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6. Análise e discussão dos dados

6.3. A produção das histórias infantis científicas

6.3.1. Captando luz – Dandara e o Sol

A primeira história infantil a ser analisada é a do grupo “Captando Luz” que escreveu a história “Dandara e o Sol”

A história traz como foco principal a utilização da energia solar. Dandara, personagem principal, vai à casa do vizinho de sua tia para obter informações sobre o funcionamento um sistema de aquecimento de água por energia solar que havia sido instalado na casa do vizinho.

O primeiro aspecto que chama atenção nesta história é o fato de ser uma história ilustrada. Isso demonstra a preocupação dos alunos em adequar a história ao mundo da criança, trazendo por meio das ilustrações, elementos que a auxiliem a sua interpretação. Os alunos demonstram, ao produzirem uma história ilustrada, ter consciência de que

crianças do Ensino Fundamental ainda não sabem ler muito bem e que, portanto, precisam do apoio das ilustrações para apreender todos os sentidos do texto.

De modo geral, nota-se o cuidado que o grupo teve com a adequação da linguagem. É utilizada linguagem adequada para crianças, contendo frases curtas e diálogos intercalados por ilustrações. No entanto, há frases compridas, em que falta pontuação, o que as torna um tanto confusas, como por exemplo,

Nas férias, ela foi para casa de sua tia Zuleica e ela adorava ir para lá, afinal tia Zuleica morava em um prédio e Dandara passava horas na janela olhando a cidade lá de cima.

Cabe ressaltar que os alunos cometem alguns pequenos deslizes em relação à norma culta da língua. Por exemplo, na primeira página os alunos usam a expressão “entrava lá dentro”. O verbo entrar já significar “para dentro”, portanto, há uma redundância desnecessária quando usam a expressão “lá dentro”.

Na quarta página, os alunos dizem:

“o que deixou Dandara encucada mesmo foram as placas que tinha no telhado...”.

Há um pequeno erro de concordância verbal e o melhor seria simplesmente escrever “as placas no telhado”.

Nota-se muita criatividade. Chamam atenção os pensamentos de Dandara que ligam o Sol diretamente a um chuveiro, assim como a ilustração da energia elétrica sendo “descarregada no lixo”.

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Cabe ressaltar, no entanto, que é como se tivesse faltado alguma dica sobre esse lixo, claro que se percebe que se está falando de economia de energia e pode-se ir um pouco além, pensando em “não devemos jogar tanta energia no lixo”. É o aproveitamento da energia, mas realmente, falta algo, quer no texto ou na imagem para que se possa entender completamente essa idéia de “energia indo para o lixo”.

Há nessa página mais um erro de gramática. É um erro de concordância verbal. Está escrito “estamos muito curiosas para saber como funciona as suas placas”. De acordo com as regras de concordância verbal, o adequado seria: estamos muito curiosas para saber como funcionam as suas placas.

Na oitava página os alunos escrevem: “a energia do sol... aqui em casa é usada como aquecedor de água”. Para tornar o texto mais compreensível, os alunos poderiam ter escrito “a energia do sol... aqui em casa é usada para aquecer a água” e, talvez aproveitado a oportunidade para chamar atenção das crianças que para aquecermos água é necessária muita energia.

Na página 9, os alunos escrevem “Dandara e sua tia caíram nos sorrisos”. A expressão utilizada é bem incomum e os alunos poderiam tê-la substituído por “caíram na gargalhada”.

A explicação sobre o funcionamento do coletor solar para aquecimento, da página 8, é bastante complexa, principalmente para crianças do Ensino Fundamental. Há muitos conceitos novos, como por exemplo, “transparente à radiação”, “alumínio”, “cobre e lã de vidro”. Muitas crianças ainda não tiveram contato com esses conceitos, portanto, mereceriam maiores explicações. Cabe lembrar que a expressão transparente à radiação, de difícil compreensão, deveria ter sido evitada. Caso os autores não a quisessem evitar, ela deveria ser explicada.

Há ainda um problema, o de indução de aprendizagem equivocada, que poderá causar problemas futuros para as crianças que lerem a história. O vizinho afirma que a lã de vidro “vai impedir que o calor escape”. Isso se repete mais tarde quando Dandara menciona que a lã de vidro não deixa o calor sair. Nesse caso, para não provocar aprendizagens equivocadas, os autores da história deveriam ter escrito que a lã de vidro impede as trocas de calor. Poderia até se aproveitar a oportunidade e falar que as trocas de calor sempre ocorrem do corpo mais quente para o mais frio.

Além disso, a explicação do vizinho, na página 8, contém muita informação de uma só vez, tornando o texto maçante e de difícil compreensão, principalmente para crianças, a redação é confusa.

Há que se mencionar, novamente, que as imagens são muito criativas. Vale ressaltar a imagem da página 9, que lembra uma resistência gigante com o Sol no meio.

Os alunos escrevem a história usando bem a criatividade e não usam qualquer elemento que possa levar a criança a interpretações preconceituosas.

O conteúdo científico é explorado com muita propriedade, apesar dos problemas citados anteriormente. As explicações são muito bem auxiliadas pelas ilustrações.

A história apresenta uma boa relação entre a vida cotidiana das crianças e o conhecimento científico. Para isso usam a curiosidade de Dandara que observa as placas de captação solar em uma casa vizinha, placas que são bem comuns hoje em dia e podem ser vistas em algumas residências. O grupo consegue vincular energia solar a formas alternativas de energia, e a preservação da natureza, ressaltando que é uma “energia limpa”, que auxilia a preservar o meio ambiente e auxilia na economia de energia. Desta forma, é inserida, na narrativa do texto, uma abordagem contemporânea da preservação ambiental, podendo levar as crianças a reflexões sobre esse aspecto.

Quanto à estrutura narrativa, pode-se dizer que o texto é bem organizado e apresenta um bom encadeamento de idéias. Compreendendo a narrativa como uma trama ou desenrolar de acontecimentos, o leitor é surpreendido ao final pelo surgimento de um novo elemento no enredo: o uso da energia solar durante a fotossíntese.

Quando esse tema surge, a primeira hipótese que se apresenta é a de que é um assunto muito complexo e daria para fazer outra história! De fato, se o leitor pensar que a intenção de quem escreveu a história era a deixar pistas para uma nova que viria posteriormente, faria todo sentido pensar assim. Mas este não é o caso.

Se o leitor se lembra, durante o processo de escolha do tema para Projeto Temático de Ciências, o grupo tinha dúvidas sobre que assunto abordar, sendo que um deles era a fotossíntese (p. 113-114). Como o grupo acabou optando por tratar da Energia Solar, uma forma conciliatória para resgatar o um dos temas do sorteio do tema, foi inseri-lo no final da história infantil. O desconhecimento do desenvolvimento do projeto poderia levar o leitor à primeira interpretação, que na verdade acaba por se justificar pela trajetória do grupo.