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1 – Características Investigativas Identificadas na Atividade Proposta

As atividades que foram desenvolvidas em função da exibição do filme “O dia depois de amanhã” envolveram várias características investigativas. Inicialmente, a organização dos estudantes em grupo e o engajamento deles em pesquisas prévias antes da exibição do filme podem ser associados à fase da problematização. Nesta fase eles foram levados a reconhecer a situação potencialmente problemática e identificar seus desafios. Além disso, foram levados a resgatarem o que já sabiam a respeito dos temas que seriam abordados; a identificar em que área do conhecimento os problemas levantados costumam ser abordados; a formular questões ou identificar processos que mereciam ser “explicados”.

Após a exibição do filme, cada grupo se envolveu em discussões e trabalhos focando novas questões e problemas diferentes abordados pelo longa-metragem. Esses trabalhos englobaram novas pesquisas ou experimentos. Em função dessas ações, os grupos dos estudantes se envolveram na fase investigativa de análise de dados e avaliação de resultados, na qual eles aplicaram e avaliaram conceitos, modelos das ciências para identificar as evidências que supostamente sustentam as informações, descrições, explicações ou interpretações que eles produziram a partir da investigação. Na fase seguinte, os grupos se envolveram na fase da investigação em que foram levados a tirar conclusão, fazer a síntese do trabalho. Nesta fase eles formularam explicações baseadas em evidências, compararam o modo como a situação problemática foi compreendida antes da investigação com a nova compreensão gerada à luz dos resultados da investigação; especularam sobre a existência de descrições,

133 explicações ou interpretações alternativas àquelas que foram produzidas por eles. Finalmente para a comunicação dos resultados, os grupos de estudantes produziram argumentos e modos para a divulgação dos resultados para o restante da turma e produziram textos escritos para divulgação dos resultados ao professor. Essas características dialogam com as apontadas por SÁ et al (2011), Sasseron, (2015) e Carvalho et al, (2013) para caracterizar uma atividade investigativa.

Vamos centrar nossas analises durante a comunicação pública dos trabalhos desenvolvidos pelos grupos. Para essa parte da atividade, todos os grupos de estudantes organizaram a apresentação do trabalho por meio de aplicativos como PowerPoint ou Prezi. Esta ferramenta cultural, permitiu os grupos organizarem as ideias do trabalho em uma sequência lógica para a comunicação pública dos resultados. Contudo, de acordo com Werstch (1998), uma das propriedades das ferramentas culturais é o fato de que ao enquanto ela permite a realização de determinada ação, inibe ou até impossibilita que outra ação seja realizada. Neste caso, o uso do suporte escrito para melhorar a oralidade dos estudantes acabou por inibir que os estudantes se utilizem de outros recursos comunicativos, como representações por desenhos, escrita, ou o simbolismo químico.

Durante as comunicações dos grupos o professor interage com os estudantes das mais variadas formas. Múltiplas intenções coexistem nestas intervenções e tentamos, a seguir, qualificar e quantificar a natureza das mesmas. Acreditamos que a própria estrutura da apresentação, em que os grupos estudam e apresentam determinados temas previamente propostos pelo professor faz com que os estudantes não se sintam autorizados para criticar ou questionar as apresentações dos colegas. Também percebemos que a natureza das intervenções era distinta entre professor e estudantes. A partir destas observações, construímos algumas categorias de análise. Estas categorias intencionam estabelecer em que sentido as ações comunicativas voltadas para o desenvolvimento da característica investigativa “valorização do debate e da argumentação” se instalaram em sala de aula.

Consideramos para a construção das categorias apresentadas a seguir as interações questionadoras e/ou argumentativas realizadas durante a apresentação dos trabalhos dos grupos. Estas categorias buscavam responder à indagação: “Qual a intenção deste agente – aluno ou professor – ao realizar a intervenção observada?”. O quadro 9, apresentado abaixo, indica algumas das categorias que foram construídas a partir desta observação das interações.

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Quadro 14: Categorias de análise das interações durante a apresentação pública das

investigações realizadas a partir do filme “O dia depois de amanhã”

A int er ve nç ão re al iz ad a t ev e por o bj et

ivo: estimular a participação dos demais estudantes questionar algum dado informado pelo grupo

trazer outros dados ou informações confirmar as informações do grupo contradizer informações do grupo

reforçar a importância de algo dito pelo grupo ressaltar aspectos do conteúdo de física ressaltar aspectos de Natureza da Ciência corrigir relações que o grupo apresentou

esclarecer uma dúvida do grupo sobre algum fenômeno falar acerca da natureza da comunicação científica fazer referência a outro filme (ou à linguagem do cinema)

A medida que cada um dos 20 grupos realizavam a apresentação de suas investigações, novas intenções foram sendo incorporadas a esse conjunto de categorias até chegar ao Quadro 14. Nesse sentido, foi possível identificar simetrias de intenção nas ações dos estudantes e do professor, o que indicia a existência de uma cultura escolar, em que os agentes têm alguma expectativa com relação às ações e posições que se espera deles. Sasseron (2015) aponta que esta cultura escolar é apresentada aos estudantes e construída ao longo de todo o processo de escolarização, ao nos dizer que:

Na escola, normas são definidas, por exemplo, por diretrizes curriculares, pelo projeto político pedagógico da escola, pelo regimento escolar, pelo contato do professor com suas turmas, podendo ser legitimadas por essas mesmas pessoas ou pelas diretrizes. Práticas escolares podem ser encontradas, por exemplo, nas atividades de sala de aula realizadas por professor e alunos, conversas entre professores sobre planejamento e atividades em momentos informais, como intervalos, brincadeiras e jogos escolares. SASSERON, 2015, p.54) Tal cultura escolar nos leva a refletir que estudantes e professores, além de sujeitos de direito, indivíduos construídos através da relação com outros, também representam papéis histórica e socialmente construídos.

A seguir, já com as categorias refinadas, assistimos novamente às gravações em vídeo e buscamos identificar quantitativamente o número de vezes em que determinadas intenções comunicativas apareciam e possíveis reincidências. Neste movimento de revisitar os dados, com novo olhar, fomos capazes de perceber nuances da interação entre os agentes no ambiente social da sala de aula que nos escaparam anteriormente.

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V.2 – Interações ocorridas durante a apresentação pública dos trabalhos dos