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Tratando agora dos dados para o estudo empírico desta pesquisa, os mesmos foram obtidos a partir de uma amostragem de três escolas de Ensino Médio Regular Noturno, da Rede Pública Estadual do Estado do Espírito Santo, no município de Serra. Como os diretores das unidades de ensino colocaram como condição para o desenvolvimento da pesquisa a NÃO divulgação dos nomes e de imagens das mesmas, as identificamos aqui como Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM) A, B e C.

10 Criada em 1999, a Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE) é uma entidade que busca de

congregar professores/as e pesquisadores/as brasileiros/as que desenvolvem atividades de ensino e pesquisa na área, de forma a estimular a realização de estudos pautados pela crítica e pela pluralidade teórica, bem como promover o intercâmbio com outras entidades de representação nacional e internacional no campo da história da educação e áreas afins. Nesta perspectiva, um dos espaços desenhados para a divulgação e o intercâmbio de conhecimentos produzidos no campo tem sido o Congresso Brasileiro de História da Educação (CBHE), que se realiza, desde o ano 2000, buscando manter uma periodicidade bianual para este evento. Sua última edição ocorreu entre os dias 15 a 18 de Agosto de 2017 na cidade de João Pessoa na Paraíba. Fonte: http://www.ixcbhe.com.

A escolha das escolas ocorreu em virtude de as mesmas ainda possuírem o Ensino Médio Regular Noturno da primeira à terceira série, haja vista que há, por parte da Secretaria Estadual de Educação do Estado do Espírito Santo, um movimento para a redução deste segmento de ensino no turno noturno, priorizando a Educação de Jovens e Adultos (EJA). Além disso, as unidades de ensino supramencionadas estão localizadas em bairros onde os indicadores socioeconômicos são muitos distintos, conforme apontaremos em 4.4 - Sobre as

unidades de ensino e os sujeitos participantes da pesquisa.

Os sujeitos protagonistas nesta pesquisa são três professores de História em suas práticas cotidianas. A participação desses docentes na pesquisa foi confirmada por “Termo de

consentimento livre e esclarecimento” (conforme Apêndice F). Aos mesmos foram aplicadas

entrevistas semiestruturadas (Apêndice E), ainda no início do trabalho de campo, que foram devidamente gravadas e transcritas, um breve questionário (Apêndice H), que se restringiu a obter maiores detalhamentos de sua formação acadêmica e experiência profissional, e principalmente, acompanhamento de sua rotina de trabalho, seja na sala de aula, nos momentos de planejamento ou em outras situações de interação no espaço escolar como, por exemplo, a hora do recreio. Os registros desses acompanhamentos foram feitos em nosso diário de campo.

Desenvolvemos também a análise de documentos que se relacionam com a práxis dos docentes tais como: Parâmetros Nacionais Curriculares (PCNs) para o Ensino Médio (BRASIL, 1997; 2000), Diretrizes Curriculares Nacionais (DCM) (BRASIL, 1998; 2012), livros didáticos11, cadernos dos alunos, registros de planejamentos (Plano de Ensino), Projeto Político Pedagógico (PPP), também chamados na rede estadual de Proposta Pedagógica ou Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) - [a proposta pedagógica da EEEFM A foi atualizada em 2015, a da EEEFM B em 2012 e o PDI, da EEFM C, em 2016] e Currículo Base da Escola Estadual (ESPÍRITO SANTO [ESTADO], 2009).

No acompanhamento do cotidiano desses profissionais em suas práticas docentes referentes ao ensino de História dentro das escolas, foi tomada como base metodológica a observação participante. Schimdt (2006, p.14) destaca que “o termo participante sugere a controversa inserção de um pesquisador num campo de investigação formado pela vida social e cultural de um outro, próximo ou distante, que, por sua vez, é convocado a participar da investigação na qualidade de informante, colaborador ou interlocutor”. Acrescenta a autora,

11 Não detalhamos aqui a data dos livros Didáticos pois cada escola analisada trabalha com uma coleção de

Livros Didáticos diferente e em duas delas o professore utilizava livros variados. Além disso, nessa pesquisa não tratamos da análise específica desse material, mas a influência desse instrumento sobre a prática dos professores participantes do estudo, conforme apresentamos no item 6 desta dissertação.

que observação participante, relaciona-se a uma forma de pesquisa na qual existe a interação direta entre pesquisador e sujeitos participantes da pesquisa, que tem como foco captar elementos que só se manifestam com naturalidade, quando há a inserção do estudioso na realidade estudada, na medida em que ele passa a ser identificado como parte da mesma.

Gil (2008) pontua que a pesquisa participante, assim como a pesquisa-ação, tem suas bases na etnografia e se caracteriza por um envolvimento entre pesquisadores e pesquisados no desenvolvimento do processo de pesquisa. Afirma também que essa metodologia surgiu da iniciativa de pesquisadores sociais de superar os modelos fechados estabelecidos pela lógica empírica clássica de bases positivas, nos pressupostos de Conte e Durkheim12, não concebendo a realidade social como algo fixo. Nessa lógica de dinamismo da realidade, propõem-se o conceito de relatividade observacional, no qual o observador e os instrumentos por ele elencados para seu trabalho têm um papel ativo e não estático na obtenção, análise e interpretação dos dados. Para isso é indissociável uma postura dialética frente à ação da pesquisa, procurando apreender os fenômenos históricos que são identificados pelo devir ser, enfatizando o lado conflituoso da realidade social.

Sobre essa questão dialética, Demo (1982), esclarece que ela é caracterizada profundamente pela ideia de que toda formação social,

[...] é suficientemente contraditória, para ser historicamente superável. Embora nem todas aceitem isto, serve como ponto de partida. Privilegia-se na realidade seu lado conflituoso, não como defeito, mas como característica histórica natural. No fundo, entende-se o histórico como conflituoso. A superação histórica é um fenômeno natural, porque predominam conflitos, não somente conflitos de menor porte, mas igualmente conflitos que não conseguimos resolver e que decretam o término de um sistema dado. Tais contradições não são extrínsecas, embora as possa haver; são intrínsecas. (DEMO, 1982, p. 68)

Dessa forma, a relação entre pesquisador e pesquisado não é concebida como simples observação do primeiro pelo segundo, mas ambos "acabam se identificando, sobretudo quando os objetos são sujeitos sociais também, o que permite desfazer a ideia de objeto que caberia somente em ciências naturais" (DEMO, 1984, p. 115).

Entendemos que essa identificação mencionada por Demo (1984) é de fundamental importância para o estudo proposto nessa dissertação, pois através dela as minúcias desenvolvidas pelos profissionais participantes do estudo em suas práticas se tornaram mais perceptíveis.

12 Emile Durkheim (1858-1917), um dos pioneiros da investigação científica nas Ciências Sociais, estabeleceu em As regras do método sociológico que a primeira e mais fundamental regra para o sociólogo é tratar os fatos sociais como coisas, que deveriam ser analisadas imparcialmente e quantificadas. Conforme destaca Gil (2008), trata-se de clara tentativa de adotar nas ciências sociais procedimentos semelhantes aos das ciências naturais, plenamente consoantes com a doutrina positivista.

Outra característica pertinente à pesquisa participante que justifica a sua escolha para este estudo é a flexibilidade que a mesma possui. Prodanov e Freitas (2013) destacam que mesmo existindo alguns direcionamentos metodológicos norteadores, tais como a determinação da base teórica do estudo a ser desenvolvido, delimitação das técnicas para a coleta de dados e da região a ser estudada, elaboração de cronograma de atividades, a pesquisa participante não possui rigidez. A adaptabilidade a diversas situações e contextos que podem surgir ao longo da pesquisa devem ser tônicas dela mesma, dado que, no decorrer do processo de acompanhamento da realidade estudada, problemas e situações antes não pensadas podem vir à tona.

Destacamos ao nosso leitor que realizamos o acompanhamento do trabalho dos sujeitos participantes dessa pesquisa em suas unidades de ensino entre os meses de fevereiro a junho de 2018. É importante ressaltar, também, que, seguindo o Artigo III, alínea “i”, da Resolução 466/2012, que regulamenta as pesquisas que envolvam a participação humana, não divulgaremos aqui os nomes dos sujeitos participantes desse estudo. Além disso, os próprios docentes colocaram essa mesma exigência como condição indispensável para a participação nessa pesquisa. Dessa forma, estabelecemos as seguintes classificações. Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio – EEEFM A – docente 1. EEEFM B - docente 2. EEEFM C – docente 3. Ressaltamos, por fim, que estamos utilizando os termos no masculino, tais como docente, para nos referirmos aos sujeitos de nossa pesquisa independentemente deles serem professores ou professoras. Optamos por este caminho sem nenhuma predileção ou inferiorização de gênero, apenas para facilitar a escrita, evitando termos tais como o (a) docente ou o (a) professor (a), o aluno (a) que repetidos muitas vezes tornam mais cansativa a leitura.

Na observação participante que desenvolvemos, seguindo as orientações de Thiollent (1983) para observar fatos, comportamentos e situações que não surgiriam ou seriam alterados na presença de elementos considerados estranhos, buscamos nos inserir de forma espontânea na rotina desses profissionais e dos educandos com a qual convivemos, para nos tornarmos, dentro do possível, o mais familiar a eles. Pudemos vivenciar o trabalho desenvolvido ao longo de um trimestre letivo inteiro desses sujeitos. Nosso objetivo foi captar, com maiores detalhamentos, suas práticas cotidianas relacionadas ao ensino de História, para analisá-las com profundidade. Não tivemos o propósito, no entanto, de desenvolver ações de intervenção para modificar tais práticas.

Para diminuir a estranheza recíproca entre pesquisador e participantes, busquei sempre o diálogo franco e respeitoso com os mesmos construindo relações de horizontalidade com os

professores. Colocava-me mais como um docente de História da educação básica, que tinha vivência dos sabores e dessabores da profissão, do que necessariamente como um mestrando (pesquisador). Enfatizava sempre que meu objetivo ali era entender melhor o ensino de História praticado e não estabelecer julgamento sobre o trabalho de ninguém. Ao longo da pesquisa conversávamos muito sobre os problemas cotidianos, os desafios de se ensinar História e das expectativas em relação à carreira. Socializamos materiais de trabalho tais como atividades, avaliações e textos. Auxiliava em atividades burocráticas, tais como fechamento de pautas e correção de atividades. Em algumas situações, assumi a condução de turmas para que o professor pudesse resolver algumas demandas emergenciais que surgiam na escola.

Com os alunos, os mais inquietos com minha presença nas aulas no início do trabalho de campo, mesmo tendo sido apresentado em cada turma pelos professores, fui me aproximando de forma bem tranquila. Oferecia ajuda na realização de atividades, participava de momentos de diálogo que surgiam esporadicamente, esclarecia perguntas daqueles que me arguiam por não ter entendido bem quem eu era e meu propósito em sua sala. Para muitos deles eu era um universitário me formando para ser professor. O fato é que em alguns dias eu percebia que minha presença ali já não mais os inquietava tanto. Com o passar do tempo os educandos não se constrangiam em conversar uns com os outros durante as aulas mesmo eu estando ao lado deles. Tampouco se inibiam de fazer provocações ou brincadeiras, entre si.

Cheguei a receber alguns títulos no mínimo curiosos dentro das unidades de ensino por parte de profissionais (professores de outras áreas, pedagogos e coordenadores) e alunos das mesmas. Na EEEFM A, tornei-me o estagiário do professor de História. Na EEEFM B, o cara da pesquisa. Na EEEFM C, o tio das aulas de História.

Partindo para o encerramento dessa apresentação, esclarecemos que esta dissertação está estruturada em cinco Capítulos.

No primeiro capítulo, partindo do pressuposto que é impossível pensar o ensino de História na Educação básica sem relacioná-lo com as mudanças ocorridas na Historiografia, realizamos um breve sobrevoo referente à construção da História enquanto campo de saber científico, pontuando mudanças observadas na forma de pensar a produção de conhecimento histórico a partir das correntes historiográficas desenvolvidas entre os séculos XIX e XX.

No segundo capítulo discorremos sobre a História ensinada, buscando evidenciar um pouco de sua História, destacando seu surgimento enquanto disciplina escolar, sua estruturação e alguns objetivos postulados a ela ao longo do tempo, com ênfase no contexto brasileiro. Além disso, procuramos apontar algumas influências que diferentes correntes

historiográficas tiveram sobre a História ensinada no âmbito da educação básica, especialmente no Ensino Médio.

No terceiro capítulo abordamos o Ensino Médio Regular tratando um pouco de sua realidade atual no âmbito nacional e estadual, bem como das particularidades dessa modalidade de ensino no turno noturno. Nele tratamos também do nosso objeto de pesquisa, fazendo uma apresentação dos docentes participantes do estudo, das escolas onde eles estão inseridos e das características do município que estas unidades de ensino se localizam.

No quarto capítulo realizamos uma discussão referente aos documentos curriculares oficiais para o Ensino de História no Ensino Médio, PCNs, DCN e Currículo Base da Escola Estadual analisando, nesses documentos, as propostas apresentadas para o ensino da disciplina de História e a proximidade destes com as diferentes vertentes da historiografia.

No quinto capítulo nos remetemos especificamente à análise das práticas dos professores de História participantes do estudo, buscando apontar as relações que eles estabelecem com a proposta curricular oficial estadual em seu cotidiano de trabalho: as apropriações que eles possuem frente às questões pertinentes à História Acadêmica e a Ensinada e como estas permeiam suas ações docentes, seu posicionamento em relação às diferentes formas de produção e transmissão de conhecimento histórico advindos das diferentes vertentes historiográficas e a influência do livro didático na ensino de História proposto aos educandos por estes profissionais.