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Cartas Lunares

No documento 2008MadalenaTeixeiraPaim (páginas 82-85)

3 A ESCRITA CONSTRÓI SEU IMPÉRIO

3.6 Duas linguagens, dois textos, um mundo

3.6.1 Cartas Lunares

Marcelo Benedito, o astrônomo solitário

3.6.1.1 Uma história de amor

Marcelo Benedito, um astrônomo solitário (conforme o subtítulo), descobre uma pequena estrela e a ela dirige uma carta, iniciando-se, assim, um relacionamento pautado pela amizade e pelo amor. As cartas entre Marcelo Benedito e Vésper Ninfa (a estrela) eram semanais e Marcelo continuava vasculhando o céu e observando-a com seu telescópio. É assim que, um dia, descobre Vésper chorando, e escreve para ela perguntando a razão da tristeza, afirmando que não poderia ser feliz se ela estivesse triste. Em sua

resposta, Vésper Ninfa diz que fora apenas uma lembrança triste, momentânea. Marcelo Benedito escreve colocando, entre outras coisas, que, desde o momento em que a descobrira, tivera os dias mais felizes de sua vida. Na mesma carta, ele convida a estrela para a festa de seu aniversário e assina, pela primeira vez, Marcelo Benedito, o Feliz. Na data marcada, a estrela vem ao seu planeta e assiste a uma apresentação de fogos de artifício, especialmente preparada por Marcelo Benedito, que culmina com uma inscrição: “Esta noite ficará para sempre. Só é eterno o que foi breve”. (OLIVEIRA, 2005, p. 16)

Rui de Oliveira trabalha, através da trajetória das personagens, a idéia da construção de um relacionamento e da fugacidade das coisas, mesmo que seja o amor. A distância existente entre os astros é metáfora para a distância existente entre duas pessoas que iniciam uma relação e que, vai, pouco a pouco, sendo percorrida. Eles se comunicam por cartas – palavras escritas demandam cuidado, tal como as palavras usadas entre pessoas não se conhecem e se respeitam.

A idéia de fugacidade está presente nas palavras de Marcelo, ao dizer que a eternidade existe apenas no momento. Porém a mesma concepção é trabalhada anteriormente, com a queima dos fogos de artifício, preparada com toda a arte, por Marcelo, e guardada por muito tempo. Os fogos são de um esplendor apenas momentâneo; seu ciclo é breve, como tudo que é eterno.

3.6.1.2 Cenário e personagens: lendo palavras e imagens

O cenário da página inicial de apresentação da história “Cartas Lunares” e onde consta o título sugere um pequeno planeta ou mesmo um asteróide, com inúmeros pequenos desenhos em formatos diferentes, espalhados, e que se assemelham a estrelas, asteróides, enfim, corpos celestes de diferentes formas, distribuídos pelo chão do asteróide, o que poderiam ser pedras, e também formas que poderiam ser duas grandes flores.

Nas páginas que seguem, o cenário modifica-se. Na segunda ilustração da história, o foco tomado pelo artista mostra o corpo celeste um pouco mais de longe e pode-se ver uma pequena mesa com um papel e um tinteiro, além da personagem. O céu é mais amplo também, mostrando um grande número de pequenos astros.

No cenário seguinte, a personagem aparece no topo do que seria um castelo, olhando por meio de um telescópio o céu, desaparecendo o formato do asteróide, mas se mantendo o céu com seus pequenos astros.

Na próxima ilustração surge, pela primeira vez, a personagem feminina para quem o astrônomo solitário estava enviando cartas. Ela está dentro de um espaço que seria a de um palácio, pelas colunas e capitéis desenhados, mas não há janelas ou paredes que limitem o espaço. O céu está presente com todos seus astros e asteróides. No que seria chão também há várias figuras geométricas distribuídas, e numa pequena mesa encontram-se uma folha de papel e um tinteiro.

No último quadro, o cenário é diverso de todos os outros, não se parecendo com nenhum dos anteriores, porque agora há mais céu do que terra. Na vastidão da abóbada celeste, os astros por ela distribuídos, sugerem inúmeras e repetidas formas de coração, mas são em tão grande número que é preciso prestar atenção para o que fica desenhado através de sua colocação.

Nessa primeira história há apenas duas personagens. Como o subtítulo diz, uma delas é Marcelo Benedito, o astrônomo solitário, e a outra é Vésper Ninfa, uma estrela para quem o astrônomo começa a escrever cartas semanalmente. O astrônomo está usando roupas de uma época imaginária e um chapéu e aparece em duas ilustrações com uma luneta na mão, sugerindo procura. Na terceira gravura, ele está perscrutando o céu com um telescópio e, na última, está de mãos dadas com a estrela, Vésper Ninfa, que aparece, pela primeira vez, apenas na penúltima ilustração da história, também vestida como as princesas das histórias infantis. No seu chapéu e em seu manto há algumas estrelas dispersas, que completam o traje de uma delicada dama.

Os cenários iniciais mostram a solidão em que vivem as duas personagens, cada uma habitando um astro celeste diferente, e distantes o suficiente para se comunicarem apenas

por cartas. O afastamento entre os dois astros também fica determinado quando Marcelo observa Vésper por meio de instrumentos óticos adequados para se ver à distância, como a luneta e o telescópio. É ele que inicia a navegação ou conquista pelo envio da primeira carta. Mas Vésper Ninfa é quem se desloca até seu planeta. Assim a história se encerra, com a celebração de amor planejada por Marcelo.

Cenários e personagens se completam, através do uso da palavra e na observação das ilustrações. O texto das imagens apresenta detalhes ausentes do texto escrito, que apenas narra a ação das personagens. Na última gravura da história, está uma exemplificação do fato. Enquanto as palavras contam da queima dos fogos, a cena abrangida pela imagem mostra não fogos, mas os mesmos corpos celestes presentes nas gravuras anteriores, ordenadas, formando corações no céu – uma transposição das palavras existentes no texto em outra linguagem.

No documento 2008MadalenaTeixeiraPaim (páginas 82-85)