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maioria dos terapeutas não médicos trabalha e se movimenta nos espaços alternativos espalhados pela região Metropolitana do rio. a quase totalidade desses espaços que se encontram atualmente em funcionamento oferece atividades terapêuticas. a grande maioria data do início da década de 1990. isso não significa dizer que a oferta dessas terapias tenha surgido nessa época. o que pode ser observado, comparando-se com a década de 1980, é que, segundo me relataram vários entrevistados, o seu número era muito reduzido e sua maior parte fechou ou passou por uma redefinição de perspectivas.

Pode-se dizer que os espaços alternativos que surgiram ao longo dos anos de 1980 possuíam um perfil mais acentuadamente esotérico, com uma predominância de atividades não estritamente terapêuticas, como é o caso dos oráculos em geral. não se pode concluir, no entanto, que a dimensão terapêutica não tivesse relevância para o adepto do mundo alternativo daquela época.

Por outro lado, não se pode deixar de observar que a reconfigu- ração da questão terapêutica, durante os anos de 1990, está intrinseca- mente ligada à dinâmica de surgimento e estruturação desses espaços, apresentando três momentos distintos:

a. os primeiros espaços alternativos datam da década de 1970 e configuram experiências isoladas, pontuais e diferentes

entre si. em contraste com um público flutuante, o quadro dos profissionais envolvidos em cada uma dessas experiências tendia a ser estável e afinado aos princípios mais gerais que compunham o perfil desses espaços.

b. durante a década de 1980 – em especial na segunda metade –, os espaços alternativos começaram a surgir em maior número e, principalmente, ganharam maior visibilidade, no bojo de um movimento de “abertura” das práticas alternativas a um público mais diversificado. o perfil adotado pelos espaços que surgiram nessa época continuava acentuadamente esotérico, mas era mais “aberto” ao público em geral, através da promoção regular de atividades variadas – cursos, workshops, consultas e pales- tras –, onde as técnicas terapêuticas também compareciam, mas em menor escala que a oferecida atualmente. Por outro lado, os espaços que priorizavam a questão terapêutica eram basicamente instituições de formação profissional com um en- foque direcionado, abarcando uma ou um conjunto restrito de técnicas afins, como é o caso, por exemplo, da acupuntura. c. o que podemos observar na década de 1990 parece ser uma re-

configuração da oferta de cursos e atendimentos terapêuticos no âmbito dos espaços alternativos. Uma parcela crescente de espaços que durante a década de 1980 possuíam um perfil acentuadamente esotérico vão, pouco a pouco, incorporando um número cada vez maior de técnicas terapêuticas ao leque de atividades oferecidas, promovendo uma pulverização das possibilidades de formação profissional nessa área, não mais restrita aos institutos da década anterior. os espaços alterna- tivos que surgiram na década de 1980 conseguiram sobreviver à década seguinte a medida que redefiniram o perfil das ati- vidades oferecidas, o que significa dizer que incrementaram a oferta de atividades terapêuticas. se, na década de 80, os espaços alternativos eram fortemente marcados pelo perfil esotérico, a novidade que a década seguinte trouxe foi o surgimento dos espaços terapêutico-alternativos.

a crescente proliferação de cursos, ao longo da década de 1980, constituía um poderoso indicador de que a demanda pelas práticas alternativas se tornava cada vez mais extensiva ao público em geral. implicado nesse mesmo movimento surgia em progressão geométri- ca um número cada vez maior de profissionais dispostos a promover cursos e atendimentos. devido a um relativo inchaço de profissionais na rede, já no início da década de 1990, aliado ao agravamento da crise econômica pela qual vinha passando o País, ao longo de toda a década de 1980, criaram-se inúmeras dificuldades para a manutenção de um espaço particular, onde pudessem ser oferecidos cursos, workshops e atendimentos. some-se a isso as dificuldades pelas quais passa qualquer profissional liberal, em início de carreira: ainda desconhecido e com uma pequena e flutuante clientela.

no bojo desse movimento de especialização terapêutica no âmbi- to da nebulosa místico-esotérica é que se desenvolveu a rede terapêutica alternativa, através do crescimento muito mais acentuado – se compa- rado à década anterior – de espaços alternativos. Começaram a surgir em maior número, principalmente na Zona sul carioca (especialmente em Copacabana) e na tijuca.

a partir do inventário de anúncios de espaços alternativos que realizei, listei 112 espaços assim distribuídos:

Gráfico 2 – Distribuição dos espaços alternativos na Região Metropolitana do Rio de Janeiro

a distribuição desses espaços, em números absolutos, nas zonas sul e norte do rio de Janeiro, onde se localiza a sua maioria, aparece nos gráficos a seguir:

Gráfico 3 - Distribuição dos espaços alternativos por bairros da Zona Sul carioca

Gráfico 4 - Distribuição dos espaços alternativos por bairros da Zona Norte carioca

a principal motivação do surgimento de muitos desses espaços alternativos, na década de 1990, residia, segundo vários relatos, nas dificuldades de viabilizar economicamente um empreendimento ex- clusivamente pessoal. a proposta de associação de vários profissionais trabalhando em um mesmo espaço físico deu-se menos por afinidades pessoais e conhecimentos anteriores, do que pelo reconhecimento das inúmeras dificuldades financeiras que concorriam para a viabilidade de um projeto pessoal, tido como incerto, ousado e arriscado.

a título de ilustração apresento aqui uma trajetória típica de “nas- cimento” de um dos muitos espaços existentes. esse espaço alternativo foi criado em 1990, a partir do projeto inicial de uma astroterapeuta que, na época, ainda era estudante de um conceituado curso de astrologia no rio de Janeiro. algum tempo após o seu ingresso no curso, ela resol-

veu abrir o seu espaço, a princípio junto com outra pessoa do curso de astrologia que possuía muitos contatos. o principal ela já possuía: um imóvel relativamente amplo, com excelente localização, de propriedade de seu ex-marido e que estava à sua disposição. Conforme descreve sua filha, que administra esse espaço:

no começo, ele [o sócio] pensou numa associação, numa coisa sem fins lucrativos... mas aí, começou a vir muita gente que não tem... dinheiro pra bancar curso fora, por que é muito caro aqui em ipanema, uma sala... por que aqui, a gente oferece... a pessoa paga o que usa. então, começou a vir muita gente interessada nisso [...] e aí, eu acho que, com o tempo, ele foi se desinteressando, que ele viu que não era bem o que ele queria, de ninguém ganhar dinheiro e a coisa aberta assim... ele foi meio saindo e acabou ficando eu e a minha mãe. [...] e começou a vir muita gente inte- ressada nessa coisa de aluguel de horário, que não tem dinheiro pra bancar um consultório. e também não tinha nenhum espaço aqui na época em que a gente abriu, era uma coisa muito nova... a estrutura de funcionamento desse espaço não constitui uma exceção à regra. Boa parte deles, dos que estão atualmente em funcio- namento, tende a adotar algumas regras básicas de funcionamento:

a. ampla variedade de atividades oferecidas, distribuídas entre cursos, consultas e workshops;

b. Flexibilidade de horário das atividades, compondo uma agenda articulada em função da disponibilidade de horário do terapeuta e do paciente;

c. Flexibilidade na utilização do espaço físico, o que os leva a não ter sala própria. a utilização das salas é feita mediante o tipo de atividade que nelas são oferecidas;

d. atendimento centralizado para a marcação das atividades; e. sistema de aluguel de horários das salas, com flexibilidade

de pagamento, podendo constituir-se numa taxa fixa ou num percentual sobre o valor da consulta.