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CONFORMAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO O Brasil, que conta atualmente com uma população de

SUMÁRIO

3.2 CONFORMAÇÃO DO SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO O Brasil, que conta atualmente com uma população de

aproximadamente 190 milhões de habitantes (BRASIL, 2011), até meados do século XX não possuía um sistema de saúde definido constitucionalmente. Pacientes ricos eram tratados em instituições privadas, pagando diretamente suas despesas; trabalhadores tinham acesso a clínicas e hospitais dos sindicatos. Nas áreas urbanas, os pobres precisavam procurar ajuda nas superlotadas instituições filantrópicas ou públicas que aceitavam indivíduos em estado de indigência. Nas áreas rurais, camponeses tinham de confiar em curandeiros ou cuidadores leigos para suas necessidades de saúde (ALMEIDA-FILHO, 2011).

No auge da redemocratização do país, a Constituição de 1988 declara a saúde como um direito do cidadão e um dever do Estado. Ao mesmo tempo, em seu artigo 199, estabelece que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada e dedica seus parágrafos à regulação das relações entre o público e o privado no sistema de saúde, especialmente no que diz respeito ao caráter complementar das instituições privadas, que devem seguir as diretrizes do SUS, através de contratos de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e sem fins lucrativos. Desta forma, teve início o processo de construção do Sistema Único de Saúde (SUS), objetivando alcançar os princípios de universalidade, integralidade da assistência, da promoção da saúde e da participação da comunidade, com fundos públicos para a prestação de cuidados de saúde gratuitos para os cidadãos brasileiros (BAHIA, 2009; ALMEIDA-FILHO, 2011).

Assim, o sistema de saúde brasileiro passa a ter um modelo de contrato público, caracterizado pela universalização do acesso às ações e

serviços de saúde, com alocação de recursos a uma pluralidade de prestadores. Isso ocorreu, inicialmente, pela transferência do Instituto de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) para o Ministério da Saúde, responsável naquele momento apenas pelas ações clássicas de saúde pública (CONILL, 2008).

Segue-se a este processo uma política de descentralização e construção de sistemas municipais de saúde, os quais têm sido reorientados pela Estratégia de Saúde da Família (ESF), criada em 1994 e regulamentada como eixo estruturante das ações e serviços de saúde na atenção básica a partir de 1998, quando entrou em vigor a Norma Operacional Básica (NOB)/96. Sendo assim, o SUS tem duas linhas principais de atuação: a Atenção Primária a Saúde (APS), na qual a ESF potencializa os cuidados primários de saúde, com mais de 34 mil equipes em 5.327 municípios; e uma rede de clínicas e hospitais públicos ou contratados pelo SUS, que presta atendimento secundário e terciário em todo o país (CONILL, 2008; ALMEIDA-FILHO, 2011, DAB/SAS/MS, 2014).

No entanto, a ampliação da cobertura para toda a população não foi acompanhada por investimentos compatíveis, caracterizando a reforma do sistema de saúde brasileiro como uma reforma universal, mas com inclusão segmentada. Uma vez que as ações e serviços de saúde são livres à iniciativa privada, os trabalhadores dos setores mais dinâmicos da economia e a população dos estratos de renda mais altos acabam contratando as empresas de seguro privado (os planos de saúde) para obter maior facilidade de acesso, contribuindo para o elevado crescimento deste setor (CONILL, 2008).

Desta forma, surgem algumas designações para caracterizar o sistema de saúde brasileiro, sendo que Mendes (2001) o traduz como um sistema segmentado, composto por três subsistemas: o Subsistema Único de Saúde – SUS (sistema público), o Subsistema de Atenção Médica Supletiva – SAMS e o Subsistema de Desembolso Direto – SDD (sistemas privados).

Paim et al. (2011) colocam que o sistema de saúde brasileiro é formado por uma rede complexa de prestadores e compradores de serviços que competem entre si, gerando uma combinação público- privada, financiada sobretudo por recursos privados, que acaba por dividir o sistema de saúde em três subsetores: o subsetor público, no qual os serviços são financiados e providos pelo Estado nos níveis federal, estadual e municipal, incluindo os serviços de saúde militares; o

subsetor privado (com fins lucrativos ou não), no qual os serviços são financiados de diversas maneiras com recursos públicos ou privados; e, por último, o subsetor de saúde suplementar, com diferentes tipos de planos privados de saúde e de apólices de seguro, além de subsídios fiscais. Diz ainda que os componentes público e privado do sistema são distintos, mas estão interconectados, pois as pessoas podem utilizar os serviços de todos os três subsetores, dependendo da facilidade de acesso ou de sua capacidade de pagamento (PAIM et al., 2011).

Em uma publicação organizada pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) sobre a saúde suplementar está colocado que o sistema de saúde brasileiro é composto por dois subsistemas: o público, que é o SUS e o privado, constituído por dois subsetores: o da saúde suplementar, que é o predominante nesse subsistema, composto pelos serviços financiados pelos planos e seguros de saúde, e o liberal clássico, composto pelos serviços particulares autônomos (BRASIL, 2011a).

Ao analisar o gasto público com saúde no Brasil, percebe-se que os valores ficam próximos aos dos Estados Unidos, cujo sistema de saúde é eminentemente privado (Quadro 1), ficando na faixa de 45,7% do total da despesa, sendo que a proporção do PIB investido é de 8,9%. Uma possível explicação para esse fato reside na concentração de renda no Brasil, assim como no alto grau de incorporação tecnológica na saúde que é disponibilizada, principalmente, pelo setor privado (BRASIL, 2011a; PAIM et al., 2011, OECD, 2013).

Prova de que o Brasil conta com uma alta proporção de gasto privado com saúde, em particular com saúde suplementar, é a proporção da renda familiar utilizada com saúde. A pesquisa da PNAD 2008/2009 comprova que 82,5% das famílias brasileiras com rendimento acima de cinco salários mínimos possuem planos de saúde. As pessoas com até um salário mínimo de renda representam 3,4%, enquanto os que têm renda superior a 20 salários mínimos representam 79,6% (BRASIL, 2010).

Grande parte desta despesa também é gasta com saúde bucal. Embora um direito constitucionalmente garantido através do SUS, o acesso à assistência odontológica ainda ocorre predominantemente no setor privado, e ainda que não exista um sistema de informações único para estimar o gasto com saúde bucal no país, estima-se que o mesmo tenha alcançado 4 bilhões de dólares em 2010 (cerca de 9 bilhões de reais). Se considerarmos as transferências do Fundo Nacional de Saúde aos municípios como gasto público, os valores ficam em torno de 10,4%

do total, sendo o restante financiado através dos planos privados de saúde (25,7%) e desembolso direto (63,9%) (IBGE, 2010; ANS, 2013a; DAB/SAS/MS 2014).

Cerca de 40% dos brasileiros relata ter consultado um dentista nos últimos doze meses (PERES K.G. et al, 2012). Quanto ao número de profissionais, o Brasil conta com uma das maiores proporções dentista/população do mundo, chegando atualmente a 1,14/1000. São mais de 250 mil dentistas registrados, com cerca de 27% atuando no sistema público e o restante na prática privada (BRASIL, 2011; CFO, 2014).

Com base na literatura consultada, o quadro apresentado a seguir sintetiza as principais características dos sistemas de saúde analisados no capítulo anterior, comparados com o sistema de saúde brasileiro.

Quadro 1. Revisão comparativa sobre alguns sistemas de saúde no mundo e o sistema brasileiro. Países N o de habitantes (milhões) Principal característica do sistema de saúde PIB gasto com saúde (%) Gasto público com saúde (%) Assistência odontológica Gasto público com saúde bucal (%) Estados Unidos 300 Sistema plural, com predomínio privado 17,7 47,8 Privada (seguros e desembolso direto) 9,3

Canadá 34 base universal Sistema de