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A biblioteca como um espaço de interação para ler, contar e explorar

No documento 2019DeboraGasparFalkembackOliboni (páginas 109-115)

NÚMERO DE LIVROS LIDOS EM

3.4. A biblioteca como um espaço de interação para ler, contar e explorar

Dando continuidade à análise dos questionários, em referência a questão 50 (como é desenvolvido o trabalho na biblioteca com a literatura infantil?), todas as professoras pesquisadas confirmaram que utilizam o espaço semanalmente, cada uma possui um horário fixo. Apesar de ser um lugar pequeno, é muito aconchegante. Os livros estão colocados em pequenas prateleiras ao alcance das crianças para que sejam manuseados de acordo com a intervenção do professor.

Em relação ao acervo literário, nota-se que algumas obras apresentam-se com rasuras, amassados e falta de páginas, porém, grande parte encontra-se em bom estado de conservação. A maioria das obras foram conseguidas pela prefeitura e pela escola. Alguns foram doados.

Um fato negativo foi verificado: os livros literários utilizados durante as experiências com a leitura não ficam na biblioteca, os professores retiram da sala da orientadora pedagógica, trabalham na sala e depois devolvem para serem guardados em caixas, em local restrito ao uso dos professores. Nesse sentido, ao referir-se ao acervo literário de qualidade, é necessário mudar a concepção de que o mais simples é o mais indicado às crianças, como está explícito na fala da professora Brinco de Princesa sobre uma das propostas que desenvolve com a literatura: “Ler um livro infantil, com história pequena2 para melhor entendimento. No início foi muito difícil, pois o interesse era muito pouco das crianças, só gostavam de imagens, mas aos poucos está melhorando, tudo é um processo”.

As estudiosas da literatura infantil Cyntia Girotto e Renata Junqueira (2014, p. 99) advertem, de forma crítica, sobre essa forma de pensamento:

No entanto, se preferencialmente a escolha ainda é pelo ‘mais simples, porque as crianças ainda não leem’, ‘mais colorido’ ‘com imagens mais bonitas, porque estereotipadas a representar uma realidade’, os educadores estão longe de compreender a constituição do leitor mirim e a materialidade dos livros a traduzir a riqueza dos recursos linguísticos e estéticos da literatura infantil.

O tamanho da história não interfere na qualidade que a narrativa apresenta. Cabe ao professor realizar adaptações e oportunizar que a criança tenha contato com diferentes tipos de textos, sensibilizando-a de modo a ter interesse e construir sua hipótese sobre a obra, dialogando com o autor por intermédio de seu professor. Por isso, ao escolher os livros a serem apresentado

2 Concepção equivocada da professora, nem todas as histórias curtas são de qualidade e de compreensão da

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às crianças, deve-se preferir “aqueles que trazem em seu bojo muita graça, mistério fruição, gerando expectativas no leitor” (BURLAMAQUE; MARTINS; ARAÚJO, 2011, p. 77).

Para isso, torna-se fundamental que os livros sejam disponibilizados às crianças sem medos, sem entraves, que as visitas à biblioteca ocorram com frequência, e que o mediador, apoiando-se em sua formação, consiga promover nas crianças uma educação literária que, além de conhecer e vivenciar o que está nos livros, também ensine os cuidados necessários com esse material. Sobre o acervo literário guardado e de uso restrito aos professores, as autoras vão além e questionam:

[...] se o acervo não é colocado à disposição de educadores e crianças, tranfiado em depósitos de limpeza, e/ou perdido e empoeirado no alto das prateleiras e na escuridão das bibliotecas, temos que investigar tal situação na direção de desvelar o porquê e para quê promover a aproximação dos livros já desde muito cedo na vida dos pequenininhos (GIROTTO; JUNQUEIRA, 2014, p. 99).

Nas observações realizadas, quatro professoras realizaram, a partir de duas práticas, uma experiência com a leitura na biblioteca, com atividades diferenciadas. Inicialmente com os alunos dispostos no tapete, a mediadora contava a história de frente para as crianças e depois pedia que levantassem e fossem até as prateleiras para que escolhessem seus livros e compartilhassem as histórias com os colegas, essa experiência aconteceu no Pré I. A atividade se deu de forma individual, em duplas e em grupos.

Outra prática observada também no Pré I, na biblioteca foi com a história do sanduíche da dona Maricota, em que a professora, sem o uso do livro literário, apenas com a fotocópia da história, contou a narrativa com os palitoches e, após o término, voltaram para a sala e montaram o sanduíche da Maricota na parede da sala para, em seguida, registrar a história em forma de desenhos, como mostram as Figuras 23 e 24.

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Figura 23 e 24: Fonte: Arquivo pessoal, Julho/2018 – OBSERVAÇÕES

Apresentar o livro literário para a criança e permitir seu manuseio, deixando olhar página por página, possibilitar seu contato com personagens dentro de um tempo e espaço com pensamento imaginário é essencial para que se desenvolva o gosto pela literatura. A criança necessita ver, tocar e experimentar o material em sua concretude. É preciso que esse material seja atrativo, colorido, possua formato, imagens e vocabulário adequados à sua faixa etária, pois a ausência do livro, como observou-se em duas práticas leitoras, pode comprometer a recepção do texto literário. A Figura 25 mostra o texto literário sem a presença do livro.

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Figura 25. Fonte: Arquivo pessoal, Junho/2018 – OBSERVAÇÕES

Nessa experiência com a leitura, o objetivo da professora era trabalhar as formas geométricas e conseguiu com que as crianças ouvissem e aprendessem as formas somente com a leitura feita por ela e os jogos proporcionados posteriormente. A professora, embora sem o livro em mãos, apresentou domínio da narrativa, leu para as crianças a história: Um bebê em

forma de gente, escrita por Ziraldo. De forma dinâmica, a docente expos a leitura às crianças

(por sinal, muito atentos) e depois permitiu que cada uma explorasse as figuras, sem pressa, de modo que assimilassem o formato e o nome.

É importante destacar que durante a fase infantil as crianças continuem tendo experiências concretas com o livro, toque, manuseie, sinta-o e busque-o em diferentes espaços, pois como afirma Hunt (2010, p. 135, grifos do autor):

As crianças são leitores em desenvolvimento; sua abordagem da vida e do texto brota de um conjunto de padrões culturais diferentes dos padrões dos leitores adultos, um conjunto que pode estar em oposição à oralidade, ou talvez baseado nela. Então, as crianças realmente “possuem” os textos, no sentido de que os significados que produzem são seus privados, talvez até mais do que os adultos.

A experiência que a criança tem com leitura, seja ela convencional ou não, aquela em que ela constrói sentidos para o que toca, vê e escuta, é única e particular. Na Educação Infantil,

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o livro brinquedo incentiva o gosto pelo literário, pois leva a criança a querer brincar, interagir, fazendo-a fomentar seu imaginário e ações lúdicas. Esses momentos, sejam em casa, na sala de aula ou na biblioteca, são importantes para que, aos poucos, a identidade leitora dos pequenos seja fortalecida. “Se a educação à cultura do livro necessita a apresentação integral da obra literária, torna-se imprescindível, quando o livro está presente, saber aproveitá-lo” (BAJARD, 2014, p.38).

Sobre o trabalho com a literatura na biblioteca, as respostas foram variadas. Algumas educadoras não colocaram as propostas na íntegra, somente comentaram que frequentam toda a semana. Quatro professoras destacaram a contação de histórias realizada por elas e pelas crianças, como exposto nos fragmentos de Jasmim, Tulipa e Violeta, respectivamente: “Para manuseio livre pelos alunos e também para momentos de contação”, “Semanalmente é feita a contação de histórias na biblioteca e os alunos também utilizam o espaço para’ler’ livros de sua preferência”, “Utilizamos para a leitura e contação de histórias. Esses momentos são bastante interativos, eles trocam bastante os livros, exploram, mostram para os colegas e pedem para o professor ler algumas obras”.

A professora Rosa respondeu: “Ainda estamos desenvolvendo certas habilidades, pois alguns alunos estão na fase de querer “pegar” o mesmo livro que o colega e acabam rasgando. Estamos na fase de “conscientização”, momentos de aprendizado”. Nota-se em sua fala uma concepção equivocada de leitura, pois é nessa fase que a criança precisa manusear e interagir com o livro, independentemente dos conflitos que possam surgir.

Porém, a educadora Brinco de Princesa expõe que “Depende do interesse das crianças, existem momentos prazerosos, alegres e participativos. Às vezes é de muito agito e falta de concentração”. Os pequenos estão construindo atitudes positivas com o livro, tudo é um processo laborioso que exige, deles, amadurecimento, e do professor, empenho e insistência. Ao encontro dessa afirmação, Margarida acrescenta: “Procuro conscientizá-los sobre os cuidados com os livros, mas sempre possibilitando o manuseio conforme sintam vontade e conforto, fazendo-os perceber a postura de cuidado e carinho que estamos construindo”. “Sentados no colchonete, almofadas, tapete, em forma de rodinhas para ouvir, após contam ou escolhem o livrinho e sentam ler ou deitam. Eles adoram este espaço” (Professora Amor- Perfeito).

Sobre esse espaço apropriado para as experiências com a leitura, Petit (2013, p. 69) afirma:

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[...] o que a biblioteca e a leitura oferecem é precisamente isto: um espaço real e metafórico onde a pessoa se sente suficientemente protegida para poder ir e vir livremente, sem perigo, para abandonar à fantasia e ter a mente em outro lugar. A biblioteca oferece um espaço e propõe objetos, objetos culturais, de que podemos nos apropriar, que podemos provar.

Diante dos registros apresentados sobre a importância da biblioteca como espaço de leitura, exploração e construção de leitores, alguns questionamentos precisam serem feitos: se todas as professoras realizam atividades de incentivo à leitura na biblioteca, explicando os cuidados que as crianças devem ter com os livros, momentos de leituras compartilhadas, contação de histórias e manuseio de livros, porque o acervo literário novo adquirido pela escola está guardado em outro espaço e somente os professores podem utilizá-lo? Por que a sala de aula foi o espaço preferido pelas professoras para o desenvolvimento das experiências com a leitura?

Uma professora, ao querer realizar a prática leitora na biblioteca, foi impedida pela equipe pedagógica, pois o espaço estava sendo usado para outro objetivo: assistir o jogo do Brasil da Copa do Mundo de 2018. Desse modo, ela teve de deslocar-se com as crianças para a sala de vídeo, local reservado para filmes, em que há uma prateleira com alguns livros.

Diante dos fatos mencionados, é necessário um novo olhar da escola como um todo sobre a importância da literatura na formação dos pequenos leitores. Novas reflexões acerca do assunto fazem-se necessárias, pois algumas respostas dadas pelas professoras não condizem com a prática observada na sala de aula sobre a leitura. São necessárias novas maneiras de trabalhar com a literatura infantil que deem à criança oportunidades de explorar e vivenciar mais a literatura infantil e o espaço da biblioteca, sem receios.

São necessários novos conhecimentos e compreensão sobre o processo de desenvolvimento das crianças, abrangendo-se o conceito de literatura e formação leitora. Alguns professores devem investir mais em sua formação pedagógica, e também literária, conhecendo e aprendendo novas formas de apreciação do texto a fim de melhorar a sua prática, principalmente no que tange ao trabalho com a literatura para os pequenininhos e pequenos.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS: A FORMAÇÃO LEITORA DA CRIANÇA

No documento 2019DeboraGasparFalkembackOliboni (páginas 109-115)