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Capital social, sociedade civil e movimentos sociais

As associações formam a base dos principais conceitos que sustentam perspectivas alternativas e/ou renovadoras da democracia, seja por meio da cooperação e da ampliação, seja por meio da contestação aos padrões de constituição da democracia representativa tradicional. Os conceitos de capital social, sociedade civil e de movimentos sociais podem ser apontados como referências centrais nessas diferentes concepções teóricas que relacionam o associativismo com os processos de ampliação e de aprofundamento da democracia.

Podemos destacar, a partir da análise de Fung (2003), as principais contribuições das associações ao processo democrático. Em primeiro lugar, as associações são analisadas pelos impactos positivos no sentido da promoção de indivíduos mais cidadãos, aumentando seu senso de eficácia, “providing them with political

information, imbuing them with political skills, developing their civic virtues, and teaching them to be critical” (FUNG, p. 518).

Em segundo lugar, as associações contribuem para a quali- dade da representação política, ao apresentarem novas demandas, transmitirem propostas mais bem informadas e detalhadas, problematizarem interesses e políticas, e organizarem debates e interesses que transcendem limites territoriais. As associações oferecem canais adicionais (beyond voting, lobbying, and direct

contact with public officials FUNG, 2003, p. 523) para as pessoas

apresentarem suas demandas no campo político-institucional. Por outro lado, as associações também impactariam as condições de igualdade da representação política, ao remediarem as desigualdades

sociais por meio da participação em organizações sociais.60

60 Embora o autor chame a atenção para a força das análises que mostram que a participação

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|||| A ss o ci at iv ismo c iv il e r epr esent açã o d emo cr át ica

Além disso, as associações, enquanto componentes principais da sociedade civil, denunciam injustiças e tencionam as relações, os padrões e os poderes tradicionais. Os movimentos sociais são aqui os sujeitos centrais.

Por último, as associações têm apresentado um papel central na participação em estruturas estatais que foram desenhadas tendo em vista a incorporação da população em processos de discussão e de definição de políticas públicas e governamentais, como são os casos dos conselhos gestores e orçamentos participativos. De maneira geral, todas estas características remetem a diferentes relações entre o associativismo e a sociedade política, que reproduzem um viés que separa a prática da representação política (levada a cabo pelos representantes dos partidos políticos escolhidos em sufrágio universal), da participação (capitaneada pelas associações nos espaços sociais e institucionais).

Um exemplo da ausência analítica do caráter representativo

da sociedade civil61 pode ser encontrado na análise de Chambers

e Kopstein ao sistematizarem uma tipologia das relações que a sociedade civil estabelece com o Estado. Segundo os autores,

são seis os tipos de relações:62 separada do Estado, com ênfase no

voluntariado, no pluralismo e nas garantias legais de constituição associativa autônoma; contra o Estado, com destaque aos protestos e movimentos sociais; de apoio ao Estado, na promoção da cooperação

e de cidadãos responsáveis;63 em diálogo com o Estado, pelo registro

da ideia de esfera pública habermasiana ocupada por atores sociais “in political science and political sociology, group research has consistently shown that the flaw in the pluralist heaven is that the heavenly chorus sings with an upper class accent (1960 apud, 2003, p. 524).

61 No Brasil, Gurza Lavalle et al. têm se destacado no sentido de analisar este processo de

pluralização da representação com destaque às organizações da sociedade civil: Gurza Lavalle; Houtzager; Castello (2006 a); Gurza Lavalle; Houtzager; Castello (2006b); Isunza Vera; Gurza Lavalle, 2010.

62 Civil society apart from the state; civil society against the state; civil society in support of the

state; civil society in dialogue with the state; civil society in partnership with the state; civil society beyond the state. (p. 364).

63 Whereas in the view of civil society apart from the state, associational life is seen as the sphere

of plural ends, in the view of civil society in support of the state, associational life is viewed as both a sphere of pluralism and a sphere that produces common values. (p. 372).

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|||| M o viment o s s o ci ais e p ar ti cip açã o

ativos e criativos que impactam positivamente o sistema político; em parceria com o Estado, por meio da participação direta em processos de decisão política ou de autorregulação na constituição de “novas formas de governança” (CHAMBERS; KOPSTEIN, 2006, p. 374), e, finalmente, para além do Estado, mediante a atuação da sociedade civil global que coloca questões que transcendem as fronteiras nacionais (a exemplo dos direitos humanos e das mudanças climáticas, entre outros).

No que diz respeito à representação, os autores enfatizam que o papel criativo e crítico da sociedade civil em modelar as democracias modernas tem se dado exatamente pelo fato de não terem que atender às premissas e obrigações da representação. Com efeito, pensar no papel de representação política do associativismo implicaria em declínio de sua capacidade autônoma e de inovação nas relações sociais. Nesta perspectiva, autonomia, cooperação, publicização, influência, participação, socialização política, confronto e protesto são as chaves analíticas que sustentam, de forma diferenciada, os principais conceitos que avaliam as relações e os impactos do associativismo civil para a democracia, com destaque aos conceitos de capital social, sociedade civil e movimentos sociais.