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2.4 SITUAÇÃO ENERGÉTICA E INTERFACE COM RSU NO BRASIL

2.4.5 Biogás e biometano no Brasil

No Brasil, a captação de biogás basicamente iniciou com a disseminação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) ou, como é mais conhecido, “Créditos de Carbono”, previstos na Convenção Quadro das Mudanças Climáticas das Nações Unidas (UNFCCC), e postos e implantados pelo Protocolo de Quioto.

De acordo com esse mecanismo, os países que tinham limitação de emissões segundo o Protocolo de Quioto, poderiam “comprar” a redução de emissões em países não obrigados à redução (em desenvolvimento). Como o metano causa mais de 20 vezes mais danos ao clima do que o dióxido de carbono, a simples queima dele, antes de ser emitido para atmosfera, era passível de receber esses créditos. O esforço então se concentrou na captação do metano para a sua queima. Poucos projetos (os maiores) aproveitavam o gás para gerar energia. Dentre os casos de sucesso, a maior parte foi para gerar energia elétrica.

Em julho de 2016, de acordo com o Banco de Geração Elétrica (BIG) da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), havia 28 plantas de biogás que reuniam uma potência de 121 MW. A maior parte das plantas de biogás é de aterros. A primeira delas, inaugurada em 2003, inicialmente tinha 20MW de capacidade, mas atualmente tem uma capacidade de 4,6MW. A geração de biogás para eletricidade pode ser conferida no Quadro 1:

Quadro 1 – Plantas de biogás no país

Fonte: Aneel (2016).

Além das plantas listadas no Quadro 1, há o aterro de Gramacho que, por mais de três décadas, foi o maior “lixão” da América Latina, até fechar em 2012. A área foi coberta e instalada uma planta de recuperação, tratamento e purificação de biogás. A planta deve operar por 17 anos e evitar a emissão equivalente de 6 milhões de toneladas de CO2. A produção dali é usada na refinaria Reduc da Petrobras, aproximadamente 49 mil m³/dia de biometano, que representa 2.5% do total de consumo de gás natural da refinaria (PETROBRAS, 2014). Uma vez que este biometano não é convertido em eletricidade, o projeto não é listado pela Aneel.

Em julho de 2016, começou a operar a maior planta termelétrica a partir do biogás do Brasil. Localizada na cidade de Caieiras, nos arredores da cidade de São Paulo, a Termoverde tem uma potência de 29,5MW e uma produção de 250 mil MWh ao ano, suficiente para atender uma cidade de cerca de 300 mil habitantes (SECRETARIA DE ENERGIA E MINERAÇÃO, 2016).

Em 2018, foi anunciado o primeiro digestor anaeróbico para resíduos de estação de tratamento de esgotos e resíduos orgânicos. A planta será localizada no Paraná e tratará 1000 m3 de resíduos de esgoto e 300 toneladas de resíduos orgânicos por dia, com potência de 2,8 MW de energia elétrica (MARTINS, 2018), cujo potencial, entretanto, permanece pouco explorado, pois há alguns estudos que mostram um potencial muito maior.

Salomon e Lora (2005), por exemplo, consideram que se poderia produzir 1,2 milhão de kw de biogás a partir de resíduos sólidos urbanos, esgoto, vinhaça, esterco e resíduos de abatedouros. Zanette (2009), considerando apenas algumas plantas viáveis do Sudeste, estipula 338 mil m3 de biogás por dia. Usando o mesmo critério econômico (só plantas viáveis economicamente), mas considerando o país inteiro, o autor prevê um potencial de 3797 mil m3 por dia de aterros, e, considerando agricultura e abatedouros, um potencial de mais de 15500 mil m3 por dia.

Não obstante, essas avaliações consideram o uso de biogás para convertê-lo em eletricidade, mas nenhuma considera o uso direto para energia térmica (calor/frio) e para gerar energia mecânica mais eficiente que combustível. Embora o biogás possa ser uma importante fonte energética para assegurar uma matriz elétrica firme e renovável, ele pode ser usado para substituir os combustíveis fósseis onde ele é ainda mais eficiente e também mais apropriado para substituir os combustíveis fósseis: no aquecimento e uso mecânico.

Nesse caso, o mercado de biometano pode aproveitar a infraestrutura da distribuição e o mercado de gás canalizado do gás natural. Uma vez que o gás natural é menos poluente e menos danoso para o clima que os demais combustíveis fósseis, muitos países, estados e cidades desenvolveram infraestrutura de distribuição de gás canalizado para substituir o uso de petróleo e carvão. É o caso do estado de São Paulo, onde só na área de concessão da Comgás são atendidos mais de mais de 1,8 milhão de clientes, em 88 municípios, por uma rede de mais de 15 mil quilômetros de extensão (COMGÁS, 2018).

Em 4 de dezembro de 2012, considerando as vantagens do biogás no lugar de combustíveis fósseis, o governo de São Paulo estabeleceu o Programa Paulista de Biogás, cujo objetivo primeiro consistia em encorajar a disseminação das energias renováveis na matriz energética do estado a partir das externalidades positivas do gás gerado da biomassa; depois, visava estabelecer um mínimo de fração de biometano na rede de gás canalizado do estado.

Um projeto que está sendo desenvolvido na Universidade de São Paulo (USP), liderada por uma parceria entre o Research Centre for Gas Innovation (RCGI), o Grupo de Pesquisa em Biomassa (GBio), e o Instituto de Energia e Ambiente (IEE), está avaliando o potencial total de injeção do biometano na rede de gás natural. Os estudos preliminares consideram aterros, estações de tratamento de esgotos, vinhaça e resíduos de agricultura e chegam a um potencial que corresponde a cerca de 45% do consumo de gás natural no estado (COELHO, 2016). Os dados estão resumidos na Tabela 3:

Tabela 3 – Potencial de biometano no Estado de São Paulo

Potencial de biometano no Estado de São Paulo

Potencial de biogás (m3/h) Potencial de Biometano (m3/h) – Aterros 276.191 138.096 Estações de Tratamento de Esgotos 49.200 24.600 Vinhaça 302.848 151.424 Agronegócios e matadouros 15.155 7.580

SÃO PAULO Total 643.394 321.700

Fonte: Coelho (2016).

Esses números, que cobrem apenas o estado de São Paulo, demonstram que o potencial do Brasil deve ser maior do que as previsões anteriores. Esse potencial pode ser muito maior se, em vez de aterros, os resíduos orgânicos forem convertidos em biogás em digestores anaeróbicos. Para tanto, o Brasil precisaria inicialmente criar um sistema de separação dos resíduos alimentares para destiná-los a digestores anaeróbicos.