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3. A EXPERIENCIA E A INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA NO ENSINO

3.4. Praxis docente

3.4.1. Observação e recolha de dados

A observação consiste na recolha de dados sobre o espaço que nos rodeia (Adler & Adler, 1994). Permite ao observador/investigador olhar para a realidade diretamente e, por isso, não toma contacto com os acontecimentos em segundo plano (Patton, 1990). Deste modo, é possibilitada uma proximidade ao objeto de estudo (Merriam, 1988), no respetivo cenário e no momento exato do seu acontecimento. Segundo a tipologia proposta por Adler e Adler (1994), as modalidades de observação podem ser três: (i) o investigador que é membro pleno (complete-member-researcher), estuda as situações que envolvem os que pertencem ao grupo; (ii) o investigador que é membro ativo (active-member- researcher), envolve-se nas atividades centrais do grupo assumindo responsabilidades para que este progrida, mas não se compromete com os valores e os objetivos; (iii) o investigador que é membro periférico (peripherical-member-researcher) observa e interage de um modo próximo com os membros, mas não participa nas atividades.

Atendendo a esta tipologia, é possível afirmar que o candidato a Professor, consoante o contexto, recorreu às diferentes modalidades apresentadas. Assim sendo, assumiu um papel de investigador membro pleno quando concretizou a sua intervenção pedagógica; ao realizar a visita de estudo inicial adotou o papel de investigador ativo; e funcionou como investigador periférico ao descrever as situações, em espaço pedagógico, sem que delas tivesse participado diretamente (por exemplo, nas primeiras aulas observadas).

No sentido de compreender as dinâmicas da turma, onde foi implementada a intervenção pedagógica, foi necessário proceder a algumas observações prévias. Pretendeu-se, com estas observações, conhecer a dinâmica relacional entre professor e alunos (pois estas funções foram assumidas no âmbito da Prática Supervisionada de Ensino), assim como, conhecer as atividades que o conjunto desenvolvia. Esta recolha de dados permitiu contextualizar a intervenção pedagógica. Neste sentido, e pela importância de que se revestiram estas observações prévias, apresenta-se uma descrição sumária, de um conjunto de três aulas, que antecederam a intervenção do candidato a Professor.

Observação n.º 1 Disciplina: Geografia A Data: 05/01/2015

Lição n.º 90 e 91 Presenças: 12 de 15 Hora: 14:25-16:15

Sumário: Breves indicações dos trabalhos a decorrer no 2.º período. Caraterização do C.B.D.

Descrição da observação

Quase toda a turma esperava a chegada da professora perto do bloco onde habitualmente decorrem as aulas, outros estavam no interior do edifício. Esta dirige- se em seguida para o 1.º andar na companhia de alguns alunos. Já dentro da sala, observa-se que nem todos estão presentes, embora tenham visto a professora (chegando mesmo a cumprimentá-la). A aula tem início cerca de 15 minutos após a hora prevista. Não são feitas menções aos atrasos. A professora começa por desejar um bom ano aos alunos questionando-os, genericamente, sobre as férias. A turma retribui o gesto. Em seguida, informa sobre o que vai consistir a aula. Durante a primeira parte foram divulgadas informações que consistiram em:

 Atividades a realizar (visitas de estudo; seminário sobre o turismo na península de Setúbal e a participação no projeto Nós Propomos);

 Agendamentos (reunião com encarregado de educação e teste de avaliação);  Sobre o desempenho: necessário praticar a produção de texto;

 Sobre os apoios: a frequência na disciplina de Filosofia é obrigatória e devido a esta decisão há um conflito nos horários da D3 e da A3 (estão com apoio na disciplina de Inglês).

Reações: durante os momentos informativos, observou-se que a atenção de metade dos presentes estava a ser canalizada para outras atividades. Havia conversas paralelas, destacando as duplas C3 e D1; D2 e B4; A1 e B2. As perguntas colocadas foram no sentido de saber se os apoios vão permanecer no horário e se há registo de faltas.

A professora passou a palavra ao candidato a Professor que, confirmando a presença de todos, começou por desejar um bom ano à turma com um ar simpático, alegre e sorridente. Constatou-se que alguns alunos também retribuíram os sorrisos e ouviram-se os habituais votos de bom ano. Em seguida entregou uma folha com as instruções (Re)Descobrir e intervir no V.A (Anexo 1). Mencionou que eram indicações

precisas sobre o que fazer e pediu que alguém as lesse em voz alta. No imediato, não houve voluntários (estavam preocupados em saber o que eram aquelas instruções), mas alguém aceitou ler. Em seguida, solicitou-se a uma outra pessoa para explicar o que tinha compreendido daquelas instruções. Após este momento e a explicação do que se pretendia com esta atividade, a professora de Geografia retomou a palavra. Escreveu, no quadro negro, um organizador prévio e contextualizou o tema. Pediu para que abrissem o manual escolar e fez perguntas não direcionadas sobre o seu conteúdo.

Reações: observou-se que em atividades elementares como descrever imagens e copiar esquemas a adesão dos alunos é significativa.

Após um intervalo de 10 minutos, a aula prossegue. A professora acrescenta novos tópicos ao esquema que tinha feito, inicialmente, no quadro negro.

Reações: grande parte da turma não voltou do intervalo no tempo previsto. É de referir que apenas a D1, a B4, o A2, o C1, a A3 e a D3 cumpriram o horário. Além de não ser uma postura adequada, perturba o ambiente em dois sentidos: (1) desconcentra quem já está a trabalhar; e (2) provoca uma quebra na dinâmica (a porta apenas abre por dentro, o que implica ir sempre alguém abrir, quando ouve bater). Este procedimento deu origem à reflexão sobre uma questão: apenas uma professora, no Mestrado em Ensino, lecionava com a porta aberta. Era a aula a que os estudantes mais chegavam a horas – espaço pedagógico muito prático, com discussões vivas – mas, se algum se atrasava, entrava sem fazer barulho e não perturbava o andamento do trabalho. Questão: Porque preferirão os professores, na sua maioria, lecionar com a porta fechada?

A professora procura promover a discussão e prossegue, referindo alguns dos serviços que é possível encontrar no Central Business District.

Reações: ao serem mencionadas as diferenças entre serviços, o A1 tentou esclarecer. Embora não tenha conseguido, promoveu a participação de outros, nomeadamente a B4, a B1 e o C1. Destacam-se pela participação espontânea a C2 e a B4.

A professora informa que o que está escrito no quadro negro (e que copiaram) é para realizar como trabalho de casa. Pede também outras atividades (perguntas de resposta curta) do manual escolar. Ao concluir os trabalhos, pede ao C3 que faça uma síntese e, no final, a professora dita o sumário.

Reações: a escolha do C3, provavelmente, deveu-se a este não ter estado atento. Quando iniciou a síntese, percecionou-se o desconforto. Mas rapidamente encontrou o que precisava no quadro negro.

– Falou-se do que é o C.B.D. – acrescentando em seguida –, é o centro da cidade local onde havia concentração de atividades, muito trânsito e acessibilidades.

Observação n.º 2 Disciplina: Geografia A Data: 06/01/2015

Lição n.º 92 e 93 Presenças: 11 de 15 Hora: 16:25-18:10

Sumário: Correção do TPC. As áreas residenciais: bairros de classes socioeconómicas elevadas, bairros de classe média, bairros de classe baixa.

Exercício de aplicação.

Descrição da observação

Observou-se que o cumprimento do horário da aula não foi concretizado por todos os alunos. O início da aula foi marcado pelo registo do sumário.

Reações: constatou-se que os primeiros a registar o sumário foram a C2, a A3, a D3, a B1 e a D1. O A1, o C1, o D2 copiaram pelo caderno dos colegas e o C3, a C4, a B3, o A2 e o B2 não registaram.

A professora confirmou se as atividades indicadas como trabalho de casa tinham sido realizadas. Em seguida, fez a correção através de pergunta dirigida.

Reações: desconfiou do trabalho do C3, sugerindo que a caligrafia era muito parecida com a da D1. Censurou o B2 por este não ter feito o TPC e questionou-o sobre a justificação para esta falta do TPC.

Reações: observou-se que existia pelo menos um manual escolar por cada dois alunos (cada mesa), mas também se observou que o C3, apesar de ter o manual escolar, não o utilizava, deixando-o guardado dentro da mochila.

A professora projeta uma apresentação. Explica que, do conjunto de slides que vão observar, apenas alguns serão para copiar para o caderno diário.

Reações: o C3, que desde o início da aula estava a conversar com a B3 (e a D1 visivelmente incomodada), ao ver o primeiro slide, pergunta se era para passar. A professora reforçou o que tinha dito.

Durante a exploração das imagens que estavam a ser projetadas.

Reações: participação espontânea da B1, A2 e C2. O A1, que estava a perturbar a aula, foi interpelado pela professora. Por sua iniciativa mudou de lugar e manteve-se numa fila mais distante, onde apenas está sentado o candidato a Professor. Ouvem-se notificações vindas de um telemóvel e isso permite constatar que o A1 continuava em comunicação com alguém, provavelmente com o C3, a B3 ou o B2 (ele agora estava de frente para esses colegas). Permanecem interessados na aula a C2, o C1, a D1, a A3 e a D3.

A professora atua de forma a solucionar o problema relacionado com o telemóvel.

Reações: exige ao C3 que lhe entregue o telemóvel. Este oferece resistência. Assertivamente, num tom de voz sério e seguro, a professora responde para entregar ou desligar. A seguir informa que o esquema que está projetado é para registar no caderno diário e vai inspecionar se estão realmente a fazê-lo.

É retomada a aula, após um intervalo de cinco minutos e, novamente, o horário não é cumprido, destacando-se: a C4, o D2, o B2, o A2, o A1. A B3 não regressou.

Reações: com a ausência da B3, o C3 e a D1 conversam. Percebe-se que a D1 está séria e procura perceber se à sua volta notam que os dois conversam. O C3 evidencia

uma atitude de quem se está a justificar, mas que não a convence. Permanecem assim até ao final da aula.

A professora retoma a aula desde onde parou e pede para que copiem alguns conteúdos.

Reações: mobilizam-se rapidamente para a cópia. A C4 diz recordar-se que – no exame do ano passado saiu ‘essa matéria’ –, o A2 complementou as explicações exemplificando com aquilo que observou durante a visita (Re)Descobrir o VA.

É distribuída uma ficha com perguntas de escolha múltipla e respostas curta. Para a sua realização percorreu-se toda a turma, começando pelo C3.

Reações: com esta estratégia conseguiu-se a participação de todos. As respostas fornecidas estavam todas corretas. Nas perguntas de resposta curta (pequenas definições e/ou indicar alguns fatores sobre determinado aspeto) houve alguma hesitação.

Observação n.º 3 Disciplina: Geografia A Data: 07/01/2015

Lição n.º 94 Presenças: 11 de 15 Hora: 11:30-12:20

Sumário: As áreas industriais. Fatores de localização.

Descrição da observação

Um dia de muito frio. Quase toda a turma já estava na sala perto do aquecedor. Antes de iniciar a aula foram dadas indicações sobre a utilização dos telemóveis. Estes devem permanecer desligados. Também foi referido que alunos indicados para apoio não frequentam as aulas (é o caso do B2, do A1, do C3, do A2 e do C1, na disciplina de Português).

Reações: Nenhuma manifestação ou comentário sobre a utilização indevida dos telemóveis. O A1 informou que vai justificar a próxima falta e o A2 informou que não vai frequentar o apoio.

A professora começou por recordar alguns dos assuntos abordados nas duas aulas anteriores através do questionando à turma. Após esta introdução, tentou projetar algo, mas sem sucesso.

Reações: não perdeu muito tempo com o constrangimento informático e insistiu no diálogo. Conseguiu obter algumas respostas sobre as perguntas que ia colocando, sobretudo da D1.

Colocou uma lista de tópicos no quadro negro.

Reações: observa-se uma grande cumplicidade do C3 com a D1, bem como conversas entre o B2 e o A1. A professora, que já tinha repreendido o C3 (talvez duas ou três vezes), pede-lhe que mude de lugar. Faz o mesmo convite ao B2 e A1. O C3 manifesta vontade em abandonar a aula, algo que acaba por acontecer. Os outros permanecem e procuram estar mais concentrados.

Após a saída do C3.

Reações: observou-se uma mudança radical na postura da D1. Mostrou-se mais atenta, registou no caderno o que estava no quadro e tentou participar (nem 10 minutos tinham passado). O A2 evidenciou estar mais satisfeito e participativo, a D3 permanece atenta (formas de ação e reação semelhantes nas aulas anteriores), a A3 escreve no caderno (será do manual? não terá ela manual e por isso copia os conteúdos?), a C2 mantém uma postura semelhante às observações anteriores.

Como foi mencionado anteriormente, a visita de estudo inicial também permitiu uma observação da turma e recolha de dados. O guião de trabalho de campo (Re)Descobrir o VA (Anexo 2) foi concebido especialmente para esse efeito e corporizou um instrumento dissimulado de avaliação de diagnóstico. Esta é uma avaliação inicial, ou seja, o ponto de partida para a conceção e desenvolvimento de qualquer projeto curricular de escola ou de turma (Leite, 2002). Justifica-se quando se pretende identificar o ponto de partida, seja em relação às caraterísticas do contexto e da comunidade onde a escola se localiza, seja em relação às caraterísticas individuais da turma (Zabalza, 2004) ou, ainda, às competências que desenvolveram. É

conveniente salientar que a concretização desta visita de estudo antecedeu as aulas observadas.