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AS RELAÇÕES ENTRE AS RÁDIOS E AS ASSOCIAÇÕES LIGADAS À VIDA BOLIVIANA EM SÃO PAULO

O RÁDIO ENTRE AS COMUNIDADES E A COLETIVIDADE BOLIVIANA 3.1 O COMUNITÁRIO COMO UMA INSTÂNCIA DO COLETIVO

3.3 AS RELAÇÕES ENTRE AS RÁDIOS E AS ASSOCIAÇÕES LIGADAS À VIDA BOLIVIANA EM SÃO PAULO

Retomando os conceitos de comunidade e coletividade aplicados ao panorama boliviano de São Paulo, citamos Martín-Barbero (2003) quando elucida as perspectivas de territorialidade e extraterritorialidade como produtora de sentido na comunicação intercultural. Para o autor, tais caminhos teóricos deixam claro:

Que não é possível habitar no mundo sem algum tipo de “ancoragem territorial”, de inserção no local, já que é no “lugar”, no “território, não confundido como Estado-Nação, que se desenrola a corporeidade da vida cotidiana e a temporalidade da ação coletiva, base da heterogeneidade humana e da reciprocidade, características fundadoras da comunicação humana, pois, mesmo atravessado pelas redes do global, o lugar segue feito do tecido das proximidades e das solidariedades. Isso exige que se esclareça que o sentido do local não é unívoco (Id. 2003 pp.58-59).

É com base nos estudos do autor que decidimos conhecer as associações bolivianas existentes em São Paulo como lócus produtor de sentido comunicacional e com vistas comunitárias. Assim, em meio a uma realidade tão multifacetada, de forma a tentar representar pessoas, causas, bandeiras e lemas, algumas organizações foram criadas como uma forma de tentar aglutinar participantes de uma mesma realidade com um determinado sentimento de pertença, situação laboral ou posição sócio-econômica comum. A fundação dessas Organizações seguiu, em princípio, os mesmos passos da chegada dos bolivianos à cidade de São Paulo. Ou seja, o eixo que guiava o nascimento de tais grupos estava baseado nos anseios que esses mesmos grupos tinham com a decisão de emigrar da Bolívia para o Brasil e com os problemas aqui enfrentados, mas outras formas de associativismo foram surgindo e deixaram o cenário mais difícil de proceder a análises categóricas. Um exemplo claro disso são

associações mais recentes, como Associação Folclórica União Brasil-Bolívia (AFOUBB), como veremos mais em frente, de que fazem parte imigrantes bolivianos que chegaram a São Paulo em distintas épocas e que compartilham de identidades, entre eles, totalmente distintas.

A fundação dessas Associações era baseada na tentativa de responder de forma conjunta aos diversos problemas que assolavam os imigrantes bolivianos em São Paulo. Tais problemas, em alguns casos, giravam em torno do desemprego, do preconceito vindo da sociedade receptora (de outros imigrantes e, até em alguns casos, dos próprios bolivianos que não queriam ser comparados com alguns de seus conterrâneos), das dificuldades com moradia, com saúde, com escolas para os filhos, do reconhecimento de diplomas de estudos cursados na Bolívia, etc. As associações bolivianas da Capital Paulista formam exemplos claros e práticos de lócus produtor e reprodutor desses diferentes relacionamentos dentro do universo boliviano que se divide e se agrupa e reagrupa em segmentos distintos, com propostas distintas e, dentro dessas propostas, o rádio possui seu papel de dialógico e mediador nas comunidades citadas.

Entre as Associações / Organizações / Agremiações / Federações mais representativas criadas pelos bolivianos em São Paulo destacam-se: a Associação de Residentes Bolivianos (ADRB), a Associação Brasil-Bolívia (BOLBRA), Círculo Boliviano (CIRBOL), a Kantuta Brasil e a Associação Folclórica União Brasil- Bolívia (AFOUBB).79 Em nossa pesquisa de campo conseguimos entrevistar os responsáveis, ou pessoas institucionalmente ligadas a todas essas entidades. Vale ressaltar que cada uma delas atende a especificações e anseios diferentes do “mundo boliviano” existente em São Paulo. Todas as associações supracitadas têm relevância no cotidiano boliviano em São Paulo, como informamos anteriormente, respondendo a demandas e interesses diferentes dentro das realidades investigadas. A última entidade relacionada, AFOUBB, é por si só um espaço privilegiado para pesquisas mais aprofundadas, pois reúne mais de cento e cinqüenta pessoas em grupos folclóricos que se apresentam nas festividades

79 Dada variedade de pessoas, nesse espaço são reproduzidas relações diversas com potenciais núcleos de pesquisas que podem revelar muito sobre as maneiras como os bolivianos pensam a si próprios e como estabelecem as suas relações uns com os outros.

bolivianas em São Paulo nos grupos folclóricos nos meses de agosto e dezembro. Em nossa pesquisa de campo, conversamos com representantes e participantes de cada uma delas, conhecendo o foco de suas atividades, assim como, os princípios fundantes e o perfil de cada uma com relação à sua atuação dentro do universo boliviano existente em São Paulo.80 A decisão por trabalhar com tais Associações deu-se por diversos motivos: a representatividade dessas Associações frente à presença boliviana na Capital, aos seus históricos de atuações, ao sentimento de pertença a algo comum além do “teto político”, ao tempo de existência de cada uma delas, à capacidade de cada uma mobilizar um número considerável de pessoas em torno de uma temática, aos distintos ramos de atuação, às diferentes propostas que têm e, a mais importante de todas elas, à estreita relação que cada uma possui com as rádios que estamos estudando.

A Associação de Residentes Bolivianos (ADRB) foi fundada em 1969 por um grupo de profissionais liberais bolivianos que chegou ao Brasil no início da década de 1960 (Silva, 2005 p.37). Sua sede é na Praça São Bento no Bairro do Parí. De acordo com o atual Presidente, Sr. Fred Vargas, médico boliviano residente no Brasil há quase trinta anos, a ADRB reúne cidadãos bolivianos, conforme o próprio nome já diz residentes em São Paulo. Os objetivos fundantes giram em torno da promoção cultural, da receptividade e cuidado social aos

paisanos bolivianos. No entanto, o que percebemos em nossa pesquisa, que já foi relatado anteriormente e se confirmou na ADRB, é que o conceito de conterrâneo não é estendido a todo natural do território boliviano. Há alguns “pré-requisitos” para ser um paisano da ADRB. A questão socioeconômica, de acordo com nossas observações e entrevistas, é um quesito para tornar-se, ou não, um paisano na Associação de Residentes Bolivianos. “Nas palavras do Presidente, a ADRB oferece, além do já citado, assistência médica-odontológica e jurídica a “toda comunidade” não só boliviana, mas em muitos casos, latina de São Paulo”. A Associação promove, ainda, nas palavras do Médico Fred Vargas, “cursos profissionalizantes que capacitam os novos imigrantes recém-chegado a

80 Para fins de simplificação de linguagem, nos referiremos a essas entidades, a partir de agora, simplesmente como Associações.

trabalharem no mercado de confecção e costura”.81 Atualmente, de acordo com Fred Vargas82:

A ADRB conta em seu quadro de beneficiados mais de vinte mil pessoas dos quais, aproximadamente, vinte e cinco por cento desse montante é composto por micro e pequenos empresários, quarenta por cento por profissionais liberais e o percentual de trinta e cinco por cento restantes é composto por outros trabalhadores e estudantes com visto temporário no Brasil.83

Atualmente (2010) a ADRB possui um departamento médico montado na sede da instituição que, de acordo com Fred Vargas, serve para conferências de médicos bolivianos que prestam serviços para toda comunidade de residentes, tais como conferências contra o câncer de colo de útero e planejamento de campanhas contra tuberculose. Aliás, a tuberculose é uma das principais enfermidades nas oficinas de costura de São Paulo, pois as condições de trabalho favorecem a proliferação desse tipo de doença. A Associação de Residentes bolivianos conta, ainda, com um periódico impresso para divulgação de suas atividades. Ele se chama “La Puerta Del Sol” e conta com mais de dez anos de existência. É por intermédio desta mídia que a ADRB divulga suas ideias e ações. Tal periódico conta com uma tiragem mensal de cinco mil exemplares.

Em nossa estada em São Paulo, conhecemos o antigo editor do periódico, que se chama José Gomboa, professor de Língua Espanhola e Jornalista formado em Cochabamba, ex-membro da Associação, que nos contou um pouco das fases

81 Não temos condições de fazer afirmações categóricas neste trabalho, mas a impressão que obtivemos é que a ADRB promove a vinda clandestina de imigrantes bolivianos para o Brasil e tais “cursos de capacitação” servem para ampliar a produtividade nas Oficinas de Costura dos Bairros do Parí e Brás. Trata-se, apenas, de uma impressão sem fundamentos concretos. Mas essa hipótese é comumente ouvida em conversas com outras Associações e, de forma delicada, por algumas entidades como a Pastoral do Migrante. Algumas dessas afirmações são acompanhadas de informações que dizem que algumas pessoas ligadas a ADRB são donos de Oficinas de Costura, interessados diretos na vinda de novos imigrantes para São Paulo. Mas conforme dissemos, não temos nenhuma condição, neste trabalho, de afirmar ou comprovar tais hipóteses.

82 Ressaltamos que as entrevistas foram transcritas no idioma que as obtivemos. Ou seja, quando os entrevistados falavam em espanhol, optamos por manter as transcrições naquela língua. Quando eram dadas em português, conservamos as transcrições também dessa forma.

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Durante a entrevista, no momento dessa explicação, nós perguntamos se no percentual de vinte e cinco por cento de pequenos e micro empresários, assim como o de trinta e cinco por cento restantes, havia a presença de donos de oficina de costura. Ele fez uma pausa em sua fala e disse que sim. Daí também nasceu uma das impressões que a ADRB tem interesse, ou facilita a vinda de novos imigrantes para atuarem no mercado de confecção e costura de São Paulo.

e dificuldades de se trabalhar na ADRB. Em uma entrevista que tivemos no Bairro do Brás, mais especificamente na Rua Coimbra, dentro do Restaurante Pollo Campeón, com o ex-membro, nos foi relatado que os Diretores e Presidente à época exploravam demasiadamente as pessoas que trabalhavam na Associação, gerando desagrados e problemas dentro do próprio grupo que compunha a frente de trabalho da Associação.84 Os desentendimentos por conta de disputa de poder e posição ideológica começaram a ficar cada vez mais intensos, gerando rupturas dentro do próprio grupo. A ascensão do Presidente Evo Morales em 2005 foi um dos momentos mais tensos vividos dentro da ADRB. De acordo com Gomboa, ela praticamente “rachou” ao meio, com um grupo de um lado que apoiava um alinhamento estreito com o então presidente eleito e um grupo que pregava distanciamento e desvinculação da imagem da Associação à imagem do novo governo na Bolívia.85

Associação Folclórica União Brasil-Bolívia (AFOUBB) é uma Associação formada pelos grupos folclóricos denominados Fraternidades.86 Foi fundada em 2003, no início, era composta pelos Grupos Morenada Nueva Revelación 2004, Morenada Bolívia Central, Morenada Unión Fanáticos, Kullaguada, Juventud Rebeld, Tinkus Bolívia e Ballet Folclórico Boliviano. A Associação está representada por uma diretoria de pessoas ligadas à coletividade boliviana de São Paulo, tendo como Presidente a Advogada Ruth Camacho, filha de bolivianos.87 As Fraternidades Folclóricas estão integradas por centenas de membros de todas as idades. A missão da Associação, nas palavras de sua Presidente, “é promover a dignidade do imigrante boliviano, incentivar a produção cultural para construção

84 José Gomboa trabalhou para ADRB durante os anos de 2004 a 2006.

85 Apesar de toda distância, as relações com o país de origem em algumas dessas Associações são mantidas e os reflexos de uma eleição na Bolívia podem proporcionar mudanças nos rumos de algumas atividades das Associações. Um exemplo claro foi o ocorrido na ADRB

86 As Fraternidades são uma espécie de “Escolas de Samba”, nas quais cada uma representa uma região da Bolívia e/ou uma dança típica com significado próprio.

87 Ruth Camacho é uma das pessoas que melhor conhece a realidade radiofônica boliviana de São Paulo. Ela já teve programas na Rádio Número 1 que tratava, entre outras coisas, de temas relacionados à vida da mulher boliviana em São Paulo. De acordo com ela, a “cultura boliviana” é muito centrada no homem e a mulher é sua propriedade. Sendo a mulher uma propriedade, o homem pode fazer o que quiser com ela. Durante a entrevista nos foi relatado que, por inúmeras vezes, o seu programa foi retirado do ar devido às reclamações dos homens costureiros que reclamavam que o programa da “Doctora Ruth”, como é conhecido em São Paulo, estava deixando as mulheres ouvintes desobedientes com relação às ordens dadas pelos seus maridos.

de uma sociedade justa, fraterna e solidária”. Nessas Fraternidades há homens, mulheres, filhos de bolivianos já nascidos no Brasil, costureiros, donos de oficinas de costura, estudantes universitários, profissionais liberais, etc.

Atualmente, a Associação conta com dezoito Fraternidades que se preparam durante oito a nove meses para as festas religiosas, culturais e nacionais que ocorrem no mês de agosto de cada ano em São Paulo. Essas dezoito Fraternidades são compostas por mais de oito mil pessoas. Em nossa opinião, trata-se de um dos locais mais perceptíveis e mais instigantes para averiguar a mistura de identidades e os conflitos existentes dentro do que muitos chamam comumente de comunidade. A paixão pela dança é o que aproxima as pessoas nessa Associação. No entanto, há outros fatores que distanciam as pessoas nesse mesmo meio. Ruth Camacho afirma que as Fraternidades servem como a representação de segmentos da vida boliviana em São Paulo e que elas são formadas a partir de afinidades e interesses comuns, juntando pessoas que se identificam com um tema e que as faz diferentes de outras pessoas que possuem afinidades com outros temas e/ou pertencem a outras realidades. Cada tipo de dança representa um tipo de história e conta um fato significativo na cosmovisão

boliviana e andina.88 Os Caporales, as Morenadas, as Diabladas, os Tinkus são danças típicas com significados próprios e oriundas de distintas regiões. Para dançá-las ou fazer parte das Fraternidades que as dançam, é preciso ter uma “Identidade” definida e pertencer a uma determinada comunidade dentro da vida boliviana em São Paulo, pois há uma rígida hierarquia em termos de sentidos, classes, e origens de cada dançarino que compõe cada um dos grupos folclóricos. Nas palavras de Ruth:

Donos de oficinas de costura não dançam nas mesmas Fraternidades que dançam os costureiros. Pessoas nascidas nas capitais da Bolívia ou já no Brasil não dançam com os nascidos nas zonas rurais bolivianas. Danças de tradição européia são mais privilegiadas do que danças autóctones. Nessas primeiras, os mais jovens são os mais requisitados,

88

A palavra Cosmovisão é usada com frequência na obra de Silva (1997, 2003, 2005) para representar o entendimento que os povos andinos têm do mundo. Ou seja, a cosmovisão é como os conhecimentos religiosos e populares dos povos dos Andes explicam o mundo, suas relações com os seus semelhantes e com a natureza em uma perspectiva sincrética capaz de abarcar o catolicismo europeu com religiões indígenas no território onde hoje se localizam Bolívia e Peru.

sobrando as segundas para os mais velhos ou aos desprovidos de bens materiais. As Fraternidades são “mundinhos” e locais de poder. Lá é possível encontrar de tudo.89

Durante a entrevista foi perguntado como poderiam ser articuladas e mobilizadas tantas pessoas dentro dessa Associação. A resposta de Ruth foi que:

O rádio é o principal meio de chegar até a essas pessoas. Não há outra perspectiva de alcançar a todos, uma vez que aparelhos celulares, telefones convencionais, internet e outras tecnologias são muito raras nessa realidade. O rádio e o boca a boca informam as pessoas das datas e locais de desfile. Não há outra maneira de se articular todas essas pessoas. Se você quer comunicar algo para os bolivianos em São Paulo, use qualquer uma das rádios, pois há um aparelho sintonizado em alguma emissora em cada uma das oficinas, seja ele de Bairros próximos do Centro (de São Paulo) como o Brás, Bom Retiro, Casa Verde, Canindé ou de Bairros mais distantes como o de Santana, Interlagos, Belém, Cidade de Guarulhos, etc. O boca a boca também funciona. No entanto, ele é mais localizado e atinge somente as pessoas que estão mais próximas das outras, que moram no mesmo Bairro.

A Associação Brasil Bolívia (BOLBRA) é a representante dos costureiros bolivianos radicados em São Paulo. Seu Presidente chama-se Juan Villegas, boliviano de Cochabamba e estava na Bolívia durante o período das nossas entrevistas. Assim, entrevistamos o Vice-Presidente, Marcos Canaviri. A função da BOLBRA é tentar articular todas as oficinas de costura de São Paulo no intuito de que busquem e ajudem os seus costureiros no processo de legalização de sua situação no Brasil, pois assim é mais fácil criar condições mínimas para que os costureiros possam trabalhar em acordo com a Legislação Trabalhista Brasileira e dela também usufruírem, sem ficar à margem da exploração laboral existente dentro do mercado de confecção e costura de São Paulo.90 Para o Sr. Canaviri a

89 A impressão que tivemos foi que essa Associação é um ambiente propício para um “mergulho” no que é o Mundo Boliviano de São Paulo, pois há imigrantes de todo o tipo, de todos os lugares da Bolívia, filhos de imigrantes, imigrantes que já estão no Brasil há quarenta anos, recém chegado, costureiros, donos de oficinas, profissionais liberais, jovens, adultos, crianças, etc. No entanto, não estão misturados, mas sim agrupados em comunidades e são portadores de identidades distintas.

90 A palavra “Exploração” representada melhor para a realidade em que vive a maioria dos imigrantes bolivianos de São Paulo, pois ela substitui o que Silva chama de “Escravização”. A mão-de-obra do imigrante é, na maioria das vezes, explorada e não escravizada. A dinâmica de pagamento aos costureiros do mercado de confecção e costura de São Paulo gira em torno da remuneração por peça confeccionada. Assim, quanto mais peças de roupas o costureiro fizer por dia, mais ele ganhará. No entanto, o valor que o dono da oficina, que geralmente pode ser um brasileiro ou um boliviano, paga ao costureiro é muito baixo com relação ao valor final da mercadoria nas lojas de roupas de Bairros tradicionais como o Bom Retiro. Daí nasce o termo

forma mais rápida de fazer qualquer comunicado aos costureiros bolivianos, assim como disse Ruth Camacho, é através das rádios comunitárias.91 Nas palavras do Vice-Presidente da BOLBRA:

É pelas rádios bolivianas que conseguimos nos manifestar. Mas não são todas que dão espaço para os interesses da maioria das pessoas. É difícil ter acesso em algumas das rádios feitas pelos meus próprios patrícios, pois eles cobram caro por um anúncio de interesse da “comunidade”. A única rádio que nós, da BOLBRA, podemos contar é com a Rádio Número 1. As outras são difíceis para nossa associação BOLBRA. As chamadas para as reuniões que a gente faz para tentar legalizar as oficinas são feitas na Rádio Número 1. As outras rádios cobram caro por isso.

Quando indagado acerca de como funcionavam as relações entre Collas e Cambas em São Paulo, Sr. Canaviri respondeu:

Existem diferenças aqui sim e isso vem, lá de trás, lá da Bolívia. Por exemplo, eu sou Colla. Os Cambas pensam que devido ao fato de terem uma pele mais clara eles se crêem superiores. Acham que são melhores que nós. Os Cambas acham que Santa Cruz (De La Sierra) é o centro do mundo. Se eles pudessem se separariam da Bolívia. Mas aqui tem muitos Cambas que estão na mesma situação que todo mundo e até pior, mas mesmo assim ainda se recusam a frequêntar os lugares que nós frequêntamos. É difícil ver Colla trabalhando com Camba.

Sr. Canaviri defende que, apesar da BOLBRA ter mais de vinte mil pessoas ligadas a ela, ela não consegue mobilizar todos em uma única preocupação de criar preços mínimos para negociação frente aos coreanos. Os bolivianos não conseguem se organizar para cobrar preços mínimos por peça trabalhada e, com isso, desarticula toda “comunidade” frente a uma “comunidade coreana” organizada e com bastante dinheiro.92

exploração e não escravização. O trabalho escravo existe, mas é menos comum do que Silva afirma (1997, p.92). O próprio autor faz uma reavaliação dessa questão na obra de 2003 com relação à obra de 1997. 91 O termo Rádio Comunitária será definido em um capítulo próprio. Por enquanto, usaremos as palavras ditas pelos nossos entrevistados, independente de entrar no mérito de serem comunitárias, de fato, ou não.

92 Preferimos, nesse caso, manter a fala do entrevistado tal qual foi dita, sem alterar o sentido para “forçá-la” a entrar em nosso conceito. Mas lembramos que o parâmetro de comunidade usada nesse trabalho difere da idéia do Senhor Canaviri. Independente de qualquer coisa, estamos tratando de uma denominação puramente