B. Produção sob contratos
4.2.1.3. O Ambiente Institucional
No âmbito do estudo de um Sistema de Agribusiness, o ambiente institucional se
refere às regras do jogo, usadas, monitoradas e impostas pelos ambientes externo e
interno ao respectivo SAG, regras estas constituídas por um conjunto de normas,
regulamentos e preceitos que condicionam as ações dos diferentes agentes do SAG.
Entretanto, o ambiente institucional do setor sucroalcooleiro analisado nesta parte do
trabalho é parcial, uma vez que a abordagem restringe-se apenas as regras do jogo
concernentes ao desenvolvimento do etanol.
Assim, para o caso do etanol, estas regras constituem a base da integração
vertical, e tiveram seu início em 1890, quando da participação dos governos estaduais
na modernização do setor, com leis e decretos que permitiram aos senhores de engenho
ampliar a escala de produção de suas unidades de processamento de cana-de-açúcar e se
integrarem para frente. (EISENBERG 1977, apud VIAN, 2003, pág, 67).
Entretanto, as mudanças no ambiente institucional do setor sucroalcooleiro e
relativas ao etanol, tem sido função das respostas do setor as crises apresentadas no
mercado do açúcar. A este respeito, segundo Vian (2003), o uso de etanol tem sido
a) Primeira fase:
Como sintetizado na Tabela n° 14a esta fase se caracteriza pela superprodução
do açúcar e pelos problemas de abastecimento decorrentes dos efeitos da Segunda
Guerra Mundial, levando a criação do Instituto do Açúcar e do Álcool IAA e ao
controle da produção e dos preços.
Tabela n° 14a: Faseologia da indústria canavieira no Brasil em função da produção do álcool. Primeira fase 1929 – 1945.
Período Eventos deflagradores Políticas Adotadas Resultados
Primeira fase:
(1929 a 1945)
Crise Mundial (“crack” da Bolsa de Nova Iorque). Superprodução de açúcar. Litígios internos (usina x fornecedor).
Disputa de mercados entre São Paulo e Pernambuco.
Pesquisas e incentivo ao álcool.
Criação do IAA (cotas de produção, controle de preços). Controle da produção nacional e estabilização dos preços.
Guerra mundial e problemas com abastecimento de açúcar e gasolina no Brasil.
Incentivo ao “álcool - motor”.
Aumento da produção paulista.
Fonte: Adaptado de VIAN (2003).
A intervenção estatal começou com a criação da Comissão de Estudos sobre o
Álcool Motor CEAM, com o objetivo de estudar e incentivar a produção de etanol
(álcool anidro) para misturar à gasolina. Em 1931, foi criada a Comissão de Defesa da
Produção de Açúcar CPDA, com o objetivo de promover a manutenção do equilíbrio do
mercado via controle da oferta de açúcar.
Vian (2003, pág. 71) qualifica a fase antes da criação do Instituto de Açúcar e do
institucional gerou as bases da ineficiência técnica, mas com a garantia de acumulação
de capital e expansão do setor.
Em 1933, foi criado o IAA, absorvendo as atribuições e competências da CEAM
e da CPDA, e tornando-se responsável pela regulação do setor e pela busca da expansão
da produção de açúcar no país. O planejamento do setor por meio do IAA abrangia o
controle da produção de açúcar e a implantação e expansão da indústria do etanol
(álcool anidro).
Segundo Vian (2003, p. 81), esta primeira fase se caracteriza como de
crescimento intensivo e extensivo da produção açucareira no Brasil, com um baixo nível
de diversificação das empresas do setor, especializando-se na produção de açúcar e
marginalizando a produção de álcool como um subproduto. Foi assim que os anos 70
foram marcados por uma nova crise de superprodução de açúcar e mais uma vez o
etanol foi utilizado como regulador do mercado, processo que durou até 1975.
b) Segunda fase:
Conforme resumido na Tabela n° 14b este momento se caracteriza pelo
lançamento do Proálcool, pelo crescimento da produção de etanol e termina com a perda
de credibilidade do consumidor em relação às disponibilidades do etanol como
combustível. A alternativa de utilizar a cana-de-açúcar para a produção de etanol, e a
Tabela n° 14b: Faseologia da indústria canavieira no Brasil em função da produção do álcool. Segunda fase 1975 – 1989.
Período Eventos deflagradores Políticas Adotadas Resultados
Segunda fase:
(1975 a 1989)
Queda dos preços mundiais do açúcar. Primeiro choque do petróleo. Lançamento do Proálcool. Crescimento da produção do etanol (álcool anidro). .
Segundo choque do petróleo. Estimativas quanto ao
esgotamento das reservas de óleo cru.
Reforço do proálcool.
Reversão dos preços do petróleo, crise nas finanças públicas e falta de álcool.
Investimentos na produção nacional de petróleo.
Quebra da confiança no etanol.
Fonte: Adaptado de VIAN (2003).
Implantado oficialmente em 1975, o Proálcool foi efetivado sob a vontade
política dos usineiros, cuja força levou a aprovar a idéia de que a produção de etanol
deveria ter a cana-de-açúcar com principal fonte de matéria-prima, medida justificada
pela necessidade do aproveitamento da capacidade ociosa das usinas, da boa
produtividade agrícola e industrial da cana-de-açúcar, da geração de empregos, e da
possibilidade de se iniciar a produção de etanol no curto prazo. (VIAN 2003, p. 85).
Nesta fase, o IAA incentivou a produção do etanol estabelecendo o preço de
paridade em relação ao açúcar, fazendo indiferente para a usina produzir açúcar ou
etanol. Em 1979, com o segundo choque do petróleo, o Proálcool foi ampliado e, em
decorrência da instalação de destilarias autônomas de álcool e de alterações na paridade
de preços, a produção do etanol tornou-se compensadora. O objetivo era aumentar a
oferta de etanol com a instalação de novas unidades produtoras, minimizando o risco do
não cumprimento das metas de produção em decorrência da elevada concentração da
Nesta etapa do Proálcool, os Governos Federais e Estaduais adotaram medidas
destinadas a incentivar a compra de carros a etanol, reduzindo impostos, concedendo
financiamento subsidiado, e fixando o preço do etanol em 50% do preço da gasolina,
passando posteriormente este porcentual para 65% e depois para 75%. (VIAN 2003, p.
89).
Sob o comando do Proálcool, o dinamismo da produção do etanol permitiu às
empresas manterem um crescimento da produção que não seria possível somente com o
açúcar. Na primeira metade da década de 1980, houve uma expansão acelerada da
produção do etanol, ritmo que diminui a partir da segunda metade do período, chegando
a estagnação em decorrência da reversão dos preços internacionais do petróleo, fato que
contrariava as projeções dos órgãos governamentais, nacionais e internacionais,
indicando que os preços de petróleo se manteriam elevados.
O final desta fase (1989) se caracterizou pelo desabastecimento do etanol,
levando à importação de metanol para atender à demanda insatisfeita, mesmo sob o
risco dos problemas que a elevada toxidez do metanol traria para o setor
automobilístico.
Neste contexto, Vian (2003, p. 94), ao descrever a polêmica provocada pelo
desabastecimento do etanol entre os usineiros, o Estado e a Petrobrás, conclui que a
oferta de veículos a etanol deveria ser reduzida, pois o setor não tinha capacidade de
continuar atendendo a crescente demanda. Assim, apesar da retomada da tendência na
Estado de São Paulo (Sopral) se posicionaram em defesa da produção do etanol como
reguladora da oferta de açúcar: a primeira, pleiteando a estabilização da produção do
etanol; e a segunda, defendendo o uso dos carros movidos a etanol (álcool hidratado).
(VIAN 2003, pág, 95).
c) Terceira fase:
Como mostra a Tabela n° 14c, esta fase se caracteriza pela extinção do IAA,
pela reestruturação produtiva, por medidas do governo que resultaram em uma nova
regulamentação sucroalcooleira, e na concentração do processo industrial para fazer
face aos preços e mercados instáveis.
No início desta fase, o ambiente institucional da cana-de-açúcar estava
fragmentado e, diante de uma tendência para sua consolidação, determinada pela
desregulamentação e pelas tentativas de auto-regulação, foi consolidada a União da
Agroindústria Canavieira de São Paulo (UNICA) como entidade de representação dos
interesses do Estado de São Paulo com relação ao setor sucroalcooleiro.
Esta fase foi marcada com a extinção do IAA, ficando o controle e o
planejamento do setor a cargo da Secretaria de Desenvolvimento Regional da
Presidência da República e, posteriormente, a cargo do Conselho Interministerial do
Álcool CIMA. Ao longo da década, esses órgãos foram paulatinamente eliminando os
Tabela n° 14c: Faseologia da indústria canavieira no Brasil em função da produção do álcool. Terceira fase 1990 – 2007.
Período Eventos deflagradores Políticas Adotadas Resultados
Terceira fase: (1990 a 2007) Extinção do IAA. Superprodução do álcool. Reestruturação produtiva: questão social e ambiental. Medidas do governo: pacto pelo emprego; Brasil álcool; bolsa brasileira de álcool. Autogestão setorial: Consecana; grupos de comercialização; e redução do número de entidades de representação patronal. Preços e mercados instáveis. Redução no uso de mão de obra. Intensificação da mecanização da agricultura. Fusões e entradas de empresas estrangeiras. Surgimento de novas estratégias. Nova regulamentação sucroalcooleira. Crescimento no uso do álcool. Promoção intensa do governo para aumentar a produção. Investimentos estrangeiros. Participação de fundos nacionais e estrangeiros.
Fonte: Adaptado de VIAN (2003).
Em 1996, foram liberados os preços da cana-de-açúcar, do álcool e do açúcar
por meio da Portaria n. 64, do Ministério da Fazenda, decisão adiada para maio de 1997
concernente ao etanol (álcool anidro), e para maio de 1998 no referente aos preços da
cana-de-açúcar, do etanol (álcool hidratado) e do açúcar cristal standard.
Em agosto de 1997, foi instituído o Conselho Nacional de Política Energética e
criada a Agência Nacional do Petróleo ANP, que assumia poderes ampliados e tinha
petróleo. Estes subsídios eram contabilizados na chamada Conta Álcool. (BACCARIN
2005, p. 149).
Em abril de 1998, por meio da Portaria n. 102, o Ministério da Fazenda adiou
novamente a liberação dos preços para 1° de novembro de 1998, com os conseqüentes
problemas de comercialização e de estocagem do produto, uma vez que o mercado
estava sem regras claras quanto a estes procedimentos. Em outubro de 1998, ocorreu um
novo adiamento da liberação dos preços para fevereiro de 1999, quando efetivamente
foram liberados os preços de todos os produtos do setor canavieiro. (VIAN 2003, p.
103).
Com estes antecedentes, Vian (2003) conclui que, até o início dos anos 90, o
Setor Canavieiro era marcado pela regulamentação e planejamento estatal. As empresas
do setor possuíam estruturas produtivas, mix de produtos diferenciados, e formas de
inserção no mercado bastante semelhantes. Com a desregulamentação, o setor deu início
a um processo de estruturação, gerando uma nova dinâmica concorrencial, e alterando
significativamente as estruturas das empresas, o tipo e o mix do produto.
O resultado desta liberação de preços, segundo Baccarin (2005, p. 113), não foi
uma desregulamentação plena, mas sim, a constituição de uma nova regulamentação
sucroalcooleira. De qualquer maneira, Vian (2003, p. 133) aponta que a
desregulamentação substituiu uma competição baseada no plantio nas melhores terras e
na eficiência produtiva por novas formas de concorrência. Mas, algumas características
ainda permanecem como a integração vertical para trás praticada pelas usinas e
destilarias autônomas.
Neste contexto, releva salientar que a estrutura produtiva não se alterou de forma
de açúcar e de etanol no Estado de São Paulo. Outro fato importante é que a estrutura
fundiária também não se modificou nesse período. (VIAN 2003, p. 100).