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Memorial das Baianas – Salvador – Ba

No documento MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA (páginas 131-134)

Este Memorial, que pertence à Associação das Baianas de Acarajé e Mingau de Salvador, foi inaugurado em setembro de 2002, em parte do Belvedere da Sé, na Praça da Sé, Centro Histórico da Cidade do Salvador, a partir de concepção visual do antropólogo Raul Lody.

É uma espécie de loja, com exposição de produtos e de seus usos, como indumentárias e adereços utilizados pelas baianas, além de produtos para a confecção de iguarias. Neste Memorial é possível um encontro e certa reflexão sobre a cultura gastronômica, chamando atenção para sabores e odores enquanto manifestação de sensibilidades culturais

reinventadas entre Bahia e parte da África, configurando-se como uma instituição para divulgação de atividades e “culturas” relativas às baianas, principalmente aquelas envolvidas com o comércio do acarajé. Também funciona como uma oficina para a produção de vestuário da baiana, com cursos de bordado tradicional, entre outros. Não há exatamente um circuito expositivo, até porque a área de exposição é bastante exígua, distribuída em uma única sala.

Figuras 80 e 81

Aqui, o questionamento é qual discurso foi realizado pelos atores ali representados neste Memorial? Apesar de ser espaço administrado pelos protagonistas ali presentes, a comunidade de mulheres produtoras e vendedoras de iguarias culinárias nas ruas de Salvador, o discurso não ultrapassa o nível do apelo folclórico e “turístico”, repetindo lugares comuns acerca da atividade exercida, limitada à apresentação da

composição do tabuleiro da baiana, sem considerações sobre dinâmicas culturais e históricas envolvidas nesta atividade que pode ser pensada em diversas dimensões: a religiosa, a econômica, a turística, entre outras.

Neste Memorial duas questões parecem essenciais para serem exploradas, apesar de ausentes do seu discurso expositivo: 1o. a questão da alimentação enquanto patrimônio, referência de articulação de sentidos e relações, com múltiplas possibilidades de articulações identitárias em torno do ato de produzir comida e forma de comer, ultrapassando a finalidade precípua de alimentar o corpo; 2o. a questão, relaciona- se à anterior, só que na perspectiva econômica do patrimônio: como articulam-se tradições e atividades de subsistência48.

Dos cruzamentos destas questões pode-se depreender e compreender os atuais embates entre vendedoras de acarajé ligadas à tradição dos orixás, versus as convertidas à Igreja Universal do Reino de Deus, bem como os conflitos pessoais por parte destas, ao necessitarem manter atividade interpretada e apontada, pelos pastores, como ligada à prática demoníaca nos cultos aos orixás. Este ambiente de tensão poderia ser explorado e capitalizado no discurso do Memorial, para promover discussões em torno de aspecto tão delicado e complexo no atual contexto de interrelações da tradição, religião, economia, subsistência.

Ainda são apresentados objetos, iconografias e textos que configuram tipos de baianas - do Bonfim, da Irmandade da Boa Morte, vendedoras de quitutes - privilegiando estereótipos e repetições estigmatizantes, reforçando a abordagem de personagens basicamente relacionados ao imaginário da indústria do turismo.

Baiana: Uma roupa multicultural.

48 Sobre a questão da alimentação e tradição afro-brasileira: LIMA, Vivaldo Costa. As dietas africanas no

sistema alimentar brasileiro. In: CAROSO, Carlos. BACELAR, Jéferson. Faces da Tradição Afro-

Brasileira: religiosidade, sincretismo, ante-sincretismo, reafricanização, práticas terapêuticas, etno- botânica, comida. Rio de Janeiro: Pallas, 1999. LODY, Raul. Santo Também Come. Rio de Janeiro: Pallas, 1998.

Roupa de baiana, roupa de crioula, estar de saia, mulher de saia, baiana de passeio, baiana de candomblé, baiana do Bonfim, baiana da Boa Morte, ou beca, ou, simplesmente baiana. A baiana reúne elementos visuais barrocos da Europa, muçulmanos da África Ocidental e da Península Ibérica, formando o tipo nacionalmente consagrado.

A roupa de baiana é uma montagem de panos. Anáguas engomadas, com rendas; saia com cinco metros de roda; camizu, rebordado na altura do busto; bata por cima em tecido mais fino; pano-da-costa ou pano-de- alaká; fios-de-contas; brincos; anéis; balangandãs e changrim - chinelo de couro.

A roupa de baiana identifica atividades profissionais, venda de comidas; compõe a liturgia do candomblé e está presente nas festas religiosas e tradicionais.

A apresentação da atividade de produção e venda de acarajé em perspectiva da história, mostrando as várias formas de tal exercício, ao longo do tempo, recebe tratamento bastante superficial, apenas com algumas

ilustrações e pequenos textos sobre a questão. No entanto, não é possível negar que o espaço pode funcionar como ferramenta para o reforço de identidades e auto-estima, sem, no entanto, acentuar a exploração do papel social e econômico que tal atividade representa para as culturas locais.

Após estes estudos sobre exposições na cidade de Salvador, optamos por incluir em nosso roteiro de trabalho instituições localizadas em Recife, Pernambuco. O que levou a tal escolha foi a necessidade de mudar de foco espacial, procurando perceber diferenças na abordagem expográfica acerca de culturas africanas e afro-brasileiras. Neste deslocamento foi possível perceber mudanças relativas a particularidades regionais, mas com a manutenção do mesmo tipo de tratamento, com imagens e abordagens recorrentes, semelhantes às observadas em espaços de memórias em Salvador.

Museu do Homem do Nordeste – Recife – Pe.

Aberto ao público em 1979, a partir da reunião de três antigos museus: Museu do Açúcar, Museu de Antropologia e Museu de Arte Popular, está ligado ao Instituto de Documentação da Fundação Joaquim Nabuco, tendo concepção museológica e museográfica inspirada

no conceito de Museu Regional, idealizado pelo sociólogo-antropólogo Gilberto Freyre enquanto síntese do Nordeste do Brasil. Atualmente, em processo de reestruturação, ocupa área que não corresponde às suas necessidades expositivas, procurando, no entanto, manter o circuito original:

Figuras 84 a 86

• Habitantes da região, os índios, na perspectiva da arqueologia e antropologia,

• Aspectos da vida colonial nordestina – Casa Grande e Senzala, o Brasil Luso-Português,

• Intimidade doméstica nordestina, arquitetura regional,

• Manifestações Sócio-culturais nordestinas – economia informal, artesanato e arte-popular, festejos do povo e religiosidade, carnaval, cultos de candomblé.

No documento MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA (páginas 131-134)