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Cidades mais violentas do Brasil

4.2 Caracterização do lócus

A coleta de dados foi realizada na Casa Abrigo de São Luís, instituição diretamente vinculada à Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação da Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça do Maranhão, em funcionamento há mais de treze anos, no acolhimento de mulheres em situações dramáticas de violência, normalmente com risco de morte.

55Qualitative analysis many things, but it is not a process that can be rigidly codified. What it

requires, above all, is an intuitive sense of what is going on in the data; trust in the self and the research process; and the ability to remain creative, flexible, and true to the data all at the same time. Qualitative analysis is something that researchers have to feel their way through, something that can only be learned by doing. (CORBIN; STRAUSS, 2008, p. 16).

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4.2.1 Casa Abrigo

Na sua conceituação, Mazoni et al. (1997, p. 66) estabelecem que

As Casas-Abrigo constituem-se em uma das ações de um Programa de políticas públicas de prevenção, assistência e combate à violência doméstica e de gênero. As casas-abrigo são locais seguros que oferecem moradia protegida e atendimento integral a mulheres em situação de risco de vida iminente, em razão da violência doméstica. É um serviço de caráter sigiloso e temporário, onde as usuárias permanecem por um período determinado, durante o qual deverão reunir condições necessárias para retomar o curso de suas vidas. O atendimento deve pautar-se no questionamento das relações de gênero enquanto construção histórico-cultural dos papéis femininos e masculinos, que têm legitimado as desigualdades e a violência contra as mulheres. Mazoni et al. (1997, p. 67) destacam ainda que “A situação de abrigo para os casos de risco de vida é uma contingência que se impõe a todo serviço de atendimento direto a mulheres em situação de violência.”

Assim, quando a violência doméstica contra a mulher leva a situações que prenunciam uma tragédia cujas condições se tornam insustentáveis e geram sentimentos de insegurança e medo, retirar a mulher e seus filhos menores de casa, dando-lhes teto e assistência, é a única alternativa que o Estado oferece como medida de proteção à vida e garantia dos direitos das vítimas.

O projeto das casas-abrigo resultou da necessidade vivenciada nos SOS- Mulher, cuja implantação teve como objetivo precípuo o apoio a mulheres que, juntamente com seus filhos menores, enfrentavam momentos difíceis, em quadro de indiscutível abandono. Por força do contato direto com a dura realidade da violência enfrentada por vítimas diretas de violência doméstica contra a mulher e da demanda de atendimento de casos de risco, essas instituições reformularam, a partir de 1999, sua proposta, passando a atender as mulheres em situações dramáticas, oferecendo-lhes abrigo e buscando preservar suas vidas e seus direitos.

Mantida pelo Tribunal de Justiça do Maranhão (TJ-MA), em São Luís, a Casa Abrigo de São Luís é um dos locais de atendimento a vítimas femininas de violência doméstica. Essa casa abrigo recebe mães sob ameaça de morte e também seus filhos menores de até 12 anos, quando encaminhados por órgãos de proteção, tais como a Delegacia da Mulher e a Vara Especial de Combate à Violência Contra a Mulher, e até maiores de 12 anos, quando houver, excepcionalmente, uma avaliação

123 dos profissionais do setor Psicossocial que recomende “a manutenção da agregação familiar”, conforme a Portaria no. 01/2012, de 27 de agosto de 2012, da Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça do Maranhão. (TJ-MA, Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar, Portaria No. 01/2012, de 27.08.2012)

Por meio de relatório individual de acompanhamento de caso, elaborado para avaliação das vítimas acolhidas e encaminhado a cada 30 (trinta) dias ao Juiz competente, a permanência na Casa Abrigo de São Luís é permanentemente avaliada. Essa permanência tem a duração máxima de noventa dias, com acompanhamento de uma equipe de profissionais que prestam atendimento de ordem psicossocial e de saúde, em um programa que envolve, além da participação em oficinas e treinamentos, palestras educativas e atividades físicas.

4.2.2 Histórico

Segundo Mazoni et al. (1997), depois da experiência dos SOS-Mulher, nos anos 70, e da criação da Casa da Mamãe, em 1986, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo implantou, em 1986, o primeiro abrigo no Brasil para mulheres em situação de risco – o Comvida – Centro de Convivência para Mulheres Vítimas de Violência Doméstica, que funcionou por três anos, fechando temporariamente e reabrindo em 1992.

Nesse período, em diversas cidades brasileiras, os movimentos de mulheres concentraram-se na reivindicação de implementação de casas abrigo como parte da política de combate à violência e, mais especificamente, à violência doméstica contra a mulher. Em decorrência dessa luta, implantaram-se, a partir de então, vários abrigos: a Casa Abrigo de Santo André (1990) e a Casa Helenira Rezende de Souza Nazareth, em São Paulo (1991), que, como o Comvida, funcionou até 1992, reabrindo depois, respectivamente, em 1997 e 2001, além da Casa de Apoio Viva Maria, em Porto Alegre (1992), a Casa do Caminho, em Fortaleza (1992), a Casa Abrigo, no Distrito Federal (1993) e a Casa Abrigo Sempre Viva, em Belo Horizonte.

Com base na experiência adquirida nessas implementações, proliferaram, no país, a partir de 1997, essas casas-abrigo, incentivadas e apoiadas pelo Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e financiadas pelo Ministério da Justiça.

124 As casas instaladas, entretanto, ainda são insuficientes para atender a demanda existente em nosso país, que continua extremamente carente de políticas públicas eficazes, incapaz, até o momento atual, de oferecer maiores garantias sejam elas de proteção, de apoio psicossocial e/ou de defesa da vida e dos direitos das vítimas brasileiras nessas situações dramáticas de violência.

Considerada pelas vítimas um lugar seguro, quando não há a quem mais recorrer após as violências sofridas, a Casa Abrigo de São Luís foi implantada em 1999, na gestão do então presidente do TJ-MA, desembargador Jorge Rachid, e ofereceu, desde então, atendimento a 621 mulheres e 1.016 crianças e adolescentes até março de 2012.

Apesar de já ter acolhido esse número significativo de vítimas desde a sua implantação, prestando um grande serviço à comunidade, esta ainda é, até esta data, treze anos depois de sua criação, a única Casa Abrigo em São Luís. A demanda aumentou e a cidade continua carente de políticas públicas que resultem na implantação de outros abrigos.

A Casa Abrigo de São Luís está diretamente vinculada à Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação da Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça do Maranhão, que é presidida pela desembargadora Nelma Sarney e tem como membros os juízes Nelson Moraes Rego, Sara Fernanda Gama e Micela Cezar Freitas.

4.2.3 Características

A Casa Abrigo de São Luís é uma instituição destinada a acolher mulheres maiores de 18 (dezoito) anos e seus dependentes que se encontrem em situação de violência doméstica e familiar, ameaçadas de morte por seu agressor, enfrentando sério risco de vitimização irreversível.

Destacamos que, além de oferecer atendimento psicossocial e de saúde, essa Casa oferece às vítimas acolhidas capacitação profissional e possibilidade de trabalho e renda. Essa capacitação por meio de oficinas de trabalhos artesanais permite que as mulheres, durante a sua permanência na Casa, se tornem capazes de gerar sua própria renda e alcançar sua independência financeira.

Considerando que a sujeição aos maus tratos e violência muitas vezes decorre, segundo o perfil das vítimas, da dependência do agressor, a oportunidade

125 de tal aprendizagem oferece-lhe, além de uma ocupação, uma terapia e uma profissão, a chance de um recomeço com maiores possibilidades. Dentre os programas oferecidos, destacam-se a oficina de tapetes e outros trabalhos artesanais, a de confecção de flores e a de biscuit. Atividades como prática de educação física e palestras educativas também fazem parte da programação semanal.

Após o encaminhamento, as vítimas diretas de violência doméstica são recebidas na Casa, sendo atendidas por profissionais da equipe que se compõe de assistentes sociais, psicólogos e enfermeiros e, depois de liberadas, são direcionadas aos serviços prestados pela rede pública, tais como o Programa Bolsa Família e a emissão de documentos.