser considerada uma mediação pura, uma vez que as partes sabem que terão uma decisão, seja tomada por elas mesmas ou pelo mediador, caso a autocomposição seja frustrada. Contudo, essa postura da Agência não é considerada ruim, pois é uma opção diante da desigualdade entre as partes (quando há o consumidor de um lado e a concessionária de outro, por exemplo). Ademais, considera-se válida a posição adotada pelas Agências Reguladoras, visto que o contexto brasileiro é diferente do contexto estrangeiro, de onde os métodos alternativos de resolução de conflitos são originários. Assim, por mais que esses métodos tenham sido importados, eles devem ser ajustados à realidade nacional, para que seus efeitos sejam proveitosos (COSTA, 2003).

No presente estudo, serão utilizados os métodos de resolução alternativa de conflitos definidos por Costa (2003) para comparar os três estudos de caso. Assim, será verificado se os métodos de negociação, mediação e/ou arbitragem foram adotados em cada um dos casos e como facilitaram e/ou influenciaram a gestão dos conflitos.

Documentos relacionados