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3.1 Metáfora, Linguagem, Cognição e Discurso

3.1.3 Metáfora e Discurso

A Análise do Discurso é uma das áreas da Linguística e começou a se delinear a partir da década de 60 do último século. Essa disciplina reúne um conjunto de teorias e correntes cujo objeto de estudo é o discurso, consideradas todas as suas modalidades escritas e orais.

Ao discutir as diversas áreas de investigação da Análise do Discurso, Maingueneau (2007, p. 24) classifica as abordagens relacionadas por Stubbe et al. (2003, p. 351) – “[...] pragmática, teoria dos atos de fala, análise da variação, teoria da adaptação da comunicação, linguística sistêmico-funcional, semiótica, proxêmica

76 e vários tipos de análise retórica, estilística, semântica e narrativa [...]”, de acordo com o que se segue.

Como disciplinas ou correntes, são listadas: a semiótica, a estilística, a etnografia da comunicação, a análise crítica do discurso etc.; como componentes necessariamente presentes nas interações verbais: proxêmica, polidez, atos de fala etc.; e, como concepções da linguagem, que não são próprias de uma corrente: pragmática (MAINGUENEAU, 2007). Isso demonstra que muitos são os estudos que se incluem na Análise do Discurso, e que, quando consideradas as divergências internas, torna-se difícil uma definição que abrigue todas as suas linhas de investigação.

Apesar de reconhecermos a existência de outras teorias e abordagens que se dedicam, sob a égide da Análise do Discurso, ao estudo da metáfora como fenômeno discursivo, tais como a Análise Crítica da Metáfora, de Charteris-Black (2004), é de nosso particular interesse, no caso desta investigação, a Análise do Discurso à Luz da Metáfora, proposta por Cameron (CAMERON, 2003, 2007a, 2007b, 2008; CAMERON; DEIGNAN, 2009; CAMERON et al., 2009; CAMERON; MASLEN, 2010).

Cameron (2007b, p. 200, tradução nossa), ao explicar a concepção de metáfora nessa perspectiva discursiva, destaca que a “Metáfora é vista como linguística, cognitiva, afetiva e sociocultural”22, definindo-a como uma ideia que

envolve múltiplos fenômenos em dimensões diversas. Essa abordagem, segundo Berber-Sardinha,

[...] tem como ênfase o estudo da metáfora em uso, no discurso. Ela está sendo desenvolvida por um grupo liderado por Lynne Cameron e tem como finalidade entender como e por que as pessoas empregam metáforas e que efeito as metáforas tem na interação. Isso é feito buscando-se sistematicidades do uso metafórico em textos e falas autênticas, colhidos em contexto real de produção. (BERBER-SARDINHA, 2010, p. 165).

Berber-Sardinha esclarece, também, que, por conta de não ser possível saber se a mente humana realmente processa as metáforas conceituais,

A unidade de análise primordial dessa corrente é a metáfora linguística, que pode ser vista como um trecho de texto falado ou

22Metaphor is seen as linguistic, cognitive, affective, and socio-cultural (CAMERON, 2007b,

77 escrito cujo significado no contexto é diferente de seu sentido base (basic sense) e que se remete a um domínio ou campo semântico diferente do predominante naquele momento. (BERBER-SARDINHA, 2010, p. 65).

Reiterando e complementando esse entendimento, Schröder (2008, p. 45), destaca que essa abordagem da metáfora está fundamentada em “[...] uma perspectiva da linguagem em uso que focaliza a interação social no processamento sendo efetuado.” Assim, ainda esclarece Schröder, é sugerida, pela autora,

[...] uma visão da conversação vis-à-vis como processo de talking-

and-thinking no qual há uma interação permanente entre cognição e

linguagem que, por conseguinte, não podem ser concebidas como domínios restritamente separados. (SCHRÖDER, 2008, p. 45).

Dessa maneira, com base nessa visão e nos pressupostos teóricos dessa abordagem, assim como na metodologia desenvolvida para coleta e análise de dados do discurso produzido, é investigada a emergência, ou não, de metáforas sistemáticas nas falas que resultam de interações verbais, em processo de talking- and-thinking, com permanente relação entre linguagem e cognição, em determinado evento discursivo.

3.2 Alicerces teóricos da investigação

Situamos, assim, a metáfora nos quadros teóricos da Linguística Cognitiva e da Análise do Discurso, nos quais se inserem, como veremos a seguir, as teorias que nos servirão de base neste trabalho.

Assim sendo, entendemos que, para que pudéssemos investigar os conceitos sobre violência doméstica contra a mulher, emersos na fala de suas vítimas diretas, durante evento discursivo que reuniu um grupo focal, seria necessário que, inserida no âmbito da LC, esta pesquisa tivesse sua fundamentação teórica ancorada nos pressupostos da metáfora conceitual (TMC e seus refinamentos), de Lakoff e Johnson (1980,1999) e da metáfora discursiva (Abordagem da Análise do Discurso à Luz da Metáfora), na visão de Cameron (CAMERON, 2003, 2007a, 2007b, 2008; CAMERON; DEIGNAN, 2009; CAMERON et al., 2009; CAMERON; MASLEN, 2010). Dessa forma, serão apresentados, a

78 seguir, os fundamentos e aspectos norteadores dessas teorias que se mostram mais importantes para esta investigação.

Inicialmente, discutiremos as teorias que têm como foco a metáfora conceitual, por entendermos que, mesmo contestada em alguns de seus aspectos, é de onde partem os estudos sobre a metáfora, seja para apoiar, complementar, questionar, contestar ou negar algum de seus pressupostos. Como origem de todo esse reposicionamento da metáfora e, ainda hoje, respeitadas por suas valiosas contribuições, é relevante revisitar a teoria inicialmente proposta por Lakoff e Johnson (1980, 1999), assim como seus refinamentos (JOHNSON, 1987; LAKOFF, 1987, 1990, 1993).

Primeiramente, abordaremos a Teoria da Metáfora Conceitual; discutiremos, em seguida, a Teoria dos Modelos Cognitivos Idealizados, que inclui a visão experiencialista; e abordaremos, por fim, a Teoria Integrada da Metáfora Primária, que incorpora algumas propostas que preenchem suas lacunas, expandindo e aprimorando a proposta teórica inicial (TMC).

Passaremos, então, a tratar da Análise do Discurso à Luz da Metáfora, tendo como base a proposta de Cameron (CAMERON, 2003, 2007a, 2007b, 2008; CAMERON; DEIGNAN, 2009; CAMERON et al., 2009; CAMERON; MASLEN, 2010), que fundamentará a nossa investigação, incluindo alguns aportes teóricos da Teoria do Caos e da Complexidade, assim como da Teoria dos Sistemas Adaptativos Complexos.