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4. BREVE HISTÓRICO DO INSTITUTO DA ADOÇÃO

4.4. A evolução do instituto no Brasil

4.4.2. Breve histórico da Adoção no Brasil

A adoção entrou em nosso ordenamento jurídico com as mesmas características que possuía no direito português, ou seja, sem o desenvolvimento que o direito romano lhe deu.

As Ordenações do Reino vigoram no Brasil até que o Código Civil de 1916 entrasse em vigor.

Segundo Eunice Ferreira Rodrigues Granato: “A primeira lei referente à adoção foi a de 22.09.1828, que transferia da Mesa do Desembargo do Paço para os juízes de primeira instância, a competência para a expedição da carta de perfilhamento.”13

Algumas leis posteriores tocaram sutilmente no assunto, afinal, naquele período, a situação de crianças e adolescentes estava longe de ser uma prioridade do Estado. Com o advento do Código Civil de 1916, o instituto da adoção foi sistematizado no Brasil.

A sistematização da adoção no Código de 1916 destinava-se a atender aos interesses das pessoas que não tinham filhos, tanto que o seu artigo 368 determinava que somente as pessoas maiores de 50 (cinquenta) anos podiam adotar, além disso, os candidatos à adoção não podiam ter prole legítima ou legitimada e deviam ser pelo menos 18 (dezoito) anos mais velhos do que o adotando. A regra por si só já desestimulava a prática da adoção. _______________

11 PINHEIRO, Ângela de Alencar Araripe. Criança e adolescente no Brasil: porque o abismo entre a lei e a realidade. Fortaleza, CE: Editora UFC, 2006. p. 50-91.

12 PINHEIRO, Ângela de Alencar Araripe. ibidem. p. 105.

A mencionada legislação determinou que, na adoção, o pátrio poder do pai biológico era transmitido para o pai adotivo, sem haver a extinção dos laços com a família natural. Por isso este continuava sendo herdeiro do pai natural e herdava, também, do pai adotivo, caso este não tivesse filhos consanguíneos. Contudo o pai adotivo só seria herdeiro do adotado se este não tivesse mais o pai biológico.

A adoção era formalizada por meio de escritura pública e podia ser revogada por ato de vontade do adotado quando este se tornasse capaz. O pai adotivo também podia revogar a adoção caso ocorresse alguma das situações que autorizavam a deserdação.

As legislações posteriores ao Código Civil de 1916 buscaram amenizar o desinteresse da sociedade pelo instituto.

A Lei 3.133 de 1957 reduziu a idade mínima de 50 (cinquenta) para 30 (trinta) anos de idade, dessa forma casais jovens podiam adotar um filho, mas estabeleceu que isso só seria possível após 5 (cinco) anos de casamento.

Essa lei eliminou a necessidade de o adotante ser pessoa sem prole legítima ou legitimada e reduziu a diferença de idade entre adotante e adotado de 18 (dezoito) para 16 (dezesseis) anos, também determinou que o adotando, caso fosse maior de idade, tinha que consentir na adoção.

A mencionada lei inovou, ainda, na possibilidade de o adotado poder acrescentar ao seu nome os apelidos de família do pai adotivo, mantendo ou retirando os apelidos advindos da sua família natural. Ficou estabelecido, também, que, se o adotante tivesse filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos, a relação de adoção não envolveria a possibilidade de sucessão hereditária.

Em 02 de junho de 1965 entrou em vigor a Lei 4.655 trazendo outras novidades para o instituto da adoção, entre elas, a criação da legitimação adotiva que consistia em atribuir a condição de filho legítimo ao menor adotado em condições excepcionais, mediante processo especial, cuja sentença tinha efeito constitutivo e era inscrita no Registro Civil, como se tratasse de registro fora do prazo, no qual se consignava os nomes dos pais adotivos como pais legítimos. A relação de parentesco nesse caso era igual à ligação entre pai e filho consanguíneo.

Só poderia haver legitimação adotiva, conforme o art. 1º da lei, em relação à criança de até 7 (sete) anos de idade quando esta fosse abandonada ou órfão não reclamado por qualquer parente por mais de 1 (um) ano, ou cujos pais tivessem sido destituídos do pátrio poder, ou, ainda, na hipótese de ser uma criança reconhecida apenas pela mãe, que não pode prover seu sustento.

A legitimação adotiva podia ser concedida em relação à criança maior de sete anos caso ela já estivesse sob a guarda dos legitimantes quando completou aquela idade. Em qualquer hipótese a criança deveria está sob a guarda dos requerentes há pelo menos 3 (três) anos.

A mencionada lei manteve a idade mínima de 30 (trinta) anos para os adotantes e o período de cinco anos de matrimônio, mas inovou ao estabelecer que, em caso de esterilidade do casal, comprovada mediante perícia médica, seria dispensado o decurso de 5 (cinco) anos de casamento, porém teria que ficar demonstrada a estabilidade da família.

Por meio dessa lei foi autorizada a realização da adoção por viúvos e desquitados, naquele caso o adotante tinha que ter mais de 35 (trinta e cinco) anos de idade e provar que a criança já integrava seu lar há mais de 5 (cinco) anos. Na outra hipótese os cônjuges desquitados ao requererem a legitimação deviam provar que guarda da criança, durante o período de prova, se iniciou na constância do casamento, de modo que já tenha ficado ajustado sobre guarda, pensão e visitas.

A legitimação adotiva era irrevogável. O adotado rompia a relação de parentesco com a família de origem e a este poderia ser dado o sobrenome dos legitimantes, inclusive autorizava-se a mudança de seu prenome.

Apesar dessas inovações, a lei 4.655/65 excluía o legitimado adotivo da sucessão dos legitimantes caso estes tivessem filhos legítimos nascidos após a adoção.

Em 1977 a Lei do Divórcio (Lei nº 6.515), ao dar nova redação ao artigo 2º da lei 883 de 21 de outubro de 1949, determinou que: “Qualquer que seja a natureza da filiação, o direito à herança será reconhecido em igualdade de condições.”

Em 10 de outubro de 1979 entrou em vigor a Lei 6.697, conhecida como Código de Menores, destinada à proteção dos menores de até 18 (dezoito) anos de idade que se encontrassem em situação irregular. O artigo 2º da lei trazia a definição da expressão “menor em situação irregular”, in verbis:

Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de:

a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;

b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;

Il - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável;

III - em perigo moral, devido a:

a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b) exploração em atividade contrária aos bons costumes;

IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável;

V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária;

VI - autor de infração penal.

Parágrafo único. Entende-se por responsável aquele que, não sendo pai ou mãe, exerce, a qualquer título, vigilância, direção ou educação de menor, ou voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente de ato judicial.

Esse código introduziu a adoção plena em substituição à legitimação adotiva, que foi expressamente revogada e também admitiu a adoção simples, regulada pelo Código Civil de 1916. Conforme o que foi exposto, as disposições do Código de Menores só se aplicavam às crianças e adolescentes em situação irregular, aqueles que estivessem com situação regularizada seriam adotados nos moldes previstos pelo Código Civil de 1916, independente de autorização judicial. Porém, aos menores de até 18 (dezoito) anos em situação irregular, que fossem adotados pelo sistema da adoção simples, aplicavam-se as disposições do aludido código, mas era necessária autorização judicial e prévio estágio de convivência, que poderia ser dispensado no caso de a criança ter até 1 (um) ano de idade.14

A adoção plena, diferente da adoção simples, rompia todos os laços de sangue do menor com a família natural, inclusive lhe foi garantido o direito sucessório em relação à pessoa dos adotantes. A adoção plena era irrevogável. O assento de nascimento do adotado era cancelado, abrindo-se novo registro por meio de mandado, podendo ser modificado o seu prenome, passando a constar o nome dos adotantes e de seus ascendentes como se filho legítimo fosse. A adoção plena se revestia de caráter mais humanitário e do intuito de inserir o adotando, definitivamente, na nova família.

O estágio de convivência foi reduzido de 3 (três) para 1 (um) ano, se os adotantes fossem casados entre si, e de 5 (cinco) para 3 (três) anos se o adotante fosse viúvo ou viúva, desde que esse estágio tivesse se iniciado enquanto o outro cônjuge era vivo.

Os estrangeiros não domiciliados no Brasil foram autorizados a adotar, mas somente sob a modalidade da adoção simples. Conforme a lição de Eunice Ferreira Rodrigues Granato, essa foi a primeira legislação brasileira a tratar sobre esse assunto.15

A Constituição Federal de 1988, no parágrafo 6º, do artigo 227, igualou o direito de todos os filhos, estabelecendo:

Art. 227 [...]

§6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

_______________

14 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: Doutrina e Prática. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2010. p. 47 e 48. 15 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. ibidem. p. 48.

A norma constitucional trouxe grande discursão para a doutrina e para a jurisprudência pátrias, pois uns entendiam que a nova sistemática constitucional teria tornado inaplicáveis todas as regras relativas à adoção que existiam no Código de 1916, pois traziam clara distinção entre os filhos. Outros afirmavam que tais normas continuavam tendo eficácia nos casos de adoção de pessoas maiores de idade.

Pedro Sampaio foi enfático:

A adoção civil, assim chamada por estar prevista no Código Civil, sofreu profundas mutações com o advento da vigente Constituição Federal. A bem dizer, tal modalidade de adoção tornou-se inviável, face à nova sistemática constitucional, como chegamos a admitir nas edições anteriores deste trabalho.16

Contudo, a tendência da doutrina e da jurisprudência era de admitir que as disposições sobre a adoção que constavam no Código Civil não foram revogadas, mas persistiam nos casos de adoção de maiores de 18 (dezoito) anos.

Antônio Chaves demonstra argumentos convincentes sobre o assunto:

Os filhos adotivos, hoje, se igualam em tudo aos legítimos, inclusive quanto à qualificação, além dos direitos, não mais subsistindo a adoção simples do Código Civil, que poderia romper-se, voltando as partes ao estado anterior.

O raciocínio prevalece apenas com relação aos adotandos menores de 18 anos. (...)

E o caput do art. 227 diz com direitos fundamentais da criança e do adolescente. Assim os regramentos dos citados parágrafos regulam situações de crianças e adolescentes, vale dizer, menores.

Por outro lado, a lei ordinária, ao regular a adoção, o faz por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) que claramente só trata da adoção de menores, como decorre expressamente do seu art. 39. A adoção de maiores, por outra parte, não foi suprimida. Com isso, como se impõe modo para procedê-la, há que se concluir que será feita como determina o Código Civil em seu art. 375, isto é, por escritura pública.17

No ano de 1990 entrou em vigor o Estatuto da Criança e do Adolescente, que veio para regulamentar as novas disposições constitucionais pertinentes às crianças e aos adolescentes, pois a Constituição de 1988 destinou tratamento especial a essas pessoas, por isso se fazia necessária uma legislação que estivesse em sintonia com a nossa Lei Maior.

O Estatuto da Criança e do Adolescente regulamentou detalhadamente o tratamento a ser dado aos destinatários dessa legislação. As crianças e os adolescentes, que pela Constituição Federal passaram a ser sujeitos de direitos, agora são vislumbrados como pessoas em especial estado de desenvolvimento e por isso são merecedoras de acolhimento familiar e de proteção especial. Diante da nova ordem constitucional estabelecida e da _______________

16 SAMPAIO, 1991 apud GRANATO, 2010. p.50. 17 CHAVES, 1995 apud GRANATO, 2010. p.51.

vigência do ECA, as normas anteriores que tratavam sobre a adoção foram revogadas, assim o adotando passou a ser filho legítimo dos adotantes, sendo vedada qualquer discriminação relativa à filiação. (CF/88, art. 227, §6º)

A adoção passou a ser tratada sob o prisma do melhor interesse da criança e do adolescente, tornando-se um ato de amor ao próximo.

Recentemente a Lei 12.010/09 trouxe algumas inovações para o procedimento da adoção. Essas medidas destinam-se a garantir maior organização e segurança no funcionamento do sistema. O assunto será abordado em capítulo próprio.