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Na abordagem feita no segundo capítulo deste trabalho, em que foram explanados os pressupostos recursais, contemplou-se o requisito de admissibilidade da adequação (ou cabimento), que se consubstancia na utilização, pelo recorrente, do recurso adequado à situação jurídica em que se encontra.

Nesse momento, buscar-se-á enfatizar as hipóteses de cabimento do recurso extraordinário, todas previstas na Constituição Federal, no artigo 102, inciso III, alíneas “a”, “b”, “c” e “d”.

Nos termos da alínea “a”, do inciso III, do artigo 102, da Magna Carta, cabe recurso extraordinário das decisões proferidas em contrariedade a dispositivo constitucional.

Parece sutil e direta a mencionada disposição constitucional, da qual se compreende, basicamente, o cabimento do recurso em testilha sempre que houver afronta a uma norma prevista na Constituição. Existem, contudo, algumas peculiaridades trazidas pela doutrina.

Nos dizeres de Shimura, Alvarez e Silva (2013, p. 360):

A ofensa à norma constitucional tem que ser direta, não se admite o recurso extraordinário com fundamento na alínea a, do inciso III, do art. 102, quando a violação for apenas indireta, em outras palavras, a decisão impugnada afronta diretamente uma norma ordinária e indiretamente a Constituição Federal, é fundamental, necessário, para o cabimento do recurso extraordinário, que a violação seja direta à Constituição, e não reflexa.

Assim, conforme explanado pelos autores, a primeira consideração verificada é a necessidade de a afronta ser direta, isto é, constatada no bojo da própria constituição, e não na legislação infraconstitucional.

Além disso, é comezinho salientar, que, embora não haja previsão expressa no texto constitucional, entende-se que tal dispositivo se aplica aos casos de negativa de vigência da Constituição da República.

A despeito, Gonçalves (2017, p. 350) preconiza que o dispositivo constitucional “Não se faz alusão [...] à negativa de vigência, que está́ abrangida pela contrariedade”.

Conclui-se, nesse diapasão, que a primeira hipótese de cabimento do recurso extraordinário dá-se nas situações em que a decisão proferida contraria dispositivo constitucional, sendo que, em tais casos, a violação deve ser direta ou frontal e se opera, embora omissa a redação contida na alínea “a”, nos casos de negativa de vigência da Constituição.

Estabelece a alínea “b”, do inciso III, do artigo 102, da Magna Carta, que é cabível recurso extraordinário das decisões que declaram a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal.

Segundo Gonçalves (2017, p. 351), “Consiste em meio pelo qual o STF efetiva o controle difuso de constitucionalidade de lei federal ou tratado.”

Na mesma senda, assevera Neves (2016, p. 1631) que a hipótese apontada no referido dispositivo é a análise da constitucionalidade no arcabouço do controle incidental de constitucionalidade, o que se opera através da via recursal.

Nesse interstício, discorre Montenegro Filho (2014, p. 184):

A declaração de inconstitucionalidade que emana do tribunal local não produz efeitos erga omnes, para promover a invalidação e a garantia da não aplicação da lei ou do ato normativo relativamente a processos que envolvam qualquer pessoa física ou jurídica, sendo limitada às partes da ação ou do processo afeto à competência do tribunal local (declaração incidenter tantum), do qual a arguição da inconstitucionalidade se originou.

É visível, pois, que ao dispor sobre o cabimento do recurso excepcional nos casos de decisões que declaram a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, trata-se de hipótese em que o Supremo realiza o controle de constitucionalidade pela via difusa.

Mostra-se razoável incumbir ao órgão de mais alto escalão do judiciário nacional, com prerrogativa de guarda da Constituição, a decisão final, pela via recursal, acerca da inconstitucionalidade de determinada norma ou tratado.

Conforme Shimura, Alvarez e Silva (2013, p. 360) “Não cabe o recurso extraordinário nessa hipótese se a decisão declarou a constitucionalidade, mas tão somente se declarar a inconstitucionalidade de lei federal ou tratado”.

A título de adendo, o artigo 97 da Constituição Federal, ao estipular a competência dos tribunais, estabelece que:

Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.

Sendo assim, é possível concluir que a situação de cabimento acostada na alínea “b”, do inciso III, do artigo 102, da Constituição da República, exige que a decisão prolatada tenha declarado a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, sendo uma

nítida manifestação da atuação do Supremo Tribunal Federal em controle incidental de constitucionalidade, não havendo a possibilidade de utilização do recurso extraordinário, nos casos em que a decisão declara constitucional a norma ou tratado.

3.3.3. Decisão que julga válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição e decisão que julga válida lei local em face de lei federal

Na forma da alínea “c”, do inciso III, do artigo 102, da Magna Carta, o recurso extraordinário é cabível contra as decisões que julgarem válida lei ou ato de governo local contestado em face da Constituição Federal.

A alínea “d”, por sua vez, dispõe acerca do cabimento do remédio excepcional nos casos em que a decisão impugnada julgar válida lei local em face de lei federal.

Bueno (2015, p. 642) enfatiza que:

[...] o que está em discussão é, antes de tudo, a repartição constitucional das competências (os arts. 22, 24 e 30 da CF, principalmente) e, portanto, o que se quer definir é qual ente federado tem, por causa da CF, competência para legislar sobre o quê.

É ululante que nesses dois casos, houve uma preocupação do constituinte em assegurar a competência atribuída na própria Carta Política, pelo que, a temática tem relevância constitucional.

Assim, abordadas as situações de cabimento do recurso extraordinário, dar-se-á sequência à presente pesquisa, passando-se à abordagem dos efeitos do recurso extraordinário.