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5. A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO FÍSICA E SEUS

7.1 A TÔNICA DAS NARRATIVAS

7.1.1 Colaborador A

A narrativa do Colaborador ‘A’151 traz uma estruturação argumentativa em torno da ideia de perda de espaço das experiências práticas no trabalho formativo desenvolvido historicamente no CEFD e, consequentemente, o estabelecimento de uma preponderância relativa à teorização sobre o fazer na Educação Física. Ao seu modo de ver, a forma como os professores são selecionados para atuar profissionalmente na Instituição tem importante parcela de contribuição nessa ocorrência, pois há destacado valor atribuído aos títulos conquistados na trajetória acadêmica dos candidatos.

Em função disso identifica uma diminuição progressiva do incentivo ao desenvolvimento de hábitos salutares na infância, entre os quais destaca o hábito da prática esportiva, pois o perfil dos egressos tende a não favorecer a experimentação prática dos conteúdos curriculares, enquanto, por outro lado, percebe um incentivo crescente à prática de exercícios físicos na chamada Terceira Idade.

Foi dando-se muita ênfase para os aspectos teóricos, a teoria venceu a parte prática [...] praticamente tu não vê mais aulas praticas para os alunos. Só teoria na frente do computador... não se vê, e a teoria venceu. [...] O pessoal tenta entrar direto para Especialização, Mestrado e Doutorado. Termina um Doutorado e entra direto para Universidade para dar aula em curso superior, sem nunca ter trabalhado com o primeiro, o segundo grau, com crianças... Eu acho que essa é uma falha, na minha forma de ver. [...] Da a impressão também que nós trabalhamos sempre na forma inversa no Brasil. Nós estamos dando valor, muito, a terceira idade. Não acha?! Por que nós não damos valor pra primeira idade, então? Para a criança já crescer com o hábito da prática da atividade física? [...] eu digo, assim: teríamos que desenvolver o hábito... (COLABORADOR A).

A partir dessas posições, compreende que haveria menos esforço e melhores resultados educacionais se essas relações fossem priorizadas com os mais jovens. Segundo ele, uma ação já promovida pelo Centro nas primeiras décadas de existência e que pode ter sido afetada por essa tendência teórica na formação dos alunos. Ademais, merece destaque, nesse contexto, a própria depreciação da infraestrutura do CEFD, que serve de suporte para as práticas em diferentes disciplinas que compõem o currículo da graduação. Apontamento que o Colaborador realiza em comparação ao estado das instalações físicas na época em que atuava no Curso.

Por outro lado, há em sua narrativa um destaque para o papel histórico do esporte no desenvolvimento das atividades institucionais, de modo que isso não somente permitiu um

151 O colaborador ingressou no CEFD em 1975 e apresenta entre suas experiências profissionais na Instituição, o

trabalho com as disciplinas de Atletismo e Futebol, inclusive, desenvolvendo projetos de Extensão nessas áreas. Também atuou com a disciplina de Educação Física no então segundo grau, hoje, ensino médio, além de ter realizado seus estudos de graduação na UFRGS e seu Mestrado na área do Movimento Natural da Criança.

reconhecimento mundial do CEFD, mas influenciou seus alunos nas relações formais com o conhecimento cotidianamente.

[...] o esporte contribuiu bastante! [...] ficou conhecida, praticamente, mundialmente pelo handebol, pela equipe da ADUFSM. Tivemos também outros esportes [...] o voleibol disputou alguns anos, seria tipo Série ‘A’ do Voleibol gaúcho [...] Eu sempre digo assim: por que o fulano está aqui, hoje, como professor?! Porque começou treinando, jogando na equipe. Há uns sete/oito professores que jogavam, ou jogaram vôlei, ou jogaram handebol, ou, outro, futebol, que jogava no Inter [...] Então quem se destacou nas equipes, não se destacou, pelo menos jogou nas equipes, há uns quantos professores que hoje são da nossa universidade. Então eu sempre dizia: por que tu acha que o fulano está aqui hoje?! Porque aprenderam, viveram, vivenciaram essas situações e sentiram ou notaram que tem que estudar, que tem que treinar, que tem que se dedicar para ser diferente dos outros. Senão ficaria... provavelmente, sem ingresso na universidade. (COLABORADOR A).

O esporte formal, ou seja, aquele com regras, formas, objetivos e organização bem delimitados socialmente, representou presença muito forte desde a constituição do Curso, adquirindo importância à medida que se disputavam competições, conquistando-se reconhecimento institucional para além dos muros da Universidade e, também, através da incorporação, ao grupo docente, de novos profissionais com forte trajetória esportiva na formação. Além disso, a própria ênfase no esporte como incentivo aos alunos do CEFD para a evolução na carreira profissional reforçou seu status hegemônico nas primeiras décadas do curso de Educação Física.

Na voz do colaborador há a indicação de que esse fenômeno também foi desenvolvido de forma destacada na composição da Educação Física Escolar em Santa Maria, por influência das ações do Centro. Não deixando de reconhecer, aí, a importância do envolvimento de escolares em competições esportivas, em várias modalidades, mobilizando número expressivo de participantes. No entanto, indica que isso ocorreu em tempos passados, e que, hoje, acredita haver pouco interesse, por parte dos professores de Educação Física, em formar equipes com os alunos na Educação Básica, de um modo geral.

No início [o CEFD] contribuiu bastante [com a Educação Física Escolar] [...] mas pelo que eu tenho visto não existe mais nada de competições, praticamente nada. Antigamente, eu lembro que existia aqui em Santa Maria o que chamavam de jogos da primavera, jogos, na época, da Radio Imembuí, que patrocinava e organizava. O Corinthians, o ginásio, ali, lotava de alunos, realizavam jogos de Vôlei, partidas de Vôlei entre um colégio e outro, Futsal, Ginástica, Handebol, todas as modalidades. (COLABORADOR A).

Realizando o destaque a esse conteúdo nas aulas de Educação Física nas Escolas de Santa Maria, o Colaborador se questiona sobre os responsáveis pelo que considera ser uma falha nessa disciplina curricular nos últimos anos, ou seja, o acentuado decréscimo das atividades práticas e das competições esportivas nos sistemas de ensino. Assim que não

identifica com clareza se há falta de interesse dos professores de Educação Física nas escolas em estabelecer maior incentivo ao envolvimento dos seus alunos em experiências dessa natureza, se é uma falha pontual por parte do CEFD na formação dos professores, se é um erro de procedimento do Estado ou uma consequência do fenômeno da globalização.

Ainda há o apontamento de que a intervenção direta do CEFD nos espaços escolares ocorria, principalmente, por conta dos estágios dos alunos de graduação, que, em alguns casos, organizavam competições para as crianças no Centro de Educação Física. Nesses casos, antes de serem atividades formais desenvolvidas mediante protocolos e com premiações aos vencedores, estavam mais próximas da realização de brincadeiras com ‘fundo’ competitivo.

De outra forma, especificamente quanto à pós-graduação, em nível de Mestrado e Doutorado, considera ter havido dois problemas importantes e complementares. De um lado, a perspectiva sustentada no desenvolvimento desses cursos era a de não “ficar somente com a visão do CEFD”, sendo oferecidas poucas oportunidades de estudo para os indivíduos vinculados à Instituição. Por outro, com a aposentadoria dos Doutores responsáveis pelas diferentes áreas e linhas de pesquisa “não houve produção de artigos [...] o MEC ‘cortou’ o Mestrado e o Doutorado”. Isso ocorreu muito em função de não se ter formado Doutores substitutos para continuar o trabalho no Programa de Pós-Graduação.

No que se refere à influência exercida pela Ditadura Civil/Militar sobre a Instituição, uma vez que o Centro foi criado e teve considerável desenvolvimento em pleno regime de exceção no país, há a indicação de que o CEFD apresentou bom relacionamento institucional com o governo brasileiro, inclusive porque o [...] “Decano era militar e dentro do grupo de professores da primeira turma havia dois, três ou quatro coronéis, ou da brigada, ou do exército” [...]. O Colaborador indica que toda a organização institucional foi realizada por militares, salientando o fato de sempre ter recebido os materiais solicitados para o desenvolvimento de suas atividades profissionais. Aliás, essa consideração ultrapassa a relação com o período da Ditadura e abarca todo o período da sua vida profissional no CEFD.

Por fim, ainda realiza uma ressignificação dos testes de aptidão física, que faziam parte do processo seletivo para ingressar na graduação, habilitando ou eliminando os candidatos à seleção teórica. Nesse caso, embora compreenda que na época em que esses testes eram realizados estavam em consonância com a forma como o curso de Educação Física se organizava, o Colaborador entende que, atualmente, [...] “não há necessidade. [...] todos devem ter o mesmo direito de exercer a profissão da qual gostam!” Sustenta, assim, uma concepção integradora no processo de seleção, salientando os direitos de se estudar a partir das condições pessoais próprias de cada um.