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E, a partir desse locus privilegiado, impessoal, podemos compreender o Idealismo objetivo que Peirce soube ver em Schelling (1775-1854) 265 : a mente – é mais fácil

1.3.2. As Ciências Psíquicas.

O fato de Peirce ter dividido as Ciências Especiais (Idioscopia) em (1.3.1) Ciências da Natureza; e, (1.3.2) Ciências Psíquicas (ou Humanas) deveria bastar para fazer o leitor compreeender a Díade (Matemática) presente nelas. Enquanto entre os elementos da Natureza há também uma Díade (a Segundidade fenomenológica), e uma inegável Tríade (a Terceiridade fenomenológica), a primeira é “fato bruto” (anancasmo) e a segunda é regida pelo “instinto” (inconsciente).

Já no universo das Ciências Psíquicas ou Humanas – o do Homem-Símbolo, capaz de produzir um Argumento - há o elemento da Reflexão Consciente (daí o Espelho ou

Speculum). A Conduta (Ação) do Homem-Símbolo pode ser uma inação (paralizada e paralizante) – Monádica (Matemática), uma contemplação (Estética, Mística; do Belo, Sublime ou Deus), mas ela tem o potencial de ser uma ação Ética (Normativa), porque fruto de Reflexão (Lógica, Metafísica), podendo se tornar Razoável (e até Admirável).

Para Platão – e certamente para Peirce, para quem a Lógica (e a Metafísica) dependem da Ética e da Estética – “a Filosofia nasce do espanto” (Estética). Aquilo que nos aparece (phanera) é verdadeiramente inacreditável. “Isso” arranca-nos de um monadismo (ensimesmado) para uma dualidade (Sujeito-Objeto) que assim não deve permanecer – senão ficamos – eticamente – no “olho-por-olho” e “dente-por-dente”, i.e., na ação-reação (inconsciente; e projetiva), traduzida em guerras (políticas ou religiosas, em geral) sem fim.

Com o advento do Homem-Símbolo, na Evolução (Sinequismo), surge um fato novo, aparentemente assimétrico, que precisa ser resolvido. A Tríade (matemática) – na matriz (Peirce é Idealista e Realista!) -, a vaga Terceiridade (fenomenológica) vai – ao tomar Consciência – tornar-se uma terceira Ciência Normativa, a Lógica; ou, Semiótica, e ganhará maior expressão na Metafísica (onde questionará seu início – Ontologia -, seu meio –

Cosmologia – e, seu fim, que é a Metafísica Religiosa), pois está claro – assim esperamos - que o Homem-Símbolo não pode se contentar com nenhuma dessas Ciências (digamos)

Menores (i.e., de pequeno alcance), sejam as Heurísticas fenomenológicas ou normativas, ou as Especiais -, mas deve buscar conhecer-se – i.e., desenvolver-se – em sua plenitude, e isto demanda o estudo da Antropologia, da Sociologia, da História (por demais “extrovertidas”), sim; mas especialmente da Psicologia e da Religião, em suas vertentes menos “duras” (superficiais), mas mais profundas como veremos.

Vamos, então, debruçar-nos sobre as Ciências Psíquicas, na “Arquitetônica” de Peirce.

Peirce divide as Ciências Psíquicas em “(a) Nomológicas, ou Psicologia; (b) Classificatórias, ou Etnologia; e, (c) Descritivas, ou História”. (An Outline Classification of

the Sciences(1903; “Um esboço da classificação das ciências”; em EP 2, p. 259)

“As Psíquicas Nomológicas descobrem os elementos gerais e leis dos fenômenos mentais. Ela é muito influenciada pela fenomenologia, pela lógica, pela metafísica e pela biologia (um ramo da física classificatória)”. (Ibid., ibidem)

Veja, caro leitor, como a Ciência Nomológica (Psicologia) está associada ao fato monádico (matemático), à primeira das categorias (fenomenológicas), à estética (normativa) e à ontologia (metafísica); como a Ciência Classificatória (Etnologia, Sociologia, Religião) está relacionada à díade (matemática), à segunda das categorias (fenomenológicas), à ética (normativa) e à cosmologia (metafísica); e que, a Ciência Descritiva (História, Crítica Literária), está associada ao triadismo (matemático), à terceira das categorias (fenomenológicas), à Lógica (normativa) e à Metafísica Religiosa (Metafísica).

Peirce divide a Psicologia Nomológica em “(i) Psicologia Experimental; (ii) Psicologia Fisiológica; e, (iii) Psicologia Infantil (Ibid., p. 261).

A Psicologia é a mais interessante de todas as Ciências Especiais de Peirce, posto que o Homem-Símbolo é o Ser Psíquico. Ele é o único ser (até onde sabemos) consciente de seu triadismo – Sentimento (Emoções), Vontade (Impotência), Inteligência (Ignorância) – e capaz de alterar sua Natureza e produzir História e Cultura (em seu sentido mais largo), e mais, é capaz de questionar sua Matriz Metafísica (Ontologia; Ágape) e seu Télos (Metafísica Religiosa).

E quanto à segunda das Ciências Psíquicas, as Psíquicas Classificatórias? Para Peirce,

As Psíquicas Classificatórias classificam os produtos da mente e tentam explicá-los através de princípios psicológicos. No presente ela está ainda em sua infância (exceto a linguística). Ela empresta da psicologia e da física. (Ibid., p. 260)

Peirce divide a Psicologia Classificatória em “(i) Psicologia Especial (Individual,

Hereditária, Anormal, de Massa, da Raça e Animal) (ii) Psicologia Linguística (Lexical e

Gramatical); e, (iii) Etnologia (Etnologia dos Desenvolvimentos Sociais, costumes, leis,

religião e tradições; e Etnologia da Tecnologia”; Ibid, p. 261).

Dê-se conta, caro leitor, de que – para Peirce -, na Segunda (e verá que na Terceira) das Psíquicas Classificatórias, não se sai da Psicologia, i.e., do “fato (humano) bruto”. Do

mesmo modo que nas Ciências Naturais se saiu da Física – da unidade (monádica; mas indeterminada) - para a complexidade (determinada) da Química e desta para a (miraculosa)

Biologia – posto que ali há “vida” – também aqui, há um salto do Homem-Símbolo como unidade do corpo individual para a complexidade do “corpus gramatical” (Linguística) e esta para o fato social (complexo), na Antropologia, Sociologia e Religião.

Dentre estes campos de estudo, vamos escolher a Religião entre as Psíquicas

Classificatórias, porque, como veremos na Parte 2, a Religião – como a Psicologia – permitem (i) uma volta à unidade; (ii) um mapeamento (mais circunscrito) do roteiro da volta; e, (iii) uma autonomia rumo ao processo de introversão e sublimação, necessários para se sair das gaiolas dos aspectos “exotéricos” tanto da Psicologia quanto da Religião (como Ciência Teológica) e ascender rumo aos aspectos mais “esotéricos” (Psicologia Analítica e Mística), como mapeado por Jung e James, exemplarmente – como veremos na Parte 2 – e cujos “métodos” (“exercícios espirituais”) receberam maior desenvolvimento pelos budistas tântricos e taoistas.

Já a terceira das Ciências Psíquicas, as Psíquicas Descritivas,

As Psíquicas Descritivas tenta, em primeiro lugar, descrever manifestações individuais da mente, quer sejam obras ou ações permanentes; e, para essa tarefa, ela junta-se àquela de tentar explicá-las baseada nos princípios da psicologia e etnologia. Ela empresta da geografia (uma ramo da física descritiva), da astronomia (outro ramo) e de outros ramos da ciência física e psíquica. (Ibid., p. 260)

Peirce divide a Psicologia Descritivas em “(i) História (Monumental, Antiga,

Moderna; a História está, por sua vez, dividida em História Política, das diferentes Ciências e dos Desenvolvimentos Sociais, religião, direito, escravidão, maneiras, etc,)” (ii) Psicologia Biografia; e, (iii) Crítica, o estudo de obras individuais mentais, por sua vez dividida em (i) Crítica Literária, e, (ii) Crítica de Arte (Ibid., pp. 261-262).

Perceba, caro leitor, que Peirce não permite (nem poderia) que – nas Ciências Psíquicas – se saia do “fato bruto” humano. A História é a história humana, desde suas Origens (indeterminadas, como a Micro-Física e o Monadismo ontológico), em seu desenvolvimento (Bio-Químico), que é sempre Biográfico (todos os fenômenos têm uma História), até que se Reflita Criticamente (Metafísica) para ver esses elementos como “Obra de Arte”. Para os grandes cientistas – como para Peirce (como já vimos) e para os grandes místicos (como veremos) – o Universo é uma Escrita a ser decifrada.

Agora, na Parte 2 de nossa Tese, utilizaremos a “Heurística” de Peirce – que expusemos na Parte 1 – para analisar seis áreas entre os ramos da Idioscopia peirceana:

1. Física;