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CANCLINI, Nestor Garcia Culturas Híbridas São Paulo: EDUSP, 2000 p

No documento MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA (páginas 31-46)

Nesta perspectiva, o museu tem exercido um papel de grande importância, pois configura-se como espaço institucional destinado a apresentação ritualizada das culturas, um “palco” para a sua exibição e encenação, espaço em que se celebram valores eleitos como representativos de nacionalidades e de culturas nacionais constituídas por elites dominantes e seus simpatizantes. Celebração como espetáculo, os museus no lugar de revelar, ocultam, excluem, a partir do ideário de grupos detentores de poderes de montagem e realização de tal espetáculo. Reapresentando o discurso hegemônico na sua intertextualidade, com artifícios para controlar a “Identidade Nacional”, o museu constitui local onde, efetivamente, o patrimônio é manipulado e utilizado como ferramenta política e de autoridade.

Considerando o desenvolvimento deste processo percebemos que o século XIX foi essencial para a definição de políticas patrimoniais, sendo um momento em que ações específicas desenrolaram-se, estabelecendo paradigmas fundamentais na definição, proteção e socialização de traços culturais entendidos como patrimônio da civilização ocidental, foram constituídos vários Espaços de Memória com o objetivo de marcar e definir os elementos de Nações que surgiam e/ou afirmavam-se.

Tal processo ocorreu em meio a projetos de definição de temas e discursos relacionados à construção de identidades nacionais, norteado pelas idéias ocidentais de evolução, civilização e progresso, sendo a cultura erudita e acadêmica, em suas expressões mais oficiais, entendidas como ferramentas de fundamental importância no jogo de negociações de memórias versus esquecimentos. Marcos culturais monumentalizados obedeceram a lógica de exaltação de determinadas práticas e grupos sócio culturais, em detrimento de outros, justificando, desta forma, inclusive, todo o processo de expansão colonizadora do Ocidente cristão como forma de propiciar processos civilizatórios para grupos considerados “inferiores”, “primitivos” e “a- históricos”. Projeto "messiânico" no qual os conflitos decorrentes do confronto de culturas e as conseqüências devastadoras destas intervenções foram absolvidos pelos benefícios "espirituais e intelectuais" dele decorrentes. A mão civilizatória e confiscatória justificava-se, por seu caráter “benemérito” e "desinteressado", como no discurso que atualmente atinge o Iraque e suas adjacências.

Desde momentos iniciais desta expansão ocidental encontra-se um grande interesse voltado à cultura material de povos e países colonizados e à criação de museus etnográficos, que acarretaram mais prejuízo para diversos grupos considerados de interesse para a etnografia e a ciência da época, com a ação violenta de retirada de elementos de suas culturas materiais, enviados para Institutos de Pesquisa e Museus etnográficos europeus em formação:

A fundação dos museus de etnologia e o movimento de idéias que se criou a seu favor respondiam a necessidades econômicas e políticas, ao mesmo tempo em que progressivamente se definiam ideologias visando interpretar os testemunhos materiais reunidos nestes museus, em um sentido previamente definido. A história desses museus e suas coleções, [...], não pode ser relatada separadamente, independentemente da análise da ideologia que estes museus deveriam confirmar14.

No caso do Brasil, o surgimento de uma nação livre, no século XIX, implicou a (re)construção de imaginários e referências que sustentassem e justificassem a pretendida nação, sendo necessária a criação de espaços de produção e sistematização de conhecimentos no Brasil, sobre o Brasil, com a definição de cenários, atores e enredos para a obra que era inaugurada. Foram de primordial importância, como bem apresenta Lilia Schwarcz em seu livro O Espetáculo das Raças15, os Institutos Geográficos e Históricos, as Escolas de Direito e de Medicina, bem como os Museus, que se afirmaram como espaços em que o perfil ideal do Brasil e do Homem Brasileiro era estudado, forjado e apresentado ao público.

Diante deste projeto de construção da Nação e da sua Identidade e Cultura Nacional, baseado em conceitos elitistas de história, povo, língua, cultura e arte, ficam evidentes as dificuldades de introdução, no rol dos elementos componentes do patrimônio nacional, de elementos da cultura material e sensível de povos considerados “primitivos, sem história e sem arte”, segundo idéias dominantes na época. Foram iniciadas, junto com as políticas patrimoniais e do imaginário delas decorrentes, formas de exclusão e/ou folclorização e manipulação de referências culturais de determinados grupos, como os

14 AKA-EVI, Jean-Luc. De l’art primitif à l’art premier. Cahiers d’Études Africaines: Prélever, exhiber. La

mise en musées. Paris: L’École des Hautes Études en Sciences Sociales. 155-156, XXXIX-3-4. 1999. p.572-773. Sobre a questão ver também DEGLI, Marine, MAUZÉ, Marie. Arts premiers: Le temps de le reconaissance. Paris: Gallimard, 2000. (Decouvertes Gallimard, 393)

15 SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil

afro-descendentes, por exemplo. Nesta perspectiva, em relação à presença do negro no Brasil

[...] o escravo configurava-se como um empecilho ideológico à higiene e à modernização. Discursos de diferentes procedências sociais colocavam-no lado a lado com miasmas e insalubridade. Na realidade, além da condição escrava, o próprio homem negro – que já havia sido excluído, por ocasião do Pacto Social implicado no Movimento da Independência, da composição de classes que constituiria, na visão do Estado, o controle da Nação brasileira – recebia conotações negativas de parte do corpo social. Escravo e negro eram percebidos, na prática, como a mesma coisa. [...] o antigo escravo era alguém a ser afastado – e, junto com ele, as aparências de pobreza, de hábitos não ‘civilizados`, de questões sociais graves16.

Apresentavam-se no Brasil questões conflitantes, relacionadas às bases da formação da sociedade brasileira e de sua história colonial marcadas pela empresa escravagista e presença maciça do negro, e mesmo do índio, nas formas de trabalho, nas práticas culturais e no contingente populacional. O problema de construção de imagens de progresso e modernidade e do projeto nacional, baseado em paradigmas referentes à civilização européia, tornou-se evidente devido à presença de matrizes culturais consideradas inferiores e incivilizáveis, segundo os teóricos mais radicais. Sobre esta questão, entre vários outros comentários acerca da formação étnica do Brasil e suas conseqüências ao desenvolvimento nacional, Nina Rodrigues, em sua obra referência da época, em fins do século XIX, afirmava:

A raça negra no Brasil, por maiores que tenham sido os seus incontestáveis serviços à nossa civilização, [...] há de constituir sempre um dos fatores de nossa inferioridade como povo. [...] Este juízo, que não disputa a infalibilidade ou a inerrância, nem aspira a proselitismo, obedece, na sua emissão franca e leal, não só ao mais rudimentar dever de uma convicção científica sincera, como os ditames de um devotamento respeitável ao futuro da minha pátria17.

16 SODRÉ, Muniz. O Terreiro e a cidade: a forma social negro-brasileira. Petrópolis: Vozes, 1988. p.39. 17 RODRIGUES, Nina. Os africanos no Brasil. 5ed. São Paulo : Nacional, 1977. p.7 Sobre a questão ver

também RODRIGUES, Jaime. O Infame Comércio: Propostas e experiências no final do tráfico de africanos para o Brasil (1800-1850). São Paulo: UNICAMP/CECULT, 2000; PENA, Sérgio D. J. (org.)

Homo Brasilis: aspectos genéticos, lingüísticos, históricos e socioantropológicos da formação do povo brasileiro. São Paulo: FUNPEC-RP, 2002. p. 131-148; MAGGIE, Yvonne. REZENDE, Claudia Barcellos. (orgs.) Raça como retórica: a construção da diferença. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002; GUIMARÃES, Antônio Sérgio. Classes, Raças e Democracia. São Paulo: Editora 34, 2002; MAIO, Marcos Chor. SANTOS, Ricardo Ventura. (orgs) Raça, Ciência e Sociedade. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1995.

Tal discurso traduz o pensamento vigente no Brasil, desde o século XIX, projetando-se para o XX e, mesmo após o surgimento de outras correntes de pensamento questionadoras destas idéias racistas, estas acabaram por firmar-se no imaginário social, não somente entre pessoas consideradas "despreparadas", mas, inclusive, e talvez principalmente, como parte do pensamento das elites brasileiras, ecoando até hoje, em vários discursos, de forma explicita ou implícita.18

A construção de imaginários idealizados sobre a formação da nação e de uma cultura brasileira, na perspectiva da pureza de raça e superioridades étnicas, configurou- se de forma bastante forte, inclusive através de controles e normas oficiais consagradas, na década de 1930, com o Estado Novo e as políticas de Getúlio Vargas para a educação e a cultura.19

A uma cultura branca, considerada superior e civilizada, com raízes européias introduzidas a partir dos primeiros colonizadores portugueses, complementada pela presença de outros imigrantes europeus a partir de meados do século XIX, opunha-se uma cultura indígena autóctone e uma cultura negra transplantada através da empresa escravista colonial, consideradas inferiores, selvagens, bárbaras. As tensões reforçaram- se na questão da mestiçagem e na idéia de uma cultura adulterada por ser mestiça. O discurso passava pela confrontação de forças e pela necessidade do estabelecimento de estratégias de controle e regulação que atenuassem o problema, possibilitando, a médio e longo prazo, a definição dos traços culturais de origem européia.20

18 Jeferson Bacelar em análise de jornais do início do século XX, em Salvador, considera que: O negro era

apresentado como o outro inferior e incivilizado, em relação ao branco, superior e portador dos padrões civilizatórios europeus. Entre as questões apresentadas pelos jornais, aponta: inferioridade do negro; violência entre negros; criminalidade; desorganização e abandono familiar; desejos imorais, degeneração sexual; atraso sócio cultural. O candomblé é descrito com seus objetos e rituais exóticos, relacionado a práticas indecorosas e ao transtorno da ordem pública, como feitiçaria, magia, curandeirismo, espetáculo vergonhoso de atraso. In: BACELAR, Jeferson. A hierarquia das raças: negros e brancos em Salvador. Rio de Janeiro: Pallas, 2001. p.48 – 51.

19 cf. SCHWARTZMAN, Simon. Tempos de Capanema. São Paulo: Paz e Terra, 2000. Sobre o debate em

torno das culturas populares e as estratégias de sobrevivências culturais nos primeiros anos da República: SOIHET, Rachel. Um debate sobre manifestações culturais no Brasil: dos primeiros anos da República aos anos 1930. em: Trajetos Revista de História UFC. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2001. vol.1 n.1. Dossiê Cultura e Poder. P.11 – 36.

20 Citando nota publicada no Jornal de Notícias, em fevereiro de 1901, Nina Rodrigues apresenta um

exemplo deste discurso da necessidade de controle e eliminação de atos culturais das classes consideradas inferiores: "Refiro-me à grande festa do carnaval e ao abuso que nela se tem introduzido com a apresentação de máscaras mal prontos, porcos e mesmo maltrapilhos e também ao modo por que se tem

O preconceito acerca das manifestações culturais de origem africana colaborou na produção de um imaginário social discriminatório, gerando novos e intermináveis preconceitos e intolerâncias, em uma cadeia de formulações de conhecimentos fundamentada no desconhecimento efetivo das características essenciais destas culturas.21

Para entender questões relacionadas às formas de representação de culturas afro- descendentes e sua preservação, devemos analisar elementos que constituem e fazem parte da dinâmica do patrimônio e suas representações, sem perder de vista que esse processo histórico-cultural está subordinado à construção de uma imagem nacional baseada na idéia de desenvolvimento e progresso. Decorre daí, tensa e conflituosa relação entre passado e presente, tradição e modernidade, memória e esquecimento, cultura popular e erudita, além de outras polarizações, sendo necessário enfatizar que este é um processo complexo e dialético, no qual a luta pelo controle de capitais simbólicos e sua preservação, através da cultura material e sensível, estabelece-se como elemento articulador para as ações empreendidas no âmbito das relações de poder e controle social, relacionadas ao

[...] processo de construção de uma identidade coletiva – a identidade nacional – (que) pressupõe um certo grau de consenso quanto ao valor atribuído a esses bens, que justifique, inclusive, o investimento na sua proteção. No caso dos patrimônios, essa capacidade de evocar a idéia da nação decorreria da atribuição, a esses bens, de valores da ordem da cultura – basicamente o histórico e o artístico. [...] O histórico e o artístico assumem, nesse caso, uma dimensão instrumental, e passam a ser utilizados na construção de uma representação de nação22.

africanizado, entre nós, essa grande festa da civilização. [...] acho que a autoridade deveria proibir esses batuques e candomblés que, em grande quantidade, alastram as ruas nesses dias, produzindo essa enorme barulhada, sem som nem tom [...] assim como essa mascarada vestida de saia e torço, entoando o tradicional samba, pois que tudo isso é incompatível com nosso estado de civilização" in: RODRIGUES, Nina. Os africanos no Brasil. 5a. ed. São Paulo: Nacional, 1977 - p.7.

21Quando, por exemplo, o olhar "civilizado" volta-se para a religião do "incivilizado", encontramos notas

como esta, de maio de 1905, apresentada por Nina Rodrigues: "Candomblés. Muita gente há que, [...] cultua uma legião de deuses inferiores, os do fetichismo, barbaramente denominados, sob curiosas invocações. Semelhante crendice, dia a dia vai ganhando terreno no seio da massa ignara, que já não a cultiva nos pontos distantes do perímetro urbano, por isso que os candomblés funcionam no próprio centro da cidade. Como é natural, à proporção que o número de prosélitos do fetichismo vai crescendo, vão aumentando as casas em que ele tem prática, surgindo novos pais-de-terreiro, o que é dizer, exploradores da credulidade dos néscios. Com isso prejudicada, embora, a civilização, muito lucram os negociantes do chamado azeite-de-dendê e os negociantes de pombos e galinhas." Nina Rodrigues, obra citada, p. 244.

22 FONSECA, Maria Cecília Londres. O Patrimônio em Processo: trajetória da política federal de

Sobre esta questão são importantes as considerações de Beatriz Sarlo, sobre o exercício de um olhar político23, que deve atentar para aquilo que é menos visível e audível, para as fissuras, os entremeios da produção do discurso. Olhar, politicamente, é entender as diferenças como qualidades frente a uma proposta de cultura massificada, é exercitar ferramentas que podem contribuir para rupturas dos controles exercidos por agentes dominantes. O olhar político deve transformar-se em discurso político que busca a explicitação das diferenças e, conseqüentemente, o respeito aos produtores de culturas não incluídas no rol dos planos de culturas oficiais.

É de grande importância o exercício deste olhar político, pois, no embate que se trava na sociedade brasileira, marcada por profundas e degradantes desigualdades sociais, fundamentadas na economia e no controle do acesso a instrumentos de melhoria da qualidade de vida, exclusão, invisibilidade, adaptação ou manipulação de elementos culturais, considerados fora dos padrões, são atitudes permanentemente identificadas no processo de preservação de referências patrimoniais. Em uma sociedade ávida por branqueamento, desejosa em assimilar elementos da cultura ocidental eurocêntrica, dita civilizada e moderna,

O negro esteve associado por séculos a sinais negativos de distinção na sociedade brasileira por sua cor de pele, sua posição ‘inferior’ no sistema produtivo e por suas práticas culturais, vistas como ‘incivilizadas’. A reconfiguração das relações entre negros e brancos (por motivos vários, entre eles a luta dos negros por direitos iguais e o reconhecimento destes por partes dos brancos) tem acontecido dialeticamente de modo que nesse processo certos elementos da cultura negra foram selecionados (samba, candomblé, capoeira, culinária etc.) e receberam sinal positivo, tornando-se legítimos na sociedade ‘branca’.24

Torna-se perceptível que na impossibilidade de exclusão ou mascaramento das referências afro nas culturas brasileiras, dada a sua força, importância e permanência,

23 SARLO, Beatriz. “Um Olhar político: em defesa do partidarismo na arte”. In: Paisagens imaginárias.

São Paulo: EDUSP. As suas considerações dirigem-se aos discursos da arte e sobre a arte, aos olhares críticos sobre a produção artística, às estéticas e jogos de relação entre tradição e ruptura, bem como estratégias de criação de discursos hegemônicos e ideais, no entanto tais considerações se aplicam a análises sobre sistemas culturais em geral.

24 AMARAL, Rita. "Educar para a igualdade ou para diversidade? A socialização e a valorização da

negritude em famílias negras". In: Os Urbanitas-Antropologia Urbana Web Site (disponível via www em http://www.aguaforte.com/antropologia/ Educarparaque.html) Internet, 2001. p.6. pesquisado em 17/11/2005. A questão também é tratada em SANTOS, Jocélio Teles dos. O poder da cultura e a cultura

foram constituídas estratégias diversas para dissimular traços destas culturas, com recorrência a artifícios como, por exemplo, a folclorização e fetichização das culturas afro-descendentes no contexto das culturas brasileiras. Neste conflituoso e dinâmico contexto de incorporações recíprocas, a preservação e patrimonialização estabelece-se como ferramenta de grande importância no processo de seleção para a formulação e estabelecimento de imagens acerca da cultura nacional.25

A necessidade de definir lugares específicos para as expressões culturais e seus agentes produz uma sistematização da cultura, estratificando manifestações e testemunhos, valorando-os a partir de padrões, paradigmas e estereótipos, produzindo, também, tipologias diferenciadas de locais de preservação. Neste processo surgem determinados espaços, alternativos, para expressões consideradas à margem, ou fora do pretendido “nível” para a qualidade da "cultura nacional". Logo, categorias como folclórico e etnográfico são pontos de direcionamento que setores dominantes pretendem deslocar do foco de elementos da cultura oficial, entendidos como os de maior representatividade nacional. Regidos pelas categorias artístico e histórico, erudito e acadêmico, determinados cânones opõem-se às categorias de folclórico e etnográfico. 26

A qualidade de folclórico, por exemplo, passa a destinar-se para a produção dita popular, no sentido de inferiorização que a idéia de cultura popular passa a ter, associada basicamente a negros e pobres, em comparação, de forma parcial e interessada, com a cultura escolar e erudita, de herança européia e, notadamente, branca. A preservação e exibição do patrimônio nacional são realizadas segundo critérios seletivos, baseados em graus de importância atribuídos para ressaltar e ocultar referenciais culturais, a partir de interesses particulares, manipulados pelo Estado e seus representantes, como entidades encarregadas da proteção legal do patrimônio.27

25 WILLIAMS, Raymond. Cultura. São Paulo: Paz e Terra, 1992 e Cultura e Sociedade, 1780 – 1950. São

Paulo: Nacional, 1969.

26 AYALA, Marcos. Cultura Popular no Brasil: perspectivas de análise. São Paulo: Ática, 1987. BOSI,

Eclea. Cultura de massa e cultura popular: Leituras de Operárias. Rio de Janeiro: Vozes, 1973. FERNANDES, Florestan. O Folclore em questão. São Paulo: Martins Fontes, 2003. VILHENA, Luís Rodolfo. Projeto e Missão: o Movimento folclórico brasileiro 1947 - 1964. Rio de Janeiro: FUNARTE, 1997.

27 No Brasil historicamente, o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional, apesar de incluir preocupações

com a questão das culturas populares desde a sua criação, com idéias e projetos de Mario de Andrade, sempre privilegiou o patrimônio relacionado ao passado colonial e à tradição ibérica. A figura jurídica do "tombamento" com a valorização do chamado "patrimônio de pedra e cal" caracterizaram a política

Percebemos uma tendência que se repete, a de pensar o folclórico e a cultura popular como referente às manifestações extintas ou em vias de extinção, ou seja, culturas pensadas como culturas mortas, arcaicas, reservadas a momentos específicos, aos círculos de estudos acadêmicos e de amadores bem intencionados. A força das culturas populares, fruto das organizações comunitárias, é reduzida a uma imagem de algo pensado como frágil, porque diferente do imaginário oficial de referências e práticas culturais “bens estruturadas”. Uma atitude política e bem definida que exotiza, exorciza e infantiliza as culturas dos grupos ditos populares, rurais, tradicionais.28

No sistema de seleção e preservação de patrimônios e construção de imagens sobre culturas nacionais, existem várias instituições e estratégias, destacando-se os museus, como uma das principais. Os museus são espaços de reunião de objetos da cultura material29, abordando determinados temas, explicitando idéias e visões sociais, buscando, também, forjar e transmitir idéias, produzir conhecimentos. Neste sentido, os espaços museológicos e suas exposições caracterizam-se como de grande importância para a formação das mentalidades, à medida que apresentam conceitos sobre as sociedades e os grupos que as constituem, suas características e traços históricos, utilizando-se de objetos da cultura material como bases essenciais de um processo de comunicação e de preservação de idealizadas tradições culturais. Os museus caracterizam-se como espaços para o exercício de jogos de simulações, de poderes e interesses que constituem a preservação do patrimônio viável para a ordem e o progresso. Culturas africanas, por exemplo, excetuando-se as referências ao Egito, estiveram sempre associadas a conceitos como “primitivo”, pouco desenvolvimento, inferioridade, ignorância, ao que ainda é exótico, bárbaro, mágico, sobrenatural. Estas visões foram transmitidas através de abordagens museológicas por intermédio de exposições. Somente

patrimonial do Estado brasileiro, desde 1930, com o reconhecimento institucional de monumentos e

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