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PARTE I- CURRÍCULO E EDUCAÇÃO FÍSICA: DIÁLOGOS COM A

CAPÍTULO 1. O CAMPO DO CURRÍCULO: DIVERSIDADE E

1.2 O CAMPO DO CURRÍCULO NO BRASIL

Segundo Moreira (1990), a história do currículo no Brasil é resultado da transferência de teorias curriculares americanas. Vários livros de autores americanos de caráter tecnicista, de acordo com Souza (1993), foram traduzidos para a língua portuguesa tais como Currículo Moderno: um planejamento dinâmico das avançadas técnicas de ensino de Robert S. Fleming (1970) e Princípios Básicos de Currículo e Ensino de Ralph Tyler (1974), sendo este último, de grande difusão no País, chegando a ter nove edições no período entre 1974-1984.

No âmbito das produções acadêmicas brasileiras, os estudos curriculares ganham destaque a partir da década de 1980 (MOREIRA, 2002). Após o processo de

44 redemocratização do Brasil ocorrido a partir dessa década, questões relativas ao currículo ganham um novo olhar provocando fortes críticas ao modelo educacional vigente no regime militar pelo qual o país tinha acabado de passar. O debate acerca dos problemas curriculares é intensificado fazendo surgir no país uma literatura de viés progressista, na tentativa de transformar o ensino tecnicista desenvolvido até a década de 1960 (PINHEIRO, 2009).

De acordo com Macedo (2013a), no início dos anos 1980, houve grande influência de teorias marxistas nos textos curriculares de cunho político, tais como os guias curriculares dos estados e municípios. Além disso, não podemos deixar de mencionar a influência de Paulo Freire para os estudos críticos de uma maneira geral, pois a relação entre política e educação evidenciada em suas obras teve (e ainda tem) grande repercussão para toda uma geração de educadores e pesquisadores.

Um trabalho de mapeamento da produção sobre currículo no país realizado na década de 1980 e início de 1990, feito por Souza (1993), apontou um crescimento no número de obras de autores nacionais, o que não acontecia até então. Oito das 12 obras publicadas eram de autores brasileiros, sendo cinco delas produzidas na década de 1980.19

Em síntese, Souza (1993) aponta que a partir da década de 1980, a produção sobre o campo do currículo no país não só cresceu em número, mas também qualitativamente. Houve um deslocamento da produção restrita aos manuais contendo modelos de sugestões de elaboração de planejamento curricular para uma literatura mais problematizadora. Assim sendo, as abordagens descritivas e prescritivas acabaram por ser substituídas por uma abordagem dialética de natureza sociológica, com base principalmente no pensamento de Michael Apple e Michael Young. Porém, dado ao dinamismo da produção da época, no fim dessa década, já se apresentavam revisões desses estudos na tentativa de superar limites e reducionismos.

Segundo Macedo (2013a), até meados dos anos 1990, o pensamento crítico foi fortemente hegemônico na teoria e na política curriculares no Brasil, porém de acordo com Lopes e Macedo (2002), o campo do currículo no Brasil vem, desde os anos 1990, colocando em diálogo teorizações de vertentes críticas com enfoques denominados de pós- críticos, advindos especialmente do pós-estruturalismo e do pós-modernismo.

19 Ao analisar a produção em periódicos a autora deparou-se com a presença de diferentes artigos de um

mesmo autor, em destaque, Tomaz Tadeu da Silva (UFRGS), Antônio F. B. Moreira (UFRJ), Ana Maria Saul (PUC/SP) e Teresa Silva Roserley (SME/SP). A produção dos periódicos assim como de livros é fruto, em sua maioria dos programas de pós-graduação.

45 Atualmente, segundo Lopes (2013), o campo do currículo é praticamente dominado pelas teorias pós-criticas, que, segundo a autora, decorre das características pós-modernas do tempo que vivemos. Para a autora, atualmente, no Grupo de Trabalho (GT) Currículo da ANPEd (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação), no qual estão reunidas as principais lideranças do campo no Brasil, é possível falar de uma hegemonia dos estudos de corte pós-crítico. Porém, ela também revela, que, caso fossem investigadas as teses e dissertações, ou mesmo os artigos, talvez essa conclusão fosse diferente, com maior referência ao pensamento crítico.

Sobre isso, Oliveira e Süssekind (2017) apontam que, no Brasil, tem se percebido que mesmo quando as teorias críticas passam a não ser mais majoritárias, é perceptível a grande influência delas no campo, “fazendo com que autores de todas as tendências e matizes dialoguem com ela compulsoriamente, mesmo que de modo subliminar” (OLIVEIRA; SÜSSEKIND, 2017, p. 16 ).

É nesse sentido que Lopes (2013) revela que é possível supor que cada vez mais o pensamento crítico é interpelado pelas reflexões pós-críticas, por vezes, gerando híbridos teóricos que indicam a necessidade de se problematizar a classificação das teorias propostas por Silva (2011).

A influência dos estudos pós-críticos não se restringe aos estudos curriculares. Eles perpassam, de um modo geral, as pesquisas do campo educacional como um todo. Esses estudos, segundo Paraíso (2004), constituem sistemas abertos, compostos por linhas variadas, que, por sua vez, também compõem outras linhas. Segundo a autora, as teorias pós-críticas, a partir da influência do pós-estruturalismo, do pós-modernismo, da teoria queer, dos estudos feministas e de gênero, dos estudos multiculturalistas, pós-colonialistas, étnicos, ecológicos entre outros

têm contribuído para a conexão de campos, para o desbloqueio de conteúdos, para a proliferação de formas e para o contágio de saberes minoritários. Os sentidos são multiplicados, os conhecimentos expandidos, os espaços de criação e invenção povoados. Elas têm-se posicionado contra a fixidez de significados, de narrativas, de valores, de classificações, de subjetividades, de verdades. Sua força tem sido grande, já que desarruma muito do já pensado na educação e mostra a importância de significar de outro modo, de criar, produzir, multiplicar e proliferar nesse terreno (PARAÍSO, 2004, p. 295).

Frente ao aumento da produção do campo sobre temática curricular e a diversidade de linhas que se constituem hoje a produção de conhecimento acerca do currículo no Brasil, Moreira (2001) faz um alerta sobre as teorizações que secundarizam a apresentação de proposições passíveis de materialização nas escolas e que privilegiam o refinamento de conceitos, de categorias e de metáforas. Para o autor, é necessário que as pesquisas

46 delimitem melhor os temas de suas investigações, pois, se por um lado, a superação da lógica de estudos que abarquem uma visão restrita de currículo como lista de disciplinas e conteúdos é indiscutível, por outro, a visão de currículo que abrange praticamente todo e qualquer fenômeno educacional, acaba por dificultar a concentração dos esforços nos problemas mais urgentes da prática curricular.