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SUMÁRIO

REDE SOCIAL  SOCIEDADE EM REDE

5. Confirmação ocorre quando um indivíduo busca o reforço de uma decisão de inovação já tomada, mas ele ou ela pode reverter essa decisão anterior se forem

3.3 O COMPLEXUS DAS REDES DE APRENDIZAGEM E INOVAÇÃO EM GESTÃO HOSPITALAR

Dada a revisão analítica dos conceitos realizada neste capítulo, infere-se que o conhecimento humano é criado, e difundido, por meio da interação social, desde que ocorra a conversão desse conhecimento. Para Takeuchi e Nonaka (2008, p. 59),

[...] essa conversão é um processo social entre indivíduos e não confinado em um único indivíduo. De acordo com a visão racionalista, a cognição humana é um processo dedutivo dos indivíduos, porém o indivíduo nunca está isolado da interação social quando percebe as coisas. Assim, através do processo de conversão social, o conhecimento tácito e o explícito expandem-se em termos de qualidade e quantidade.

Logo, deduz-se que o conhecimento organizacional é um fenômeno promovido por indivíduos no âmbito de uma coletividade. O que corrobora a assertiva, já apresentada, de que a aprendizagem organizacional é entendida como um processo contínuo que vai além da soma da aprendizagem individual dos integrantes de uma organização. Inicialmente, tal

inferência leva a acepção do princípio sistêmico ou organizacional e do princípio hologromático, relacionados ao pensamento complexo, associando-os ao processo de aprendizagem organizacional. Se, por um lado, a aprendizagem é um processo interno e pessoal, que surge da interação entre duas ou mais pessoas, o princípio sistêmico configura- se na dinâmica da aprendizagem organizacional a partir do momento em que o conhecimento de cada sujeito da organização é agregado ao conhecimento dos demais sujeitos da organização, e o resultado desta agregação é maior do que a soma do resultado do conhecimento de cada sujeito colocado em prática isoladamente.

O princípio hologromático se estabelece nesse processo quando se entende que o conhecimento organizacional se dá a partir do conhecimento individual e que o conhecimento organizacional está inscrito no conhecimento de cada individuo. À medida que é compartilhado e interiorizado, o conjunto do conhecimento organizacional estará refletido no conhecimento de cada indivíduo.

As assertivas de Argyris (2010) sobre a aprendizagem de modo duplo e as de Senge (2010) sobre a adoção e incorporação das tecnologias componentes nas organizações que aprendem se alinham com as investigações propostas por Bastos (2002) quando este faz uma analogia entre cérebro e organizações. Este autor pensa o mecanismo operacional do cérebro tal qual o funcionamento das organizações, e sugere investigações de “como os indivíduos e organizações constroem os seus ambientes e como tais processos se relacionam com importantes produtos organizacionais” (BASTOS, 2002, p. 65-66). Neste contexto, é possível refletir sobre o princípio do círculo retroativo e o princípio do círculo recursivo, relativos ao pensamento complexo, associados aos processos de aprendizagem organizacional e de inovação gerencial.

Para Argyris (2010) e Senge (2010), a aprendizagem organizacional requer o uso de estratégias emergentes e criativas, promove o surgimento de novas práticas, e essas, uma vez incorporadas às imagens e às representações mentais dos indivíduos, desde que construídas coletivamente, podem constituir inovações nas ações organizacionais. Logo, a aprendizagem e a inovação emergem a partir da ruptura do princípio da causalidade linear (i.e. das evidências de erros nas ações organizacionais) e pela inclusão dos processos autoreguladores (i.e. inter-retroações computantes e cogitantes dos sujeitos cognoscentes na busca das soluções para os erros detectados, conforme Morin, 2005b, p. 195). O círculo

estabilizando o sistema (i.e. as ações organizacionais), corroborando um fenômeno complexo. O círculo de retroação retrata os laços a que se refere Argyris em seus conceitos acerca de aprendizagem organizacional.

Uma das principais características desse fenômeno são as emergências resultantes das recursividades ou iteratividades de partes ou indivíduos nos sistemas (MORIN, 2005a). Para esse autor, as emergências se configuram como criações em relação a um dado contexto desde que sejam recorrentes. Neste sentido, supõe-se que a Rede InovarH-BA, a partir dos seus meios e espaços, promove a criação de conhecimentos em gestão hospitalar desde que os sujeitos introduzam em seu habitus a socialização, externalização, combinação e internalização de seus conhecimentos recursivamente.

Ainda com base nos princípios do pensamento complexo, o princípio do círculo

recursivo introduz a noção de autoprodução e auto-organização. Este princípio remete a um

círculo gerador, no qual o produtor (nesta tese, os sujeitos), no processo de produzir (nesta tese, em sua atuação profissional), modifica o meio onde se insere e é modificado por ele. Assim, produtor, processo e produto estão intimamente ligados.

Nessa abordagem, um ser inteligente, embora divida o mundo complexo em subconjuntos mais simples, cognoscíveis, não perde a perspectiva do conjunto. Compreendendo o todo e as partes, o sujeito pode planejar sua ação, entendendo planejamento como a capacidade de combinar conhecimentos para decidir o melhor desenvolvimento da ação a fim de alcançar seu objetivo. Essa capacidade, segundo Imbert (1988, p. 55-56), é uma das faces da capacidade de aprendizagem e dentre ela se inclui a capacidade de “modificar as estruturas do conhecimento, as estratégias perceptivas e a ação”.

Assim sendo, é possível, também, correlacionar o princípio da auto-eco-organização ao processo de aprendizagem organizacional. Esse princípio é caracterizado pela autonomia e dependência dos sistemas vivos (MORIN, 2003 e 2005a). Ora, se as organizações (i.e. hospitais) são entendidas como sistemas, espera-se delas a capacidade de regeneração permanente, que, de certo modo, pode ser compreendida como uma a aprendizagem organizacional. Observa-se que essa capacidade se efetiva por meio dos sujeitos (i.e. auto- organizadores das organizações) e por meio do conhecimento tácito desses sujeitos (i.e. autoprodução). Para tanto, é recomendado a interação desses sujeitos com o ambiente organizacional (i.e. externo e interno à organização) para retirar e apreender a energia e a

informação deste ambiente nos quais esses sujeitos estão inseridos, caracterizando a auto- eco-organização.

Logo, a aprendizagem organizacional é vista como algo interativo e socialmente imerso, não descolada do envolvimento de organizações e do contexto cultural dessas. Assim sendo, infere-se que esse processo é relacional e implica a capacidade de regeneração e de autoprodução, a partir da (re)significação do conhecimento organizacional e da assimilação de um novo habitus. Tal condição revela tanto uma autonomia como uma dependência dos sistemas.

Isto posto, a autoprodução, no contexto da aprendizagem organizacional, não é descolada da condição dialógica entre a desordem (i.e. novas energias e informações apreendidas pelos sujeitos), a ordem (i.e. as energias e informações já inculcadas nos modelos mentais dos sujeitos) e a organização (i.e. o comportamento dos sujeitos frente às suas estratégias de ação organizacional) por meio de inumeráveis inter-retroações constitutivas do mundo físico, biológico e humano (MORIN, 2003).

Encontram-se as relações entre o princípio dialógico do pensamento complexo e as inovações gerenciais ou mesmo a metanoia, preconizada por Senge (2010), quando se defende que estas dependem das inter-retroações computantes e cogitantes entre os sujeitos nas organizações. Tal princípio se coaduna com a adoção de uma flexibilidade da cultura organizacional e da capacidade cognitiva dos sujeitos no sentido de absorção de novos conhecimentos. Esta adoção e esta capacidade são atributos essenciais para a difusão de novas tecnologias gerenciais e são recorrentes ao processo de aprendizagem organizacional.

Destarte, o processo de inovação é consequência do processo de aprendizagem, uma vez que esse se caracteriza como um processo cumulativo, por meio do qual as organizações ampliam os estoques de conhecimento, aperfeiçoam procedimentos de busca e refinam habilidades em desenvolver ou manufaturar tecnologias, expressas em produtos, processos, novas ferramentas de gestão e novos modelos de negócio.

Nesse aspecto, o princípio da reintrodução do conhecimento em todo

conhecimento é associado ao processo de inovação gerencial e ao processo da difusão

dessas. Nesta tese, a difusão de inovações é entendida conforme proposto por Rogers (2003), ou seja, como um processo pelo qual uma inovação é comunicada por meio de canais, no tempo e entre membros de um sistema social. Esta acepção caracteriza a Rede

InovarH-BA como um sistema social, pois promove a difusão de inovações gerenciais por meio do conhecimentos dos sujeitos que integram essa Rede, a partir da interação destes nos espaços presenciais e virtuais. A difusão se efetiva se, de fato, esses sujeitos compartilharem seus conhecimentos.

Assim, a reintrodução do conhecimento em todo conhecimento opera a restauração do sujeito e torna presente a problemática cognitiva central. Para Morin (2003), essa problemática se constitui a partir de que todo conhecimento é uma reconstrução, dependente da tradução desse conhecimento por um espírito/cérebro, em uma cultura e tempo determinados. Infere-se que, no contexto da aprendizagem organizacional e da inovação gerencial, a Rede InovarH-BA possibilita a difusão do conhecimento em gestão hospitalar, no entanto, não assegura as inter-retroações computantes e cogitantes, relacionadas ao espírito/cérebro dos sujeitos que a compõem. Supõe-se que tais inter- retroações, no âmbito dos hospitais, podem ser cotejadas uma vez que essas organizações de serviços assimilem o habitus de interação entre sujeitos na troca de energia e informações relacionadas à gestão hospitalar.

Observa-se que essa interação (i.e. um novo habitus) não é dependente apenas de uma estrutura telemática, mas da adoção do modelo de aprendizagem de circuito duplo de Argyris (2010), das disciplinas propostas por Senge (2010) e do modelo de criação do conhecimento de Takeuchi e Nonaka (2008). Aprender e inovar são muito mais que internalizar informações, depende da disposição para compartilhá-las e transformá-las em algo novo.

No Quadro 10, são elencados, resumidamente, os sete princípios-guia de Morin (2003).

Neste capítulo, foram abordados conceitos sobre os processos de aprendizagem organizacional e inovação gerencial. Não obstante o quadro analítico conceitual discorrido, a abordagem epistemológica do pensamento complexo, proposta por Morin (2003), foi contemplada, evidenciando o complexus desses processos nessa sociedade.

Como síntese, pode-se dizer que aquelas organizações que promovem a aprendizagem são compostas por sujeitos cognoscentes conscientes36. E que o trabalho de

36 “A consciência é o produto global de interações e de interferências cerebrais inseparáveis de interações e

cada sujeito afeta o cognoscível dos demais e vice-versa. Logo, as organizações não são sistemas isolados e estão em um processo de contínua correção de rumo.

Essa correção de rumo pode ser subsidiada por meio da incorporação e adoção, por esses sujeitos, de tecnologias de geração de conhecimentos, de processamento de informação e de comunicação de símbolos, desde que ratifiquem a importância dos fenômenos cognitivos.

Quadro 10 - Paralelismo entre os princípios-guia do pensamento complexo e a abordagem sobre aprendizagem, inovação e redes sociais (i.e. Capitulo 3)

PRINCÍPIOS GUIAS TEMÁTICA TESE

1. Princípio sistêmico ou organizacional Individual e Coletivo  Liga o conhecimento das partes (i.e. sujeitos) ao conhecimento do todo (i.e. grupo). O todo é mais e menos simultaneamente do que a soma das partes.

2. Princípio hologramático Conhecimento organizacional e conhecimento individual  A

parte (i.e. conhecimento individual) está no todo e o todo (i.e. conhecimento organizacional) está inscrito na parte. Inspira-se no holograma em que cada ponto contém a quase totalidade da informação do objeto que o contém.

3. Princípio do círculo retroativo Erros ou práticas constituídas  O círculo de retroação ou

feedback permite reduzir o desvio, estabilizando o sistema. Rompe o princípio da causalidade linear pela inclusão dos processos autoreguladores.

4. Princípio do círculo recorrente Relação entre sujeitos (produtor), ações (produto) e processo (atuação na organização)  Introduz a noção de autoprodução e auto-organização. Ao longo do processo, o produtor gera o produto e, ao mesmo tempo, é modificado por ele.

5. Princípio da auto-eco-organização: autonomia e dependência

Aprendizagem  Toda organização vivente se regenera permanentemente a partir da morte de suas células. Há tanto uma autonomia como uma dependência em todo sistema vivente: “Viver de morte, morrer de vida” (Heráclito).37

6. Princípio dialógico Inovação  A dialógica entre a desordem, a ordem e a

organização, através de inumeráveis inter-retroações, é constitutiva do mundo físico, biológico e humano.

7. Princípio da reintrodução do

conhecimento em todo conhecimento

Conhecimento dos Sujeitos em Redes  Opera a restauração do sujeito e torna presente a problemática cognitiva central: todo

conhecimento é uma reconstrução/tradução por um

espírito/cérebro em uma cultura e tempo determinados. Fonte: o autor, fundamentado em Morin (2003).

Esta pesquisa considera que, para o SUS consolidar seus princípios doutrinários (integralidade, equidade, universalidade) e operacionais (municipalização, hierarquização, regionalização), é pertinente, em sua gestão, a adoção de um novo habitus, a interação,

37 Para Morin (2005a, p. 255), “tudo o que está aberto vive sob ameaça de morte e da ameaça de morte. Em

entre as instituições e organizações, incluindo os hospitais da Rede InovarH-BA, que são parte desse sistema em rede e do complexo industrial da saúde. Assim, a tese que aqui se defende é explicitada na assertiva segundo a qual, para uma rede de aprendizagem e inovação se concretizar, é necessária a adoção desse novo habitus.

No próximo capítulo, é discorrida a base metodológica desta pesquisa, elucidando o tipo de estudo, as fontes e os instrumentos utilizados na pesquisa, os métodos de análise das informações levantadas, o lócus, as instâncias e os respectivos sujeitos do objeto empírico, e os processos de levantamento, organização, análise e interpretação das informações levantadas.