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A ocupação da Fazenda Ithayê aconteceu na madrugada do dia 20 de julho de 2002, com cerca de 600 famílias, que arregimentadas pelas possibilidades de conquistas de um “pedaço” de terra, prospecção de um futuro lar e vida comunitária, acampam nesta área, às margens do Km 27,5 da Rodovia Anhanguera para barrar o projeto de aterro sanitário.

A área dessa fazenda, que atualmente é a Comuna da Terra Irmã Alberta, está dividida em quatro núcleos de moradias, com mais ou menos 13 famílias em cada núcleo, localizados nas extremidades de toda a área, sendo que cada família ocupa um lote de 1,5 hectare.

As ocupações de terras são a forma como o MST inicia o processo de questionamento judicial para as áreas destinadas à Reforma Agrária, portanto rever as bases de êxodo rural e migração entre regiões, as condições de vida nos grandes centros urbanos e a questão do retorno ao campo, estimulando um processo de inserção dos sujeitos urbanos, que desejam retornar à terra para trabalhar e viver, apresenta-se como desafio principal para contrapor o latifúndio e concentração das terras.

O Movimento adentra a periferia com o trabalho de base para conhecer os sujeitos urbanos, que em maior número possui históricos familiares de origens, hábitos e costumes camponeses. Suas histórias de vida, as formas como vivenciaram a experiência de morar e trabalhar nas grandes cidades, foram fundamentais para desenhar uma proposta de vida comunitária, de produção com

o trabalho agrícola para os trabalhadores, que são expropriados, através do subemprego, precarização da mão de obra e trabalhos informais. Os conhecidos “bicos” geram, entre outras coisas, a desigualdade de ganhos e condições de vida para a maioria dos trabalhadores rurais do campo e das cidades, que em grande parte moram em casas precárias, localizadas em favelas, em áreas de risco, cortiços, albergues ou até nas ruas.

Esta nova concepção de assentamento (Comunas da Terra), baseia-se na organização de uma comunidade de produtores, que dinamizam o plantio de alimentos em pequenos módulos de terras e, portanto, criam as condições básicas para a geração de renda e trabalho às famílias, com a titulação coletiva da terra, impedindo a venda dos lotes, ou qualquer negócio envolvendo a conquista deste importante meio de produção e reprodução da vida que é a terra. Assim, as famílias que vivem nas Comunas são incentivadas a trabalhar, viver, pensar e decidir tudo coletivamente nas reuniões de núcleos, que encaminhadas à coordenação do assentamento, permitem o alinhamento com a direção regional e estadual do Movimento.

Originalmente, as famílias que compõem a Comuna da Terra Irmã Alberta possuem contextos e histórias de vida baseadas na pobreza, escassez e miséria, evocam um contexto permanente de desemprego e falta de oportunidades, ou mobilidade social, migrações desordenadas e resquícios do êxodo rural.

Nos organizamos a princípio à beira da estrada sem asfalto, sem luz e muito perigosa, mas com o passar dos anos, percebemos que o processo de regularização da área demoraria, assim, aos poucos os mais de mil barracos espalharam-se por todo o restante da área.

Após alguns meses na Comuna Irmã Alberta, algumas famílias seguiram a dinâmica do MST ocupando outras terras como a Comuna da Terra Dom Pedro Casaldáliga em Cajamar, Milton Santos e Elizabeth Teixeira, na região metropolitana de Campinas, entre outras áreas que foram ocupadas neste mesmo período entre 2002 e 2004.

Restaram 48 famílias, que mais tarde acolheriam as famílias despejadas no acampamento Carlos Pachin, na cidade de Itapevi e novos núcleos familiares que se formaram após a chegada à vida adulta dos jovens da Comuna.

O núcleo 1 possui oito casas que estão próximas à estrada principal, comércios e demais bairros da região; o núcleo 2 está localizado em frente ao

núcleo 1 e portanto do outro lado da estrada, é composto por 10 lotes, área de produção coletiva, área social, um teatro e um campo de futebol. Esta parte da Comuna da Terra Irmã Alberta está mais próxima à cidade de Cajamar. Os núcleos 3 e 4 estão no extremo sul da área, onde moram o restante dos moradores. Estes núcleos fazem divisa com bairros periféricos da cidade de Santana de Parnaíba (Morro da Mandioca e Colinas da Anhanguera). Os núcleos 3 e 4 são os espaços mais isolados e distantes do restante da Comunidade, mas possuem maior área de produção coletiva e cumprem um papel de extrema importância na demarcação da Comuna, evitando novas ocupações desordenadas, prevenção e vigilância contra incêndios criminosos e entre tantas questões organizativas e de controle sobre nossa Comunidade. Em síntese, os assentamentos do MST, são normalmente organizados por núcleos de moradias (conhecidos por lotes), que são as parcelas de terras destinadas à moradia, produção doméstica, criação de animais de pequeno porte, hortas e demais possibilidades da produção camponesa.

Figura 30 – Divisões por núcleos de famílias acampadas na Comuna da Terra Irmã Alberta

Fonte: Disponível em: googlemaps.com

A aliança entre as Comunas da Terra, as entidades sindicais, associações de moradores, outros movimentos populares urbanos e a comunidade do entorno, é fortalecida e renova-se a cada reivindicação, manifestação e protesto sob as pautas comuns a todos os moradores do bairro.

Núcleo 1

Núcleo 2

São inúmeras as reivindicações, como a extinção da praça de pedágio, ilegal por estar dentro do raio de 35 quilômetros do marco zero da capital25, sendo

que o bairro Chácara Maria Trindade localiza-se no Km 28 da Rodovia Anhanguera, ou seja, a praça de pedágio isola este bairro dos demais locais da cidade de São Paulo, além de dificultar o acesso aos equipamentos públicos de saúde, educação, lazer, cultura e arte.

Demais pautas incluem, por exemplo, a reabertura da escola municipal do bairro, fechada pela justificativa de “falta de demanda”, outra contradição, já que no bairro e seu entorno há considerável contingente de crianças e adolescentes em idade escolar.

A falácia sobre uma possível falta de demanda não se confirma, já que contabilizamos mais de mil crianças e adolescentes em idade escolar, que dependem do transporte público para ir até a escola.

Figura 31 – Divisão dos lotes no Núcleo 2 da Comuna da Terra Irmã Alberta

Fonte: Disponível em: googlemaps.com

Os argumentos utilizados como impedimento à reativação da escola do bairro Maria Trindade, revela o total descaso por parte da Diretoria de Ensino do

Município de São Paulo e, pelo fato de que os membros desta Diretoria sequer possuem dados sobre a quantidade de pessoas afetadas com o fechamento da escola, tampouco apresenta qualquer projeto para reativação da escola do bairro. Contudo para que a experiência das Comunas resulte positivamente como alternativa de moradia e produção agrícola próxima ao meio urbano, é necessário compreender as diversidades existentes entre os assentados, moradores dos bairros circunvizinhos, incentivando a unificação das lutas e projetos de desenvolvimento que seja favorável para todos e, portanto, aos lutadores da Comuna da Terra, assim como aos moradores do bairro Chácara Maria Trindade, já que estes possuem histórias de vidas similares, baseadas em falta de oportunidades para acessar estudos mais elevados, ou qualquer tipo de desenvolvimento social, econômico. De forma geral, essa parte da população paulistana reflete as mazelas da população brasileira, porque sofrem com a falta de emprego ou qualquer expectativa de melhorar as condições de vida, ao mesmo tempo que revelam desejos, sonhos, alicerçados pela esperança de um futuro melhor. Por tantas questões comuns, os moradores do bairro Chácara Maria Trindade, juntamente com os acampados da Comuna da Terra Irmã Alberta, buscam experiências coletivas de produção agroecológica de alimentos, manejo sustentável do assentamento, condições dignas de trabalho e moradia, com acesso às estruturas e políticas públicas como educação e saúde de qualidade, segurança pública, emprego, entre outros.

Esta dinâmica de integração, diálogo e articulação das comunidades do MST é um exemplo comum para organizar os trabalhadores de forma coletiva, a partir de dois objetivos complementares que são: viabilizar a conquista da terra, para em seguida dar um peso maior aos assentados em nível econômico; e como suporte ideológico o projeto socialista que atenda aos anseios maiores do movimento de uma maneira geral, ou seja, “uma experiência que desponta como uma forma superior de organização da produção” e articulação social, aproximando cada vez mais apoiadores, consumidores, ampliando os espaços de atuação para o fortalecimento da luta pela Reforma Agrária (MST, 1997).

Essas ações reforçam o caráter agregador das Comunas que, ao realizar atividades políticas, de ocupação de áreas, ações festivas e culturais, promovem a unificação das lutas encabeçadas pela classe trabalhadora. Ao passo que luta e festeja, promove o encontro entre inúmeros grupos de apoio à Reforma Agrária,

com os moradores do bairro e da Comuna, pensando saídas e soluções dos problemas de forma coletiva, participativa e dialógica.