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Museu do Homem do Nordeste – Recife – Pe.

No documento MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA (páginas 134-138)

Aberto ao público em 1979, a partir da reunião de três antigos museus: Museu do Açúcar, Museu de Antropologia e Museu de Arte Popular, está ligado ao Instituto de Documentação da Fundação Joaquim Nabuco, tendo concepção museológica e museográfica inspirada

no conceito de Museu Regional, idealizado pelo sociólogo-antropólogo Gilberto Freyre enquanto síntese do Nordeste do Brasil. Atualmente, em processo de reestruturação, ocupa área que não corresponde às suas necessidades expositivas, procurando, no entanto, manter o circuito original:

Figuras 84 a 86

• Habitantes da região, os índios, na perspectiva da arqueologia e antropologia,

• Aspectos da vida colonial nordestina – Casa Grande e Senzala, o Brasil Luso-Português,

• Intimidade doméstica nordestina, arquitetura regional,

• Manifestações Sócio-culturais nordestinas – economia informal, artesanato e arte-popular, festejos do povo e religiosidade, carnaval, cultos de candomblé.

A questão que colocamos para este Museu do Homem do Nordeste: de que nordestino trata a sua exposição? Como é abordada a cultura da região? Qual o papel atribuído aos negros no seu discurso?

Neste Museu, identificamos distorções que ocorrem na maioria dos nossos museus que tratam de atividades e práticas culturais dos vários trabalhadores, artesãos, artistas populares que construíram e sustentam este “país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza”. Uma proposta que, já no seu título, apresenta-se como genérica, abstrata, a exposição carece de indicadores que dêem conta do tema proposto. Neste caso, o tema Homem do Nordeste, deixa suspenso uma diversidade e abrangência histórica que o museu tenta trabalhar mas fica sempre como proposta grandiloquente, fomentando um reconhecimento inatingível. Limitando ao homem pernambucano, relacionado ao mundo rural, evidente ainda hoje, a forte influência dos estudos e teorias de Gilberto Freyre, em um simulacro de Homem do Nordeste na medida em são perceptíveis várias ausências, como de homens e mulheres de culturas negras litorâneas.

A abordagem gira em torno de atividades relacionadas a um universo econômico associado a manifestações culturais consideradas populares, como religiosidade sertaneja, carnaval, arquitetura popular, produção, consumo e manifestações de hábitos relacionados à cachaça, em contraposição a outros elementos. Mais do que a idéia de encontro de culturas que se batem, negociam, sobrevivem, vemos a contraposição de imagens e referências culturais. Nos textos e imagens apresentadas há o recurso recorrente de utilização de referenciais culturais do universo dominante para classificação e explicitação da cultura do povo.

Catolicismo Popular - Compreende-se o catolicismo

popular, religiosidade vivida pelo povo pobre em geral, como distinto e até antagônico catolicismo oficial, disseminado pelas autoridades eclesiásticas. Nesse raciocínio, podemos classificar, etnocentricamente, dois catolicismos. Um oficial, erudito e eclesiástico, [...] e, um outro, popular e rústico, marcado pela ignorância, dando margem às crendices, as superstições, e as diversas práticas devocionais sem fundamentos teológicos. No entanto, essa perspectiva dicotômica não é apropriada para se entender as diferenças culturais observadas na experiência religiosa dos católicos, com símbolos e formas cotidianas diversificadas davivencia de fé. O catolicismo popular caracteriza-se pela apropriação e incorporação da religião oficial, a cultura do povo pobre, com seus códigos de conduta e estilos de vida próprios. [...] O resultado é uma fé repleta de devoções e cultos destinados aos santos, promessas, romarias, velas, bentinhos, ex-votos, medalhinhas, ladainhas, escapulários, novenas, etc. 49

Figuras 87 e 88

Ex-Votos - Parece um grotesco bazar surrealista: em volta da imagem de um santo, vêem-se esculpidas em cera, barro ou madeira, dezenas de pernas, braços, cabeças, pulmões, orelhas, narizes e... garrafas. Se estivermos em capela ou igreja de área rural, além desse "esquartejamento humano", encontraremos esculturas figurativas de tratores, espigas, bois, cavalos, etc. São os ex-votos. Cada um daqueles objetos testemunha, como insólitos troféus canibalistas, uma vitória do santo contra a doença, a pobreza, o vicio, a angústia. [...] As peças que compõem a coleção dos ex-votos revelam a complexidade dos simbolismos e dos materiais em que foram confeccionados, tais como cera, madeira, barro, tecido, com destaque para quadros pintados a óleo sobre madeira que são raríssimos. Alberto Cunha Melo.50

49 Texto Museu do Homem do Nordeste. 50 Texto do Museu do Homem do Nordeste.

Aguardente de cana-de-açúcar - Bebida destilada,

obtida da fermentação do caldo da cana-de-açúcar, a aguardente começou a ser produzida no Brasil em meados do século XVI. Presença marcante nas transações comerciais envolvendo o tráfico de negros, contribuiu para o crescimento e o prolongamento do mercado africano exportador de escravos.

Intrinsecamente ligada à cultura e aos hábitos dos negros, a aguardente constituiu-se numa exigência protocolar nos cultos afro-brasileiros. E voz corrente entre seus adeptos que, sem cachaça não se arma um feitiço eficiente. Usada na medicina popular - sempre associada a outras ervas - e igualmente apreciada na culinária regional, acompanhando inúmeros pratos como a buchada e a feijoada.

O folclorista Mario Souto Maior assina que, em alguns engenhos, a aguardente era fornecida aos negros do eito logo com a primeira refeição do dia, para que pudessem melhor suportar o árduo trabalho nos canaviais durante o inverno, pois os escravos trabalhavam seminus, expostos à chuva, atolados no massapé.

Figura 89

A principio bebida vulgar de escravos e navegantes, a aguardente se inscreveria nos hábitos das classes mais privilegiadas, constituindo-se numa bebida com assento à mesa de camadas sociais diversas.[...] 51.

Neste texto é interessante a relação atribuída à cachaça em cultos afro-brasileiros, tratada, como estratégia cultural, como se o uso da cachaça fosse regra, quando sabemos que não há "exigência protocolar do uso da cachaça nos ritos", ou melhor, a sua utilização constitui-se mais como uma exceção do que regra. Neste caso, vale reter que a cachaça é representada como marca identitária de negros.

Museu da Abolição – Centro de referência da Cultura Afro-

No documento MARCELO NASCIMENTO BERNARDO DA CUNHA (páginas 134-138)