B. Produção sob contratos
4.2.3. Comparação entre os SAG´s da cana-de-açúcar e da soja
Para efeito do estudo, a abordagem se resume no fato de que o mercado de
derivados da cana-de-açúcar está centrado em dois bens de consumo intermediário: o
açúcar gerado pelas refinarias; e o etanol produzido pela indústria de biocombustíveis.
No caso da soja o mercado de derivados se resume ao farelo destinado para a indústria
de rações, e ao óleo vegetal, que pode ser processado como óleo refinado e como
biodiesel.
Por outro lado assume-se que as transações para atender as demandas, tanto do
etanol quando do biodiesel, devem permanecer vinculadas ao atual ambiente
institucional, e que não haverá competição entre a demanda de matérias-primas para
produzir biocombustíveis e matérias-primas para a produção agroalimentar, uma vez
que a demanda adicional de matérias-primas estará vinculada com a produção de
energia.
Neste contexto, a comparação entre o SAG da cana-de-açúcar e da soja se refere
as respectivas formas de organizar as transações e do ambiente institucional, enquanto
sinalizadores de como cada sistema organiza sua capacidade de fazer frente aos
mercados de biocombustíveis, no caso o etanol e o biodiesel.
4.2.3.1. As transações
Duas transações foram analisadas considerando os três componentes do sistema
de agribusiness da cana-de-açúcar e da soja, isto é: insumos; produção agrícola; e
organizadas as transações insumos – produção agrícola (T1) e a transação produção agrícola – processamento (T2) nos sistemas de agribusiness da cana-de-açúcar e da soja.
No caso da transação insumos – produção agrícola (T1) a transação no sistema de agribusiness da soja é organizada principalmente através de contratos e os ativos
envolvidos referentes a fertilizantes e corretivos apresentam uma baixa especificidade,
somente as sementes apresentam alta especificidade locacional.
O sistema de agribusiness da cana-de-açúcar organiza a transação insumos –
produção agrícola (T1) majoritariamente através do mercado, ainda quando os ativos apresentam alta especificidade quando referentes a máquinas e implementos agrícolas e
os defensivos. Este sistema apresenta empresas especializadas na prestação de serviços,
tais como aplicação de insumos, colheita mecânica entre outros.
A transação produção agrícola – indústria (T2) para o caso do sistema de
agribusiness da soja é realizada predominantemente através de contratos formais e via
mercado. A soja é considerada um ativo específico tanto temporal, devido à competição
pela aquisição da produção na época de colheita, quanto locacional devido a questões
fiscais de circulação de mercadorias.
O sistema de agribusiness da cana-de-açúcar organiza esta transação de forma
hierárquica devido à alta especificidade dos ativos. A cana-de-açúcar também apresenta
especificidade locacional e temporal, além do que a usina em si constitui um ativo de
alta especificidade.
Tabela n° 15. Comparação das transações entre os sistemas de agribusiness da cana-de-açúcar e da soja.
Transações insumos -produção agrícola (T1)
Transações produção agrícola – indústria (T2)
SAG Soja
Esta transação é organizada tanto por estruturas de mercado assim como através de contratos denominados “troca-troca”; A natureza dos ativos envolvidos
mostra uma especificidade baixa para fertilizantes e corretivos, e uma alta especificidade para as sementes determinada por aspectos locacionais diferenciadores.
Alta especificidade locacional (associada a problemas fiscais de circulação de mercadorias).
Predominam as negociações via mercado e mediante contratos formais entre produtores e indústrias processadoras.
SAG Cana-de- açúcar
Predominam as estruturas de mercado;
Alta especificidade dos ativos máquinas; e implementos agrícolas.
As operações de compra de fertilizantes e defensivos, se organizam no mercado spot na época do plantio e na cana soca; Existe a prestação de serviços aos
produtores pelas usinas, tais como aplicação de insumos, colheita mecânica, entre outros.
Elevada especificidade locacional (distância dos campos em relação à usina); alta especificidade temporal (prazos para esmagamento da cana- de-açúcar depois do corte);
Alta especificidade técnica
determinada pela variedade cultivada e pelo teor de sacarose do produto. Alta especificidade da usina no
esmagamento da cana-de-açúcar. Existência de forte integração
vertical;
Arrendamentos de terras;
Produtores especializados na atividade de produção mediante contrato.
4.2.3.2. Ambiente institucional
Na Tabela n° 16 apresenta-se a comparação entre os ambientes
institucionais do etanol e do biodiesel. Assume-se que estes ambientes institucionais
representam as regras do jogo que estes sistemas de agribusiness deverão considerar no
fornecimento de matérias primas para a produção de etanol e biodiesel.
A definição das regras do jogo no caso do etanol apresenta um período superior
a 30 anos, onde a participação deste produto no sistema de agribusiness sucroalcooleiro
passou por várias etapas, desde a regulamentação estatal até a uma nova regulamentação
em resposta à desregulamentação.
No caso do biodiesel, a participação dentro do sistema de agribusiness da soja é
recente. De fato o início da produção em escala pode ser considerado a partir de 2005
quando, por lei, se facultou a mistura de 2% ao diesel convencional.
Tabela n° 16: Comparação entre os Ambientes Institucionais do etanol e do biodiesel.
Etanol Biodiesel
Mais de 30 anos de desenvolvimento da indústria.
Apoio estatal e promoção
internacional.
Definição da cana-de-açúcar como única matéria-prima.
Visão da indústria como resíduo regulatório da oferta do açúcar.
Produção em escala relativamente nova.
Apoio estatal, mistura compulsória e tributação.
Diferentes incentivos por matéria- prima.
Incertezas na indústria, quanto a fornecimento de matérias-primas.
No caso dos incentivos fiscais para o desenvolvimento da indústria, existe uma
Desta forma fica claro que o fato de que as regras do jogo do etanol estavam
definidas para desenvolvimento a partir da cana-de-açúcar, e que este sistema de
agribusiness, amplamente verticalizado, obteve respostas em função das condições de
preços do produto substituto do ponto de vista da indústria: o açúcar. Enquanto no caso
do biodiesel existe elevada incerteza por parte da indústria, refletida nos investimentos
por plantas de múltiplas matérias-primas, o que retardaria a resposta do sistema de agribusiness da soja particularmente porque os investimentos em pesquisa e mesmo agronômicos não são enfocados somente para a soja e sim para outras matérias-primas
alternativas como pinhão manso, mamona, etc.