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4. BREVE HISTÓRICO DO INSTITUTO DA ADOÇÃO

4.1. Na Antiguidade

Durante a Idade Antiga os ritos religiosos consagravam o culto familiar e os rituais fúnebres, acreditando-se que os mortos dependiam de seus descendentes para alcançarem a tranquilidade após a morte.

A religião só se propagava por meio das gerações, daí a preocupação em deixar descendentes para que perpetrassem o culto familiar e dedicassem ritos fúnebres a seus ancestrais. Para isso era fundamental ter filho do sexo masculino, pois a mulher ao se casar abandonava o culto doméstico de seu pai para seguir o do marido.

Nesse contexto, a adoção só era admitida a quem não tinha filhos e a sua função era livrar a família da desgraça de se findar sem que houvesse descendentes para continuar o seu culto e venerar seus ancestrais. Como se observa, a adoção não se dava em benefício do adotado, mas sim para servir aos interesses do adotante e aos ritos religiosos. Por meio dela os vínculos com a família de origem eram extintos, sendo substituído pelo vínculo do culto doméstico.

O Código de Hamurabi (1.728 – 1.686 a.C) já trazia alguns dispositivos sobre a adoção e dizia que os pais biológicos só podiam reclamar a devolução do filho caso o adotante tivesse um ofício e não o ensinasse ao adotado ou se este não fosse tratado como filho ou, ainda, se tiver sido renegado em favor dos filhos naturais. Interessante observar que nessa época já existia a preocupação de definir se os pais teriam ou não o direito de requerer a devolução do filho que deu em adoção. Ressalte-se que o filho adotivo tinha os mesmos direitos dos filhos naturais. E em caso de ingratidão do adotando, a adoção poderia ser revogada.1

A Bíblia, por sua vez, traz algumas indicações da existência da adoção entre os hebreus. Moisés, por exemplo, foi salvo das águas do Nilo e foi adotado pela filha do Faraó, Térmulus. O livro do Gênesis (16, 1-2) faz menção à história de Abraão e Sara que não podiam ter filhos, porque ela era estéril, mas consentiu que Abraão deitasse com uma das escravas para que fosse possível aquele casal criar um filho. Ora, o relato Bíblico se refere ao que atualmente denominamos de “barriga de aluguel”, situação que conduz a uma adoção. _______________

Eunice Ferreira Rodrigues Granato leciona que, “no Egito os jovens eram escolhidos na ‘Escola da Vida’ para serem adotados pelo Faraó, assim um deles poderia sucedê-lo no trono.”2

Em Atenas o instituto foi regulamentado com maiores detalhes, mas manteve a finalidade de evitar a extinção da família e de perpetuar o culto religioso, assim como em quase todas as sociedades antigas. Somente os cidadãos podiam ser adotados ou adotar, e poderiam fazê-lo por meio de testamento ou de ato solene perante o magistrado. O filho adotivo só poderia voltar para sua família natural se entregasse um filho seu à família adotiva, como forma de substituí-lo. A adoção podia ser revogada em caso de ingratidão do adotado.

Os hindus também conheceram a adoção, pois as Leis de Manu previa: “aquele a quem a natureza não deu filhos pode adotar um, para que as cerimônias fúnebres não cessem”. Ainda conforme essa codificação, a adoção era ato solene e o adotado deveria ser do sexo masculino, além de pertencer à mesma classe social dos adotantes e de saber a importância das cerimônias religiosas. Havia o desligamento da família biológica, passando a ser herdeiro da família que o adotou, mas se concorresse com filhos legítimos somente lhe caberia a sexta parte dos bens.3

Foi em Roma que a adoção mais se desenvolveu e foi utilizada. Segundo a lição de José Cretella Júnior:

Grande importância tem a adoção, entre os romanos, servindo, entre outras coisas, para dar herdeiros a quem não os tem, por motivos de família (continuação dos

sacra privata) ou políticos (assegura sucessor ao príncipe, como no caso de

Justiniano, adotado por Justino); para transformar plebeus em patrícios; para atribuir o jus civitas a um latino.4

A Lei das XII Tábuas definia dois tipos de adoção: a ad rogatio e a adoção propriamente dita. Ambas consistiam na colocação de alguém sob a patria potestas.

A ad rogatio era uma modalidade de adoção por meio da qual o pater familias faz entrar para a sua família outro pater familias, que será tratado com filho. Aplicava-se apenas aos homens. Conforme o ensinamento de Ebert Chamoun, o instituto tinha finalidade política, pois por meio dele se obtinham as horas e as magistraturas, além de possibilitar que o adotado migrasse da classe dos plebeus para a dos patrícios ou da classe dos patrícios para a dos plebeus, esta última situação possibilitava ao patrício ser o tribuno da plebe.5

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2 GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: Doutrina e Prática. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2010. p. 37. 3 SZNICK, 1993 apud GRANATO, 2010. p. 37.

4 CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de direito romano: o direito romano e o direito civil brasileiro. 16ª ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 125.

Para adotar através da ad rogatio era necessário que o adotante tivesse mais de sessenta anos e ser, pelo menos, dezoito anos mais velho que o adotado. Consistia na adoção de um pater familias por outro. A ad rogatio extinguia a família do ad-rogado, passando o adotado, seus descendentes e bens a submeterem-se a patria potestas do adotante em cuja família se integravam pela linha agnata.

Por ser medida demasiadamente gravosa e de importantes efeitos, a ad-rogatio somente se concretizava por força de lei. E para sua efetivação era necessária a concordância das partes interessadas e do povo. Dessa forma, o adotante era interrogado para saber se desejava ter como filho legítimo a pessoa que iria adotar e o adotando era consultado se aceitava que aquilo fosse feito, e ao povo era perguntado se ordenava que assim se fizesse.

Alguns imperadores romanos foram adotados por meio da ad rogatio, são exemplos disso, Scipião Emiliano, César Otaviano, Calígola, Tibério, Nero, Justiniano. No fim da República, Cláudio, para chegar ao tribunato, fez-se adotar por um plebeu, Galba adotou Pison, homem do povo, para que continuasse as tradições de seu governo.6

Já a adoptio ou adoção propriamente dita é a que mais se assemelha à concepção moderna do instituto. A adoptio trazia como requisitos subjetivos para a pessoa do adotante a obrigatoriedade de ser do sexo masculino, ser capaz de exercer os atos da vida civil, ser ao menos dezoito anos mais velho do que o adotando, e não possuir filhos legítimos ou adotados.

Importante diferença entre a adoptio e a ad-rogatio é que a primeira pertencia ao ramo do direito privado, a segunda, ao direito público. A adoptio poderia recair sobre mulheres, menores, estrangeiros, enquanto que a ad rogatio só se dava entre homens.

O procedimento para a concessão da adoptio seguia duas solenidades: o mancipium, que extinguia a patria potesta do pai natural, e a cessio in juri, que consistia na cessão de direito pura e simples em favor do adotante, que deveria ser realizada perante o pretor. Posteriormente, na época de Justiniano, passou-se a realizar somente a cessio in júri, além disso, o filius famílias também tinha que demonstrar sua adesão ao ato, nem que fosse tacitamente por meio do silêncio.

Na época de Justiniano, havia duas espécies de adoptio: a plena e a minus plena. Aquela tinha a finalidade de conceder patria potestas a quem não a tinha, porém somente entre membros da mesma família natural ou de sangue. A adoptio minus plena se caracterizava por manter os laços de parentesco do filho adotivo com sua família natural, _______________

6ALVIM, Eduardo Freitas. A evolução histórica do instituto da adoção. Disponível em: www.franca.unesp.br/A%20Evolucao%20historica%20do%20instituto.pdf Acesso em: 29.03.11.

ficando sob o pátrio poder de seu pai de sangue e permanecendo como sucessor do mesmo. No caso de falecimento do adotante, sem que tenha deixado testamento, o filho adotivo concorreria à sucessão.7

Observamos que o Direito Romano inaugurou uma série de procedimentos para esse instituto e o sistematizou. A importância da adoção para a sociedade romana estava, sobretudo, no seu papel político-religioso. Importante destacar que a disciplina dada pelo Direito Romano à adoção repercutiu em legislações posteriores, inclusive no Código Civil brasileiro de 1916, devido à riqueza de sua sistematização. De fato, a civilização romana foi o berço do direito positivado.