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6.6 Reflexões do perfil de concepção esportiva dos professores-técnicos

6.6.2 Categoria de análise: Competências do Professor-Técnico

Na compreensão dos professores, ser técnico de esporte escolar perpassa pelo conhecimento técnico-instrumental (14), conhecimento didático-pedagógico (24), ensino dos valores esportivos universais (18) e qualificação da prática pedagógica (2).

Durante a análise do processo de formação dos professores-técnicos, observou-se que os saberes profissionais possuem certa unidade70 em relação à fundamentação das competências e ao mesmo tempo, subsidiam a utilização de diferentes recursos requisitados para atuar como técnico escolar. Como destaca Tardif (2000, p. 14), os saberes profissionais não formam um conhecimento unificado porque “são, antes, ecléticos e sincréticos” devido aos “vários objetivos que os professores procuram atingir simultaneamente”, e que não exigem necessariamente, os mesmos conhecimentos, competências ou habilidades.

Nesta perspectiva, o conhecimento técnico-instrumental significa “o que” ou quais conteúdos os professores-técnicos precisam saber. Este conhecimento na visão dos professores é sustentando pelo domínio de conteúdos das áreas biológica e psicológica. Os principais conteúdos pertencentes ao domínio de conhecimento biológico estão relacionados com o desenvolvimento (1), crescimento (1), maturação (1), nutrição (1), aprendizagem e controle motor (4), treinamento esportivo e competição esportiva direcionada aos jovens esportistas (12). Os conteúdos pertencentes ao domínio psicológico estão relacionados aos aspectos emocionais e controle de ansiedade (3) dos alunos-atletas durante os treinos e/ou competições escolares.

Há outros componentes do conhecimento técnico-instrumental que integram os saberes profissionais dos professores-técnicos como o gerenciamento, a reflexão e a qualificação da prática pedagógica (2)71. Estes componentes auxiliam na sustentação do domínio dos conteúdos específicos sobre o esporte através da realização de cursos e atualizações permanentes por meio de estudos e pesquisas científicas imbricadas com a prática pedagógica.

Outro conhecimento importante é o didático-pedagógico que significa “como” ou quais metodologias e/ou estratégias de ensino e aprendizagem os professores-técnicos se fundamentam e utilizam em situações de treinos e competições escolares. A aplicação do

70 Conhecimento acadêmico, experiência como atleta e técnico escolar e não escolar.

71 Apesar de 12 professores destacarem a relevância do gerenciamento e qualificação da prática pedagógica durante o processo de formação na categoria de análise anterior, somente dois professores ressaltaram a importância do gerenciamento e qualificação da prática pedagógica na categoria das competências para ser técnico escolar.

conhecimento para o rendimento esportivo ancora-se na administração, organização e gerência das turmas de treinamento e das equipes que disputam as OE (3). Deste modo, os caminhos considerados pelos professores que compreendem o ensino das modalidades esportivas devem considerar a ludicidade e a formação esportiva geral na iniciação, objetivando em seguida, diversificar o repertório motor (2). Assim, o aumento da dificuldade de execução das tarefas motoras através de atividades combinadas são pré-requisitos para o treinamento específico (desenvolvimento da aptidão física, desempenho motor e a inteligência tática dos alunos- atletas) das modalidades esportivas praticadas (9).

A aplicação do conhecimento didático-pedagógico direcionado aos aspectos educacionais no ensino do esporte no contexto escolar pauta-se nos princípios democráticos e inclusivos (6). Para 17 professores, a função primária do professor na escola é utilizar o esporte como ferramenta transformadora, objetivando a formação cidadã dos alunos. Além disso, não é prioridade da escola e do professor de Educação Física, detectar ou formar alunos-atletas para o alto rendimento, porém existe a possibilidade de apoiar os alunos, caso queiram prosseguir na carreira esportiva como uma função secundária (2).

Outra observação que deve ser ressaltada é que o conhecimento técnico-instrumental e didático-pedagógico que integram os saberes profissionais são personalizados. Cada professor se apropria, incorpora e embute saberes e experiências de modos diferentes em situações contextualizadas e particulares de trabalho (TARDIF, 2000). Nesta direção, os professores- técnicos têm como objeto de trabalho os alunos-atletas - seres humanos - que pertencem a diferentes grupos, mas que são em sua essência, individualizados. Embora o professor trabalhe com o coletivo de alunos, é necessário atingir cada indivíduo que compõe o grupo. Isto perpassa pelo conhecimento das particularidades individuais e deve estar repleta de sensibilidade e discernimento relativos às diferenças existentes entre os alunos.

O saber profissional para Tardif (2000) requer um componente ético e emocional: ético porque leva a um constante questionamento de valores e maneiras de como ensinar sem perder de vista o consentimento da cooperação, da tolerância e do respeito; e emocional porque é necessário motivar e envolver os alunos a aprenderem, exigindo mediações complexas da interação humana entre professores e alunos.

Em seu estudo, Tardif (2000) destaca que os saberes profissionais são personalizados, situados e carregam as marcas do seu objeto, que é o ser humano. Diante desta ótica, os valores esportivos universais significam “para que” e podem ser considerados como um dos principais conteúdos de ensino do esporte no contexto educacional. Isto implica em assumir uma educação humanística que transcenda os aspectos físicos, técnicos e táticos, a começar pela

conduta exemplar do professor-técnico (3), “para que” o esporte promova os valores morais e éticos, objetivando que os alunos-atletas adquiram atitudes positivas como o “saber-ser”: ser responsável, ser honesto, ser dedicado, ser disciplinado, ser cooperativo, ser determinado, respeitar o próximo e valorizar a amizade (15). Para três professores, é essencial considerar a valorização da participação de seus alunos independente dos resultados obtidos, para que os alunos saibam de outros benefícios como o desenvolvimento físico, mental e social que visam à qualidade de vida.

Diante do que os professores-técnicos descreveram sobre os valores esportivos universais, de forma análoga, é o que Contreras (2002, p. 76) afirma dizendo que a “profissionalidade docente deriva do fato de que o ensino supõe um compromisso de caráter moral para quem o realiza”. A obrigação moral (questão pessoal e política) e a consciência da autonomia docente implicam vínculos emotivos e relações de afeto, bem como representa o comprometimento ético (profissional) do professor com o desenvolvimento de todos os seus alunos como pessoas e seres únicos, na realização do ensino.

Nesta direção o saber-ser condiz com o domínio ético e está relacionado com o comprometimento da verdade, da justiça, da imparcialidade, das atitudes e dos valores da conduta moral. Assim, o compromisso educativo só tem sentido se estiver pautado em valores que humanizem o homem (AZEVEDO, 2012; BETTI, 1997; BENTO, 1999). Neste sentido, os valores humanos são a bússola ética e “as qualidades ou significados que o ser humano atribui à realidade por meio de impressões e juízos manifestados através da consciência moral” (AZEVEDO, p. 41, 2012).

Portanto, a conduta moral e a ética do professor têm como principal responsabilidade, como afirma Marques (2000), ensinar o esporte na perspectiva da dimensão humana, combatendo os excessos ou a crise de valores72, contribuindo no desenvolvimento da axiologia, fundamentada na equidade e justiça, verdade e beleza, esperança e sonho.