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Stephen Hawking & Leonard Mlodinov O grande projeto – Novas respostas para as questões definitivas da vida Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011.

PARTE 2. A Arquitetônica Posta em Prática e Revisada

2.1. As Ciências da Natureza

2.1.1.2. Stephen Hawking & Leonard Mlodinov O grande projeto – Novas respostas para as questões definitivas da vida Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011.

“teorema da incompletude de Gödel” – “todo sistema moderadamente complexo de axiomas provoca, de

maneira inevitável, perguntas que não podem ser respondidas pelos axiomas” (Ibid., 93) -, mas quer nos

parecer que a maioria dos físicos – e outros cientistas fazem “vistas grossas” a esse teorema; afinal, precisam continuar a crer [sic] em outra crença, provavelmente para manter o emprego. David Lindley (The End of Physics; “O fim da física”), acha que com “a teoria das supercordas [os físicos] já não estão mais fazendo pesquisas físicas, porque suas teorias jamais poderiam ser validadas por experimentos, mas apenas por critérios subjetivos, como elegância e beleza” e, assim, “a física de partículas corria o perigo de se transformar num ramo da estética”. (Ibid., 94) Estamos quase na arena (da “ciência como literatura”) de Rorty, para desespero de Susan Haack. O Nobel de Física, Steven Weinberg (Universidade do Texas, Austin), autor de Dreams of Final Theory (1993; “Sonhos de uma teoria final”), “tem uma fé [sic] profunda no poder da física para atingir a verdade absoluta” (Ibid., 96), pois “os físicos acabaram tendo que confiar na elegância e coerência matemáticas como guias” (Ibid., 97), embora uma teoria final possa não ter nenhum “valor prático”. (Ibid., ibidem) Weinberg sugeriu que “o ideal seria adotar a interpretação de universos paralelos da mecânica quântica” (Ibid., 100) e confessa que gostaria que uma Teoria Final “eliminasse o wishful thinking, o misticismo e a supertição que impregnam grande parte do pensamento humano, mesmo entre os físicos”. (Ibid., 101). Ele deseja algo “muito impessoal e frio”, um “mundo desencantado”, pois “o mundo é assim, é melhor saber disso”, (Ibid., ibidem) acrescentando que “a perspectiva trágica acrescenta uma certa dimensão à vida”. (Ibid., 102) Para Hans Bethe (Cornell, Nobel 1967), que “transpira sabedoria e gravidade”, “já não existem surpresas [na Física]” (Ibid., 103).

John Wheeler, que para Horgan “é o físico arquétipo da física-para-poetas” (Ibid., 105), famoso por propor “a experiência de escolha retardada” (a das “duas fendas”; Ibid., 107), diz que “antes que o físico decida como observá-lo, o eléctron não é nem onda nem partícula. Em certo sentido, é irreal: existe um limbo indeterminado. “Só quando se começa a fazer uma pergunta (bit) é que se obtém alguma coisa (it)”. (Ibid., 108) David Bohm desenvolveu uma filosofia da ordem implícita, “que procurava abranger tanto o conhecimento científico quanto o místico”. (Ibid., 111) Esta significa que “subjacente ao mundo aparentemente caótico das aparências físicas – a ordem explicada – há sempre uma ordem implícita, oculta, mais profunda”. (Ibid., 114) Para ele, “o que está subjacente a tudo é desconhecido e não pode ser compreendido pelo pensamento” (Ibid.,115) e, portanto, “a ciência é inegotável”. (Ibid., ibidem) Por fim, o Nobel de Física Richard Feynman, autor de The Character of

the Physical Law (2001), acha que a Física “[E]stá uma mixórdia (...), pois os filósofos e os físicos preferem uma interpretação à outra [quanto à interpretação da mecânica quântica] por razões estéticas e filosóficas – isto é, subjetivas”. (Ibid., 119)

Justificativa da escolha. Escolhemos o físico teórico britânico, Stephen Hawking (n. 8/1/1942) - para a Física -, pois ele é o maior divulgador dos conhecimentos em Astrofísica das últimas décadas; e pela sua obra, The Grand Design (2010; “O grande projeto291 – Novas respostas para as questões definitivas da vida”, Nova Fronteira, 2011),292 porque foi sua última obra publicada – o que em ciência é de fundamental importância.

Os autores dividem o texto em uma “Introdução” e oito Capítulos: 1. O mistério do ser;293 2. O domínio da lei;294 3. O que é a realidade?295 4. Histórias alternativas;296 5. A

291 A palavra inglesa “design”, significa, além de (i) projeto (no sentido de “plano mental”, “arquitetura”,

“esquema”); também significa (ii) propósito (intenção, objetivo). Essa palavra tem uma história, e esta fala de um “Desígnio de Deus”, que estaria “na ordem e harmonia revelados pelo cosmos”. (Mora, 684) O erudito espanhol recomenda a obra, Hume, Newton, and the Design Argument (1965) de Robert H. Hurlbutt, III. (Ibid,

ibidem), em que Newton a defende e Hume a refuta. Os escolásticos – como Aquino - denominaram-na de “prova teleológica” (a “finalidade” do mundo não estaria em sua “contingência”, mas necessariamente, naquele que o criou). Ver também, Thomas McPherson, The Argument from Design (1972; “O argumento a partir do desígnio”); e, J. E. Horigan, Chance or Design? (1979; “Acaso ou desígnio?”). Para esclarecer a questão relacionada à Prova Teleológica, Mora recomenda R. E. D. Clark, The Universe and God (1939; “O universo e Deus”; IN Mora, 2829).

292 A obra foi escrita em conjunto com o físico Leonard Mlodinow (n. 1954). Este publicou The Drunkard's

Walk: How Randomness Rules our Lives (“O andar do bêbado: como o acaso determina nossas vidas”, Jorge Zahar, 2009), uma obra de grande interesse para ser cologida com o conceito de Tiquismo (Acaso) de Peirce, que está relacionado ao Monadismo (Matemática), à Primeiridade (Fenomenologia), à Estética (Ciências Normativas) e à Ontologia (Metafísica), com sua ênfase na Liberdade, i.e., na esfera das Possibilidades.

293 “Tradicionalmente, essas questões [Como compreender o mundo no qual nos encontramos? Como se

comporta o universo? Qual a natureza da realidade? De onde veio tudo isso? O universo precisou de um criador?] são do âmbito da filosofia, mas a filosofia está morta”. (H & M, 7) “Segundo [Richard Dick]

Feynman, um sistema não tem somente uma única história, mas todas as histórias possíveis”. (H & M, 8) ”A visão ingênua da realidade simplesmente não é compatível com a física moderna. Para lidar com tais paradoxos, adotaremos uma abordagem que denominaremos realismo dependente do modelo, que se fundamenta na ideia de que nossos cérebros interpretam os dados vindos dos órgãos sensoriais elaborando um modelo de mundo. Quando o modelo explica satisfatoriamente os eventos, tendemos a atribuir-lhe, e aos elementos e conceitos que o constituem, a qualidade de realidade ou verdade absoluta”. (H & M, 8-9) “A teoria-M [...] é um mapa”. (H & M, 9)

294 “Se a natureza é governada por leis, surgem três questões: 1. Qual a origem das leis? 2. Há quaisquer

exceções às leis, isto é, milagres? 3. Há somente um único conjunto possível de leis?” (H & M, 23) “Este livro é fundamentado no conceito de determinismo científico, o que implica que nossa resposta à segunda questão é que não há milagres ou exceções às leis naturais”. (H & M, 27) “A maioria dos cientistas diria que elas [as leis naturais] são o reflexo matemático de uma realidade externa que existe independente de seu observador. Mas, ao refletirmos sobre o modo como observamos e formamos conceitos sobre o que nos cerca, deparamo-nos com uma questão: temos realmente razões para acreditar que existe uma realidade objetiva?” (H & M, 27) 295“Mas se – como nós – os seres no mundo simulado não pudessem observar seu universo pelo lado de fora,

não haveria razão para duvidarem de seu próprio quadro da realidade. Essa é uma versão moderna da ideia de que somos fragmentos do sonho de outro alguém”. (H & M, 31) “Esses exemplos conduzem-nos a uma conclusão importante neste livro: ao conceito da realidade independente de um quadro ou de uma teoria. Em vez disso, adotaremos uma abordagem que denominaremos realismo dependente do modelo: a ideia de que uma teoria física ou uma imagem de mundo é um modelo (geralmente de natureza matemática) e um

conjunto de regras que conectam elementos do modelo às observações. Isso fornece um quadro com o qual

interpretar a ciência moderna”. (H & M, 32) “Embora o realismo possa ser um ponto de vista tentador, como veremos mais tarde, o que conhecemos sobre física moderna torna-o dificilmente defensável; por exemplo, de acordo com os princípios da física quântica, que é uma descrição precisa da natureza, uma partícula não tem nem uma posição, nem uma velocidade definida, a não ser e até que essas quantidades sejam medidas por um

observador”. (H & M, 33) “Um modelo é um bom modelo, se: 1. For elegante; 2. Contiver poucos elementos

arbitrários ou ajustáveis; 3. Concordar com e explicar todas as observações existentes; 4. Fizer previsões detalhadas sobre observações futuras que podem descartar ou falsificar o modelo se não se realizarem”. (H & M, 38) “A respeito das leis que governam o universo, apenas podemos afirmar que não há um modelo matemático

teoria de tudo;297 6. Escolhendo nosso universo;298 7. O aparente milagre;299 e, 8. O grande projeto.300

ou uma teoria única que descreva todos os seus aspectos. Em vez disso, parece haver uma rede de teorias chamada teoria-M. Cada teoria nessa rede descreve muito bem fenômenos dentro de um determinado

domínio”. (H & M, 43) “Nesse quadro [teoria quântica], o universo não tem apenas uma única existência ou história, mas todas as versões possíveis do universo coexistem simultaneamente no que chamamos de superposição quântica”. (H & M, 44)

296“A física quântica [...] impõe um esquema conceitual inteiramente diferente [do clássico], no qual um objeto

não tem uma posição, trajetória e mesmo passado e futuro precisamente determinados”. (H & M, 50) “A física quântica é um novo modelo da realidade, que fornece uma imagem do universo na qual muitos conceitos fundamentais para nossa apreensão intuitiva da realidade não têm mais significado”. (H & M, 51) “As probabilidades nas teorias quânticas refletem uma aleatoriedade fundamental na natureza”. (H & M, 55) “O princípio de que a observação de um sistema deve alterar o seu curso”. (H & M, 60) “A física quântica nos diz que não importa quão detalhada seja nossa observação do presente, o passado (não observado), assim como o futuro, é indefinido, e existe somente como um espectro de possibilidades. O universo, de acordo com a

física quântica, não tem nem passado, nem uma história única. O fato de que o passado não tem uma história

definida implica que as observações que fizermos de um sistema no presente afetam o passado”. (H & M, 62)

297 “De acordo com esse princípio [o Princípio da Incerteza de Heisenberg], o valor de um campo e de sua taxa

de variação desempenha o mesmo papel que a posição e a velocidade de uma partícula. Isto é, quanto mais

precisamente determinamos um, mais incerteza há na determinação do outro. Uma importante

consequência é que não há espaço vazio”. (H & M, 84)

298“Dentro desse quadro [somadas todas as histórias que satisfazem à condição sem-contorno e terminam no

universo como observado atualmente], o universo apareceu espontaneamente, começando de todo modo

possível. A maior parte desses modos corresponde a outros universos”. (H & M, 100) “Criamos a história pela nossa observação, em vez de a história nos criar”. (H & M, 103) “Parece haver uma vasta paisagem de possíveis universos. Contudo, como veremos no próximo capítulo, universos nos quais a vida como a nossa possa existir são raros. Vivemos em um universo onde a vida é possível, mas se ele fosse apenas ligeiramente diferente,

seres como nós não poderiam existir. O que podemos deduzir dessa sintonia fina? Seria a evidência de um

universo cujo projeto devemos a um criador benevolente? Ou a ciência oferece outra explicação?” (H & M, 106)

299 “O princípio antrópico fraco não é muito controverso. Mas há uma forma mais forte, que defendemos aqui,

apesar de ser encarada com desdém por alguns físicos. O princípio antrópico forte sugere que o fato de

existirmos impõe restrições não apenas ao nosso ambiente, mas também às possibilidades de forma e

conteúdo das leis naturais. Essa ideia surgiu porque não são somente as características do nosso sistema solar que parecem estranhamente favoráveis ao desenvolvimento da vida humana, mas também as características de todo o universo, o que é muito difícil de explicar”. (H & M, 114) “Contudo, a existência das estrelas e, dentro delas, dos elementos dos quais somos feitos, não é suficiente. A dinâmica das estrelas tinha que ser tal que algumas por fim explodissem, e mais, explodissem precisamente de tal modo que os elementos mais pesados

fossem distribuídos pelo espaço. Além de tudo isso, as leis naturais teriam que impor que esses restos se recondensassem numa nova geração de estrelas, estas, por sua vez, circundadas por planetas que incorporassem

os elementos recém-formados. Do mesmo modo que era imprescindível uma sequência de eventos na Terra para que surgíssemos, também cada elo dessa cadeia cósmica é necessário para nossa existência.” (H & M, 114-15)

“É duvidoso que a vida possa surgir espontaneamente na ausência de carbono. As razões para isso são

técnicas, mas têm a ver com a capacidade única do carbono de formar ligações com outros elementos”. (H & M, 5114) “Basta mudar as regras do nosso universo só um pouquinho, e acabam-se as condições para nossa existência!” (H & M, 117) “Não fosse por uma série de coincidências espantosas dos detalhes precisos das leis físicas, parece que nós, humanos e a formas de vida semelhantes, jamais teríamos aparecido”. (H & M,

118) “O que podemos deduzir dessas coincidências? Sorte na forma e natureza precisas das leis físicas fundamentais é uma espécie distinta da sorte encontrada nos fatores ambientais. Não pode ser explicada tão

facilmente e tem implicações físicas e filosóficas mais profundas. Nosso universo e suas leis parecem seguir um projeto feito sob medida e que, for para realmente existirmos, deixa pouca margem para alterações. Isso não é simples de explicar e suscita a questão natural de por que é desse modo”. (H & M, 119) “A recente descoberta de que tantas leis naturais têm uma extrema sintonia fina pode levar ao menos alguns de nós de volta à velha ideia de que este grande projeto é obra de algum grande projetista”. (H & M, 120) 300 “Nossa realidade depende do modelo que empregamos”. (H & M, 129) “Tal vida [um objeto de um mundo

como de Conway] seria capaz de perceber sua própria existência? Seria autoconsciente? Essa é uma questão que divide profundamente opiniões. Alguns defendem que a autoconsciência é uma particularidade dos seres humanos. Isso lhes confere livre-arbítrio, a capacidade de escolher entre diferentes cursos de ação. Mas como podemos saber se um ser tem livre-arbítrio?” (H & M, 131) “A teoria-M é a única candidata a uma teoria

Os autores começam por dizer que, “[T]radicionalmente, essas questões (Como compreender o mundo no qual nos encontramos? Como se comporta o universo? Qual a natureza da realidade? De onde veio tudo isso? O universo precisou de um criador?) são do âmbito da filosofia, mas a filosofia está morta”. (página 7)

Mas, essas questões discutidas nesses oito capítulos são, certamente, de ordem filosófica – não apenas Empírica, mas Metafísica. A vantagem da “Arquitetônica” peirceana é, precisamente, a de mostrar a importância da Matemática e da Filosofia (Fenomenologia, Ciências Normativas – Estética, Ética e Lógica – e Metafísica) para dar conta das Ciências Especiais. Entretanto, como ficará patente na nossa exposição, falta um Edifício Filosófico sólido a Hawkins e Mlodinow para lidar com os fenômenos que se lhes apresentam (sob o telescópio ou aceleradores de partículas). Ficam incertos entre rotular esses fenômenos como sendo resultado de um “Grande Desígnio” (pp. 106 e 120) – mesmo reconhecendo que “[B]asta mudar as regras do nosso universo só um pouquinho, e acabam-se as condições para nossa existência!” (p. 117) e que “[N]ão fosse por uma série de coincidências espantosas dos detalhes precisos das leis físicas, parece que nós, humanos e a formas de vida semelhantes, jamais teríamos aparecido”. (p. 118) - ora - como bons nominalistas – que “[N]ossa realidade depende do modelo que adotamos” (pp. 8-9; 129) – caindo, assim, ora no ceticismo (p. 43) ora na ânsia de chegar a uma “Teoria de Tudo” (Capítulo 5), a “Teoria-M” (p. 133). Por fim, sobre o “livre-arbítrio” e a “autoconsciência” (p. 131), não têm resposta.

Vamos, então, olhar a obra – e a Física – “através das peirceanas”.

Quanto ao fato de que “a filosofia está morta” (H & M, 7), seria importante perguntar aos autores o que entendem por “Filosofia”. Talvez tenham em mente a Filosofia

Analítica; ora, uma filosofia sem o arsenal heurístico como a de Peirce não é propriamente uma Filosofia.

Quanto ao Capítulo 1. O mistério do ser, em que os autores citam [Richard Dick] Feynman, “um sistema não tem somente uma única história, mas todas as histórias possíveis” (H & M, 8) eles devem estar se referindo – não a um sistema -, mas à própria realidade (microfísica). Sim, ela “é um mistério” e “possui todas as histórias possíveis”, mas apenas na esfera Monádica (Matemática), que contém todos os mundos possíveis. É por isso que esta

completa do universo. Se este é finito – e isso ainda precisa ser provado -, será um modelo de universo que cria a si mesmo”. (H & M, 133)

está relacionada à Primeiridade (Fenomenológica), à Estética (Normativa) e à Ontologia (Metafísica). É o reino (indeterminado) da Liberdade e do Acaso (Tiquismo). Não adianta tentar “definir” esse reino, pois ele é “sem rei”, i.e., “sem lei”.

Quando dizem que adotam uma abordagem “realista dependendo do modelo” (H & M, 8-9) “que se fundamenta na ideia de que nossos cérebros interpretam os dados vindos dos órgãos sensoriais elaborando um modelo de mundo” e que “[Q]uando o modelo explica satisfatoriamente os eventos, tendemos a atribuir-lhe, e aos elementos e conceitos que o constituem, a qualidade de realidade ou verdade absoluta”, isso merece esclarecimento, pois é filosoficamente confuso.

Senão vejamos. Ser Realista, como Peirce, significa que “aquilo que nos aparece” (phanera), de que a Fenomenologia dá conta com suas três categorias (irredutíveis)

Primeridade, Segundidade, Terceiridade -, possui, i.e., está “enervado” (spinozamente; Chauí), por uma Ideia; afinal, como vimos, para o Idealista-objetivo Peirce (Schelling e Royce), a matéria é mente cansada (“effete mind”), i.e., ideias que adquiriram hábitos no decorrer da Evolução (Sinequismo). Se assim não fosse, não poderia haver Ciência. Se o “modelo” a que os autores aludem é um “método” (Heurística), é verdade, mas não devemos nos esquecer de que esse “modelo” só é bom porque, como diz Peirce, “Há um parentesco entre a Realidade Divina e a Razão Humana”, senão nossas “hipóteses” não seriam tão certeiras. Os próprios autores, ao se referirem à Teoria-M, dizem que ela “é um mapa” (H & M, 9). Ora esse “mapa” ou “modelo” é um “diagrama” presente na mente do pesquisador (Microcosmos) e na natureza (Macrocosmos). Uma Teoria-M é a Arquitetônica de Peirce, pois reflete (Speculum) essa admirável Simetria.

No Capítulo 2. O domínio da lei, os autores continuam a misturar os conceitos. Dizem eles: “Se a natureza é governada por leis, surgem três questões: 1. Qual a origem das leis? 2. Há quaisquer exceções às leis, isto é, milagres? 3. Há somente um único conjunto possível de leis?” (H & M, 23) Quanto à primeira questão, “sobre a origem das leis”, eles dizem o seguinte:

A maioria dos cientistas diria que elas [as leis naturais] são o reflexo matemático de uma realidade externa que existe independente de seu observador. Mas, ao refletirmos sobre o modo como observamos e formamos conceitos sobre o que nos cerca, deparamo-nos com uma questão: temos realmente razões para acreditar que existe uma realidade objetiva?” (H & M, 27)

Quanto à primeira parte, como já vimos, isso é verdadeiro: “a realidade (física) externa existe independente de seu observador”. O advento do Homem-Símbolo é tardio em relação à natureza. O universo tem 13 bilhões de anos e o planeta Terra tem 4.5 bilhões de anos. Que “as leis naturais são o reflexo matemático de uma realidade externa” é claro na “Arquitetônica” de Peirce, como já vimos na Parte 1, ad nauseum. O ramo da Matemática serve de alicerce a todo o Edifício das Ciencias de Peirce, com seu monadismo, diadismo e

triadismo, e seus conceitos fundamentais do Contínuo e seu método da Lógica dos Relativos. Mas o Universo e o Homem-Símbolo são Um.

Quanto à segunda parte da sentença, ela revela a pobreza filosófica – e confusão - dos autores, pois misturam “a observação de conceitos”, o que é verdadeiro, pois a Realidade Física é “enervada” de Conceitos – as Leis (Conceitos) são fruto da Observação Atenta (Terceiridade) da Natureza -; mas questionar “se existe uma realidade objetiva” a partir da observação de “o modo como formamos conceitos” é desconhecer o fato da Simetria – Peirce fala do “parentesco” - entre o Macrocosmos (Razão Divina, que “enerva” a Natureza) e o Microcosmos (Razão Humana). Eles são um. Nós “homens-símbolos” formamos “conceitos” a partir da Abdução, que para Peirce é um “Instinto”, um “Faro” – pela “Inspiração das Musas”, que raramente falha. Indução e Dedução apenas asseguram a hipótese. É assim que se conhece a “realidade objetiva” (natureza), que é, portanto, simétrica com a “realidade subjetiva” (ideia).

Quanto à segunda questão -, “Há quaisquer exceções às leis, isto é, milagres?” – os autores não têm vergonha de dizer que “[E]ste livro é fundamentado no conceito de determinismo científico, o que implica que nossa resposta à segunda questão é que não há milagres ou exceções às leis naturais”. (H & M, 27) É indubitável que a Segundidade (“fato bruto”; Existência) existe. Mas falar da Existência (Segundidade) sem compreender que ela está prenhe de Primeiridade, “o reino sem rei ou lei” da Liberdade e das Possibilidades (infinitas) é negar que os milagres são “possíveis”. Mas nem deveria ser necessário explicar – como acabamos de fazer – o fenômeno dos milagres filosoficamente; basta que o cientista tenha humildade e vá a Lourdes, ou Fátima, ou a Aparecida do Norte e visite a “Sala dos Milagres”. Ou um ente amado tenha uma doença terminal e busca salvação para lá da prática científica (médica).

Quanto à terceira questão – “Há somente um único conjunto possível de leis?” – é uma pergunta sem cabimento.301 As “Leis” da Natureza – lembrem-se que estamos lidando

301 Os autores voltam ao tema mais adiante dizendo, “A respeito das leis que governam o universo, apenas

com a Física -, são fruto da observação dessa Natureza (do Indeterminado para o determinado). Para que falar de “um único conjunto de leis”? Porque os Físicos estão à procura de uma “Teoria de Tudo”, mas crer e investir nesse empreendimento é somente para justificar verbas (?), posto que como mostra John Horgan em seu capítulo, O fim da física IN O fim da ciência -, citando John Barrow, autor do popular Theories of Everything (“Teorias de tudo”) -, isso é matematicamente impossível devido ao “teorema da incompletude de Gödel” – “todo sistema moderadamente complexo de axiomas provoca, de maneira inevitável, perguntas que não podem ser respondidas pelos axiomas” (Ibid., 93). Ou, como diz David Lindley (autor de The End of Physics; “O fim da física”), acha que com “a teoria das supercordas [os físicos] já não estão mais fazendo pesquisas físicas, porque suas teorias jamais poderiam ser validadas por experimentos, mas apenas por critérios subjetivos, como elegância e beleza” e, assim, “a física de partículas corre o perigo de se transformar num ramo da estética”. (Ibid., 94) A Estética – na “Arquitetônica” de Peirce – recordamos ao