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Fusos Horários: uma evolução marcada com o tempo – Paulo e Silas confusos

6. Análise e discussão dos dados

6.3. A produção das histórias infantis científicas

6.3.5. Fusos Horários: uma evolução marcada com o tempo – Paulo e Silas confusos

A última história analisada chama-se “Paulo e Silas confusos...” do grupo “Fusos Horários: uma evolução marcada com o tempo”. A história relata a confusão feita por dois grandes amigos, Paulo e Silas. Um deles, Silas se muda do Brasil para a Rússia. Chegando lá, liga para seu amigo, Paulo, para contar as novidades. Contudo, não se dá conta de que existe uma diferença de fuso horário entre as duas localidades. Assim, um dia Silas, logo depois do almoço, resolve telefonar para seu amigo. Para sua surpresa, Paulo é acordado pelo amigo, Silas, no meio da madrugada. Assim, é tecida a trama da história, os dois amigos começam a buscar informações sobre o porquê da diferença de fuso horário entre os dois lugares.

O grupo apresenta uma narrativa interessante e bem construída. Cria-se uma trama entre os personagens, instigando a curiosidade do leitor. A história incita o leitor

para tentar entender o porquê da diferença de horários. Há uma espécie de mistério, em que se busca explicar como pode haver horários diferentes em diferentes lugares da Terra. Tanto que o protagonista pergunta ao seu amigo se ele se encontra em outro planeta. No entanto, tudo acaba sendo resolvido de forma rápida demais. Assim, como nas demais histórias analisadas, o grupo apresenta todo o conteúdo científico de uma só vez (p. 2).

A primeira característica que chama atenção nessa história é o título. Os alunos, de forma bastante criativa, fazem um trocadilho com a palavra “fusos” e “confusos”, adiantando para o leitor a confusão existente entre os amigos Paulo e Silas. As frases curtas e o grande número de diálogos entre os personagens é a segunda característica, que parece bem sensata para uma história dirigida ao público infantil. Isso facilita o entendimento da história por parte da criança.

Ao contrário das demais, esta história não apresenta nenhum tipo de ilustração. Devo acrescentar que, esse tema é tão rico para a apresentação de esquemas, que poderia ser desenhado com certa facilidade. Será que nenhum dos alunos-autores tinha esse tipo de habilidade? Não é isso que se espera de um pedagogo, justamente o profissional habilitado para trabalhar com crianças pequenas? Não desenharam nem as que poderiam ser úteis para um melhor entendimento dos conceitos científicos apresentados na narrativa. Em conversa com o grupo sobre as ilustrações da história infantil, uma das alegações do grupo para que ela não fosse inserida foi:

-Professora, alunos do quarto ano já são grandes. Não precisam de tantas figurinhas na história (Marcos).

No momento, essa justificativa me pareceu uma desculpa. Mesmo achando que tenha sido uma desculpa do aluno, pois o grupo já não tinha mais tempo, reforço a hipótese de que esses alunos não compreenderam que, quando as explicações científicas expressas nos textos vêm acompanhadas de ilustrações, esquemas, diagramas etc., os alunos-leitores (crianças do Ensino Fundamental) têm maior clareza sobre o que é dito, reduzindo a possibilidade de desentendimentos e dúvidas.

Como mencionado, a narrativa apresenta frases curtas, buscando imprimir um diálogo o mais próximo possível da realidade das crianças, utilizando interjeições para demonstrar isso. Por meio delas, os alunos buscam exprimir emoções, sensações, dúvidas, enfim, o “estado de espírito” dos personagens. Esse recurso acaba por enriquecer a narrativa.

- HAN! 1 da tarde? Agora sou eu que não estou entendendo? Você está em qual “planeta”? (p.1)

- AAAAhhhh... Acho que ouvi meu pai falar algo sobre isso! – Exclamou Silas. Acho que tem a ver com a movimentação da Terra. Ou algo assim (p.1).

Os alunos-escritores cometem alguns deslizes quanto ao uso da norma culta da língua. Um deles pode ser visto no trecho “para entender melhor os fusos-horário (sic)”, faltou o “s” dos fusos horários e a expressão não tem o hífen.

A pontuação do trecho abaixo apresenta problema.

- Com o Silas e ele me acordou era de madrugada! (p.2)

Como se trata de um diálogo, as frases acabam sendo bem mais curtas, portanto, o melhor seria: “- Com o Silas, ele me acordou. Era de madrugada!”

Já o trecho a seguir, a frase está confusa.

- Mas eu não entendi o porquê que lá é dia e aqui noite!

Uma sugestão de escrita seria “Mas eu não entendi o porquê de lá ser dia e aqui noite!”

Em alguns parágrafos, identifiquei deslizes de pontuação, como nos trechos a seguir.

Paulo (sic) não se contendo de tanto entusiasmo e dúvida, procurou tia Tetéia (p.2).

Diante de tais indagações a professora decide usar tal situação para complementar sua aula. E viu nessa situação uma oportunidade de explicar um tema vasto e de muita importância para as crianças do quarto ano (p. 2).

No primeiro deles, faltou a vírgula, logo depois de Paulo. Já no seguinte, o ideal teria sido escrever “Diante de tais indagações, a professora decide usar tal situação para complementar sua aula e viu, nessa situação, uma oportunidade (...)”.

É interessante ressaltar, no trecho anteriormente destacado, que os alunos mencionam, na própria história, para qual ano escolar se destina o tema “fusos horários”, para o “quarto ano”.

Sobre os conceitos científicos apresentados, há um grande problema. Moscou tem 6 horas à frente do horário de Brasília e, portanto, não poderia ser uma hora da tarde para Paulo e de madrugada para Silas. Sei que eu, que os orientava, enquanto escreviam, deveria ter percebido o equívoco. No entanto, isso nem sempre foi possível, por dois motivos: tempo e fundamentação teórica. Eram cinco grupos em sala e todos queriam minha atenção ao mesmo tempo. O conteúdo científico também é um problema para a professora formadora, que também precisa consultar e aprender. Não há como saber Física, Química e Biologia com tanto aprofundamento.

O grupo comete um equívoco ao dizer que Paulo foi morar em um país chamado Moscou, quando o correto seria dizer, na cidade de Moscou na Rússia. Outro pequeno problema, de menos peso, que aparece no texto diz respeito à explicação dada sobre os movimentos de rotação e translação da Terra.

Sabemos que a Terra está em movimento e o sol está parado (...) (p. 2). Neste caso, caberia dizer que o Sol está parado em relação à Terra. Os movimentos são sempre relativos.

Ao apresentar os conceitos científicos, o grupo faz com muita propriedade. Busca dar muitos exemplos à medida que introduz as explicações, sobretudo sobre os fusos horários.

Imaginemos o planeta Terra com uma esfera perfeita. Agora vamos dividi-la em 24 partes iguais, de norte a sul ao longo dos meridianos; cada parte parece-se com gomos de mexerica ou poça, e cada gomo desse recebe o nome de fuso-horário (p. 2).

Percebo que estes conceitos poderiam ter sido apoiados em ilustrações, que tornariam as explicações ainda mais claras. Essas ilustrações poderiam ser facilmente feitas pelo grupo ou encontradas na internet.

Mas se por um lado os alunos não utilizam ilustrações, por outro traz elementos do dia-a-dia da criança para dar as explicações. Buscam exemplos de coisas que a criança conhece, como por exemplo, gomos de mexerica ou poncã, lanterna, varinha e esfera. Esses mesmos elementos são trazidos pelos alunos quando fazem o experimento em sala de aula sobre o projeto (item 6.2.6, p. 133). Isso demonstra uma preocupação do grupo em estabelecer um elo entre a história infantil e o processo de ensino- aprendizagem da criança por meio do experimento.