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O MST tem como uma das principais bandeiras de luta, no contexto da Reforma Agrária, garantir espaços de educação básica para todos os acampados, assentados em seus espaços orgânicos, por isso mantém programas, projetos e formações permanentes e itinerantes para garantir momentos de reflexão e debates sobre temas diversos, mas principalmente aqueles que envolvem a Luta pela Terra.

Neste sentido, o MST é um Movimento de massas que busca implementar a política de Reforma Agrária de forma ampla em todo o Brasil através das ocupações de terras. Este Movimento Social está organizado em 24 estados brasileiros e completou 35 anos de fundação. Fez a opção pelo centralismo democrático desde sua fundação dentro de uma organicidade, em que divide tarefas e coordenações nos estados e regiões.

Para Freire (1997), o MST é a “marcha” que representa a participação popular na pauta política brasileira, o autor destaca a expansão da luta pelo Brasil,

pelas mobilizações e marchas, ou “andarilhagens históricas pelo mundo” e completa: “e os Sem Terra constituem pra mim hoje uma das expressões mais fortes da vida política e da vida cívica deste país”. Este Movimento Social/Popular de massa, que hora é descrito como radical, ao utilizar a ocupação de terras como estratégia de reivindicação das áreas públicas, devolutas ou decretadas por “improdutivas”, destinadas para fins de Reforma Agrária, em outros momentos, se une a tantas outras entidades e pautas para ocupar rodovias e avenidas em grandes marchas, como estratégia de visibilidade e pressão política para a efetivação de um sistema de educação público de qualidade, saúde, água, estradas, fornecimento de energia elétrica, entre tantas outras políticas públicas. Ao dedicar-se à sistematização da “pedagogia libertadora”, Freire explica que apenas os oprimidos podem compreender a necessidade de desvelamento da realidade e fundamenta os pressupostos da própria pedagogia quando, ao se definir como educador, explica que os movimentos populares são de fato capazes de pensar um projeto de sociedade. O potencial dos coletivos de educação popular apresentam importantes processos e resultados positivos no exercício da democracia e cidadania através da EJA, por isso mesmo a educação não é neutra, tampouco o processo de educação praticada pelos movimentos deve servir aos “opressores”, desta forma ganha o significado de ato político (FREIRE, 2005): “Pedagogia do Oprimido que, no fundo, é a pedagogia dos homens empenhando-se na luta por sua libertação”, exemplificando que são estes, “próprios oprimidos, que se saibam ou comecem criticamente a saber-se oprimidos, um dos seus sujeitos” (FREIRE, 1997, p. 40).

A educação praticada no MST se baseia muito mais em uma teoria do conhecimento do que de uma metodologia de ensino, direciona seu foco na formação humana, política e cidadã, colocando no centro do processo o próprio educando, como parte de um coletivo, provocando o debate sobre a realidade, levantamento dos problemas comuns, propondo soluções e estratégias de superação destes problemas. Para Freire (2002), é assim caracterizado o processo de transição entre a consciência ingênua à consciência crítica, da reflexão sobre a realidade e ação concreta, dispondo da teoria e da prática em um movimento constante e dialético (práxis).

Consideramos, portanto, que contribuir no fortalecimento da educação oferecida nas áreas da Reforma Agrária é um meio para o desenvolvimento dos

jovens e adultos e não um fim em si mesmo, como fica evidente principalmente na dinâmica dos acampamentos e assentamentos do MST.

É o encontro das pedagogias: de um lado as experiências educativas, formativas, culturais acontecendo nos territórios, ao passo que as pedagogias do MST fervilham no dia a dia do MST-Escola, quando homens, mulheres, idosos e crianças são os sujeitos no processo de libertação da terra e de si mesmos. Este tipo de formação escolar vinculada à luta e organização popular praticada pelo MST oportuniza, incentiva e fomenta, acima de tudo, a emancipação humana, acompanhado de um movimento dialético de planejamento-ação-avaliação, construindo uma identidade coletiva do “Ser Sem Terra”, ser e estar em luta por terra, marca um posicionamento perante o mundo e a história.

O processo de ensino do MST é resultado da união entre as pedagogias freirianas e a pedagogia própria do MST. A trajetória da educação no MST reflete o alinhamento ao aporte teórico-metodológico da Pedagogia Histórico Crítica fortemente influenciada pelo marxismo e obras de Paulo Freire, no entanto está em sintonia com o caráter revolucionário e dialético de uma pedagogia própria da luta, do fazer cotidiano da luta, aproximando a ilusória dicotomia entre prática e teoria, quando o conhecimento não se estabelece apenas a partir de livros, mas na relação dialética e dialógica entre sujeitos.

4.1 Educação Popular e MST

A influência da pedagogia freiriana sobre a pedagogia do MST impulsiona inovações e experimentos da educação popular, dos oprimidos, sobre a luta proletária, dos desgarrados da terra, com o viés político, socialista e crítico nas atividades formativas do Movimento. A estratégia é contrapor as tendências conservadoras que permeiam o sistema de ensino.

A maior parte das instituições de ensino, de cunho tradicional, que insistem em métodos e conteúdos arcaicos, não acompanham as dinâmicas de cada tempo histórico e, portanto, não atendem as demandas da classe trabalhadora que vive, trabalha e participa das mudanças.

No caso do ensino escolar percebemos a falta de inovações, dinamismo dialógico-dialético no processo de ensino-aprendizagem para as classes oprimidas. Por essas e tantas outras razões, é necessário desenvolver alternativas para a

construção do pensamento crítico, promovendo a ruptura do imobilismo social, compreendendo a educação como ato político de fato, sendo a tarefa dos movimentos sociais, a defesa de um projeto que vá de encontro às necessidades da classe trabalhadora, que “vincula organicamente com os processos sociais que visam à transformação da sociedade atual” (MST, 1999, p. 6).

Começamos, então, por compreender a educação popular como parte do processo de formação que se pauta nas demandas locais, como princípio para o estímulo do desenvolvimento da consciência crítica de cada indivíduo, abrangendo a coletividade, a fim de despertar o grupo para a condição de opressão, oferecendo subsídios teóricos e práticos para transformar a sociedade. (LIBÂNEO; PIMENTA, 2002).

Os autores Arroyo (2003); Libâneo (2008) e Gohn (2006), ao discutirem sobre a temática “Educação, Movimentos sociais e práticas educativas não escolares no Brasil”, contribuem no sentido de descrever os processos da educação nos movimentos populares como parte de um posicionamento político-pedagógico, a partir da prática de ensino em diálogo com a realidade vivenciada pelos próprios sujeitos do processo.

A metodologia de ensino pauta os saberes já construídos pelos coletivos, comunidades do campo e das cidades. Este tipo de processo educativo une teorias e experiências descritas nas obras de Paulo Freire, nos relatos reflexivos e referências de processos pedagógicos para as classes populares, para as comunidades pobres e/ou marginalizadas, promovendo a construção da consciência crítica para a liberdade. Esta prática de ensino se baseia no conhecimento da comunidade e, de modo geral, tende a transformar a realidade ao passo que homens e mulheres assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo, tornando-os anunciadores/as e denunciadores/as das mazelas e necessidades, vivenciadas em seu meio social.

Neste mesmo sentido, este tipo de educação faz uma releitura sobre as tradições culturais, assimilando, ressignificando ou simplesmente preservando algumas tradições da nossa cultura do povo, no sentido de inserir as concepções freirianas sobre uma educação que ao se constituir enquanto crítica, emancipadora, em prol da liberdade, traz consigo as marcas da cultura popular por ser dinâmica, dialógica e dialética.

A educação do campo é a educação popular em sua essência, mas segue uma diretriz própria, que associa trabalho no campo como princípio pedagógico no processo produtivo e educativo, prima não só pelo acesso e pertença à escola, mas principalmente à permanência e participação do educando no planejamento, execução e avaliação dos espaços educativos dentro e fora das escolas do campo.

Compreendemos a educação do campo muito ligada aos princípios freirianos de engajamento sociopolítico, ao mesmo tempo em que a formação omnilateral segue a lógica dos eixos das ações interdisciplinares sobre Gestão e Práticas Pedagógicas, Formação Inicial e Continuada de Professores, Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional e planejamento sobre Infraestrutura Física e Tecnológica. Tem como proposta promover a cultura popular, trabalhar e respeitar os saberes das comunidades camponesas e o debate coletivo como princípio organizativo, espaço formativo e o fortalecimento da identidade dos sujeitos, principalmente os sujeitos do campo.