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3. A EXPERIENCIA E A INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA NO ENSINO

3.4. Praxis docente

3.4.4. Caminhos possíveis para a avaliação: escolhas e desafios

Reconhecendo o papel que os agentes educativos e os públicos escolares têm, bem como os curricula, no projeto de transformação das relações sociais (McCarthy, 1994), a visão crítica de currículo associa-o à noção de projeto, tendo em conta os contextos onde este se constrói e desenvolve. Reconhece o papel dos agentes nos processos de dinâmica social e cultural (Peréz Gómez, 1998; Gimeno Sacristán, 2000; Pacheco, 2001). Os princípios e as intenções que orientaram o plano curricular são elucidados de forma flexível, à semelhança dos processos e critérios previstos para a sua concretização. Esta planificação evoluiu durante o seu desenvolvimento, em espaço pedagógico, como resultado do trabalho em comunhão com a investigação e a reflexão sobre os seus pressupostos (Eisner, 1979; Elliot, 1978, 1993; Stenhouse, 1984, 1987; Kemmis, 1986 citados por Leite, 2002). Neste sentido, o currículo constrói-se à medida que se vai desenvolvendo, demarcando-se do determinismo e orientando-se para perceções da instituição escolar como espaço social de relações e de desenvolvimento de participações legítimas e plurais. Este posicionamento teórico assume caraterísticas dos modelos de investigação-ação, sendo os resultados obtidos, dessa investigação, aplicados na operacionalização de processos de intervenção pedagógica, como este que aqui se relata e que deu origem a um produto final avaliado por uma entidade externa – professores participantes no projeto Nós Propomos – que lhe atribuiu um prémio.

É imprescindível conceber uma Escola que interaja com o exterior e eduque em cidadania (Reis, 2002). Logo, é necessário desenvolver ações: (1) junto dos professores, perspetivando a valorização da interdisciplinaridade; (2) com os públicos escolares, promovendo a solidariedade, a autonomia e a responsabilidade; e (3) incluindo os encarregados de educação, no sentido de motivar para a necessidade da sua participação na vida escolar. É preciso a colaboração, acompanhamento (monitorização), dinamização e avaliação, definindo objetivos, metas e concebendo tarefas a propor aos alunos que permitam atingi-los. Pretende-se, portanto, que os professores, perante a heterogeneidade dos públicos, assumam uma posição de respeito pela diferença e fomentem os direitos de cidadania, tais como a justiça social, solidariedade e respeito mútuo (Araújo, 2008). Para alcançar estas finalidades, dever- se-ão desenvolver práticas adequadas à diversidade e conceber o pluralismo como fator de enriquecimento para os processos de ensino e de aprendizagem.

Num modelo de desenvolvimento curricular centrado no processo (Pacheco, 2001), o currículo é perspetivado como um projeto, privilegiando-se a resolução de questões práticas. Os professores desempenham um papel central no âmbito das decisões curriculares, assumindo-se como construtores do currículo e não como meros executores, uma vez que lhes compete, de forma autónoma, adaptar o currículo nacional à situação específica das instituições e dos públicos escolares, sendo-lhe proporcionada, também, liberdade para elaborar e adaptar materiais (Pacheco, 2001). A avaliação, no modelo centrado no processo, segundo Stenhouse (1991), não tem que ver com uma mera função quantitativa. Deve ser encarada como um instrumento de melhoria das aprendizagens, remetendo para os professores o desempenho de um papel de críticos e não apenas de classificadores. Por isso mesmo, o feedback fornecido aos alunos em etapas intermédias, a avaliação qualitativa e faseada, o carater formativo e autorregulador da avaliação, devem ser aspetos privilegiados quando se pretende promover o aprender a aprender, ou seja, a autonomia e a autorresponsabilização dos alunos em relação aos seus processos de aprendizagem (Courela & César, 2012).

Assim, a avaliação é associada a um processo formativo, que ajuda a identificar dificuldades e, simultaneamente, a encontrar caminhos para as ultrapassar. A afirmação de que a avaliação «não existe, pois, de um modo isolado nem tão pouco é um processo neutro» (Leite & Fernandes, 2002, p. 11), encerra em si o assumir de que é necessário um esforço no sentido de trabalhar o processo avaliativo de um modo inovador, mostrando que este é capaz de auxiliar os destinatários na mobilização dos conhecimentos, contribuindo para a aprendizagem. Mais do que uma avaliação- sanção, trata-se de uma avaliação que contribui para uma autorregulação dos processos de aprendizagem (Cortesão, 1993). Nesta perspetiva, a avaliação assume-se como formativa e tem um caráter próprio, manifestando-se de forma qualitativa e apresentando, também, uma vertente diagnóstica.

A avaliação formativa é, pois, uma concepção da avaliação que visa, sobretudo, uma melhoria dos processos de aprendizagem. Neste sentido, pressupõe um conjunto de práticas variadas, recorrendo a diversos instrumentos de avaliação, orais e escritos, individuais e em grupo, que sejam coerentes e sustentem os próprios processos de ensino e de aprendizagem. Devem contribuir para que os públicos escolares se apropriem das aprendizagens curricularmente estabelecidas como importantes (Cortesão, 1993). Por conseguinte, a avaliação formativa pressupõe uma avaliação diagnóstica dos pontos de partida e das situações relativas aos processos que conduzem

à aprendizagem (Fernandes, 2005). Subjacente a esta modalidade de avaliação, surge a noção de avaliação formadora que, não pondo em causa os pressupostos da avaliação formativa, define mais objetivamente os papéis dos principais intervenientes no processo avaliativo (Fernandes, 1997). O papel atribuído à autoavaliação é central (Perrenoud, 1998a), de maneira a que a apropriação dos critérios de avaliação e dos objetivos estabelecidos se constituem como fundamentais neste processo.

Acredita-se, portanto, que se não for restringida a educação formal, nomeadamente em contexto escolar, à dimensão da instrução e se se seguir uma linha ampla no que se refere aos aspetos do desenvolvimento pessoal e social, sustentada não apenas no saber e no saber-fazer mas, sobretudo, no saber-ser para o saber- tornar-se (Reboul, 1980), se promove, nos alunos, uma participação legítima, ao invés de uma posição periférica. Assim, compreender-se-á a importância de opções educativas baseadas na construção social interativa (Delors, 1996), sobretudo se baseadas no trabalho colaborativo, aquele que mais promove a autorresponsabilização e a autonomia, como se viu nesta intervenção pedagógica. Foi nítido como alunos com diversas retenções em anos anteriores, que não cumpriam horários, que se ausentavam a meio dos tempos letivos, se empenharam em trabalhos autónomos e realizados em horas extracurriculares. Fotografaram, elaboraram sínteses, reuniram-se em grupo para decidirem o que enviavam por e-mail, produziram um trabalho de projeto digno de um prémio atribuído por uma entidade externa. Se, em apenas meia dúzia de aulas, foi possível fazer algo semelhante, o que não se conseguiria se a Escola funcionasse de forma mais colaborativa, desenvolvendo trabalhos de projeto com mais sentido para os alunos, as famílias e a comunidade exterior à escola? O processo de avaliação, quer das práticas quer das aprendizagens realizadas pelos alunos, contribuiu para este sucesso, que é possível considerar simultaneamente escolar – na disciplina de Geografia e no prosseguimento de estudo, que não estava anteriormente previsto – e social – através do prémio recebido, da sessão em que participaram na Reitoria da Universidade de Lisboa e na capacidade de intervenção que ganharam, na comunidade.