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SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

BENEFICIÁRIOS

MODELO  DE   ATENÇÃO  À  SAÚDE

vEstratégia    de   Saúde  da  Família  

(ESF)

(Modelo  de  atenção   às  condições  crônicas  -­‐

MACC)

Fonte: a autora.

Olhando o modelo conceitual a partir dos conceitos mais distais ao objeto, observa-se que o SUS, através de seus princípios ordenadores, configura um determinado modelo de atenção à saúde, traduzido nas diretrizes da Estratégia de Saúde da Família e, mais recentemente, renovado pela proposta de um modelo de atenção às condições crônicas. Ao mesmo tempo, ao englobar o subsistema de saúde suplementar, caracteriza-se como um sistema duplicado, onde os arranjos entre o mercado da saúde e o Estado constituem o mix público- privado do sistema.

A ANS, como Agência Reguladora vinculada ao Ministério da Saúde, além de estabelecer a regulamentação através de normas e

resoluções, busca formular políticas indutoras com base no modelo de atenção à saúde idealizado no SUS, em uma tentativa de aproximá-lo do subsistema de saúde suplementar, configurando a macrorregulação do setor. Por outro lado, ocorre também o processo de microrregulação, que se estabelece na interface das relações entre operadoras, prestadores e beneficiários. Estes dois processos acabam por determinar o modelo de atenção à saúde na saúde suplementar, e como consequência, seu modelo de atenção em saúde bucal, nas suas dimensões política, organizativa e assistencial.

A seguir, faz-se uma apresentação de cada um dos conceitos elencados no marco conceitual deste trabalho, para uma melhor compreensão do próprio objeto da pesquisa.

4.1 O MODELO DE ATENÇÃO À SAÚDE NO SUS

Desde a sua criação em 1988, e até mesmo antes, por conta do movimento pela reforma sanitária brasileira, o SUS vem sendo construído através da implementação de políticas, normas e estratégias que se refletem principalmente na organização dos serviços e das práticas de saúde. Sua trajetória tem sido marcada pela redefinição de ideias oriundas de movimentos internacionais de reforma dos sistemas de saúde (TEIXEIRA, 2006).

Nos primeiros anos de implantação do SUS, prevaleceram ações na esfera político-jurídica e administrativa com integração e fusão de instituições, além da viabilização de estruturas físicas e recursos humanos, associados à tentativa de manter e difundir os novos princípios da política de saúde. Preocupações com mudanças no modelo assistencial permaneceram restritas, embora um conjunto de críticas e pesquisas já apontasse os perigos que a falta de transformações no quotidiano assistencial da população poderia trazer para a legitimidade da Reforma Sanitária (CORDEIRO et al., 2010).

As propostas para uma reorientação do modelo de atenção à saúde no SUS emergem principalmente na década de 90, como foi anteriormente discutido no marco contextual. Surgem as ideias de um “modelo tecnoassistencial em defesa da vida” e das “ações programáticas em saúde”, as concepções da “vigilância da saúde”, o movimento das “cidades saudáveis”, organizado com base no conceito de “promoção da saúde” e como marco deste processo, o surgimento do Programa de Saúde da Família (PSF).

O PSF surge em um cenário onde a implementação do SUS acaba por transferir a responsabilidade pela atenção primária à saúde aos gestores municipais, sendo que hoje estes são os principais atores no que se refere à mudança do modelo de atenção à saúde (TEIXEIRA, 2006). A existência de um vazio programático para a questão assistencial parece explicar a emergência do programa, sendo possível, também, que oferecer um incentivo financeiro para contratação de equipes se configurasse como um mecanismo operacionalmente viável para estimular o reordenamento das práticas em nível municipal (CORDEIRO et al., 2010).

O programa tem se tornado, nos últimos anos, a principal ferramenta para a reorganização dos serviços de saúde na atenção básica. Tem como estratégia a reformulação do processo de trabalho no SUS e centrado na vigilância à saúde por meio de ações individuais e coletivas, situadas no primeiro nível de atenção e voltadas para a promoção, prevenção e recuperação dos agravos à saúde. Também se baseia na nova concepção sobre o processo saúde-doença, com atenção voltada para a família e com ações organizadas em um território definido (SOUZA et al., 2001; SOUZA; RONCALLI, 2007).

Desta forma, o modelo de atenção à saúde no SUS se configura atualmente com base nas diretrizes do PSF, hoje denominado Estratégia de Saúde da Família (ESF) e pode ser considerado inovador, ainda que tenha recebido influências externas importantes, das quais diferiu, sobretudo, por não instituir-se como uma proposta exclusiva de medicina familiar e, sim, como uma política pública voltada para a saúde da família. A ESF se distanciou de forma singular dos modelos de medicina familiar prevalecentes no mundo desenvolvido que, em geral, se articulam em torno do papel protagonista dos médicos generalistas ou de família e valorizam a liberdade de escolha dos médicos pelos usuários, independentemente de adscrição geográfica, com o objetivo de obter ganhos de competitividade. Pelo contrário, a estratégia optou por um modelo de base populacional e territorial que se articula em função de mecanismos de cooperação e não de competição (MENDES, 2012).

Essa opção estratégica convoca, necessariamente, a territorialização dos espaços de atuação e a ação intersetorial, de modo a cumprir com os objetivos do SUS inscritos na legislação e a atuar sobre os determinantes sociais da saúde em seus distintos níveis por meio de ações integradas de promoção da saúde e de prevenção, cuidado, cura, reabilitação e paliação das condições de saúde. Outro grande diferencial da ESF é ter incorporado, desde seu início, o trabalho multiprofissional

realizado em equipe e a figura do agente comunitário de saúde (ACS), criando possibilidades de um relacionamento mais próximo entre a equipe de saúde, as pessoas usuárias e suas famílias, e as organizações e movimentos sociais do território (MENDES, 2012).

As evidências produzidas por diversos estudos avaliativos em diferentes regiões do Brasil indicam, de forma clara, que os resultados da ESF são muito positivos, mesmo assistindo, em geral, a uma população de maior vulnerabilidade social. Isso ocorre porque há uma maior organização a partir das ações desenvolvidas pela ESF, com impacto significativo tanto nos níveis de saúde da população como em outros determinantes sociais, tais como educação e emprego (MENDES, 2012).

A estratégia também propiciou mudanças no processo de trabalho com atividades inovadoras nas Unidades Básicas de Saúde com ESF em comparação às tradicionais, sendo a mudança do perfil das práticas mais evidente em municípios de pequeno porte. No entanto, persistem importantes problemas no acesso, principalmente para serviços especializados e exames complementares, na obtenção e na manutenção de recursos humanos adequados, na gestão e na implantação em grandes municípios e regiões metropolitanas (CONILL, 2008).

A partir desta contextualização passamos a trabalhar o referencial de Mendes (2010; 2011; 2012) para apresentar as atuais propostas de modelo de atenção à saúde no SUS, que passam pelo fortalecimento da ESF através da incorporação do Modelo de Atenção às Condições Crônicas (MACC).

4.1.1 A consolidação da Estratégia de Saúde da Família (ESF) Uma vez que os sistemas de atenção à saúde são respostas sociais às necessidades de saúde dos cidadãos, estes deveriam operar em total coerência com a real situação de saúde das pessoas. No Brasil, esta realidade é marcada hoje por uma transição demográfica acelerada, aliada a uma tripla carga de doenças: uma agenda não superada de doenças infecciosas, uma carga importante de causas externas e uma presença hegemônica de condições crônicas. Essa situação não poderá ser respondida adequadamente por um sistema de atenção à saúde fragmentado, reativo, episódico e voltado, prioritariamente, para o enfrentamento das condições agudas e das agudizações das condições crônicas. Há que se estabelecer a coerência entre a situação de saúde e o SUS, através da implantação das Redes de Atenção à Saúde (RAS), uma

nova forma de organizar o sistema de atenção à saúde em sistemas integrados que permitam responder, com efetividade, eficiência, segurança, qualidade e equidade, às condições de saúde da população (MENDES, 2011).

Sendo assim, as RAS são organizações de conjuntos de serviços de saúde, vinculados entre si por uma missão única, por objetivos comuns e por uma ação cooperativa e interdependente, que permitem ofertar uma atenção contínua e integral a determinada população, com responsabilidade sanitária e econômica. Seus principais objetivos são melhorar a qualidade da atenção, a qualidade de vida das pessoas usuárias, os resultados sanitários do sistema de atenção à saúde, a eficiência na utilização dos recursos e a equidade em saúde (MENDES, 2012).

A implantação das RAS convoca mudanças radicais no modelo de atenção à saúde praticado no SUS e aponta para a necessidade da implantação de novos modelos de atenção às condições agudas e crônicas, alguns experenciados com sucesso em outros países e que devem e podem ser adaptados à realidade de nosso sistema público (MENDES, 2011).

No Brasil, a concepção das RAS vem sendo discutida há algum tempo, tendo sido incorporada oficialmente ao SUS pela Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010, que estabelece diretrizes para a organização das redes de atenção à saúde no âmbito do SUS, e pelo Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011, que regulamenta a Lei nº 8.080/90. Na Portaria Ministerial, a RAS é definida "como arranjos organizativos de ações e serviços de saúde, de diferentes densidades tecnológicas, que, integradas por meio de sistemas de apoio técnico, logístico e de gestão, buscam garantir a integralidade do cuidado". No Decreto Presidencial explicita-se que “a integralidade da assistência à saúde se inicia e se completa na Rede de Atenção à Saúde” (BRASIL, 2011b; MENDES, 2012).

Nas RAS o sistema organiza-se sob a forma de uma rede horizontal de atenção à saúde, não havendo uma hierarquia entre os diferentes pontos de atenção à saúde. Rompem-se as relações verticalizadas onde o sistema é formatado segundo as densidades relativas de cada nível de atenção (básica, média e alta complexidades), para, respeitando as diferenças nas densidades tecnológicas, constituírem-se redes policêntricas horizontais em que o centro de comunicação situa-se na Atenção Primária à Saúde (APS).

O quadro abaixo, adaptado de Mendes (2011), aponta algumas diferenças entre um sistema fragmentado e as redes de atenção à saúde, e serve de subsídio para a contextualização das propostas atuais de modelos de atenção à saúde voltados para condições crônicas.

Quadro 3. Diferenças entre o sistema fragmentado e as redes de atenção à saúde.