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CAPITULO 1: AUTOGESTÃO: (TRANS)FORMAÇÃO DE IDEAIS E EXPERIÊNCIAS

1. O SOCIALISMO UTÓPICO

1.2 Charles Fourier (1772-1837)

François Marie Charles Fourier nasceu em Besançon em 1772, de uma família de comerciantes de classe média. Procurou ganhar a vida como empregado de oficina, vendedor viajante. Foi empregado do comércio em Lyon.

Segundo Kropotkin (1916), Fourier já na sua infância, quando colocado para trabalhar em uma casa comercial onde observou de perto as “inomináveis especulações e fraudes cometidas”, rebelou-se contra o comércio e jurou combatê-lo.

Para Kropotkin (1916), foram os ideais dos sans-culottes10 que influenciaram Fourier a partir da idéia de nacionalização do comércio, pregada por L’Ange, autor de um plano de associação denominado “Associação Voluntária”.

Fourier descobriu sua teoria ao comer uma maçã em Paris e constatar que era cem vezes mais cara do que em sua terra Besançon. Fourier não apenas fazia uma crítica ao capitalismo como apresentava uma interpretação global e unitária do universo, “sugerindo um plano de reorganização da sociedade através da associação voluntária que refletia as aspirações de uma classe média urbana, prejudicada pelo desenvolvimento capitalista” (Teixeira, 2002, p. 63).

Para Teixeira (2002), Fourier propõe uma reforma do homem e considera que o autor não era contra a propriedade privada, nem que a organização social que propõe seja comunista, pois respeitava o direito à herança e considerava riqueza e pobreza como fatos naturais. Apesar de antiigualitário e antidemocrata, era anti-autoritário e propunha que o Estado fosse uma federação de associações livres.

Em sua obra O Novo Mundo Industrial e Societário de 1829, Fourier denomina de novo mundo Industrial a ordem societária que imagina, que cria. Neste mundo próprio, o

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Expressão francesa que designa os adeptos populares da causa revolucionária. São compostos pela pequena e média burguesia das cidades, e contam com lojistas e outros pequenos comerciantes, artesãos e artífices de todas as profissões. Defendiam idéias radicais, apoiando os interesses populares contra a alta burguesia que assumira o controle da Revolução. A designação de "sans-culottes" vem do uso de largas calças até os pés. Os aristocratas e a alta burguesia vestiam os "culottes", espécie de calções justos que apertavam no joelho.

trabalho é a base, onde os “desocupados” trabalhariam com prazer, cuidando tanto de suas propriedades quanto das fábricas. A partir das chamadas Séries Passionais ou de Grupos Constrastantes, o trabalho se tornaria agradável, guiado pelas paixões. Fourier concebe um mundo “direito” em que a justiça e a verdade são meio de enriquecimento.

Fourier propõe a associação de famílias na produção industrial, e acredita que poderia dar certo pela vontade Divina e a partir da atração passional, suposição ligada à teoria de Newton. Para o autor, a finalidade da ordem societária estava em associar o passional e o material, conciliando as paixões, os gostos, o caráter, os instintos e as desigualdades.

Nesta obra, o autor considera que os benefícios cedidos aos pobres, os quais chama de classe operária, levavam à ociosidade e, para resolver tal problema, seria preciso encontrar um mecanismo de atração industrial que tornasse o trabalho prazeroso. As condições para o estabelecimento desse mecanismo societário seriam a atração industrial, a repartição proporcional e o equilíbrio populacional. Para Fourier, a paixão só poderia ser sustentada se houvesse um método de repartição eqüitativo, e que o estado societário tem que equilibrar a população para que não exista miséria.

Fourier critica Owen, pois acredita que seu método seja contrario à natureza ou atração. Para Fourier, Owen “lança ao descrédito a palavra, ele a torna o objeto de especulação, fantasiando-a com formas filantrópicas” (Fourier in Teixeira, 2002, p.71).

Fourier concebia que nenhum escritor ou empreendedor havia chegado ao cerne da questão, que era a associação das paixões, o desenvolvimento de cada indivíduo sem prejudicar o grupo, fazendo brotar as vocações desde a infância e colocando as pessoas nos postos em que a natureza convoca.

Para que este novo mundo societário fosse possível, Fourier sugeria a formação de Falanges de Séries Passionais. Sua proposta era que se formassem cozinhas, adegas, celeiros coletivos que implicariam maior economia em relação à propriedade fragmentada. Cada coletivo teria especialistas trabalhando neles. Por exemplo, o pão seria feito por padeiros especializados e assim tornaria a produção mais barata.

Para a formação deste sistema, as funções industriais seriam divididas em: atividades domésticas, atividades agrícolas, atividades manufatureiras, atividades comerciais, atividades de ensino, estudo e emprego das ciências e estudo e emprego das artes.

As falanges deveriam ser constituídas de 1800 pessoas. Fourier acreditava que mais de 2000 pessoas gerariam confusão e complicação, enquanto que menos de 1600

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pessoas deixaria a falange frágil em suas ligações e sujeita a falhas no mecanismo com lacunas de atração industrial.

De acordo com Kropotkin (1916), as falanges resolveriam o problema da troca e da distribuição dos produtos de primeira qualidade. Porém, a comuna não seria proprietária dos produtos armazenados, mas sua depositária, como intermediária de recepção e distribuição, sem fins lucrativos, uma espécie de cooperativa de consumo e comercialização.

Engels (1980) considera que Fourier, a partir de sua crítica às condições sociais existentes, “põe a nu, impiedosamente, a miséria material e moral do mundo burguês”. Porém, Fourier realizou seu projeto social sem atenção à materialidade e ao fator político, pois ao avaliar que a sociedade burguesa se movimenta em um “ciclo vicioso” de contradições em que não pode superar, conseguindo sempre o contrário do que se deseja, Fourier cai na mesma dialética de Hegel, projetando no seu estudo da história a idéia do futuro desaparecimento da humanidade.