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CAPÍTULO 2: A CRISE FINANCEIRA GLOBAL 2008-2009 : ORIGEM, PROPAGAÇÃO

2.4 Os Canais de Transmissão da Crise

2.4.1 Canal Financeiro

Segundo Claessens et al. (2010), Giannone et al. (2010), Didier et al.(2011) a maior integração31 das economias ao mercado financeiro internacional pode ser considerado elemento fundamental para que a transmissão dos choques originados no setor de hipotecas subprime dos Estados Unidos alcançasse proporções mundiais. Lane (2012) considera que é possível identificar ao menos duas contribuições da abertura financeira para as condições que deram origem à crise. A primeira consiste no aumento da participação de investidores estrangeiros, principalmente os bancos europeus, que impulsionaram o crescimento acelerado das securities lastreadas em ativos nos Estados Unidos. A segunda contribuição consiste no

30 Frankel e Saravelos (2012), Rose e Spiegel (2012), Babecky et al. (2013), Llaudes et al.(2010), Lane e Milesi- Ferretti (2010), Blanchard et al. (2010); Berkmen et al. (2012)

31 Segundo Damasceno (2008) é preciso apontar que a expressão integração de um país ao mercado financeiro internacional é amplo, e pode assumir diversas formas: Abertura financeira, Liberalização Financeira e Liberalização da Conta Capital e Financeira. Nas palavras de Kose et al. (2003, p.7) “Financial globalization and financial integration are, in principle different concepts. Financial globalization is an aggregate concept that refers to rising global linkages through cross-border financial flows. Financial integration refers to an individual country’s linkages to international capital markets. Clearly, these concepts are closely related. For instance, increasing financial globalization is perforce associated with rising financial integration on average. In this paper, the two terms are used interchangeably”. O movimento de Integração Financeira Internacional da economias nacionais e formação de um mercado financeiro internacional integrado é, de maneira geral, denominado de globalização financeira.

rápido crescimento dos balanços patrimoniais de diversos bancos em dois níveis, a nível internacional com o aumento do tamanho e da complexidade dos bancos ativos internacionalmente, tornando difícil para os reguladores nacionais supervisionar adequadamente os perfis de risco e a nível local, com aumento da capacidade dos bancos locais em expandir os empréstimos que estimulou a alavancagem do crédito em diversos países.

Lane (2012) e Bernanke et al. (2011) consideram também que a abertura financeira impulsionou o aumento da participação dos países emergentes no mercado financeiro internacional, principalmente países com superávit em contas correntes, com aquisição de ativos dos Estados Unidos considerados seguros, como: títulos do tesouro, dívidas de agência, títulos lastreados em hipotecas e outros produtos de investimento estruturados lastreados por hipotecas residenciais dos EUA.

Segundo Didier et al. (2011) o processo de securitização levou a uma maior conexão entre as instituições financeiras dos países promovendo a ampliação de ativos opacos e difíceis de avaliar nos balanços patrimoniais das instituições financeiras, aumentando substancialmente sua alavancagem e o financiamento das carteiras de investimento com menos capital e mais dívidas de curto prazo. Ademais, Lane (2012) considera que a alavancagem é produto da regulamentação inadequada dos mercados de crédito e dos bancos que poderiam ser melhores supervisionados e limitados se os sistemas financeiros fossem autárquicos:

Financial globalisation plausibly contributed to rapid domestic credit growth by operating on both supply factors and demand factors. In relation to credit supply, domestic banks and the affiliates of foreign banks can raise various types of wholesale funding on international markets, with foreign investors also an important source of bank equity (both through portfolio equity and FDI). In relation to credit demand, capital inflows can contribute to a low interest rate environment and improve the net worth of domestic borrowers by pushing up domestic asset prices. (LANE, 2012, p.564)

Didier et al. (2011) aponta que no auge da crise financeira, há grande fugas de capitais das economias mais abertas financeiramente aumentando a fragilidade dos sistemas financeiros domésticos. Os efeitos negativos sobre as riquezas dos países desenvolvidos levaram a uma retração do capital disponível diminuindo os investimentos estrangeiros, principalmente para os países em desenvolvimento, esses efeitos foram amplificados pela aumento da incerteza dos agentes que reduziram sua exposição aos países em desenvolvimento, provocando grandes declínios nos preços dos ativos e nos fluxos de capitais em todo o mundo, esse fator pode ter contribuído para ampliar a desvalorização das bolsas de

valores e congelamento do crédito, como sugerido pelo padrão de amplificação da crise apresentado anteriormente por Korinek (2011):

[…] while capital was flowing out of the financially open economies during the peak of the turmoil, stock markets collapsed in a highly synchronized way across regions and credit growth stagnated. This suggests a reinforcing pattern in which a decline in capital flows might have triggered a collapse in asset prices and a generalized deterioration in domestic financial systems, which in turn could have amplified the capital outflows due to margin calls, capital requirements, and so forth (DIDIER et al., 2011, p.19).

Segundo Lane (2012) independentemente da abertura financeira ter contribuído ou não para a ocorrência da crise, os fluxos de capitais são mecanismos importantes para ampliação ou fornecimento de condições para redução dos choques da crise. Os períodos de maior risco global estão associados ao momento em que há menores volumes dos fluxos brutos de capital, ou seja, os investidores tendem a fugir de compromissos e posições assumidas em tempos normais, o autor destaca que na crise financeira global esse acontecimento pode ser observado, principalmente, no setor bancário:

The most dramatic turnaround took place in relation to banking-sector flows, with foreign investors draining liquid liabilities (deposits, short-term wholesale funding) from stressed banks and domestic investors similarly repatriating foreign liquid assets. In both directions, banks were the main proximate investors in other banks, so the cross-border retrenchment was part of the general breakdown in inter-bank markets during the crisis. While individually rational, the collective exit from these markets contributed to the illiquidity problems that defined the acute phase of the crisis. Given the lack of an adequate international regulatory framework, cross- border liquidity runs were more difficult to forestall than domestic liquidity runs (LANE, 2012, p.567).

Na perspectiva do autor, a fuga de capitais não é uniforme, alguns tipos de fluxos de capitais podem ter efeitos estabilizadores durante uma crise, como por exemplo, diante de um declínio nos preços dos ativos domésticos, os investidores estrangeiros podem ser uma fonte de novos influxos de capitais nas formas de investimento de carteira e investimento estrangeiro direto (LANE, 2012). O canal financeiro é de fundamental importância para o presente trabalho, uma vez que representa o enfoque da pesquisa em analisar os efeitos da abertura financeira sobre a incidência e recuperação da crise financeira global. A análise desse canal será realizado, principalmente, por meio dos índices de abertura financeira dos países como as medidas de abertura financeira de facto e jure, que serão apresentadas com maiores detalhes a seguir.