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BREVE PANORAMA DA MIGRAÇÃO BOLIVIANA NA AMÉRICA DO SUL 2.1 A BOLÍVIA E SEU CONTEXTO INTERNO

2.3 BOLIVIANOS EM SÃO PAULO

Silva (2005) afirma que a presença boliviana no Brasil, mais especificamente em São Paulo, não é um fenômeno que teve início nos últimos 20 anos, como afirma o senso comum na Capital Paulista.31 O início da década de 1960 marca, de fato, o início dos primeiros fluxos de bolivianos a deslocarem-se para o Brasil de forma massiva (SILVA, 2005), (BONASSI, 2000) e (ROMMANELI e MEZZATO, 2007). É nessa época que estudantes universitários da Bolívia escolhiam instituições de Ensino Superior do Brasil para fazer especializações, ou estudar em algum outro nível acadêmico, com a “intenção de ampliar suas condições laborais e culturais” (BONASSI, id. ibid. 76).

Silva (1997) afirma que outros motivos, além de estudos e perspectivas acadêmicas, motivavam bolivianos a buscarem no Brasil um lugar para migrar. Alguns desses motivos eram a fuga das sucessivas turbulências políticas vividas no país de origem e às perseguições ideológicas que muitas pessoas sofriam, ocasionadas, em muitos casos, por discordância com o pensamento oficial e vigente daquele momento histórico da região. O autor coloca que, mesmo um pouco antes de 1960, houve uma saída em massa de mão-de-obra qualificada da Bolívia, formada não só por estudantes universitários, mas também por profissionais já estabelecidos em suas carreiras (professores, médicos, advogados e dentistas) e que, concomitantemente a isso, militavam em prol de ideais contrários ao do partido Movimiento Nacionalista Revolucionário (MRN) (SILVA 1997 p.85). Alguns desses primeiros imigrantes, logo após alguns anos no Brasil, retornaram para a Bolívia, outros rumaram para novos países e, outra significativa parcela decidiu ficar, fazendo da Terra estrangeira sua nova pátria. Com isso, dedicaram-se a atividades diversas e, “consequêntemente acumularam experiência para, em seguida, tornarem-se referências da comunidade latina em vários segmentos” (ROMMANELI e MEZZATO, 2007 p.32).

31 Tal afirmação de Silva é perceptível em conversas com donos de bares, comerciantes, e com a população geral que divide espeços físicos com os bolivianos em Bairros tradicionais da Capital Paulista como o Bom Retiro, Canindé e Brás. Ou seja, para maioria das pessoas que vivem ou transitam por estes bairros, a imigração boliviana em São Paulo começou nos anos de 1990.

Os espaços profissionais comuns desses primeiros imigrantes giram em torno do ramo empresarial (micro, pequenos e, em alguns casos, médios) de diversos segmentos, nas profissões liberais, dentistas, médicos, bancários, professores, advogados, entre outras. O Senhor Edwin Tiñini é hoje um dos maiores empresários bolivianos radicados no Brasil. É uma espécie de “símbolo” e “espelho” para muitos imigrantes, pois chegou ao país sozinho, sem conhecer ninguém, desprovido de qualquer bem material e conseguiu reunir um considerável patrimônio dos anos de 1986 aos dias atuais, tornando-se uma referência dentro do cenário boliviano brasileiro. Foi um Pasante das festas populares que ocorrem no mês de agosto. A função do Pasante é ser uma espécie de padrinho do evento, patrocinando as festas e, dentre outras coisas, trazendo grupos diretamente da Bolívia para cantar em São Paulo e patrocinando festas temáticas como as que homenageiam a Virgem de Copacabana e a Virgem de Urkupiña.

Algumas associações bolivianas, como o Círculo Boliviano e a ADRB (Associação dos Residentes Bolivianos) são compostas por estes primeiros imigrantes. Tais grupos e associações serão mais bem citados no decorrer deste capítulo. Alguns imigrantes que compunham essas primeiras levas ficaram indocumentados no País por vários anos. Os motivos geralmente giravam em torno do alto preço cobrado pelas autoridades brasileiras e pela burocracia dos órgãos oficiais para expedição dos documentos necessários para regularização (BONASSI, 2000). Silva (1997, p.21) aponta que o Estatuto do Estrangeiro de 1980, Lei implementada pelo Governo Brasileiro, foi o instrumento legal utilizado para selecionar a entrada e permanência de grupos migratórios oriundos de países pobres, pleiteantes por uma nova perspectiva de vida no Brasil.32

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O Estatuto do Estrangeiro através da Lei 6815 de 19 de agosto de 1980, definia a situação jurídica de todos os estrangeiros no Brasil Suas disposições abordam uma ampla gama de aspectos relacionados com os procedimentos de imigração e extradição, entre outros, questões relativas a vistos, situações de asilo, naturalização e regulamentos em matéria de deportação e expulsão. Estipula os requisitos para a extradição e descreve ao mesmo tempo o processo e exemplifica os casos em que o Governo Brasileiro não autorizará a extradição. Ademais, estabelece o Conselho Nacional Brasileiro de Imigração, encarregado de orientar e coordenar a política brasileira no âmbito de imigração. Disponível em

http://www.dpu.gov.br/encontro/encontroredpo/pdf/Lei%206815%20-%2019081980%20 %20Estatuto%20do%20estrangeiro.pdf acessado em 22 de fevereiro de 2010.

É nesse contexto de restrição institucional legal à imigração denominado de leis que desfavorecem as migrações de cidadãos oriundos de países pobres, que a presença Boliviana começou, de fato, a ganhar volume na cidade de São Paulo (BONASSI, 2000, pp.99-100).33

Bonassi (2000) resgata a idéia de que tal Lei trazia consigo uma abordagem acintosamente policial e penal, criminalizando o imigrante que estivesse no país em situação irregular, mesmo que, em alguns casos, o maior “crime” que essa pessoa possa ter cometido tenha sido não se regularizar face à Legislação Brasileira (Id., Ibid. p.59).34 Vale lembrar que a história e os problemas vividos por esses primeiros imigrantes são importantes para entender o início dos fluxos massivos do grupo étnico em questão para São Paulo, mas insuficientes quando se tenta compreender o fenômeno como um todo e seus desdobramentos daquela época aos dias atuais, pois ele se apresenta, em suas diversas etapas e momentos, como um acontecimento multifacetado e com nuances próprias de uma época para outra.

A segunda metade da década de 1980 é um bom exemplo para confirmar esta última afirmação, pois nessa época é marcado o início do segundo grande movimento migratório de bolivianos para o Brasil que, dessa vez, tem no perfil do imigrante não mais o daquele universitário que buscava melhor formação acadêmica ou do perseguido político que buscava refúgio, mas essencialmente de pessoas que fugiam das crises econômicas vividas na própria Bolívia ou dos problemas estruturais da mesma ordem na qual a economia da Argentina começava a mergulhar (ROMANELLI e MEZZATO, 2007 p. 23). Assim, as chamadas “migrações laborais”, termo alcunhado e comumente presente na obra de Silva (1997, 2003), ganha cada vez mais volume e intensidade em São Paulo.

33 A repressão a esses imigrantes chamados por Bonassi de “indesejados” partia de princípios firmados entre os países da América do Sul no qual permitiam que, se algum imigrante oriundo de algum dos países signatários, suspeito de subversão, fosse pego em um outro país também signatário, este segundo “o entregaria” às autoridades competentes do primeiro (Bonassi, 2000 p.39).

34 Bonassi defende que tal Lei era de um desdobramento e resquício da medida sustentada no princípio da Segurança Nacional, baseada no Decreto-Lei 477 do Ato Institucional 5, no qual, entre outras coisas, todo estrangeiro era considerado subversivo e que a desconfiança com o imigrante era tratada como um princípio, não como uma exceção (Bonassi, 2000 p.61).

Na década em questão, o processo migratório apresentou características peculiares que o diferenciava substancialmente das décadas anteriores. A baixa especialização da mão-de-obra, a destinação laboral quase que exclusivamente para o mercado de confecção e costura e a alta rotatividade dos trabalhadores bolivianos no ramo em questão foram alguns dos traços marcantes desse novo momento da imigração boliviana para São Paulo (SILVA, 2005 p.66). Jovens de ambos os sexos, solteiros, com média ou, mais comumente, baixa escolaridade, oriundos, principalmente, dos interiores das principais regiões orientais da Bolívia (La Paz e Cochabamba)35, sem domínio da Língua Portuguesa e, em muitos casos, tendo como Língua Materna o quéchua ou aymará, investiram no sonho de vir para o Brasil, atraídos pelas promessas e/ou propagandas de parentes, amigos ou desconhecidos que já haviam feito o mesmo caminho acerca dos bons salários possíveis de ser ganhos e da nova perspectiva de vida em São Paulo (ROMANELLI E MEZZATO).36 Já nesse aspecto, podemos expor o ponto de vista de nossos ouvintes acerca do que pensam sobre o papel da rádio que ouvem na questão migratória.

35 Há pessoas provenientes de outros Departamentos como Oruro, Potosí, Santa Cruz, Beni, Pando, Chuquisaca e Tarija (Pastoral do Migrante, 2007 p.34). Um fato importante é destacado por Silva quando afirma que os imigrantes bolivianos tentam esconder o seu lugar de nascimento, informando, muitas vezes quando são indagados acerca disso, que nasceram nas capitais que compõem os principais centros urbanos da Bolívia. A explicação usada pelo autor é de que tal prática é comumente adotada para que se esconda sua identificação como camponês, que está estritamente ligada à identidade indígena, a qual é carregada de preconceitos tanto na Bolívia quanto no Brasil (Silva, 1997 p.89).

36 Esse contato, ainda hoje, é comumente feito, como foi dito, por um parente ou conhecido que já está no Brasil há mais tempo e decide buscar novos trabalhadores para a produção e confecção de peças em São Paulo. Tal intermediação pode, ainda, ser realizada por um coreano ou um brasileiro que vai até à Bolívia para buscar novas pessoas. Nesse momento, as relações entre empregador e futuro empregado já começam em cidade com El Alto e, em geral, são mediadas por rádios e jornais da região, nos quais é possível encontrar, nos pontos de encontro entre esses empregadores e potenciais empregados, a oferta de vagas de trabalho em vários destinos do exterior (Silva, 1997 p.104). Esses pontos de encontros são, geralmente, espaços públicos como feiras e as principais avenidas de El Alto, por exemplo.

Questão 26:

Você acha que os donos das oficinas de costura utilizam rádios de São Paulo para oferecer novos postos de trabalho para o imigrante que já está

na capital?

Sim 65% Não

35%

Em princípio, o item por ele mesmo, não traz informações por si sós conclusivas, não há nada de malévolo nele ou passível a essa conclusão. Mas a questão mais problemática é que ele pode servir como uma “porta de entrada” para que se examine potenciais relações entre radialistas e donos de oficinas. Na verdade, tratava-se de um ponto muito “espinhoso” quando tocávamos nele com os ouvintes e, principalmente, com os radialistas. Era algo não muito confortável de se tratar, o clima tendia a ficar tenso e ao encerramento da conversa, coisa que não queríamos que acontecesse. Mesmo assim, dos noventa e seis entrevistados, sessenta e dois afirmaram que pelo rádio é possível saber há oferta de trabalho em outras oficinas.

Questão 27:

Você acha que a rádio que você ouve atende mais às necessidades de quem? Ouvintes 38% Donos Oficinas 19% Com os dois 43%

Dos nossos noventa e seis entrevistados trinta e seis sinalizaram que as preocupações das rádios eram os ouvintes. Dezoito manifestaram que as rádios se preocupavam mais com os donos das oficinas e quarenta e dois ouvintes disseram que as rádios preocupavam-se mais com os dois (ouvintes e donos de oficinas). Esse é um dado relevante para suposições de que existem ligações mais profundas entre radialistas e donos de oficinas. Se somarmos as pessoas que responderam “aos donos das oficinas” com “os dois”, excluindo os que responderam, “só aos ouvintes”, nosso gráfico ficaria assim:

Continuação e releitura da Questão 27:

Donos Oficinas + Ouvintes

30%

Com os dois 70%

Lendo os dados dessa forma, praticamente sessenta ouvintes, setenta por cento, afirmariam que os interesses dos donos das oficinas têm vazão dentro das rádios. Isso abre pressupostos para inúmeras interpretações que não fazem parte de nossos objetivos centrais, mas é importante relatar isso. A questão vinte e oito, da mesma forma, abre espaço para esse tipo de elucubração relativa ao papel e relações das rádios com os donos das oficinas.

.Como já foi informado anteriormente por Bonassi, há várias correntes migratórias envolvendo sul-americanos em direção aos países da própria região. Esses movimentos podem ser classificados como Rural-Rural, Rural-Urbano, Urbano-Urbano e, de acordo com a autora, de forma complementar, Nacional- Nacional, Nacional-Internacional e Internacional-Internacional (BONASSI, 2000).37 É nestes dois últimos casos, aliados à perspectiva Urbano-Urbano, que ocorre o processo migratório de bolivianos para o Brasil, seja partindo de El Alto, La Paz, Cochabamba ou Buenos Aires com destino a São Paulo. No caso dos bolivianos que decidem emigrar para o Brasil, saindo diretamente da Bolívia, a rota mais comum é atravessar a fronteira entre os dois países, situando do lado Boliviano Puerto Suarez (Santa Cruz de La Sierra) e, do lado brasileiro, Corumbá (Mato Grosso do Sul).38

O capital inicial para custear o deslocamento terrestre e alimentação durante a viagem é feito pelo empregador que vai à Bolívia para contratação dessa mão de obra (ROMANELLI e MEZZATO, id.). Silva complementa que tais custos compõem uma dívida que o imigrante contrai antes mesmo de começar a trabalhar. Tal dívida, de acordo com a pesquisa do autor, é ainda ampliada, ao chegar a São Paulo, com os gastos com moradia, alimentação, água e luz que lhes são disponibilizados. Em inúmeros casos, salienta Silva (1997), muitos imigrantes passam meses sem receber dinheiro algum, somente trabalhando em troca de comida e moradia, pois tudo que produziram durante o mês foi para pagar dívidas contraídas desde a sua saída do país de origem. Fora isso, complementa

37

Vale lembrar que eles não são estanques, mas, em muitos casos, sucessivos e uma única pessoa pode ter passado por todas essas etapas até chegar ao destino almejado.

38A maior parte dos bolivianos que chegou a São Paulo após 1990 passou, de início, por um processo, nas categorias usadas por Bonassi, Rural-Urbano Nacional para, em seguida, um contexto Urbano-Urbano Internacional.

o autor, há uma “dívida” que não é mensurável e, também, creditada à conta do imigrante, que é a “dívida de gratidão” que o empregado tem com seu empregador, dado ao fato deste segundo ter dado ao primeiro uma oportunidade de melhorar de vida, tirando-o de um cenário com poucas perspectivas e transplantando-o para uma nova realidade com melhores condições econômicas.39 No Brasil, o circuito das confecções e costura é o destino comum e, sem dúvidas, o mais representativo para eles.

Questão 6:

Você trabalha no mercado de confecção e costura de São Paulo?

Costura 84% Prestação de serviços ligados à costura 16%

Dos noventa e seis entrevistados, oitenta e um trabalham diretamente na costura. Os quinze restantes prestam algum tipo de trabalho ao mercado de confecção e costura que não propriamente a costura em si. Esses trabalhos são ligados à parte de serviços, por exemplo, que faz almoço aos costureiros. Acreditamos que não há prejuízos em termos analíticos em considerar todos empregados no mercado de confecção e costura. Um fato curioso que surgiu no momento da aplicação dos questionários, exatamente quando chegávamos à questão número seis, era a curiosidade de saber qual era a profissão desses imigrantes antes de sair da Bolívia. Apesar do nosso questionário não ter previsto

39 Tais “melhores condições” dependem do ângulo que se observa a situação. Em nome de tal dívida de gratidão abrem-se espaços para que se criem vínculos de obrigações morais que vão muito além da dívida financeira contraida, dificultando rompimento de ciclos de exploração em uma relação, muitas vezes escamoteada de apadrinhamento. Em São Paulo a remuneração dos costureiros funciona de maneira que a cada três unidades monetárias produzidas, duas ficam com o dono da oficina e uma com o costureiro que confeccionou tal peça de roupa. O aluguel pelo espaço de dormida, e os valores pelo uso da água, luz e principais refeições do dia (café da manhã, almoço e janta) são descontados na produção do mês daquele imigrante que trabalha para os coreanos, brasileiros ou para os seus próprios conterrâneos da Bolívia.

essa informação, informalmente nós a fizemos sem rígida contabilização. O que podemos aferir disso, mesmo sem a sistematização necessária, é que praticamente nenhum deles era costureiro na Bolívia. No país de origem, os que já haviam trabalhado, eram empregados do setor mineiro, que entrou em colapso, pertencentes ao setor cocalero, uma atividade complexa pela dualidade que o cultivo da coca tem na região andina e suas repercussões no mundo, pois de um lado ela faz parte do uso cultural dos povos daquela região, por outro ela é a matéria prima para produção de substâncias ilícitas como a cocaína. Fora isso, os históricos das pessoas eram de desemprego e, no caso dos jovens, dado não ingresso no mercado de trabalho pela falta de idade, não tinha uma profissão definida. Silva (2009) fala de algumas peculiaridades acerca disso e que envolvem diretamente o desenvolvimento do mercado de confecção e costura da cidade de São Paulo.

Entidades, órgãos públicos e pesquisadores do assunto defendem, quase que unanimemente, que para cada imigrante latino regular exista de dois a três irregulares. Para se ter uma noção, os dados oficiais do Consulado da Bolívia em São Paulo apontam para mais de 46.354 bolivianos regulares (Consulado da Bolívia em São Paulo, 2008).40 Dessa forma, o número pode chegar a 150.000, tornando-se de aceitação razoável entre os pesquisadores, entidades envolvidos com o tema e entre os próprios imigrantes. Quanto ao mercado de confecção e costura de São Paulo, Silva (2009) afirma que no final dos anos 1980 e durante a década de 1990 o mercado em questão passou por profundas reformas, com a intensificação e terceirização da mão-de-obra. Pochmann (2004 p.53) contribui com a temática ao afirmar que:

O número de empregos formais neste setor diminuiu drasticamente, passando de 180 mil em 1989 para 80 mil em 1999 e o mais curioso é que estes números não refletem nenhuma perda de dinamismo para o setor ou qualquer substituição de mão-de-obra por tecnologia.

Concomitantemente a isso, proliferaram-se pela cidade de São Paulo oficinas de costura terceirizadas e subcontratadas junto às empresas de

confecção de Bairros como Brás e Bom Retiro, ampliando as margens do trabalho informal e empregando bolivianos indocumentados que chegavam à capital paulista. A conjuntura das migrações de bolivianos para o Brasil, dessa forma, encaixou-se na dinâmica competitiva do mercado de confecções em São Paulo, pagando salários baixos e sem garantias sociais (SILVA, 2004 p.7). Com relação a isso, nosso questionário aplicado aos ouvintes, buscou saber o papel das rádios o na perspectiva migratória de bolivianos para o Brasil. Tratava-se, na verdade, como havíamos dito, de temas complexos para falar com ouvintes e, principalmente, radialistas.

Questão 47:

Com relação à migração. As rádios de São Paulo dão espaço para o debate acerca dos fluxos migratórios da Bolívia para o Brasil?

Sim 57% Não sei

43%

A percepção dos ouvintes sobre as questões quarenta e sete e quarenta e oito, que buscavam conhecer se as rádios davam espaço para se debater o fluxo de pessoas da Bolívia para o Brasil, as respostas se dividiram em dois blocos iguais entre “sim” e “não sei”. Acreditamos que isso se deva a um possível não entendimento por parte dos nossos ouvintes do que buscávamos, pois afinal de contas, queira ou não, as rádios falam de uma forma ou de outra do fluxo de pessoas para o Brasil, mas sem especificar exatamente o que dentro desse fluxo queríamos saber. Já na questão quarenta e nove queríamos saber, de forma específica, se os ouvintes achavam que as rádios auxiliavam a vinda de pessoas para o Brasil. A resposta, da mesma forma, ficou dividida praticamente meio a meio e não demos seguimento na investigação de como isso acontecia, mas há indícios para algumas deduções de uso da mídia para a vinda de pessoas que,

analisando o ato por si só, não gera nenhuma penalidade criminal. O que se precisa saber é como isso é feito e qual tipo de “promessa” se vincula. As questões cinquenta e cinquenta e um buscavam identificar se os ouvintes já haviam precisado, ou se conheciam alguém, de algum serviço da rádio que ouviam e se precisaram pagar por isso.

Não se pode deixar de destacar as relações interétnicas que envolvem o setor em questão. Bolivianos, coreanos, judeus e brasileiros têm, ou já tiveram, importantes papéis na logística de produção, confecção e costura em São Paulo. Na década de 1940 e 1950, os judeus eram os vanguardistas do mercado de confecção e costura, tornando-se referências de produção de vestuário que abastecia, até então, a cidade de São Paulo.41 Com o passar dos anos, a segunda geração de semitas foi-se dedicando a atividades liberais e poucos tinham interesse em dar continuidade aos negócios dos pais (CARNEIRO, 1999 pp.98-